Historia Do Direito
Trabalho Escolar: Historia Do Direito. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: • 8/4/2014 • 2.161 Palavras (9 Páginas) • 264 Visualizações
O Direito Primitivo
Segundo John Gilissen, no seu livro Introdução Histórica ao Direito, a pré-história do direito escapa quase inteiramente ao nosso conhecimento por não terem as sociedades primitivas deixado registros escritos de suas estruturas normativas, de suas leis.
Mas sabe-se da existência de leis nas sociedades sem escrita, porque, quando surgiu a escrita, por volta de 4.000 – 3.500 anos antes de Cristo, já existiam regras tradicionais que vinham do tempo em que não havia escrita: por exemplo, o casamento enquanto instituição já existia; o poder paternal também; a propriedade mobiliária, regras de sucessão, doação, troca e empréstimo também já existiam.
No entanto, embora saibamos que existia um direito primitivo, acessá-lo é muito difícil. O que os historiadores do direito fazem são reconstituições hipotéticas, partindo da análise de sociedades sem escrita que ainda existem no mundo, o que, segundo Jonh Gilissen, é um método não muito confiável.
Para explicar a história do direito nas sociedades primitivas, vamos partir do pressuposto de que os antepassados do homem moderno surgiram na África entre 3 e 5 milhões de anos a. de C., como resultado de uma diferenciação evolutiva no tronco dos primatas.
Esses antepassados do homem moderno – os hominídeos – foram evoluindo e se diferenciando, aprimorando técnicas e adaptando o meio ambiente às suas necessidades. Esse gênero hominídeo (ou homo) deu origem a várias espécies, mas a única que sobreviveu foi a espécie homo sapiens sapiens (ou homo sapiens moderno), que somos nós.
O homo sapiens moderno surgiu na Era paleolítica (ou Primeira Idade da Pedra, também chamada de Idade da pedra lascada), que vai desde as origens da humanidade até cerca de 10 mil anos a. C.
No paleolítico predominou o nomadismo (a necessidade das comunidades migrarem de uma região para outra). Os hominídeos começaram a se organizar em pequenas comunidades ou clãs – clã é uma reunião de famílias –, em torno de interesses comuns; mas os laços de união entre os indivíduos não eram muito fortes, e essas comunidades não eram muito estáveis, porque a vida exigia que elas se deslocassem com frequência à procura de alimentos. A atividade básica era a coleta de frutas e raízes, reservada às mulheres, e a caça, reservada aos homens.
O primeiro mecanismo mais sofisticado elaborado pelo cérebro humano foi o arco, para atirar flechas, no período paleolítico. Foi nesse período também que os hominídeos inventaram o arpão e o anzol, o que demonstra a importância da caça e da pesca na vida desses grupos humanos.
Entre 200 e 100 mil anos a. C. surgiu o homem moderno (o homo sapiens sapiens), e com ele novos desenvolvimentos técnicos podem ser observados, além de uma maior capacidade de simbolização, através das pinturas e esculturas.
No campo do direito, o que se observa é que a simplicidade daquelas comunidades (a pouca complexidade das relações sociais) refletia-se numa correspondente simplicidade do direito – direito aqui entendido enquanto lei e ordem (porque direito pode ser também ciência ou ideal de justiça).
O direito primitivo era, na sua essência, o costume tradicional da comunidade, passado de geração a geração. Quem não respeitasse os costumes do grupo, poderia ser banido, e isso significava, muitas vezes, a morte, pois o homem não conseguia sobreviver longe do seu grupo.
O direito no paleolítico era um direito costumeiro, não escrito – é o que a gente chama de direito consuetudinário –, que ordenava uma sociedade extremamente simples: as mulheres saíam em busca de alimentos nos bosques e florestas, cuidavam dos filhos, preparavam os alimentos; os homens caçavam e procuravam abrigos nas cavernas. Quando faltava alimento na região, eles migravam e se estabeleciam temporariamente numa região mais abundante de vegetais comestíveis, água e caça.
Por volta de 10 mil anos a. C. ocorreu uma mudança no clima da Terra que influenciou a vegetação e o comportamento dos animais. Os vegetais comestíveis se tornaram mais escassos e as dificuldades para encontrar caça aumentaram. Isso fez com que os homens começassem a desenvolver técnicas agrícolas e a domesticar os animais para a alimentação. O homem se tornou agricultor de trigo, cevada e aveia, e pastor de gado, ovelhas, búfalo, porco, etc., e essa nova situação fez com que ele se sedentarizasse, ou seja, se fixasse numa determinada região .
