RELATOS SELVAGENS FILME DE DAMIÁN SZIFRÓN
Por: dolorespuga • 9/9/2020 • Resenha • 471 Palavras (2 Páginas) • 272 Visualizações
RELATOS SELVAGENS – FILME DE DAMIÁN SZIFRÓN
Dolores Puga
Assistir o filme argentino de 2014 Relatos Selvagens – do diretor Damián Szifrón e produzido pelo espanhol Pedro Almodóvar –, nos faz levantar a seguinte questão: a violência é algo intrínseco à natureza humana, ou é a sociedade, da maneira como foi organizada, a real responsável pelo estado de brutalidade pelo qual o homem se encontra quando estimulado em circunstâncias limites? Essa questão não é nem um pouco recente. Pelo contrário, por um lado traduz pensamentos filosóficos do século XVI ao XVIII como as teorias de Thomas Hobbes ao afirmar que “o homem é o lobo do próprio homem” e, nesse sentido, o Estado (o governo), serviria para tirar o homem de seu próprio caos de destruição íntima, organizando as relações sociais. Por outro lado, traduz uma teoria oposta, de Rousseau, que viria quase duzentos anos depois, quando este define que na realidade o homem é bom por natureza, e seu problema encontra-se justamente na sociedade que o corrompe.
Imagine essas ideias mescladas a perspectivas existencialistas do século XX, em que o homem é totalmente responsável por sua própria individualidade, existência e liberdade e o telespectador irá compreender um pouco do teor de Relatos Selvagens e sua trama tão peculiar. O enredo trata de seis histórias sem nenhuma ligação entre si. Demonstra situações díspares em que a fúria pode ser levada para condições extremas: um avião cujos usuários foram selecionados por um depressivo buscando vingança; uma garçonete que se encontra entre envenenar ou não a comida de um agiota responsável pelo suicídio de seu pai; dois motoristas que se matam de forma bizarra por uma simples ocasião problemática em uma ultrapassagem; um engenheiro furioso com o sistema injusto de guinchos e multas da cidade; a corrupção e ambição dos representantes da lei com o desespero do pai rico que se vê tentando esconder o fato de seu filho ter atropelado e matado uma mulher grávida; uma noiva que promove loucuras terríveis quando descobre a traição de seu companheiro no dia de seu casamento.
Apesar da violência crua e abusiva de Relatos Selvagens, o viés cômico da película produz um efeito de distanciamento no público, que observa as cenas ao mesmo tempo em que é conduzido por uma reflexão sobre o sentido de atitudes tão limítrofes. A estética escolhida, vinculada por ângulos de câmera inusitados – como a imagem acoplada ao carro do engenheiro, ou acoplada à porta pela qual a noiva passa desesperada, seguida do noivo – auxiliam na contemplação da crueza e tensão próprias de histórias capazes de serem visualizadas cotidianamente nas páginas policiais dos jornais, mas que nunca nos questionamos ou aprofundamos sobre o assunto. Uma obra necessária para pensar o que a sociedade pode fazer com o ser humano ou para indagar sobre a capacidade dele mesmo de expor seu lado mais terrível.
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