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UMA BREVE ANÁLISE SOBRE A TEORIA DA PEDAGOGIA DO OPRIMIDO E SUA IMPORTÂNCIA PARA A EDUCAÇÃO BRASILEIRA.

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Por:   •  3/9/2014  •  5.094 Palavras (21 Páginas)  •  963 Visualizações

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UMA BREVE ANÁLISE SOBRE A TEORIA DA PEDAGOGIA DO OPRIMIDO E SUA IMPORTÂNCIA PARA A EDUCAÇÃO BRASILEIRA.

Mariane Cristina da Silva DOMINGUES

RESUMO: A presente pesquisa trata busca primeiramente fazer uma análise do contexto histórico da educação brasileira, suas limitações e avanços. Faz-se uma abordagem de como a educação pode se tornar um instrumento de transformação ou alienação. Tendo como foco principal apresentar a contribuição da teoria do oprimido de Paulo Freire para o sistema educacional. A base teórica e metodológica foram os estudos do educador e filósofo Paulo Freire, com pesquisa de levantamento bibliográfico.

PALAVRAS-CHAVE: Educação no Brasil; Teoria do Oprimido; Paulo Freire.

1 Introdução

O interesse pelo assunto tratado decorreu de um processo de reflexão durante os ensinamentos da pós- graduação em Docência no Ensino Superior, no que diz respeito à forma como está sendo tratada a educação no Brasil. O gosto pelo estudo da realidade exposta foi parcialmente alimentado pelas leituras realizadas e devido à notória relevância da teoria de Freire para a educação brasileira.

Diante da temática, percebe-se o desafio posto, visto que apesar do Brasil ter evoluído nos debates acerca de novas possibilidades de mudanças societárias, ainda pesa em suas práticas uma educação conservadora e mecânica, seguindo o padrão dos moldes fabris. Este modelo é uma herança de um sistema industrial utilizado para ditar regras e normas aos trabalhadores das fábricas e indústrias, e assim poder ter o controle sobre os mesmos, através de rituais: filas indianas, campainhas que determinam horário de entrada / saída e para intervalos, carteiras alinhadas, castigo, recompensa, advertência, a relação de poder e obediência do professor e aluno; tais paradigmas institucionais são seguidos até hoje nas instituições de ensino do Brasil.

A discussão é extremamente necessária visto que há de se reconhecer a importância da teoria em questão para a educação brasileira, trazendo a reflexão de que o indivíduo deve criar consciência e visão crítica de mundo e sociedade, utilizando-se de uma pedagogia libertadora que o faça transformar a realidade opressora e dominadora.

A breve análise, não busca conceituar minuciosamente a ideologia construída durante décadas por Freire e sim trazer brevemente e de forma articulada a sua importância, bem como os impactos e resultados de um trabalho legitimado conhecido como a pedagogia transformadora.

2 Contextualizando a educação no Brasil.

A história da educação brasileira foi marcada de acordo com o contexto político, cultural, social e econômico de cada época, permeada de rupturas marcantes.

Com o início da colonização do Brasil, os europeus trouxeram consigo o seu modelo educacional, que se deu de maneira conflitante com os costumes nativos existentes ao período. Os jesuítas não trouxeram para o país apenas a moral, os costumes e a crença, apresentaram também novos – e repressivos – métodos pedagógicos.

Este método funcionou absoluto durante 210 anos, de 1549 a 1759, quando uma nova ruptura marca a História da Educação no Brasil: a expulsão dos jesuítas por Marquês de Pombal. Se existia alguma coisa muito bem estruturada em termos de educação o que se viu a seguir foi o mais absoluto caos. Tentou-se as aulas régias, o subsídio literário, mas o caos continuou até que a Família Real, fugindo de Napoleão na Europa, resolve transferir o Reino para o Novo Mundo. (BELLO, 2001, p.1-2)

Mesmo após a vinda da Família Real para o Brasil e as adequações realizadas por D. João VI – estas foram feitas para atender às suas necessidades pessoais – a Educação se apresentava inábil. É em 1824, com a implantação da 1ª Constituição do país que a educação primária passa a ser gratuita para todos os indivíduos, porém as dificuldades continuavam como, por exemplo, a ausência de professores no território brasileiro. Por volta de 1826 e 1827 são criadas escolas nos locais mais populosos e permitido o acesso das meninas às escolas (BELLO, 2001).

