O BARROCO E ROCOCÓ
Por: Adriano Augusto • 15/6/2015 • Ensaio • 4.609 Palavras (19 Páginas) • 241 Visualizações
A transição de urna época arquitetônica para a se¬guinte processa-se, em geral, lentamente e, no início, é quase imperceptível. Esta afirmação é espe¬cialmente válida para a transição do Renascimento para o Barroco: quando é que o excesso decorati¬vo, o movimento, a modelação pictórica dos espa¬ços interiores e a estruturação dos edifícios foram levados ao extremo para se poder falar de Barroco? O facto de o ponto de partida para todas as igrejas barrocas ser uma obra projetada, ainda em mea¬dos do séc. XVI, por um dos mais importantes arquitetos (tardo)renascentistas - a igreja jesuíta II Gesú, em Roma (1568-75) - mostra quão direta¬mente o novo estilo tem a sua origem no Renasci¬mento Tardio. O seu arquiteto. Giacomo da Vignola, desenvolveu com esta igreja de nave única com colunas adossadas à parede - uma versão moderna da basílica paleocristã - um modelo que se tomou paradigmático para a construção das igrejas católicas: um corpo basilical com uma nave longitudinal coberta por abóbadas de berço que termina num espaço central. o cruzeiro, coroado por uma cúpula de tambor, as naves laterais foram reduzidas a capelas separadas umas das outras e por vezes da própria nave central (sendo no entanto importantes, do ponto de vista construtivo, como contrafortes). Fala-se frequentemente da interpene¬tração de dois espaços (nave longitudinal e espaço central), contudo seria mais exato descrevê-los corno fundidos um no outro
Mal tinha sido construída, a igreja principal dos cristãos católicos, São Pedro de Roma, foi trans-formada num edifício orientado, tendo Carlo Maderna, em 1607-1626, adicionado uma nave central ao edifício de planta centrada. A igreja católica que seguiu com reticências a ideia renascentista de que os edifícios de planta centra¬da representavam a forma adequada da casa de Deus, regressava agora à antiga planta. Este recon¬siderar não se circunscreveu ao domínio cons¬trutivo: pelo contrario, os processos aí verificados eram apenas a expressão de um desenvolvimento geral: a época do Renascimento tinha conduzido por muitas vias a uma perda maciça do poder da igreja Romana. Grande parte da Europa tinha-se tomado protestante e as ciências naturais moder¬nas, baseadas na razão, tinham refutado inúmeros dogmas da fé - como a forma da terra ou a sua localização no universo. A Igreja tinha pedido o monopólio da formação e a arquitetura sacra a sua posição normativa no desenvolvimento da arte de construir.
Contra esta tendência foram tomadas medidas cada vez mais severas. Em 1545, inicia-se a Contra-Reforma com o Concílio de Trento, que instituiu, por um lado, reformas tardias da Igreja Católica e, por outro, uma luta tenaz contra os protestantes. Assim, em 1559 foi criada a Congregação do Índex para os livros proibidos, o que conduziu, a partir de 1562, a violentas lutas religiosas e a perseguições de protestantes (huguenotes) em França.
Não foram construídas igrejas barrocas protestan¬tes que tivessem uma importância suprá-regional. A única exceção é constituída pelas Casas do Senhor da Igreja Anglicana na Inglaterra que, no entanto, não tinha sido fruto de uma reforma vinda de baixo, como na Alemanha, mas sim do conflito que se tinha instalado entre Henrique VIII e o papa. A Frauenkirche de Dresden, edifício de planta centrada considerado a mais importante igreja barroca protestante, foi outra exceção. No ambiente pomposo da arquitetura barroca deu-se um papel central à pregação, o centro da transmissão da fé protestante.
Um forte apelo aos sentidos
A arquitetura do Barroco foi sobretudo marcada pela entrada em ação da Contra-Reforma. O poder eclesiástico e temporal era absoluto e de origem divina. A arquitetura barroca veio representar com a grandeza e a sumptuosidade apropriadas a autoridade de ambos os poderes. Os meios utilizados eram semelhantes: o poder era encenado, os sentidos do observador estimulados; os objectivos eram a desorientação e a subjugação. Assim, por exemplo, a vantagem de uma igreja de corpo longitudinal é evidente para a estratégia da Contra-Reforma: tal como num percurso triunfal, o olhar do visitante é dirigido, tomando possível inúmeras outras encenações.
Tal como aconteceu com outros estilos, o termo “barroco” foi inicialmente utilizado de modo pejorativo para uma fôrma considerada estranha e de mau gosto (a palavra portuguesa "barroco" designa uma pérola com uma formação irregular). Na Segunda metade do séc. XVIII este termo era utilizado para insultar a arquitetura de Borrornini e de Guarini, que se considerara como sendo um desvio, sem estilo, das regras da arquitetura clássica. Ainda hoje é utilizado, na generalidade, como qualificativo com o significado de “esquisito, exagerado, extravagante”.
A fantasia da maior parte dos arquitetos barrocos era realmente transbordante: os contornos definidos eram esbatidos, as paredes eram subdivididas tanto quanto possível, decoradas e desenhadas com formas movimentadas e ondulantes. As mais variadas partes das fachadas eram modeladas de forma côncava ou convexa, as janelas e as portas eram coroadas com frontões triangulares ou curvos, muito trabalhados e, frequentemente, segmentados, contracurvados, dobrados, quebrados ou como na fachada do II Gesú, fundidos uns nos outros. Os entablamentos (dos quais o do telhado era frequentemente penetrado pela coroação das janelas) eram fortemente escalonados, tendo outras decorações típicas como grinaldas, vasos, urnas, putti, volutas com forma de S, olhos de boi (janelas ovais) e cartelas (peça de cantaria geralmente oval com vários cantos quase sempre enrolados). Tal como na Antiguidade Clássica romana ostentatória, os capitéis compósitos passaram a ser os preferidos, assim como outras misturas das ordens clássicas para pilastras (inclusive “pilastras Hermes”, que afunilam para baixo e têm em cima um busto humano) e colunas sem funções. A modelação barroca decompunha-se em muitos elementos. No entanto, o seu efeito de conjunto era sempre monumental. Os elementos de suporte eram realçados e avolumados, as colunas e os pilares, por exemplo, eram aplicados aos pares ou prolongados de acordo com a ordem colossal, ou seja, abarcando de modo contínuo dois pisos, e, por vezes, o piso térreo era modelado como soco - eventualmente rusticado.
A multiplicidade de possibilidades arquitetônicas não era, porém, um simples amontoado caótico de enfeites e elementos decorativos, seguindo, pelo contrário, um plano racionalmente trabalhado, originado não raramente numa ideia que mais tarde se veio a designar corno “obra de arte global”. Deste modo, não eram apenas a grandeza das dimensões, o movimento e a sumptuosidade que serviam o objetivo de confundir, impressionar e subjugar,
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