Não havia mais necessidade de sair a procura de vegetais para coleta e animais para caça, pois o homem passou a produzi-los. Isso gerou uma estabilidade muito grande, e o resultado dessa estabilidade não foi uma sociedade mais simples. Pelo contrário, as sociedades primitivas se tornaram mais complexas e, consequentemente, o direito também.
Essa mudança climática ocorrida por volta de 10 mil anos a. C. foi tão significativa para a história da humanidade, que ela marca o início de uma nova era: a Era neolítica – ou Nova Idade da Pedra, também conhecida como Idade da pedra polida, devido ao maior desenvolvimento técnico.
O processo de sedentarização não se deu da mesma forma em todas as regiões. Na Europa, por exemplo, ele foi mais demorado, enquanto no Oriente Médio ele se deu primeiro, pois antes mesmo da agricultura, as comunidades primitivas do Oriente já estocavam grãos, como aveia e cevada, que cresciam nas pastagens sem o controle do homem. Para estocar os alimentos, os homens construíram celeiros e acabaram se estabelecendo numa só região. Assim, com o tempo, acabaram desenvolvendo as técnicas de agricultura, e ao mesmo tempo aprenderam a domesticar os animais, sobretudo ovelhas, carneiros e cabras selvagens, que se aproximavam das pastagens de cereais para se alimentarem. Na Europa não havia essas pastagens naturais de cereais, e os homens tinham que continuar se deslocando para tentar encontrar caça, frutas e raízes.
Uma das consequências da agricultura, da pecuária e da sedentarização foi o aumento populacional, graças ao aumento da produção alimentar e à estabilidade gerada pela própria sedentarização. A agricultura e a pecuária facilitaram muito o sustento e a manutenção das crianças, reduziu o esforço das mulheres (que não precisavam mais carregar seus filhos de um lado para outro), e isso gerou uma situação mais favorável à reprodução.
Esse aumento populacional, ocorrido em comunidades humanas sedentárias, fixas, fez com que as sociedades se tornassem mais complexas: um número maior de pessoas vivendo em comunidade implica um número maior de encontros sociais, de trocas sociais. Se antes um indivíduo se relacionava apenas com uma ou duas pessoas no seu dia a dia, com o aumento populacional, ele vai se relacionar com um número maior de pessoas, e de formas diferentes, com objetivos diferentes. As relações sociais tornam-se mais complexas, e é a partir da avaliação da complexidade das relações sociais que determinamos a complexidade da própria sociedade.
Uma mudança importante que ocorreu após a sedentarização, no período neolítico, foi que a mulher deixou de simplesmente coletar vegetais e passou a cultivar os campos, a colher cereais nas épocas de colheita, a fiar e tecer a lã; o homem preparava os cultivos, construía casas – nesse período as comunidades saíram definitivamente das cavernas –, cuidava do gado, fabricava ferramentas bem mais sofisticadas (em pedra polida e metais), estocava alimentos e defendia esses alimentos dos ataques de inimigos.
Foi um período de urbanização e de intensa divisão social do trabalho: a sociedade se tornou mais complexa, as atividades se diversificaram porque novas necessidades surgiram. A agricultura e a pecuária exigiram que a mulher se desdobrasse em outras atividades (colheita e tecelagem); a necessidade de defender os alimentos estocados de inimigos levou a um processo de militarização; e a complexidade dos rituais sagrados fez com que surgisse a figura do “chefe do ritual”, que cuidava dos assuntos religiosos: o sacerdote, espécie de líder que, com o tempo, passaria a ser a figura mais importante da sociedade, inclusive enquanto ditador de normas, produtor de direito.
Já não estamos mais diante de uma comunidade primitiva nômade, que trocava de caverna sempre que a necessidade de alimentos exigia e que era pouco complexa na sua organização social e divisão do trabalho. As comunidades primitivas do neolítico eram mais complexas: já havia uma maior divisão do trabalho, ou seja, uma maior diversidade de ocupações, e, com o tempo, essas mudanças iriam se acelerar cada vez mais, rumo a uma urbanização cada vez mais intensa.
É claro que isso teve repercussões no campo do direito. Por exemplo, a mulher perdeu a importância que tinha no paleolítico: antes, quando o homem não conseguia caça, ele dependia do que a mulher coletava. O trabalho da mulher era muito importante, porque se não houvesse caça, era a coleta de frutos e outros alimentos vegetais realizada pela mulher que garantia a alimentação do grupo. No neolítico, o homem passa a estocar alimentos, e o processo de militarização originado da necessidade de defender o alimento estocado – e a especialização masculina nessa atividade de defesa – fizeram com que o homem se percebesse enquanto um ser mais forte, superior à mulher. Lembrem-se que o costume se confundia com o direito, e se o costume determinava que a mulher tinha menos importância na organização social, a lei também a percebia assim.