Após a Revolução de 1930, referencial da entrada do país no mundo capitalista de produção, a necessidade de mão-de-obra especializada culminou em investimentos na educação. Dá-se início ao ensino profissional. É apenas com a adoção de mais um novo modelo de Constituição que o ensino primário passa a ser obrigatório e, competente ao Governo, a definição de estratégias na área educacional. Porém, o Golpe Militar frustra as iniciativas de revolucionar-se a educação brasileira (Bello, 2001), a educação pública fica devastada. De acordo com Marilena Chauí – em entrevista à Rede Brasil – é possível compreender o peso da ditadura na educação, mediante alguns aspectos:

Primeiro: a violência repressiva que se abateu sobre os educadores nos três níveis, fundamental, médio e superior. As perseguições, cassações, as expulsões, as prisões, as torturas, mortes, desaparecimentos e exílios. Enfim, a devastação feita no campo dos educadores. Todos os que tinham ideias de esquerda ou progressistas foram sacrificados de uma maneira extremamente violenta. Em segundo lugar, a privatização do ensino, que culmina agora no ensino superior, começou no ensino fundamental e médio. As verbas não vinham mais para a escola pública, ela foi definhando e no seu lugar surgiram ou se desenvolveram as escolas privadas. Eu pertenço a uma geração que olhava com superioridade e desprezo para a escola particular, porque ela era para quem ia pagar e não aguentava o tranco da verdadeira escola. Durante a ditadura, houve um processo de privatização, que inverte isso e faz com que se considere que a escola particular é que tem um ensino melhor. A escola pública foi devastada, física e pedagogicamente, desconsiderada e desvalorizada. (CHAUÍ apud SOUZA, 2012, pág.1)

Ao longo da ditadura a Educação perdeu seu cunho pedagógico, este foi substituído pelo caráter político (Bello, 2001).

Após esse período de repressão, o Brasil, retomou o fôlego, os anos 60 e 70 foram marcados “[...] por movimentos estudantis- reflexo das dificuldades por que passavam os educadores, inseridos na massa brasileira, oprimida pelo movimento de 1964 [...], o ano de 1964 será sempre um marco na história política do Brasil [...]” (VALLE,2009, p.23)

Nos anos 80 a mobilização por cidadania ganhou visibilidade, devido às muitas lutas de base, em busca da democratização do país, e não por mera benevolência do Estado. Em 1988, foi promulgada a nova Constituição brasileira, conhecida como a carta magna. Esta traz princípios e garantias dos direitos como saúde, educação e assistência social, o famoso tripé da seguridade social.

No que diz respeito à educação, esta passa a ser um dever do Estado, de maneira que este deve atender as demandas gratuitamente, diante desse cenário, muitas políticas educacionais foram formuladas com a finalidade de respaldar os objetivos educacionais, dentre elas a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, a LDB- Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que norteia desde a educação básica (educação infantil, ensino fundamental e médio), o projeto pedagógico das escolas, o financiamento da educação, a formação profissional e o ensino superior (ROSA, 2009).

A sociedade, influenciada pelos seus fatores externos e internos foi desenvolvendo suas políticas, conforme as necessidades dos detentores do poder e a pressão popular. Houveram sim mudanças significativas, mas ínfimas se comparadas à grandeza do capital, à continuidade da divisão de classes e má distribuição de renda.

Assim, pode-se avaliar que a pedagogia enquanto ciência componente da educação acompanhou esses diversos momentos históricos, e assim como os bens socialmente produzidos não são distribuídos de forma igualitária, assim é a educação, tornando-se um bem que não chega a todos, ou seja, que propicia a geração da desigualdade (FREIRE, 1967).

E apesar das conquistas recentes na publicização da educação, ainda há de se remar contra a maré para legitimá-las e materializá-las.

