Entrevista com Manuela Penafria
Seminário: Entrevista com Manuela Penafria. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: renatinha • 15/5/2013 • Seminário • 1.792 Palavras (8 Páginas) • 379 Visualizações
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54 Manuela Penafria
A. C – Não. Eu gostaria, na realidade, de me dedicar apenas a filmes do
género de ‘Almadraba Atuneira’ ou de ‘Vilarinho das Furnas’. Por exemplo:
se eu for a um mercado e vir as peixeiras ou os homens a descarregarem
batatas, não os vejo sob o prisma de os ‘transformar’ e fazer com eles um
filme de ficção; o que me interessaria seria agarrar na máquina e seguir um
dos homens, saber onde ia ele comer, se tinha mulher, filhos, onde vivia...
enfim, para ele me contar as suas dificuldades, etc. É este o tipo de cinema
que me atrai.
V.M. - Portanto, para si o mais importante, agora, é o puro cinema
documental, o cinema documental ‘vivido’, ou seja, um tipo de cinema
que só é possível fazer vivendo intensamente aquilo que se filma, no local
das filmagens, convivendo longamente com as pessoas, etc.
A. C. - Exactamente. É isso o que me interessa. De resto, mesmo para
o meu primeiro filme (‘O Tesouro’), que era um filme de ficção, fui conviver
dias e dias com a personagem principal do filme (uma mulher paupérrima
que vivia numa aldeia perto de Leiria), conversando com ela, porque queria
de facto compreender a sua mentalidade, as suas reacções. Era ali que eu
passava o tempo sempre que não estava a filmar.
V.M. – V. conhece os filmes de Jean Rouch?
A. C. - Não. Apenas conheço a sua obra através da leitura de críticas, dos
argumentos, etc.
V.M. – Isso é muito importante, porque poderia dizer-se: ‘V. limitou-
se a retomar o exemplo do Rouch’... O que não aconteceu, porém, visto
V. nunca ter visto o cinema de Rouch. E o que é também bastante im-
portante é que, ao contrário de partir de qualquer ideia preconcebida de
cinema, V. fala, antes de tudo, como participante dos acontecimentos.
A.C. – O Manuel de Oliveira, quando há dias viu ‘Vilarinho das Furnas’,
referiu-se precisamente a isso. Ele disse-me: ‘ V. fez um filme que eu não
faria; V. ‘despiu-se’ da sua arte para fazer um filme totalmente imparcial,
sem quase nada de seu...’. E só nessa altura é que tomei consciência de que
o que ele dizia era a verdade. Quando filmo faço-o pelo meu instinto, pela
minha ideia, enfim. E a minha ideia era fazer um filme como se eu fosse de
Vilarinho..., Só tenho pena que o filme não cheirasse a terra...
V.M. - V. como autodidacta que é aprende de filme para filme: creio
que o próximo filme que pensa fazer, sobre Rio de Onor, será bastante
diferente de ‘Almadraba Atuneira’ e de ‘Vilarinho das Furnas’.
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O Paradigma do Documentário ...
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A. C. - Sim. A ideia é, pelo menos, completamente diferente.
V.M. – Até agora, V. não tem utilizado equipa: V. é o realizador, o
operador; o técnico de som, o moldador, ‘Rio de Onor’ será feito nos
mesmos moldes?
A. C – Não poderá ser feito de outra maneira. Bem vê: são filmes moro-
sos; vou para lá viver (como sempre). O dinheiro que me dão é muito redu-
zido, é um dinheiro – limite..., e isto é lamentável: eu gosto de fazer certas
coisas, e se se constata que, com outros meios, eu, poderia fazer essas mes-
mas coisas de uma forma melhor... não sei. . . deveria haver algum mecenas
que financiasse esses filmes. Mas não: é preciso quase, mendigar. Para fa-
zer ‘Vilarinho das Furnas’ fui sozinho para lá, num país de não sei quantos
milhões de habitantes.... E depois do filme feito não houve ninguém que me
tivesse perguntado: ‘Mas quanto é que V. gastou? De quanto é que V. precisa
para pagar o filme?’. Não, não há ninguém. Não houve ninguém para dar o
dinheiro suficiente de modo que eu, ou outra pessoa qualquer, pudesse fazer
um filme sobre Vilarinho das Furnas.
V.M. – V. empenhou-se até ao pescoço...
A. C. – Venho empenhado quase desde que nasci – desde que comprei a
minha primeira máquina.
V.M. – V. nunca pensou passar para 35mm?
A.C.- Pensei. Simplesmente 80 contos a multiplicar por 4 são 320 con-
tos...
V.M. - V. nunca agiu em termos de exibição comercial? Dado que não
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