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O CHOQUE DE CIVILIZAÇÕES, AS LINHAS DE FALHA E A TURQUIA

Por:   •  17/5/2018  •  Ensaio  •  6.081 Palavras (25 Páginas)  •  227 Visualizações

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O CHOQUE DE CIVILIZAÇÕES, AS LINHAS DE FALHA E A TURQUIA

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Introdução

Proposta inicialmente em 1992, pelo cientista político Samuel P. Huntington, a teoria do Choque de Civilizações abrigava as inquietações existentes tanto em setores acadêmicos quanto por parte do “establishment conservador-político-corporativo” dos Estados Unidos e de seus aliados históricos do outro lado do Atlântico Norte, decorrentes das forçosas transformações na geopolítica internacional que se seguiram ao colapso da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (“URSS”) em 1991. (HUNTINGTON, 1996)

Ainda que o autor tenha feito referências a relevantes períodos históricos anteriores, é com o fim da disputa ideológica por “corações e mentes” durante a Guerra Fria, travada entre as superpotências Estados Unidos e URSS, que Huntington inicia a sua análise.

Huntington sugeriu que os conflitos entre as nações não teriam mais como origem disputas ideológicas ou econômicas, mas que, fundamentalmente, as disputas seriam motivadas por questões relativas às identidades culturais e religiosas existentes entre os povos.

A categorização mais importante proposta pelo autor tem, também, uma forte clivagem geopolítica, uma vez que ele fundamenta as diferenças de valores e práticas que existem entre as “civilizações” a partir de um conceito histórico- cultural-geográfico - o conceito de “Ocidente” , em oposição a diversas outras culturas, notadamente a islâmica.

Dentre certos tópicos relevantes desenvolvidos na teoria do Choque de Civilizações, este escrito pretende abordar a questão mais premente e específica do embate entre Ocidente e o Islã, especificamente contextualiza-la a partir da evolução histórica que marcou o fim do Império Otomano e o nascimento Turquia secular e moderna, uma nação-chave, localizada estrategicamente e marcada histórica e culturalmente entre a Europa e o Oriente, entre o Ocidente e o Islã.


Huntington também se referiu à Turquia como um “país dilacerado” por - apesar de ter uma relativa homogeneidade cultural - estar dividida a respeito de qual civilização sua sociedade irá seguir. A conformação territorial também contribui para essa divisão já que os 769 mil km² do território turco têm como característica geográfica o fato de pertencerem tanto à Ásia quanto à Europa, tanto ao Mediterrâneo quanto ao ao Mar Negro, tanto ao Cáucaso quanto aos Bálcãs.

O Ocidente e o Islã, uma breve história e dois conceitos.

A análise do Ocidente como conceito, que permeia toda a obra “O Choque de Civilizações”, não poderia ficar, obviamente, restrita à clássica divisão do globo em dois hemisférios. Se fosse esse o caminho escolhido não haveria qualquer dificuldade em defini-lo, bastaria seguir a lógica cartesiana, buscando apenas e tão somente seguirmos uma linha traçada cartograficamente e teríamos tanto o Ocidente, quanto a sua oposição, o Oriente.

Ocidente e o conceito de ocidentalização estão entrelaçados a uma visão do mundo baseado numa perspectiva eurocêntrica que, sob um prisma histórico- cultural, foi sendo constituída pari passu ao florescimento da própria civilização europeia, impulsionado por uma formidável conjunção de uma ideologia do progresso e do avanço cientifico-tecnológico com a noção de liberdade individual e de uma embrionária noção de empreendedorismo.

A partir do século XV, as incursões europeias, que buscavam novas rotas comerciais, mercados e territórios e que se consolidaram através do processo de colonização dos novos territórios, disseminou pelo mundo o conceito da supremacia europeia. É este processo expansionista e colonizador que de certa forma estabelece, também, que a noção de desenvolvimento é inerente, derivada da Europa, sendo, portanto, um feito do Ocidente.

É importante notar, que um dos motivos que levaram os europeus a buscar novas rotas comerciais foi justamente o tamponamento pelo Império Otomano, força ancestral da Turquia moderna, dos caminhos que levavam os europeus à Índia e à China. (ROBINSON 1996)

Um fator determinante para a consolidação deste entendimento foi o êxito, nas últimas duas décadas do século XIX e nas primeiras duas do século


XX, do capitalismo nas nações centrais europeias (notadamente na Inglaterra, França e Alemanha) e nos Estados Unidos.

Na visão de Huntington, esse construto geográfico e geopolítico de Ocidente foi expandido, alargado para abrigar os países onde a cultura europeia moderna, capitalista e anglo-saxônica, foi assimilada e bem sucedida. Assim, os Estados Unidos, o Canadá, a Austrália e a Nova Zelândia vieram a se incorporar à civilização ocidental hegemônica.

O CHOQUE DE CIVILIZAÇÕES – Representação Cartográfica

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Apoiados pela tríade capitalismo, burocracia e ciência, o “desenvolvimento” se converteu em “modernidade” numa escala global, na qual o Ocidente serviu como o centro difusor do que era moderno. Assim, enquanto o Ocidente representava a pujança econômica e o avanço modernizador hegemônico, as demais civilizações não ocidentais eram a representação do atraso e, de certa forma, do obscurantismo.

O Ocidente e, consequentemente, a cultura ocidental foram constituídos, sucessivamente, por vários povos num movimento sócio cultural complexo que incorporou características relevantes dos gregos (a polis, a ciência, a educação), dos romanos (o direito, a propriedade privada), da revolução ética e escatológica da bíblia (fruto da cultura judaíco-cristã), e com a promoção da democracia liberal, resultantes das revoluções democráticas e burguesas. Decorrem daí, assim, os componentes essenciais do Ocidente: o estado de direito, a


democracia, a liberdade intelectual, a racionalidade crítica, a ciência e a economia baseada na propriedade privada. (NEMO 2004)

Outro fator determinante para a legitimação do Ocidente como “centro” do mundo foi sua própria representação cartográfica, tal como construída pela civilização Europeia através dos tempos. O Ocidente, como conceito, necessitava uma construção física no espaço, que o materializasse, de modo a torná-lo percebido, apreendido e, mesmo, apropriado. Enquanto forma de expressão, a cartografia está essencialmente sujeita a convenções e, também, às relações de poder historicamente condicionadas pelo seu tempo e pelos modos segundo os quais seus elaboradores viam o mundo. (RAFFESTIN, 1993)

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