3 A educação como instrumento da transformação

A educação pode ou não formar indivíduos pensantes. A metodologia das ações, o que realmente é ensinado, bem como o método de aprendizagem interferem na formação dos indivíduos, portanto o modo como as políticas educacionais são implementadas têm um impacto violento sobre a sociedade a qual pertencem esses indivíduos. As diretrizes educacionais que vêm sendo praticadas pelo Governo Brasileiro infelizmente vêm contribuindo para a formação de uma população impensante, alheia inclusive à sua própria alienação.

A política educacional - impregnada da cultura capitalista, atrelada à educação conservadora e autoritária, junto aos métodos pedagógicos ultrapassados - contribui eficazmente para uma alienação, que nada mais é a do que a “coisificação da vida”; é a introdução ao consumismo exacerbado, pois o objeto ou o bem material tem maior valor e importância do que o próprio ser humano; isto é, o ter é melhor que o ser; o que favorece grandemente o capital e traz prejuízos consideráveis à educação no Brasil.

Essas políticas déspotas oprimem o verdadeiro trabalho docente, pois, ainda que disfarçadas, influenciam fortemente no trabalho dos professores. Normalmente fazem com que estes profissionais “[...] não cheguem a localizar o opressor concretamente, como também, enquanto não cheguem a ser ‘consciência para si’, assumam atitudes fatalistas em face da situação concreta de opressão em que estão.” (Freire, 1968, p. 27).

O Estado capitalista e suas ações dominadoras e controladoras apostam na formação de um indivíduo subserviente em detrimento de um indivíduo pensante e questionador. Infelizmente, os educadores, supostos responsáveis pela crise educacional, de tanto ouvirem que “[...] são incapazes, que não sabem nada, que não podem saber, que são enfermos, indolentes, que não produzem em virtude de tudo isto, terminam por se convencer de sua incapacidade” (Freire, 1968, p.28). Particularidade que, de acordo com o autor, forma a auto desvalia como resultado da absorção do pensamento dos opressores.

As forças opressoras agem de maneira naturalista, como se o mundo fosse assim, e que a posição social e econômica que cada um ocupa diz respeito ao seu esforço individual na sociedade.

“[...] infelizmente, o que se sente, dia a dia, com mais força aqui, menos ali, em qualquer dos mundos em que o mundo se divide, é o homem simples esmagado, diminuído e acomodado, convertido em espectador, dirigido pelo poder dos mitos que forças sociais poderosas criam para ele. Mitos que, voltando-se contra ele, o destroem e aniquilam. É o homem tragicamente assustado, temendo a convivência autêntica e até duvidando de sua possibilidade” (FREIRE, 1967, p.44) .

Tal fato é facilmente identificado ao observar-se a realidade das escolas públicas do país bem como a ausência de investimentos necessários para a melhoria do mínimo – a educação básica. A crise é tão intensa que atualmente os pais culpam os professores e os aprendizes culpam às famílias pelo fracasso na aprendizagem; o que significa que não há uma análise de toda conjuntura engendrada em que se revela o ensino atualmente. Sendo assim, os educadores culminam por pactuar, ainda que inconscientemente, com o ensino posto; este que não deixa nenhuma possibilidade para que sejam colocados os interesses da sociedade acima da veemência do capital. (MÉSZÁROS, 2002).

Dessa forma, a pedagoga Rosa (2009, p. 49) afirma que:

“[...] a escola tem estado atrelada aos interesses do estado, representando, com isso a classe dominante, que tenta moldar a produção de conhecimento como forma de construir e consolidar uma certa forma de pensar, de agir, de usar os objetos, de fazer politica, de falar e de viver, garantindo, assim, o consenso de que a burguesia é a representante de todos nós [...]’’

Visando atender aos interesses do capital, o Estado acaba reprimindo inclusive os trabalhadores que estão prestando serviço na sociedade, como é o caso dos educadores. Mediante qualquer intento contrário a esta ordem, o capital tem seus métodos de controle da situação. Isto é abordado por Freire ao afirmar que, para o capital, não poderia deixar de ser assim, ou seja: se a humanização dos oprimidos é subversão, sua liberdade também o é. Daí a necessidade de seu constante controle. E, quanto mais controlam os oprimidos, mais os transformam em “coisa”, em algo que é como se fosse inanimado (FREIRE, 1968, p.26).

