Feminismo e Modernidade no Oriente Médio
Por: Lidia Aleixo • 22/5/2020 • Monografia • 9.043 Palavras (37 Páginas) • 251 Visualizações
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho busca analisar a forma como o envolvimento das mulheres muçulmanas nos movimentos islamistas pode contribuir em sua vida política e social. Um estudo como esse é relevante pelo fato de o mundo muçulmano vir se destacando como um polo geopolítico. Além disso, compreender os movimentos fundamentalistas islâmicos é de grande importância, uma vez que sua presença em conflitos internacionais tem se tornado cada vez mais frequente.
No Brasil, os estudos sobre a questão das mulheres no islamismo e a questão de gênero no Islã são quase nulos. A base desses poucos estudos sobre o tema no Brasil vem dos meios de comunicação, criando assim um senso comum sobre a mulher muçulmana ser vista apenas como vítima de opressão e segregação. Ao estudar trabalhos de autoras de outros países como Margot Badran (2009), Fatima Mernissi (1991) e Leila Ahmed (1992), podemos perceber que a realidade dessas mulheres muçulmanas é muito mais abstrusa do que a retratada pelo senso comum. Nesse sentido, compreendemos que uma análise a partir da Teoria Feminista das Relações Internacionais pode oferecer um contraponto a essas perspectivas e promover debates mais profundos sobre o assunto.
Para esclarecer o objeto de estudo escolhido, é necessário explicar os sentidos que neste trabalho são atribuídos aos termos
Islã, islâmico, islamismo e islamista. Islã refere-se ao sistema de crenças, princípios, dogmas e valores da religião fundada por Maomé, sendo islâmico o adjetivo que lhe corresponde. Islamismo, por sua vez, refere-se especificamente a movimentos e ideologias políticas fundamentalistas do Islã, sendo islamista o adjetivo correspondente. (DEMANT, 2004, p. 19).
Leila Ahmed, define islamismo como sendo:
uma particular e intensa forma política do Islã, que tem sido crescente nas sociedades muçulmanas desde a ressurgência islâmica, nos anos 1970, uma ressurgência significativamente impulsionada por atividades da Irmandade Muçulamana (2011, p.1-3).
Azza Karam declara:
Eu uso o termo islamista porque sinto que é necessário referir-se a esses grupos em termos de agendas que eles mesmos proclamam e em alguns casos implementam (...) o termo islamista é como, frequentemente, muitos ativistas islamistas nomeiam a si mesmos. Como um jovem ativista da Irmandade Muçulmana, declarou: “dá-me uma fonte de orgulho e satisfação quando eu sou referido como um islamista. Tudo o que eu busco é ver o Islã implementado” (2006, p.265).
Dessa forma, trabalharemos com o seguinte problema de pesquisa: Como o envolvimento das mulheres muçulmanas nos movimentos islamistas podem contribuir para sua autonomia sociopolítica? Para se aproximar de uma resposta, iremos analisar o envolvimento das mulheres dentro dos movimentos fundamentalistas do mundo muçulmano, pós anos 1980, nas regiões do Egito e Turquia, a fim de compreender como elas lidam com a contradição que é ser mulher e feminista no mundo islâmico. Enquanto objetivos específicos, buscaremos: a) identificar como o islamismo afeta a vida social e política das mulheres muçulmanas; b) analisar como as mulheres conciliam o mundo moderno com as leis e tradições islâmicas; c) traçar um quadro histórico a partir do início dos anos 1980 até os dias atuais, sobre o envolvimento dessas mulheres nos movimentos islamistas; d) comparar as diferenças e semelhanças desses envolvimentos no Egito e na Turquia; e) examinar se houve mudanças no mundo islâmico com a chegada da modernidade.
Para compreender o que apresentamos como modernidade, vale destacar a definição usada por Peter Demant sobre o mito da modernização, transcrita a seguir
mito, em primeiro lugar, porque atribui a “emergência do Ocidente” a fatores primariamente internos, descartando fatores externos tais como: 1) a influência geográfica que beneficiou certas regiões em lugar de outras; 2) a influência temporal, que favoreceu as primeiras sociedades modernas à custa das retardatárias; e, 3) a influência estrutural de um “sistema mundial”, que abarca todas as sociedades numa rede global, determina o papel de cada uma e da qual é difícil escapar. Mito, por fim, porque por trás da fenomenologia desta “modernização” se esconde uma ideologia de desenvolvimento determinista que parece uma versão secularizada do arco do tempo linear – aquele do deus das religiões da revelação -, desde a criação até o último julgamento. (DEMANT, 2004, p. 318-19).
A pesquisa a ser conduzida tem caráter exploratório, tendo em vista que não existem muitos estudos sobre essa temática no Brasil com uma perspectiva das Relações Internacionais. A metodologia aplicada será uma pesquisa histórico-analítica, pois esse trabalho irá acompanhar a evolução do objeto pesquisado e comparar como ele era visto anteriormente e na atualidade.
Trabalharemos principalmente com as noções de Islã, fundamentalismo muçulmano, gênero, feminismo e modernidade. Dessa forma, a pesquisa terá como base os livros de autoras como Margot Badran (2009), Leila Ahmed (1992) e Fátima Mernissi (1991), as quais trazem uma abordagem mais focada na história do islamismo e em como ele trabalha a questão da mulher, além de trazer também suas visões feministas sendo mulheres islamistas. Por fim, vale destacar que se trata de uma pesquisa de caráter qualitativo, pois apesar de utilizarmos alguns dados e estatísticas, a maior parte do trabalho decorre de pesquisas documentais.
2 FUNDAMENTALISMO ISLÂMICO E A MULHER MUÇULMANA
O presente capítulo tem como objetivo analisar o contexto histórico do fundamentalismo religioso no Egito e na Turquia. Abordando a participação feminina no contexto destes dois países, iremos também analisar alguns pontos da ideologia islamista sobre as mulheres, gerando, assim, uma reflexão sobre como esse fundamentalismo afeta a vida social e política das mulheres muçulmanas.
Esse impacto pode ser cada vez mais notado em diversas esferas da sociedade islâmica, e vemos que ele pode trazer tanto efeitos positivos como negativos para a vida da mulher muçulmana. Nesse sentido, buscaremos compreender se esse impacto aumenta a participação das mulheres no âmbito sociopolítico e como as mulheres feministas muçulmanas conciliam o feminismo com o islamismo.
Fundamentalismo religioso
O fundamentalismo é algo que ocorre em todas as religiões, e não somente na religião Islâmica. Afinal, fundamentalismo nada mais é do que os fundamentos
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