Outro exemplo interessante é o do sacerdote. Como vimos, no período neolítico os rituais sagrados ficam mais complexos e passa a existir uma figura que vai aos poucos se especializando na organização desses rituais: o sacerdote. Rapidamente, devido à importância que as comunidades passaram a atribuir ao Sagrado, o sacerdote passou a ser cada vez mais respeitado – respeitado inclusive enquanto “ditador” dos costumes, das normas, responsável pelo cumprimento das normas de conduta, etc.
Começa, então, a haver uma diferenciação hierárquica maior entre as pessoas, embora não ainda ligada à posse de bens materiais, mas à posição social, ao tipo de atividade exercida. Os costumes mudaram para se adaptar à nova realidade.
E a revolução continuou: o homem começa a produzir cerâmicas, desenvolve ainda mais as técnicas de produção de tecidos e, o mais importante, aprimora a metalurgia.
A sociedade se tornou ainda mais complexa: alguns setores se especializaram em cerâmica, outros em tecelagem, outros na metalurgia, fora a agricultura, a pecuária e as atividades religiosas, monopólio dos sacerdotes, que ganhavam cada vez mais poder.
Imaginem as relações estabelecidas entre elementos desses vários setores: quem se especializou em cerâmica e precisasse de metal tinha que se dirigir a quem conhecesse a metalurgia, e vice-versa. Para comer, todos tinham que se dirigir ao pecuarista ou agricultor, caso não produzissem seu próprio alimento. Entenderam a complexidade das relações sociais? Surgiram novas situações que precisavam ser normatizadas, por isso a estrutura normativa (o direito) se tornou mais complexa.
A população cresce e as aldeias aumentam de tamanho, exigindo a formação de estruturas administrativas mais sofisticadas para coordenar as atividades produtivas, sociais, culturais e de defesa. Junto com a estrutura administrativa, torna-se mais complexa a estrutura jurídica, que continua baseada no direito consuetudinário ou costumeiro (não escrito), o que não o impede de se tornar cada vez mais complexo.
O cientista político Norberto Bobbio diz o seguinte em um de seus livros: "Hoje estamos acostumados a pensar no direito em termos de codificação, como se ele devesse necessariamente estar encerrado num código. Isto é uma atitude mental particularmente enraizada no homem comum e da qual os jovens que iniciam os estudos jurídicos devem procurar se livrar".
Livrem-se, então, dessa idéia. Mesmo não codificado, não escrito, o direito existe na sua forma consuetudinária.
Vamos ver agora como duas grandes comunidades primitivas do neolítico evoluíram e se transformaram em duas grandes civilizações: a civilização egípcia e a civilização mesopotâmica:
Com a mudança climática ocorrida no neolítico, regiões antes úmidas tornaram-se secas, e algumas comunidades nômades se fixaram nas margens de grandes rios. No Egito, os povos se fixaram nas margens do rio Nilo; e na Mesopotâmia – região que hoje corresponde mais ou menos ao que é o Iraque – eles se fixaram na região localizada entre os rios Tigre e Eufrates.
Quando destacamos as civilizações egípcia e mesopotâmica, muitas pessoas acreditam que todas as comunidades primitivas do neolítico desapareceram, restando somente essas duas grandes civilizações. Não é verdade. O neolítico havia ficado para trás por volta de 6000 anos a. C., mas as comunidades continuaram a se desenvolver, em diversas regiões da África, Ásia e Europa, tendo inclusive ocorrido migrações de povos para outras regiões, como, por exemplo, para o continente americano, onde deram origem aos povos que aqui estavam quando da chegada dos colonizadores europeus, nos séculos XV e XVI.
A diferença é que as comunidades que originaram as civilizações egípcia e mesopotâmica se desenvolveram de forma muito mais sofisticada, criando verdadeiros impérios.
Isso, de certa forma, também ocorreu na América. Nas regiões onde hoje é o México e o Peru, as comunidades primitivas que migraram para a América na pré-história constituíram, com o tempo, civilizações bastante complexas: os Maias, os Incas e os Astecas, que se diferenciavam, na sua complexidade, dos outros povos americanos (os índios brasileiros, por exemplo).
Essa diferenciação ocorreu no Egito e na Mesopotâmia, dando origem a duas grandes civilizações, bastante complexas na sua organização; por isso são essas duas civilizações que se tomam como paradigmas, modelos, para se estudar um capítulo da história da civilização e, também, da história do direito, porque foi ali que surgiram os primeiros textos jurídicos escritos.
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