A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA EXECUÇÃO FISCAL: REFLEXOS DO NOVO CPC
Por: Renan Barhum • 1/3/2018 • Artigo • 2.080 Palavras (9 Páginas) • 313 Visualizações
A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA EXECUÇÃO FISCAL: REFLEXOS DO NOVO CPC
André Alia Borelli[1]
Renan Moreno Barhum[2]
RESUMO
Pretendeu-se demonstrar, por meio de sintética análise de teoria e prática acerca da possibilidade ou não da aplicabilidade do incidente de desconsideração da pessoa jurídica no processo de execução fiscal, tendo em vista o conflito aparente de normas entre o CPC, o CTN e a Lei 6.830/80 (Lei de Execução Fiscal). Com base em entendimentos doutrinários e jurisprudenciais foi possível chegar a uma conclusão.
CONSIDERAÇÕES SOBRE O ASSUNTO
O instituto da desconsideração da personalidade jurídica é uma ferramenta de grande utilidade, bastante difundida pelo Código de Processo Civil de 1973. Durante a época em que vigia referido diploma processual, a jurisprudência passou a admitir a desconsideração da personalidade jurídica nos autos da ação principal, não necessitando o ajuizamento de uma ação autônoma para tal. O entendimento majoritário era pelo cabimento de que, incidentalmente, o juízo poderia desconsiderar a personalidade jurídica de sociedade na ação de execução.
Com o advento do Novo Código de Processo Civil, vigente desde março de 2016, referido instrumento fora positivado, denominado “incidente de desconsideração da personalidade jurídica”, o que pavimentou entendimento já consolidado acerca da desnecessidade de uma ação específica a fim de atingir o patrimônio pessoal dos sócios ante o patrimônio societário, nos casos em que o.
Tais normas foram alocadas no Livro III, Título III, Capítulo IV do diploma processual civil, mais precisamente nos artigos 133 a 137.
Art. 133. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica será instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo.
§ 1o O pedido de desconsideração da personalidade jurídica observará os pressupostos previstos em lei.
§ 2o Aplica-se o disposto neste Capítulo à hipótese de desconsideração inversa da personalidade jurídica.
Art. 134. O incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial.
§ 1o A instauração do incidente será imediatamente comunicada ao distribuidor para as anotações devidas.
§ 2o Dispensa-se a instauração do incidente se a desconsideração da personalidade jurídica for requerida na petição inicial, hipótese em que será citado o sócio ou a pessoa jurídica.
§ 3o A instauração do incidente suspenderá o processo, salvo na hipótese do § 2o.
§ 4o O requerimento deve demonstrar o preenchimento dos pressupostos legais específicos para desconsideração da personalidade jurídica.
Art. 135. Instaurado o incidente, o sócio ou a pessoa jurídica será citado para manifestar-se e requerer as provas cabíveis no prazo de 15 (quinze) dias.
Art. 136. Concluída a instrução, se necessária, o incidente será resolvido por decisão interlocutória.
Parágrafo único. Se a decisão for proferida pelo relator, cabe agravo interno.
Art. 137. Acolhido o pedido de desconsideração, a alienação ou a oneração de bens, havida em fraude de execução, será ineficaz em relação ao requerente.
No entanto, além de trazerem certezas, supracitados dispositivos também foram responsáveis pela ocorrência de variadas dúvidas e, por conseguinte, proveitosas discussões acerca da possibilidade da aplicabilidade desse instituto nas ações de execução fiscal, eis que o artigo 134 do CPC prevê cabimento do instrumento de desconsideração da personalidade jurídica nas execuções que tenham por fundamento título executivo extrajudicial.
Ante a regra acima, observa-se predominante nas Fazendas Públicas a não provocação do incidente de desconsideração da personalidade jurídica nas execuções fiscais, eis que há incompatibilidade frente à Lei de Execução Fiscal e ao Código Tributário Nacional. Vejamos:
A Lei de Execução Fiscal exige a garantia do juízo para que o processo possa ser suspenso, ao inverso do que dispõe o CPC;
O Código Tributário Nacional limita a responsabilidade de terceiros àqueles que possuem poderes de gerência ou administração, enquanto o incidente trazido pelo CPC pode ser oposto a qualquer sócio com responsabilidade limitada. O responsável tributário está disciplinado no artigo 121, inciso II e, em relação ao sócio com poderes de gerência, no artigo 135, inciso III, ambos do CTN, transcritos abaixo:
Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária.
II - responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.
Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:
III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado
Em seu artigo 4o, inciso V, a Lei de Execução Fiscal permite que a execução seja promovida: “contra o responsável, nos termos da lei, por dívidas, tributárias ou não, de pessoas físicas ou pessoas jurídicas de direito privado”. Além disso, o conteúdo do §3º do mesmo artigo prevê que os bens do responsável tributário que seja sócio com poder de gerência, estão sujeitos à execução fiscal, sem mencionar a necessidade de instauração de incidente de desconsideração de pessoa jurídica ou qualquer outro procedimento.
Por outro lado, o incidente normatizado pelo diploma processual civil impõe a ocorrência de desvio de finalidade e confusão patrimonial e não há possibilidade de ser decretado de ofício.
Com base nessa fundamentação, diversos tribunais vêm adotando o entendimento de que na execução fiscal não é possível a aplicação do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, conforme se pode verificar nas ementas abaixo:
“AGRAVO – EXECUÇÃO FISCAL referente a ISS de 2006 – Município de São José do Rio Preto – Redirecionamento da execução contra sócio administrador – No caso, cabimento, pois demonstrada a dissolução irregular da empresa – Precedentes e súmula 435 do c. STJ – Desnecessidade de instauração de incidente de desconsideração da pessoa jurídica, pois o sócio responde pessoalmente com seus bens por ato ilícito da empresa – Contraditório e ampla defesa que podem ser exercidos na própria execução – RECURSO PROVIDO”. (TJSP, Relator: Rodrigues de Aguiar; Comarca: São José do Rio Preto; Órgão julgador: 15ª Câmara de Direito Público; Data do julgamento: 09/08/2016; Data de registro: 09/08/2016).
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