A Coincineração De Resíduos
Tese: A Coincineração De Resíduos. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: ghar • 24/9/2014 • Tese • 6.626 Palavras (27 Páginas) • 140 Visualizações
A coincineração de resíduos em fornos de cimento: riscos para a saúde e o meio ambiente
Co-incineration in cement kilns: health and environmental risks
Resumo O objetivo do artigo é discutir a forma como a coincineração de resíduos em fábricas de cimento vem crescendo no Brasil, bem como seus impactos sobre a saúde humana e o meio ambien- te. Informações gerais sobre mercado e efeitos so- bre a saúde foram obtidas através de revisão bi- bliográfica e alguns estudos de caso, escolhidos a partir de debate com integrantes da Rede Brasi- leira de Justiça Ambiental, foram construídos para ilustrar a situação no Brasil. Os estudos encon- trados mostraram que, independente do nível de desenvolvimento tecnológico dos países, a saúde dos trabalhadores e das pessoas que moram próxi- mas às fábricas de cimento vem sendo prejudica- da pela poluição emitida pelas empresas de ci- mento, em especial por aquelas que praticam a coincineração. Além disso, no contexto brasilei- ro, a vulnerabilidade das instituições e popula- ções afetadas tende a agravar este problema. Como conclusão, defende-se o aumento da capacidade institucional dos órgãos brasileiros responsáveis pelo monitoramento das atividades industriais, bem como uma rediscussão mais aprofundada dos aspectos políticos e éticos ligados ao transporte e comércio de resíduos industriais. Palavras-chave Riscos ambientais, Coincinera- ção, Resíduos perigosos, Produção de cimento
Abstract In this article we discuss the develop- ment of hazardous waste co-incineration in ce- ment kilns in Brazil as well as its impacts on health and the environment. Information was gathered through an extensive review on social and envi- ronmental impacts of co-incineration, and case studies, chosen after discussion with social move- ment representatives concerned with the co-in- cineration issue and related to the Brazilian Net- work on Environmental Justice, are described to illustrate the reality of co-incineration in Brazil. Studies showed that workers and community health suffers negative impacts from such prac- tices in high-, middle- and low-income countries. In the Brazilian context, the institutional and social vulnerability intensifies these problems. To conclude, we argue for the necessity of increasing the institutional capacity of health and environ- mental agencies in Brazil, through staff training and better infra-structure. Additionally, we also propose a return of the debate about political and ethical aspects of industrial waste trade. Key words Environmental risks, Co-incinera- tion, Hazardous waste, Cement production
Bruno Milanez 1 Lúcia de Oliveira Fernandes 2 Marcelo Firpo de Souza Porto 3
2144
Milanez B et al.
Introdução
Neste artigo, buscamos avaliar os riscos e im- pactos da coincineração sobre o meio ambiente e a saúde dos trabalhadores e das comunidades próximas às fábricas e discutir sobre a necessi- dade da incineração e coincineração de resíduos industriais perigosos. A partir dessa discussão, argumentamos que a coincineração de resíduos em fornos de cimento vem crescendo de forma significativa e inadequada no Brasil, causando impactos negativos sobre a saúde humana e o meio ambiente. Este tema é ainda pouco discutido no Brasil. Na língua portuguesa, existem dois termos usa- dos para se referir ao tratamento de resíduos em fornos de cimento: coprocessamento e coincine- ração. O primeiro é frequentemente adotado por empresas e transmite a idéia de que essa prática é apenas “mais uma” atividade industrial, na qual resíduos são “apenas” um insumo alternativo do processo. Por outro lado, o termo coincineração explicita o caráter de queima de resíduos, incor- porando noções de poluição e seus impactos ne- gativos. Essa segunda terminologia revela o foco no tratamento de resíduos, tornando mais clara a existência de riscos para a saúde humana e para o meio ambiente. Devido à ênfase nas questões de saúde humana e ambiental, optamos por ado- tar o termo coincineração. Na seção “A produção de cimento e a coinci- neração”, descrevemos as atividades realizadas durante a produção de cimento e no preparo dos resíduos para a coincineração. Na seção “Impac- tos da coincineração sobre a saúde humana e o meio ambiente”, apresentamos como os poluen- tes se dispersam através das emissões atmosféri- cas e do cimento e comentamos sobre outros riscos associados à atividade da coincineração. Na seção seguinte, “Coincineração, saúde e am- biente”, apresentamos uma revisão da literatura que discute como a poluição gerada nessas ativi- dades prejudica a saúde humana e ambiental. Na seção “Coincineração no Brasil”, focamos na si- tuação brasileira: iniciamos descrevendo como a coincineração vem crescendo no país e relatamos três estudos de caso que mostram não apenas as condições de trabalho em algumas localidades, mas também a falta de monitoramento e con- trole por parte dos órgãos públicos. Concluí- mos o artigo recomendando o aumento da ca- pacidade técnica dos órgãos de vigilância ambi- ental e o desenvolvimento de estratégias que faci- litem o trabalho cooperativo entre as instituições
públicas e destas com a sociedade e os movimen- tos sociais. Por fim, defendemos a necessidade de uma retomada da discussão dos aspectos éticos e políticos do transporte e comércio de resíduos industriais. O artigo foi elaborado, fundamentalmente, através de uma extensa revisão bibliográfica, que incluiu relatórios técnicos e artigos científicos. A escolha dos estudos de caso analisados foi feita com base em uma ampla discussão com pesqui- sadores, técnicos e ambientalistas vinculados à Rede Brasileira de Justiça Ambiental, realizada em agosto de 2006 na Escola Nacional de Saúde Pública, da Fundação Oswaldo Cruz1.
A produção de cimento e a coincineração
O cimento tem como principal integrante o cal- cário que, depois de extraído e moído, é mistura- do a outros minerais como argila, óxido de ferro e óxido de alumínio. Essa mistura, chamada de farinha crua, é encaminhada para os fornos, sen- do calcinada a temperaturas que variam entre 1.200 e 1.500 ºC. Durante esse processo, ocorre a fusão parcial do material e a formação dos grâ- nulos de clínquer, que são resfriados, mistura- dos a outros aditivos e moídos, dando origem ao cimento2,3. Uma das características da produção de ci- mento é a sua dependência de energia. Tradicio- nalmente, as empresas utilizam combustíveis fós- seis; entretanto, os preços crescentes dessas fon- tes de energia têm incentivado
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