Resenha Filme Amistad
Por: Cindy Layara • 1/7/2015 • Resenha • 1.645 Palavras (7 Páginas) • 1.409 Visualizações
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E LETRAS – CCHL
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS
CURSO: DIREITO DIURNO
DISCIPLINA: HERMENÊUTICA JURÍDICA
PROFESSOR: CARLOS AUGUSTO PIRES BRANDÃO
Resenha do filme:
“Amistad”
Cindy Layara Pires de Carvalho
Teresina, 2013
AMISTAD. Autor: David Franzoni. Diretor: Steven Spielberg. Produção: Steven Spielberg; Debbie Allen; Colin Wilson. Estados Unidos: DreamWorks Pictures e Paramount Home Vídeo, 1997. (154 min).
Cindy Layara Pires de Carvalho[1]
Amistad: denominação que, concomitantemente, intitula o nome de um navio e um filme americano. A duplicidade da definição anteriormente exposta simboliza o enlace entre o real e o fictício, no qual se encontra o Amistad. Baseado em fatos verídicos, a produção cinematográfica propala a história de um grupo de africanos aprisionados e transportados para servirem como escravos no ano de 1839. Surpreendente, a película principia com arquejos contínuos de dor e cansaço de um dos personagens – Cinque (interpretado por Djimon Housou) – que culminam com o alcance do instrumento libertário: um prego retirado do navio, fato que eclode na insurreição dos negros capturados contra os seus opressores.
Em alto-mar, o conflito desenvolve-se, a tripulação da embarcação é morta, com exceção de dois espanhóis, que foram poupados com o intuito de guiar o barco de volta para as terras africanas. Entretanto, os marinheiros espanhóis desviaram a rota e dirigiram o navio para terras norte-americanas. Ainda sobre o controle dos africanos e sem a consciência da alteração do itinerário, a nau será interceptada pela marinha americana, que conduzirá todos os que estavam a bordo a um tribunal, onde seus destinos serão julgados.
Envolto no contexto de intrigas ideológicas e políticas entre norte e sul dos Estados Unidos da América, marcado pela cisão entre abolicionistas e escravocratas, reside o impasse do futuro do grupo africano. Theodore Joadson (interpretado por Morgan Freeman) negro liberto apoia a causa e busca uma forma de defender aquele conjunto de pessoas acorrentadas a um embate político-filosófico que os distanciava da sua terra natal. Junta-se à ele, Roger Sherman Baldwin (encenado por Matthew McCounaughey), jovem advogado decidido e voraz em na realização de seus deveres, que irá buscar as mais diversas formas de driblar as jogadas políticas e convencer a todos da importância e necessidade de proporcionar a liberdade daqueles indivíduos, retirados a força de seus lares.
A notícia da disputa judicial aflorou interesse nas mais diversas pessoas. A primeira delas foi a jovem rainha da Espanha, Isabel II, que exigiu o direito de propriedade sobre a tripulação negra. Os oficias da marinha americana também ajuizaram ambição na causa, alegando a seu favor que a embarcação e sua carga (considerando os escravos como composição da mercadoria) eram uma maneira de compensar os seus feitos de encontrar e resgatar o navio. Por sua vez, os tripulantes espanhóis declararam-se donos do grupo africano, justificando a condição de donos por meio da obtenção dos escravos em Havana, Cuba.
Em oposição a todos eles, encontra-se a equipe liderada pelo já mencionado Theodore Joadson e seu advogado Roger Baldwin. E é em meio a esse combate que se edifica toda a trama do filme. A problemática inicial permeava a acusação de assassinato supostamente cometida pelo grupo negro à sua tripulação branca. Todavia, a temática desloca-se para o questionamento de posse dos escravos.
Perpassando por várias intempéries, a equipe abolicionista enfrentou inúmeros julgamentos com astúcia. O maior de todos os impasses foi a relevância do posicionamento do governo dentro das decisões judiciais, explicito em todo o filme e fortemente marcado pela passagem em que há a troca do juiz, que seria favorável a libertação dos negros, com o intuito de adequar a sentença aos interesses políticos.
É interessante ressaltar, a sobreposição do poder executivo sobre o poder judiciário, o que denota um forte prejuízo ao princípio da separação dos poderes. Aspecto que pode ser vislumbrado como uma crítica a República norte-americana em consolidação, em que um dos pilares encontra-se fortemente abalado pelo jogo de interesses. O aumento do interesse político por um aparente simplório caso de escravos provinha da tensão entre os estados nortistas absolutistas e os estados sulistas escravocratas, que ultrapassava o campo do ideológico e perpassava o âmbito eleitoral, provocando uma grande relevância na circunstância judicial, devido à necessidade do apoio sulista à reeleição do então presidente, Martin Van Buren, o que acirra a problemática. Além do impulso interno, Buren também procurava a condenação do grupo africano devido às relações externas, e a sua intenção de agradar o reino espanhol.
Outra temática abordada claramente na produção cinematográfica são os direitos humanos. A simples indagação sobre se os africanos do navio Amistad são ou não propriedades privadas, o que denota que mesmo em países que se intitulam republicanos o princípio da equidade não é contemplado. Seres humanos em meio a uma sociedade supostamente democrática são definidos como cargas, que não possuem a liberdade de escolha para decidir os rumos de sua vida. Todavia, o contraponto do filme – que, na realidade, não demonstra a superação desse pensamento racista, mas a concomitância com percepções igualitárias e humanitárias – aparece na defesa dos abolicionistas que procuram não só defender a garantia dos mínimos direitos aos negros, mas também permitir à eles a possibilidade de expressar suas ideias sobre as circunstâncias, o que fica bem claro na passagem em que John Quincy Adams – ex-presidente dos Estados Unidos – inquiri Cinque sobre os métodos a se proceder no tribunal, ou no momento em que o advogado Baldwin tenta compreender o africano para construir sua defesa, as belezas dos trechos residem no posicionamento igualitário.
Ainda no âmbito dos direitos humanos, o filme gera a reflexão sobre o valor de uma vida ao apresentar o episódio em que cerca de 50 pessoas são atiradas ao mar, por conta da baixa reserva de alimentos e bebidas. Problemática que se agrava por conta da maneira como é apresentada ao tribunal, quando os escravocratas argumentam em sua defesa que não seria lucrativo jogar carga ao mar, portanto, isso não teria ocorrido, o que, embora seja uma falácia, denota a concepção que eles possuem do homem africano.
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