VISUALIZAR PARA TRANSFORMAR
Por: mancardoso • 8/9/2015 • Resenha • 2.883 Palavras (12 Páginas) • 253 Visualizações
Amanda Franceline Cardoso R.A. 10.1061-0
ADEC I
Resenha do texto: “VISUALIZAR PARA TRANSFORMAR”
Para muitos, uma motocicleta Harley-Davidson é o símbolo máximo do individualismo norte-americano, e talvez por isso a empresa ocupe espaço tão importante na história cultural dos Estados Unidos. Porém, na década de 1980, ela quase abandonou a atividade depois de comprovar que, mesmo sendo um ícone nacional, perdia cada vez mais espaço para as motocicletas importadas. Por meio de uma série de iniciativas estrategicamente coordenadas, a Harley-Davidson conseguiu revolucionar seus produtos e criar uma nova identidade na indústria chamada de “estilo de vida”. Durante o processo, a companhia revitalizou sua visão e redefiniu suas energias, melhorando a qualidade, a produtividade e as relações com os colaboradores. Ampliou a marca para negócios afins e tornou-se líder do setor. Ao desenhar –e perseguir– uma visão que entusiasmou clientes e funcionários, voltou a ser uma das organizações mais dinâmicas dos Estados Unidos. Como isso aconteceu? De forma simples, a empresa colocou a visão no centro do processo estratégico, criando o impulso necessário para superar as limitações do passado. Ela pôs em prática a visualização (visioning, em inglês), também chamada de “visão pelo design”, uma ferramenta estratégica que permite libertar-se de tais restrições e que pode ser fonte de transformação. Ao contrário do que se acredita, a visualização não é um processo mágico isolado da realidade dos negócios. Ao longo de nossa experiência com empresas de todos os setores, descobrimos que o processo funciona melhor quando se baseia no conhecimento das equipes de líderes existentes. A lição mais valiosa foi que o poder da visualização, em qualquer processo, está no compromisso reflexivo dos líderes com uma dimensão de passado, presente e futuro. Reflexão é a capacidade de se distanciar conscientemente do que é imediato para levar em conta as questões fundamentais e gerar alternativas por meio do discurso. O processo de visualização estimula a reflexão e abre espaço de diálogo para questionar as premissas e introduzir novas possibilidades. Comprovamos mais de uma vez que a visualização induz as equipes estratégicas a conceber, de maneira sólida e realista, um futuro melhor. O principal objetivo deste artigo é mostrar que a visão constitui uma ferramenta prática da gestão e é essencial para a elaboração da estratégia. Outro objetivo é demonstrar que, quando se emprega a visualização de forma reflexiva, ela contribui para a melhoria Os especialistas em estratégia e gestão de alto desempenho Sydney Finkelstein, Charles Harvey e Thomas Lawton analisam o reposicionamento da Harley-Davidson como empresa arquetípica da indústria do estilo de vida à luz da ferramenta da visualização, ainda pouco utilizada Visualizar para transformar HSM Management 71 novembro-dezembro 2008 2 da qualidade das decisões estratégicas. Finalmente, queremos alertar que é fundamental que os líderes estratégicos desenvolvam uma visão de 360 graus, baseada no presente e voltada para o futuro. A visualização ajuda as empresas a direcionar tempo, energia e recursos para iniciativas transformadoras. Para comprovar as qualidades essenciais envolvidas, apresentamos um modelo de visualização em quatro dimensões, que facilita a avaliação dos contextos interno e externo do negócio. A vantagem desse enfoque é a divisão em partes, o que traz estrutura ao processo. Vejamos o caso da Harley-Davidson. O que é visão? Apesar de bastante utilizado, o termo em geral está definido e aplicado de modo incorreto. A visão reúne a ideologia ou filosofia que dirigem uma empresa, expressando os valores, o objetivo e o rumo por meio de uma missão e de um conjunto de metas corporativas. Os valores centrais e o objetivo devem ser preservados, mas todos os demais fatores podem mudar. O princípio básico é que a visão deveria ser ao mesmo tempo constante e flexível. Os estudos falam pouco sobre como formular, comunicar e aplicar a visão, e há relutância em aplicar a visualização em profundidade, como forma de condução de conversas estratégicas. Vários executivos associam aspectos visionários à falta de realidade, um sinônimo de ideais elevados e metas inatingíveis. Acreditamos que a melhor maneira de libertar a visão das percepções negativas é por meio de uma demonstração prática. Recomendamos um enfoque de avaliação 360 graus. A visão é um produto estratégico deliberado. A visualização é a técnica conversacional utilizada para criar uma visão. Para determinar uma agenda de desenvolvimento organizacional e definir as bases de um