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Por:   •  10/3/2015  •  1.468 Palavras (6 Páginas)  •  226 Visualizações

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IDEOLOGIA

Marilena Chauí

Marx afirma que a consciência humana é sempre social e histórica, isto é, determinada pelas condições concretas de nossa existência.

Isso não significa, porém, que nossas idéias representem a realidade tal como esta é em si mesmo. Se assim fosse, seria incompreensível que os seres humanos, conhecendo as causas da exploração, da dominação, da miséria e da injustiça nada fizessem conta elas. Nossas idéias, historicamente determinadas, têm a peculiaridade de nascer a partir de nossa experiência social direta. A marca da experiência social é oferecer-se como uma explicação da aparência das coisas como se esta fosse a essência das próprias coisas.

Não só isso. As aparências – ou o aparecer social à consciência – são aparências justamente porque nos oferecem o mundo de cabeça para baixo: o que é causa parece ser efeito, o que é efeito parece ser causa. Isso não se dá apenas no plano da consciência individual, mas sobretudo no da consciência social, isto é, no conjunto de idéias e explicações que uma sociedade oferece sobre si mesma.

Feuerbach estudara esse fenômeno na religião, designando-o com o conceito de alienação. Marx interessa-se por esse fenômeno porque o percebeu em outras esferas da vida social, por exemplo, na política, que leva os sujeitos sociais a aceitarem a dominação estatal porque não reconhecem quem são os verdadeiros criadores do Estado.

Ele o observou também na esfera da economia: no capitalismo, os trabalhadores produzem todos os objetos existentes no mercado, todas as mercadorias; após havê-las produzido, as entregam aos proprietários dos meios de produção, mediante um salário; quando vão ao mercado não conseguem comprar essas mercadorias. Olham os preços, contam o dinheiro e voltam par casa de mãos vazias, como se o preço das mercadorias existisse por si mesmo e como se elas estivessem à venda porque surgiram do nada e alguém as decidiu vender. Em outras palavras, os trabalhadores não só não se reconhecem como autores ou produtores das mercadorias, mas ainda acreditam que elas valem o preço que custam e que não podem tê-las porque valem mais do que eles. Alienaram dos objetos seu próprio trabalho e não se reconhecem como produtores da riqueza e das coisas.

A inversão entre causa e efeito, princípio e conseqüência, condição e condicionado leva à produção de imagens e idéias que pretendem representar a realidade. As imagens formam um imaginário social invertido – um conjunto de representações sobre os seres humanos e suas relações, sobre as coisas, sobre o bem e o mal, o justo e o injusto, os bons e os maus costumes, etc. Tomadas como idéias, essas imagens ou esse imaginário social constituem a ideologia.

A ideologia é um fenômeno histórico-social decorrente do modo de produção econômico.

À medida que, numa formação social, uma forma determinada da divisão social se estabiliza, se fixa e se repete, cada indivíduo passa a ter uma atividade determinada e exclusiva, que lhe é atribuída pelo conjunto das relações sociais, pelo estágio das forças produtivas e pela forma da propriedade.

Cada um, por causa da fixidez e da repetição de seu lugar e de sua atividade, tende a considerá-los naturais (por exemplo, quando alguém julga que faz o que faz porque tem talento ou vocação natural para isso; quando alguém julga que, por natureza, os negros foram feitos para serem escravos; quando alguém julga que, por natureza, as mulheres foram feitas para a maternidade e o trabalho doméstico).

A naturalização surge sob a forma de idéias que afirmam que as coisas são como são porque é natural que assim sejam. As relações sociais passam, portanto, a ser vistas como naturais, existentes em si e por si, e não como resultados da ação humana. A naturalização é a maneira pela qual as idéias produzem alienação social, isto é, a sociedade surge como uma força natural estranha e poderosa, que faz com que tudo seja necessariamente como é. Senhores por natureza, escravos por natureza, cidadãos por natureza, proprietários por natureza, assalariados por natureza, etc..

A divisão social do trabalho, iniciada na família, prossegue na sociedade e, à medida que esta se torna mais complexa, leva a uma divisão ente dois tipos fundamentais de trabalho: o trabalho material de produção de coisas e o trabalho intelectual de produção de idéias. No início, essa segunda forma e trabalho social é privilégio dos sacerdotes; depois, torna-se função de professores e escritores, artistas e cientistas, pensadores e filósofos.

Os que produzem idéias separam-se dos que produzem coisas, formando um grupo à parte. Pouco a pouco, à medida que vão ficando cada vez mais distantes e separados dos trabalhadores materiais, os que pensam começam a acreditar que a consciência e o pensamento estão, em si e por si mesmos, separados das coisas materiais, existindo em si e por si mesmos. Passam a acreditar na independência entre a consciência e o mundo material, entre o pensamento e as coisas produzidas socialmente. Conferem autonomia à consciência e às idéias e, finalmente, julgam que as idéias não só explicam a realidade, mas produzem o real. Surge a ideologia como crença na autonomia das idéias e na capacidade de as idéias criarem a realidade.

Ora, o grupo dos que pensam – sacerdotes, professores, artistas, filósofos, cientistas – não nasceu do nada. Nasceu não só da divisão social do trabalho, mas também de uma divisão no interior da classe dos proprietários ou classe dominante de uma sociedade. Como conseqüência, o grupo pensante

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