O sistema educativo é deficiente, mas ainda sim a atuação do educador é fundamental para que haja tais mudanças significativas, pois ele tem o papel do “ensinar”, facilitar o conhecimento, transmitir o saber para seus aprendizes, além de formar pensadores críticos, através da reflexão crítica e do aguçamento da curiosidade, para adquirirem a autonomia que tanto Freire relata em suas obras.

“O educador democrático não pode negar-se o dever de, na sua prática docente, reforçar a capacidade crítica do educando, sua curiosidade, sua submissão. Uma de suas tarefas primordiais é trabalhar com os educandos a rigorosidade metódica com que devem se "aproximar" dos abjetos cognoscíveis. E esta rigorosidade metódica não tem nada que ver com o discurso "bancário" meramente transferido do perfil do abjeto ou do conteúdo. É exatamente neste sentido que ensinar não se esgota no "tratamento" do objeto ou do conteúdo, superficialmente feito, mas se alonga à produção das condições em que aprender criticamente é possível. E essas condições implicam ou exigem a presença de educadores e de educandos criadores, instigadores, inquietos, rigorosamente curiosos, humildes e persistentes. Faz parte das condições em que aprender criticamente é possível e pressuposição por parte dos educandos de que o educador já teve ou continua tendo experiência da produção de certos saberes e que estes não podem a eles, os educandos, ser simplesmente transferidos. Pelo contrário, nas condições de verdadeira aprendizagem os educandos vão se transformando em reais sujeitos da construção e da reconstrução do saber ensinando, ao lado do educador, igualmente sujeito do processo. Só assim podemos falar realmente de saber ensinando, em que o objeto ensinado é apreendido na sua razão de ser e, portanto, aprendido pelos educandos.” (FREIRE, 1996, p.13).

O caminho para o enfrentamento desta realidade faz-se dependente, sobretudo, da predisposição dos mestres em utilizar a educação a favor da autonomia, criatividade e criticidade de modo que estes, assumam o papel de formadores conscientes e não se isentem da responsabilidade de estimular o pensamento críticos de seus aprendizes.

Estudiosos de Freire designam uma passagem que orienta esta discussão:

Não podemos, enquanto educadores libertários, permitir que o educando se contente apenas com a aquisição de palavras, mas sim com a aquisição de uma postura observadora; com voz crítica em seu cotidiano e em seus discursos. Essa educação libertária deve instigar o educando a aprender com vontade, de maneira significativa, de forma que ele sinta-se parte daquilo que está aprendendo: com pertinência, como um cidadão ativo. É preciso que o educando perca o receio de se colocar diante do mundo; de expressar suas necessidades e indignações. Enfim, devemos fazer um resgate social “lendo” e “relendo” o seu próprio mundo e escrevendo e reescrevendo a sua própria história, pois somente assim estaremos exercendo a nossa verdadeira cidadania. (DUARTE; BARBOZA 2007, p.4)

Lembrando que, o professor não tem a função única, mas indispensável para que a educação se operacionalize como instrumento de transformação.

4 A contribuição de Paulo Freire e a teoria pedagogia do oprimido para a educação brasileira.

A obra: Pedagogia do Oprimido foi considerada um marco nas bases educacionais brasileiras. Em 1968, foi editada, propondo a mudança nas relações que estruturam o pensamento formador do indivíduo, não como um ser isolado, mas enfatizando sobre o relacionamento entre educador e educando na construção do saber de maneira dialética e dialógica. Freire não se limita apenas ao espaço da sala de aula, mas ao contexto estrutural que reflete nessas relações hierárquicas.

Quando se faz a pormenorizada leitura e reflexão da teoria em questão, percebe-se que o educador quis passar não somente uma teoria pedagógica, mas uma práxis libertadora, trazendo como pano de fundo a problematização da política educativa, propondo que o indivíduo seja o protagonista de sua história, e não um fantoche utilizado para dar continuidade ao que o capitalismo impõe.