trabalho estratégico mais detalhado, a visão deve atender a três condições: ser integral e atingir todos os aspectos do negócio; ser inclusiva, reunindo os âmbitos interno e externo da empresa e os principais grupos interessados; e estabelecer uma trajetória de mudanças dinâmicas. Para isso, é preciso contar, na verdade, com duas visões: uma estática, que mostre onde a empresa se encontra, e outra dinâmica, que revele o lugar em que ela pode estar se forem dados os passos adequados. Não é fácil elaborar uma visão integral, inclusiva e dinâmica. Algumas vezes, ela só nasce das mãos de líderes como Katsuaki Watanabe (Toyota) ou Steve Jobs (Apple). Visão e reflexibilidade Como garantir que a visão seja integral, inclusiva e dinâmica? Em nosso trabalho, conseguimos isso por meio do processo de “elaboração da visão”, que envolve uma reflexão crítica sobre cada uma das quatro principais dimensões da empresa –organização, cultura, mercados e relações–, que têm por sua vez, suas partes integrantes. A cultura, por exemplo, é definida pelos valores (as crenças que orientam sua relação com o mundo), estilo de gestão (estilo e comportamento dos líderes) e relações com os colaboradores (qualidade das interações entre gestores e funcionários). Ao examinar cada item, identificamos as características essenciais que devem se refletir na visão geral. (O desenvolvimento sustentável e a não-utilização de animais nos testes de produtos são valores fundamentais para The Body Shop, por exemplo.) Vistos em conjunto, os 12 atributos da visão formam uma imagem realista do que a empresa pode ser em poucos anos (veja figura na página seguinte). Utilizamos a elaboração da visão para facilitar as conversas estratégicas da primeira etapa. Convidamos a equipe de líderes para uma reflexão crítica sobre cada uma das dimensões do modelo. No que se refere a cada atributo, perguntamos onde a empresa se situa no momento e onde pretende estar em três anos. Esse processo aparentemente simples propicia a expressão de uma variedade de visões e intenso debate, conforme os participantes se esforçam para identificar os aspectos positivos e negativos do quadro atual e a melhor forma de aperfeiçoá-los no futuro. Ao refletir sobre “o quê”, “por quê”, “quando”, “onde”, “quem” e “como”, é possível identificar problemas, questionar certezas e elevar aspirações. Os participantes deixam de ver o aqui e agora estático e adotam uma orientação mais dinâmica no sentido das idéias. A reflexão refresca as idéias. HSM Management 71 novembro-dezembro 2008 3 A visualização se torna uma ferramenta prática da estratégia para descrever um conjunto de transições do estado estático para o dinâmico. Em geral, pede-se que a equipe descreva, para cada dimensão, o estado atual e o panorama desejado para o futuro. No caso da Harley-Davidson, a visão estática contemplava a fabricação de motos pesadas, enquanto a visão dinâmica apontava para a transformação em uma marca associada ao estilo de vida. O catalisador da mudança foi a forte concorrência dos fabricantes japoneses de baixo custo, o que forçou a renovação da marca e a concentração nas partes mais lucrativas da cadeia de valor. Renovação da visão na Harley-Davidson O ressurgimento da Harley-Davidson foi guiado por uma visão sensível em relação ao cliente e voltada para a formação de parcerias, que identificou o que a empresa era e para onde deveria encaminhar seu futuro. Para muitos, o renascimento teve início com a criação do Harley Owners Group (HOG, na sigla em inglês, ou grupo de proprietários da Harley-Davidson), a fim de estimular a fidelização e o envolvimento dos clientes. Em pouco tempo, o HOG se tornou o maior clube desse tipo em todo o mundo, reunindo quase 1 milhão de integrantes. Os passeios de moto, os encontros e os eventos patrocinados pela fábrica geram grande visibilidade, capaz de beneficiar tanto o marketing como o serviço de atendimento ao cliente, além de posicionar a marca como uma escolha associada ao estilo de vida. O segundo componente essencial para o renascimento foi o lançamento de produtos complementares, que ampliaram a ênfase no estilo de vida. As extensões da marca incluíram upgrades e acessórios: roupas para motociclistas e peças de vestuá- rio comuns, artigos para uso doméstico e uma série de emblemas disputados pelos “harleymaníacos”. Em 2006, as vendas de itens como acessórios e outros somaram US$ 862 milhões, e a comercialização geral foi responsável por mais US$ 277,5 milhões (o total das vendas foi de US$ 5,8 bilhões). Ao mesmo tempo, a Harley-Davidson começou a diversificação para atividades próximas. A compra da Eaglemark, rebatizada de Harley-Davidson Financial Services (HDFS), permitiu à empresa oferecer seguros para