O papel do racismo na criminalização da maconha
Por: luizaverso • 27/8/2022 • Ensaio • 1.283 Palavras (6 Páginas) • 122 Visualizações
O papel do racismo na criminalização da maconha
“O corpo esmagado da menina jazia espalhado na calçada um dia depois de mergulhar do quinto andar de um prédio de apartamentos em Chicago. Todos disseram que ela tinha se suicidado, mas, na verdade, foi homicídio. O assassino foi um narcótico conhecido na América como marijuana e na história como haxixe. Usado na forma de cigarros, ele é uma novidade nos Estados Unidos e é tão perigoso quanto uma cascavel." É assim que se inicia a matéria de 1937 “Marijuana: assassina de jovens” publicada pela revista American Magazine. O episódio narrado pelo texto nunca aconteceu, mas ele exprime o preconceito evidente pela maconha e os efeitos que ela provoca.
Sua criminalização vai muito mais além de seus malefícios para a saúde humana, pois se esse fosse realmente o motivo, drogas como o cigarro ou as bebidas alcoólicas e até mesmo os refrigerantes também teriam sido proibidas. Na verdade, a proibição da maconha se dá por diversos fatores, incluindo os sociais, morais, raciais, políticos e econômicos. Ela se relaciona com o preconceito com árabes, mexicanos, chineses e a população negra, isto é, os usuários da maconha no início do século XX.
A maconha é a droga ilícita mais utilizada no mundo derivada da planta Cannabis sativa. Quando comparado com outras drogas lícitas, seu consumo fica atrás apenas para o cigarro e para o álcool, a estimativa da OMS (Organização Mundial da Saúde) é de que existam 181,8 milhões de usuários de cannabis com idade entre 15 e 64 anos no mundo. O principal constituinte ativo da planta, isto é, sua principal substância psicoativa, é o delta-9-tetraidrocanabinol (delta-9-THC), ou, seguindo as regras IUPAC (União Internacional de Química Pura e Aplicada) 6,6,9-trimetil-3-pentil-6H-dibenzo[b,d]piran-1-ol, que pode ser obtida através de sua extração da planta ou por síntese em laboratório. O THC é uma das 400 substâncias produzidas pela Cannabis sativa, e uma das 60 substâncias consideradas canabinóides, ou seja, psicoativas. A estrutura química de uma molécula de THC apresenta os grupos funcionais éter (identificado pelo átomo de oxigênio posicionado entre dois átomos de carbono) e o fenol (identificado pelo grupo OH - hidroxila, ligado ao benzeno).
Fórmula estrutural do THC
Das 60 substâncias psicoativas da maconha, o THC é a mais poderosa, pois é a sua concentração que determina a potência dos efeitos da droga, isso porque essa substância altera a atividade cerebral. Posto isso, alguns de seus efeitos são as alucinações, diminuição da percepção de espaço e tempo e delírios. Outros efeitos causados pela maconha são a inquietação, a perda de peso e a irritabilidade, porém o seu uso também pode provocar o sentimento de euforia e de bem estar, o que faz com que essa droga seja muito procurada.
Entretanto, o cigarro, atualmente a principal forma de industrialização de tabaco, também apresenta diversos malefícios para a saúde humana e mesmo assim é uma droga lícita em diversos países espalhados pelo mundo. É importante pensar que a legalidade de uma droga não a torna menos prejudicial à saúde. Segundo Ana Paula Teixeira, analista em Ciência e Tecnologia na Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, no Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca) “Qualquer cigarro faz mal à saúde. Não há diferença quanto aos riscos decorrentes do consumo de cigarros, sejam os vendidos legalmente, sejam os vendidos no mercado ilegal. Qualidade não é um atributo que se possa dar a qualquer tipo de cigarro. Todos causam doenças graves e fatais aos seus usuários.”.
Sendo assim, a criminalização da maconha deixa dúvidas nas discussões sobre a sua pertinência, pois, apesar dos seus efeitos negativos, ela apresenta certos benefícios. Alguns estudos revelam que o uso da maconha pode trazer benefícios terapêuticos. O CBH, por exemplo, apesar de ter uma estrutura semelhante ao THC, apresenta menores efeitos colaterais e por isso vem sendo usado para o tratamento de certos problemas apresentando diversos benefícios para a medicina de alguns países, dentre eles incluem-se o alívio das náuseas e vômitos causados por quimioterapia, o tratamento da ansiedade e depressão e o estímulo do apetite em pacientes com AIDS ou câncer.
Acontece que existe, desde muito tempo atrás, um amplo preconceito a respeito dessa droga. No Brasil, ela era considerada “coisa de negro”, isso porque eram usadas no candomblé para facilitar a incorporação e por agricultores dos meios rurais. Nos Estados Unidos os que mais usavam essa droga eram os imigrantes mexicanos. Na Europa era associada aos indianos, imigrantes árabes e aos julgados preconceituosamente como vagabundos. Em suma, o fumo da maconha para o Ocidente era designado a classe marginalizada e vista com maus olhos pela classe média branca.
No livro “Fumo de negro”: a criminalização da maconha no pós-abolição, Luísa Saad analisa o período histórico que precede a proibição da maconha para compreender os discursos que serviram de base para a sua criminalização. A autora, em certo momento de sua análise, para entender os pensamentos da elite, essa que determinava o modelo ideal de sociedade, elege um personagem importante para estudar, Rodrigues Dória, homem letrado, médico e político, que ajudava a ditar o pensamento da época, que representava os desejos da elite e autor do primeiro texto aprofundado sobre a maconha no Brasil. Ela
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