No pensamento freiriano é explanado que, uma cultura secular e dominadora, torna-se um paradigma difícil de romper-se. Na verdade são necessárias reformas, mudanças e transformações, na busca pela libertação e autonomia do oprimido, através de novos métodos educativos eficientes e abordagens pedagógicas eficazes que valorizam e respeitam o ser humano como um todo. Trata-se de uma educação mais crítica e ao mesmo tempo humanizada, em nada mecânica, opressora, hostilizadora e dominadora.

Destaca-se o papel do educador/professor, pois tem ação fundamental no desenvolvimento educacional do educando, Freire adota a teoria dialógica, onde o próprio nome já carrega em seu sinônimo: dialogar, colaborar e interagir, partindo do princípio que ambos os autores precisam um do outro. Gadotti elucida, de maneira mais clara, esse método:

“A criança, o jovem e o adulto só aprendem quando têm um projeto de vida onde o conhecimento é significativo para eles. Mas é o sujeito que aprende através de sua própria ação transformadora sobre o mundo. É ele que constrói suas próprias categorias de pensamento, organiza o seu mundo e transforma o mundo. [...] Todavia, o educador também não fica unicamente no saber do aluno. O professor tem o dever de ultrapassá-lo. É por isso que

ele é professor e sua função não se confunde com a do aluno” (GADOTTI, 1999, p 8 e 10).

E, em contrapartida, Freire condena a teoria antidialógica, que seria o contrário desse pensamento, visando apenas, a dominação, a invasão cultural e manipulação.

Conforme Freire (1997), o ensinar exige respeito aos saberes, as linguagens, as diferenças e a autonomia do ser educando. Portanto, um sistema educativo autoritário é um desvio eminente e um transgressor ávido da identidade cultural e da própria dignidade deste individuo e sua história.

O novo causa temor, mas as mudanças são evidentemente necessárias. No entanto, a tarefa de romper com os paradigmas antigos e ideologias dominantes é uma missão árdua. Pois assim como Freire (1997) afirma que o ensinar exige risco e a aceitação do novo.

É próprio do pensar certo a disponibilidade ao risco, a aceitação do novo que não pode ser negado ou acolhido só porque é novo, assim como o critério de recusa ao velho não é apenas o cronológico. O velho que preserva sua validade ou que encarna uma tradição ou marca uma presença no tempo continua novo. (FREIRE, 1996. p.17).

A transformação pode iniciar-se a partir de uma palavra relevante neste momento: a esperança. É possível melhorar a educação brasileira, utilizando-se de métodos pedagógicos que atendam às necessidades não só educacionais do sistema em si mas, principalmente, do educando como o principal protagonista de sua própria história.

Na verdade, do ponto de vista da natureza humana, a esperança não é algo que a ela se justaponha. A esperança faz parte da natureza humana. Seria uma contradição se, inacabado e consciente do inacabado, primeiro o ser humano não se inscrevesse ou não se achasse predisposto a participar de movimento constante de busca e, segundo, se buscasse sem esperança. A desesperança é a negação da esperança. A esperança é uma espécie de ímpeto natural possível e necessário, a desesperança é o aborto deste ímpeto. A esperança é um condimento indispensável à experiência histórica. Sem ela, não haveria História, mas puro determinismo. Só há História onde há tempo problematizado e não pré- dado. A inexorabilidade do futuro é a negação da história. (FREIRE, 1996. p.29).

O ensinar transformador e libertador exige a convicção de que a mudança é possível sim. É natural para o ser humano ficar assustado diante de algo novo mas na história, política, economia, cultura, entre outros, o individuo deve ser o sujeito e não meramente o objeto dos mesmos, precisa sentir a necessidade de modificar-se e ao mesmo tempo querer transformar o que está a sua volta.

É a partir deste saber fundamental: mudar é difícil, mas é possível, que vamos programar nossa ação político - pedagógica, não importa se o projeto com o qual nos comprometemos é de alfabetização de adultos ou de crianças, se de ação sanitária, se de evangelização, se de formação de mão - de - obra técnica. (FREIRE, 1996, p.37).