motos e ampliar as linhas de crédito para varejistas e atacadistas. A unidade de negócios cresce a um ritmo de dois dígitos e contribui cada vez mais para os lucros operacionais da empresa-mãe. Hoje os clientes podem, por exemplo, aprender a pilotar uma moto em uma concessionária da marca ou alugar um modelo durante um período de testes. As atividades de promoção incluem desde o patrocínio de corridas até o fornecimento de ve- ículos para a escolta das cerimônias políticas oficiais. A transformação da visão e do negó- cio pode ser compreendida por meio de quadros. A organização anterior, hierárquica e baseada no sistema de comando e controle, foi substituída por uma estrutura mais plana e integrada, com práticas e procedimentos mais flexíveis e inclusivos. A Harley-Davidson também renovou sua cultura corporativa, mas sem a necessidade de mudar tudo. Os valores defendidos por ela, como verdade, correção, integridade e respeito pelo indivíduo, sempre funcionaram; era preciso aperfeiçoar o estilo de gestão A Harley renovou sua cultura, mas sem a necessidade de mudar tudo. era preciso aperfeiçoar o estilo de gestão quatro dimensões de uma empresa ORGANIZAÇÃO CULTURA MERCADOS RELAÇÕES VISÃO Processos Estrutura Sistemas Valores Estilo de gestão Relações com os colaboradores Clientes Produtos Lugares Concorrentes Órgãos reguladores Cadeia de fornecimento HSM Management 71 novembro-dezembro 2008 4 (veja quadro abaixo. A empresa abandonou o foco nas metas de curto prazo e a gestão vertical, de olho nas melhorias contínuas e no compromisso dos colaboradores com qualidade, produtividade e inovação. Em vez de ocupar o papel de antagonistas, os sindicatos passaram a atuar como parceiros. E o que não faltava na Harley-Davidson era espaço para melhorar suas relações. Desde o início da década de 1980, a companhia alimentava uma relação protecionista com os órgãos reguladores, aproveitando sua posição de ícone nacional para conter, por meio de barreiras fiscais, o avanço de concorrentes estrangeiros, sobretudo japoneses. Duas décadas depois, o mundo havia mudado e ficou muito difícil justificar a postura protecionista. Como se não bastasse, a Organização Mundial do Comércio condenou esse tipo de tarifas e, para a Harley-Davidson, era conveniente ingressar em uma concorrência mais aberta e mais justa. Para isso, era necessário contar com padrões de qualidade mais elevados em toda a cadeia de valor. A fim de reduzir custos e melhorar sua capacidade de resposta, a empresa implantou o sistema just-in-time e começou a atuar de forma cooperativa com os parceiros da cadeia de fornecimento. Ao mesmo tempo, a concorrência franca foi substituída por uma postura que reconhecia as possíveis vantagens da cooperação para todos os competidores. No que se refere aos mercados, a Harley-Davidson se conscientizou de que sua carteira de clientes era bastante limitada, pois se restringia ao público masculino com idade entre 30 e 50 anos. O lançamento do Harley Owners Group (HOG) permitiu ampliar a oferta e aproximar a marca também de mulheres e de consumidores mais jovens, por meio de itens como perfumes e roupas. Outra medida importante foi o abandono da imagem exclusivamente norte-americana, visando uma presença mais global. Mas como tudo isso aconteceu? Não é tarefa fácil modificar a cultura de uma empresa ou alterar o comportamento dos funcionários, especialmente quando as pessoas não aceitam que a atua- ção da companhia poderia ser melhor. Essa era a situação da Harley-Davidson no início da década de 1980, e a transformação exigiu vários anos de esforço constante. O cérebro dessa recuperação foi Richard Teerlink, diretor de finanças (1981), de operações (1987) e presidenteexecutivo (1989). Depois de solucionar diversos problemas, ele compreendeu que as dificuldades de organização, cultura, mercados e relações da empresa se encontravam intimamente ligadas e que seria difícil desatar esse nó. Teerlink realmente acreditava que os recursos humanos eram o ativo mais importante e ampliou os espaços de participação dos colaboradores. Com o apoio do consultor em desenvolvimento organizacional Lee Ozley, o executivo definiu um processo de mudança, orientado A transição da Harley-Davidson – Cultura A transição da Harley-Davidson – relações A transição da Harley-Davidson – mercados Visão dinâmica Preservação dos valores da empresa Postura proativa e positiva, com interesse na melhoria constante, horizontal Criação de grupos de trabalho autônomos; grande envolvimento dos funcionários; parceria com os sindicatos Visão dinâmica Vontade de libertar-se da proteção dos reguladores Introduzir o sistema just-in-time para reduzir o estoque, com a cooperação dos fornecedores Relações mais amplas, criativas