Globalização e Diversidade Cultural
Por: jopsic • 24/7/2017 • Trabalho acadêmico • 2.721 Palavras (11 Páginas) • 450 Visualizações
ANTROPOLOGIA
Globalização
e
Diversidade cultural
Jorge de Abreu
O mundo em que vivemos atravessa um momento complexo e conturbado. A complexidade, não é algo de novo, antes, é a marca característica da história da humanidade. Diferentemente da visão desenvolvida por alguns teóricos sociais clássicos, a humanidade nunca foi um campo de relações pacíficas e lineares, com sentido e direcção determinado. Houve sempre imponderáveis pelo caminho da história social que contribuíram para moldar e alterar os factos, ou as relações dentro de um grupo ou entre grupos. Exemplos que provavelmente estiveram presentes em todas as sociedades podem ser as descobertas (de artefactos tecnológicos e de novos espaços) – gerando novas formas de interacção com o mundo – e os conflitos de diversas ordens – produzindo novas formas de relação entre os mundos, provocando cisões, reordenamentos étnicos, geográficos, etc. A novidade deste momento em que vivemos não reside, portanto, nem na complexidade do tempo e nem nas transformações que ele está a passar, mas na escala e na velocidade com que estes factos estão a ocorrer.
A globalização é um fenómeno que muitos teóricos têm vindo a definir como a marca desta nova época mundial; uma reacção de interconexão do globo por diversos elementos que redefinem os limites territoriais, naturalmente ou socialmente construídos, transformando a diversidade de espaços numa grande aldeia global de comunicações e trocas. Entretanto, o termo globalização é ambivalente e, via de regra, é utilizado sem muitas reflexões aderindo às acepções do senso comum que são bastante variadas, servindo a muitas interpretações dependendo do contexto onde está sendo empregado.
Partido da constatação de Boaventura de Sousa Santos de que a globalização não é um fenómeno único e monolítico, devemos então falar não de uma globalização, mas de “globalizações", no plural e sempre de forma adjectivada. Isto porque, o autor distingue quatro principais modos de produção de globalizações. São eles: os localismos globalizados, os globalismos localizados, o cosmopolitismo e a herança comum da humanidade (SANTOS, B. in CUCÓ i GINER, J. in BANAÑO 164:2005).
O localismo globalizado é o processo pelo qual um dado fenómeno local é transformado em global. Já o globalismo localizado consiste na operação inversa, ou seja, na transformação de processos globalizados em fenómenos locais. Por serem formas hegemónicas de globalização ambas caracterizam-se por gerarem meios de regulação social global, operando em conjunto, na maioria dos casos, embora para efeitos analíticos possam "ser estudadas separadamente, dado que os factores, os agentes e os conflitos que intervêm num e noutro são distintos” (idem, ibidem).
Este modelo de globalização hegemónica caracteriza-se por modelos e padrões socioeconómicos que se difundem e se impõem a todos os países, uniformizando relações e estabelecendo critérios únicos e universais para serem aplicados a todos os povos, indistintamente. Defendem um modo de produção capitalista baseado num mercado livre e auto-regulador, que aos poucos parecem vencer as velhas formulações fundada nos princípios regulatórios do Estado-nação. É ainda um conjunto de orientações e estratégias que vão assumindo um corpo político sob a forma de um consenso único a partir de um centro económico e político formado por grandes potências mundiais, cuja principal expressão é o chamado “G8”, ou Grupo dos Oito países mais industrializados do mundo. Trata-se de um conjunto de ideias e práticas que conformam um sistema de relações de poder e produção, e que hoje é dominante nos cinco continentes. Este paradigma que vê a sociedade regulada por princípios economicistas, onde a produção e o consumo são as formas de regulação e classificação social por excelência, está ligado a um projecto imperial muito característico e que difere qualitativamente do imperialismo industrial do século XIX.
Este modelo, apesar de ser o mais defendido pelos mentores do status quo conservador, não é o único fenómeno que está em curso. Existem outros processos que seguem justamente no sentido oposto e que procuram contrapor-se a esta lógica universalizante e globalizante, entendidas como formas de globalização contra-hegemónica (idem,ibidem). Como no caso anterior, este tipo de globalização também se expressa sob duas formas distintas, mas mutuamente interligadas, e que podem ser entendidas, na sua generalidade como meios para gerarem emancipação social. A primeira destas formas de globalização contra-hegemónica é o cosmopolitismo. O cosmopolitismo é composto pelo cruzamento de lutas locais a partir de redes transnacionais com o objectivo de ampliar as formas de resistência à globalização hegemónica. Nas palavras de Sousa Santos, o cosmopolitismo é: “a organização transnacional de resistência de Estados-nação, regiões, classes ou grupos sociais vitimados pelas trocas desiguais de que se alimentam os localismos globalizados e os globalismos localizados”, (idem, ibidem) usando em seu benefício as possibilidades de interacção transnacional criadas pelo sistema mundial em transição, incluindo as que decorrem da revolução nas tecnologias de informação e de comunicação. A resistência consiste em transformar trocas desiguais em trocas de autoridade partilhada, e traduz-se em lutas contra a exclusão, a inclusão subalterna, a dependência, a desintegração, a despromoção. A segunda forma de globalização contra-hegemónica é o património comum da humanidade. Esta forma compõem-se "de lutas transnacionais pela protecção e desmercadorização de recursos, entidades, artefactos, ambientes considerados essenciais para a sobrevivência digna da humanidade" (idem., ibidem.)
Mas no contexto desta reflexão o fenómeno da globalização é o de uma reflexão sobre identidade, identidades e multiculturalismo e o que é certo é que, apesar da sua pré-história e da sua história, as características com que tal fenómeno hoje se apresenta e as implicações que tem sobre a esfera cultural marcam com novos traços o fenómeno da multiculturalidade e contribuem também para sublinhar as insuficiências do conceito de cultura com que muitas concepções de multiculturalismo.
Com efeito, quer no que se refere às implicações culturais da globalização neoliberal, quer no que se refere às consequências dos movimentos alternativos de solidariedade entre povos e culturas da globalização anti-hegemónica, quer se tenham em conta o impacto dos fluxos comunicacionais, o que se acentua é o movimento, a circulação, a transformação e o devir. Ao lado de tendências homogeneizadoras ao nível do vestuário, da alimentação, da música ou do cinema, com a sua vocação uniformizadora, verificam-se também tendências diferenciadoras através de formas múltiplas de assimilação, miscigenação e cruzamento cultural, sendo, por isso, tão inadequado considerar que a globalização só promove a homogeneização quanto considerar que não interfere com as culturas societais a partir das quais se definem os conceitos de nação, comunidades regionais ou locais, idiossincrasias linguísticas ou configurações étnicas.
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