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Por que o Estado precisa do nosso sexo como um critério definidor do que nós somos?

Por:   •  28/8/2018  •  Artigo  •  2.026 Palavras (9 Páginas)  •  96 Visualizações

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“Por que o Estado precisa do nosso sexo como um critério definidor do que nós somos? (Parte 1)”[1]

[pic 1]

Vou ficar mais um pouquinho

Para ver se eu aprendo alguma coisa

nessa parte do caminho.

Martela o tempo pr'eu ficar mais pianinho

Com as coisas que eu gosto

E que nunca são efêmeras

E que estão despetaladas, acabadas

Sempre pedem um tipo de recomeço.[2]

Introdução

Atualmente, temos nos deparado com muitas situações constrangedoras fundadas na aparente desigualdade de gênero e no sistema machista-patriarcal que, como sempre, surgem de uma tentativa de rotular as pessoas como sendo isso ou aquilo, como se, de fato, definir “o sexo” ou o “gênero”, por si só resolvesse todos os problemas (e pior! Só os provocam...). Tudo gira em torno do que a sociedade escolheu como parâmetro definidor de um determinado modo de ser... humano.

De fato, definir o que é homem ou mulher tem uma relevância específica e que vai muito além da rotulação: a exclusão. Sim, a exclusão e marginalização, na medida em que os que não se enquadram em homem ou mulher não teriam direitos garantidos ou os teriam de modo limitado, ao ponto de “desqualifica-lo” enquanto sujeito de direitos, portador da dignidade da pessoa humana, já que enquadrar-se em homem ou mulher a partir da constituição biológica de seu corpo implicaria na diminuição da sua própria condição de ser humano:

“Así pues, las normas que gobiernan la anatomía humana idealizada producen un sentido de la diferencia entre quién es humano y quién no lo es, qué vidas son habitables y cuáles no lo son. Esta diferencia opera también en una amplia variedad de incapacidades (aunque la norma que funciona para las incapacidades no visibles es otra).” (BUTLER, 2004, p. 18)

De fato, a questão que se põe como central é a condição limitadora do ser humano nas possibilidades do ser e como determinados marcadores podem operar como limitadores da garantia de direitos fundamentais para aqueles que não se encaixam na definição biológica de ser humano, a saber, não se enquadram nem como homem, nem como mulher. Sendo assim, estariam estes seres desprovidos da proteção de sua intimidade? E, em que proporções? Em que medida a imposição do conceito biológico que determina este enquadramento sufoca e expõe a vários riscos a existência de algumas pessoas?

A discussão é, de fato, muito mais ampla do que parece e, este tema não será aqui esgotado, apenas, apresentado e, como a coluna Humana Sensus Ignoratum cujo propósito está vinculado a uma reflexão no que tange às experiências vivenciadas por pessoas em razão das divergências provocadas pela imposição da heteronorma em confronto com a dignidade da pessoa humana, tentaremos abordar de modo sucinto o tema. Falaremos um pouquinho da construção do Direito enquanto normatizador da vida em sociedade, da dignidade da pessoa humana e como a [imposição da] ideia de gênero é afetada neste contexto. Então, vamos lá!

O Direito e a Sociedade

O Direito, enquanto regulador da conduta humana, será positivado como todas as valorações, normas e expectativas de comportamento na sociedade (LUHMANN, 1980) e, desse modo, alcança o problema do sentido das coisas, da vida, do homem, da sua circunstância e, em razão de sua função instrumental, realiza o controle social através da decisão de conflitos (FERRAZ JR, 2011, p. 324-325). Ainda nos ensinamentos de Tércio Sampaio Ferraz Jr:

“Em parte, o que chamamos vulgarmente de direito atua, pois, como um reconhecimento de ideais que muitas vezes representam o oposto da conduta social real. O direito aparece, porém, para o vulgo, como um complicado mundo de contradições e coerências, pois, em seu nome tanto se veem respaldadas as crenças em uma sociedade ordenada, quanto e agitam a revolução e a desordem. O direito contém, ao mesmo tempo, as filosofias da obediência e da revolta, servindo para expressar e produzir a aceitação do status quo, da situação existente, mas aparecendo também como sustentação moral da indignação e da rebelião.” (FERRAZ JR, 2011, p.9).

Em suma, o Direito tem como uma de suas finalidades, permitir a convivência pacífica em sociedade. Garantir os Direitos das pessoas que vivem sob sua égide. E, mais, o Direito será realizado em razão de alguns parâmetros de acordo com cada sociedade onde vige. Em nosso caso, como em muitos outros ordenamentos jurídicos, todos os institutos infraconstitucionais, desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, devem ser submetidos a este valioso documento jurídico, promovendo, assim, uma nova ordem, uma nova ideologia e um novo modo de pensar e de interpretar vários institutos jurídicos, dando unidade ao ordenamento jurídico (BARROSO, 2004:191).

Considerado o papel orientador dos ditames constitucionais, lembremo-nos de que a Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988) tem como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana e, como um de seus objetivos, promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação[3]. Sendo assim, podemos deixar claro que os ditames constitucionais se sobrepõem aos demais, incluindo aqui os costumes e, esta sobreposição interfere diretamente no modo de garantia dos direitos: sem discriminação, buscando o bem-estar de todos, sem preconceitos e, principalmente, garantindo a dignidade da pessoa humana.

Tais fundamentos e objetivos são mais profundamente trabalhados em Direitos Humanos ou Direitos Fundamentais, tidos como direitos que realçam justamente a condição humana, garantindo o básico para a manutenção desta condição, independentemente de qualquer outra condição que não seja a humana – ou seja, seriam direitos universais (SARLET, 2003, p. 34). Como produto de uma construção histórica e humana, os direitos humanos trazem vinculação com a solução de problemas de convivência coletiva dentro de uma comunidade política (LAFER, 1988, p. 146) e construídos a partir da necessidade de impor limites ao poder estatal.

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