e mais bem gerenciadas Visão dinâmica Relações mais amplas, criativas e mais bem gerenciadas Extensões de linhas para mulheres e jovens Expansão pelo mundo e ênfase global Visão estática Agir de forma verdadeira e honesta; cumprir o prometido; respeitar os indivíduos; estimular a curiosidade intelectual Vertical, com foco na rentabilidade de curto prazo; dificuldade de adaptação às mudanças Participação passiva nas decisões e ações da empresa Visão estática Protecionista Sem ligações sólidas Gestão regular e desenvolvimento das relações Visão estática Base de clientes limitada Linhas de produtos limitadas Centrada nos Estados Unidos com uma gerência que conduz as exportações Valores Estilo de gestão Relações com os colaboradores Órgãos reguladores Cadeia de fornecimento Concorrentes Clientes Produtos Lugares A transição da Harley-Davidson – Organização Estrutura Sistemas Processos Visão dinâmica Eliminação de níveis hierárquicos; estabelecimento de sinergia entre as divisões Descentralização nas camadas intermediárias; estímulo à circulação da informação de cima para baixo Redução da burocracia; corte do número de aprovações necessárias para decisões menores Visão estática Fragmentada e com vários níveis Vertical descendente, sem circuitos de feedback nem contribuições ascendentes Burocrática HSM Management 71 novembro-dezembro 2008 5 pelo que mais tarde foi chamado de “visualização conjunta”. A idéia central era a de que os funcionários poderiam se sentir “donos” da visão se participassem de sua criação. A visualização conjunta permitiu integrar as contribuições de colaboradores até então excluídos, como os operários. Para facilitar seu acesso à alta gerência, foram eliminados níveis hierárquicos. Esses esforços se traduziram rapidamente em maior compromisso dos funcionários e avanços de produtividade e qualidade. O impacto da recuperação da Harley-Davidson e dessa visão mais ampla foi considerável. Perto do ano 2000, a média de crescimento anual da empresa era de 15%. Em 2003, centenário de sua fundação, ela vendeu 291.147 motos, quase o dobro do total apresentado cinco anos antes, e o lucro operacional da HDFS aumentou 61%. A HarleyDavidson voltou a liderar a produção de motos pesadas, com participação de 50% no mercado norte-americano e de 25% no mundial. Suas principais divisões (motos e produtos relacionados, além de serviços financeiros) superaram em desempenho os resultados de quase todas as grandes empresas automobilísticas e de acessórios. Mais de 21% das vendas totais foram internacionais. A empresa continua crescendo em um ritmo de dois dígitos na Europa e mantém a liderança no mercado japonês de motocicletas de grande porte. Atualmente, apontou sua mira para os mercados emergentes da China e da Índia, nos quais a visão do estilo de vida é altamente atraente para muitos fanáticos por motos. [No Brasil, onde há uma fábrica da Harley-Davidson na Zona Franca de Manaus e oito concessionárias exclusivas, o número de vendas de motos dobrou nos últimos quatro anos e já há um HOG com mais de 5 mil membros.] Visualizar é preciso O caso Harley ilustra o papel essencial da visão e da visualização na recuperação de uma empresa. A visão trouxe rumo e novo sentido para os objetivos da organização e as várias partes interessadas se sentiram inspiradas e voltaram a confiar nela. A visualização contemplou tanto interesses individuais como coletivos e propiciou conversas estratégicas que não teriam despontado de outra forma. O que aconteceu na Harley-Davidson é um magnífico exemplo de como tirar o maior proveito possível da visão e da visualização. É importante destacar três aspectos: A visão que surgiu no processo era absolutamente realista e associada à trajetória e às circunstâncias da Harley-Davidson. O processo de visualização foi transformador, porque deu origem a conversas estratégicas que contaram com a participação de colaboradores, clientes, sócios e investidores. A empresa reconheceu a necessidade de uma visão de 360 graus que fosse ao mesmo tempo integral, inclusiva e dinâmica. Ao fazer isso, estabeleceu uma agenda de melhorias organizacionais que funcionou como plataforma para o crescimento sustentável. O poder de visualização como ferramenta prática de desenvolvimento organizacional está no fato de conduzir as equipes de líderes a um pensamento reflexivo e à formulação de perguntas básicas sobre a organização, cultura, mercados e relações, o que só pode ocorrer contemplando as dimensões do passado, presente e futuro. O resultado é uma compreensão profunda dos problemas e das perspectivas da empresa. Desse processo, naturalmente surgem soluções diferentes e objetivos mais ambiciosos.
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