O fato de haver a rejeição de mudanças se dá devido às pessoas não compreenderem que tem a capacidade de intervir na própria realidade. Por isso, inconscientemente, se adaptam, ao invés de inovar-se e se rebelar ao poder ideológico dominante que inculca nos dominados a responsabilidade e a culpabilidade dos mesmos pela própria situação de infortúnio.

É importante ter sempre claro que faz parte do poder ideológico dominante a inculcação nos dominados da responsabilidades por sua situação. Daí a culpa que sentem eles, em determinado momento de suas relações com o seu contexto e com suas classes dominantes por se acharem nesta ou naquela situação desvantajosa. É exemplar a resposta que recebi de mulher sofrida, em São Francisco, Califórnia, numa instituição católica de assistência aos pobres. Falava com dificuldade do problema que a afligia e eu, quase sem ter o que dizer, afirmei indagando: Você é norte-americana, não é? importante ter sempre claro que faz parte do poder ideológico dominante a inculcação nos dominados da responsabilidades por sua situação. Daí a culpa que sentem eles, em determinado momento de suas relações com o seu contexto e com suas classes dominantes por se acharem nesta ou naquela situação desvantajosa. É exemplar a resposta que recebi de mulher sofrida, em São Francisco, Califórnia, numa instituição católica de assistência aos pobres. Falava com dificuldade do problema que a afligia e eu, quase sem ter o que dizer, afirmei indagando: Você é norte-americana, não é? (FREIRE, 1996. p.32).

É imprescindível reconhecer que o ensinar estabelece que a educação é também uma forma de intervenção no mundo quando consegue refletir junto ao educando a capacidade de ponderação crítica do saber, de se obter uma visão dialética do mundo, de querer se envolver nele e interferir no mesmo para combater a alienação e o sistema de ideias predominante.

Outro saber de que não posso duvidar um momento sequer na minha prática educativo-crítica é o de que, como experiência especificamente humana, a educação é uma forma de intervenção no mundo. Intervenção que além do conhecimento dos conteúdos bem ou mal ensinados e/ou aprendidos implica tanto o esforço de reprodução da ideologia dominante quanto o seu desmascaramento. Dialética e contraditória, não poderia ser a educação só uma ou só a outra dessas coisas. Nem apenas reprodutora nem apenas desmascaradora da ideologia dominante. (FREIRE, 1996. p.27).

Tendo como base uma experiência bem-sucedida de Paulo Freire – a alfabetização de 300 cortadores de cana em menos de 60 dias – criou-se o Plano Nacional de Alfabetização - idealizado por Freire - que propunha extinguir o analfabetismo no Brasil (FOLENA, 2010).

Tal iniciativa foi considerada tão fundamental e transformadora para o Brasil que foi duramente combatida durante o Regime Militar. Freire foi condenado por traição e preso por 70 dias, em seguida exilou-se na Bolívia e trabalhou por cinco anos no Chile. Ele foi um autor ousado para sua época, tanto que suas obras, e em especial o livro “a Pedagogia do Oprimido”, uma dos seus principais frutos, não foi divulgada com tanta facilidade, tendo em vista que representava uma ameaça para os detentores do poder.

A contribuição de Freire para a educação brasileira foi, sem dúvidas, imprescindível para o enfrentamento da pedagogia bancária, onde o educador autoritário apenas deposita seu conhecimento definido no aprendiz e não abre possibilidades de uma pedagogia calcada na democracia e liberdade. Uma das suas notórias conquistas, dentre o seu legado, foi uma pedagogia de alfabetização diferenciada, a Educação de Jovens e Adultos – E.J.A., que valoriza o indivíduo que traz consigo toda uma bagagem de experiência vivenciada no seu cotidiano, conforme suas limitações sociais, culturais e econômicas, as quais são consideradas respeitosamente.

Assim, em sua obra a pedagogia da autonomia, direcionou os educadores á uma prática docente onde toda forma de opressão fosse negada, apresentando métodos de ensino capazes de promover uma articulação sem hierarquia, calcada na ética, respeito, reciprocidade, pesquisa, curiosidade, rigorosidade metódica, esperança, bom senso, e enfim, propostas baseadas na objetividade e subjetividade, com a finalidade maior de promoção da autonomia (FREIRE, 1996).

Todavia, essa prática/teoria de ensino não ficou em destaque nos interesses governamentais. Assim, temos como exemplo a EJA que “[...] sempre ocupou espaço reduzido nos sistemas educativos, com um caráter estritamente compensatório e quase que exclusivo dos desprovidos de valor social” (FÁVERO; ANDRADE, 2009, p.163). Reafirma-se, portanto, que a educação pública não está seguindo ao encontro dos atributos inicialmente propostos.

Segundo Fávero e Andrade (2009, p.167) “[o] contingente de jovens e adultos, predominantemente marcado pelo trabalho, é o destinatário primeiro e maior da EJA”; pode-se verificar, portanto, que este grupo diante das condições existenciais de precariedade que o sistema impõe, muitas vezes, fica desprovido de uma escolarização apropriada, cabendo ao Estado os meios de garantir dentro da política pública de educação, oportunidades gratuitas e de qualidade.

Mas Freire previa a resistência do Estado, bem como a precarização de todos os mecanismos educacionais (falta de qualificação dos professores, descontinuidade das politicas públicas, materiais didáticos defasados, espaço escolar precarizado, falta de investimos, etc.), pois é de interesse deste a estagnação de um déficit no aprendizado.

É inegável diante desse legado, a contribuição que Freire trouxe na educação brasileira, ultrapassando as barreiras nacionais e a importância da pedagogia libertadora.

5 Considerações finais.

Este artigo trouxe a tona aspectos imprescindíveis para compreendermos a contribuição que o legado da Teoria do Oprimido deixou à educação brasileira, pois traz em seu bojo a realidade concreta vivenciada em todo processo sócio-histórico que engendra a ordem capitalista e as conjunturas desde os seus primórdios até os dias atuais, refletindo arduamente no sistema educacional do país.

Apesar de todo este cenário catastrófico, Freire, ainda que desvele toda a obscuridade do capital que influencia negativamente a educação; ao mesmo tempo, ele traz possíveis respostas, métodos e estratégias para realizar melhorias.

Apesar de todo este cenário catastrófico, Freire, ainda que desvele toda a obscuridade do capital que influencia negativamente a educação, concomitantemente, traz possíveis respostas, métodos e estratégias para realizar melhorias.

Freire idealizou princípios que buscavam dar uma nova roupagem à ordem social - pensamentos transformadores, de uma longa análise da totalidade das relações sociais. Em suas apreciações, teve o cuidado de ponderar que o desafio não seria fácil, até porque os oprimidos deveriam ter consciência das relações objetivas e subjetivas que os regem, e os opressores entenderem a posição de poder que exercem. De forma que “a libertação, por isto, é um parto. E um parto doloroso. O homem que nasce deste parto é um homem novo que só é viável na e pela superação da contradição opressores-oprimidos, que é a libertação de todos”. (FREIRE, 1968, p.19).

A liberdade deve ser a finalidade da educação, a liberação da realidade opressiva e a transformação da sociedade de modo a torná-la mais humana para que enfim, seja possível o reconhecimento dos indivíduos como seres humanos autores de sua vida e não como meros objetos.

Assim, o educador aponta o caminho para uma transformação da realidade e enfatiza que está convencido que somente através do diálogo com as massas populares poderá ser realizada uma revolução autêntica (FREIRE, 1968). E complementa esse pensamento ao indicar que “a verdadeira revolução, cedo ou tarde, tem que inaugurar o diálogo corajoso com as massas" (Freire, 1968, p.76).

Almeja-se que as massas tenham participação efetiva no poder, vislumbrando sua expressividade democrática.

Seria pretensão demais ou utopia imaginar uma sociedade justa e igualitária? Para alguns certamente sim, no entanto, Freire apresentou algumas possibilidades significativas, através de uma mudança de base, de consciência, de socialização do saber e dos bens sejam materiais, culturais e sociais. Para isso é necessário que a escola deixe de formar uma mão-de-obra barata e alienada e passe a formar seres humanos completos.

Freire completa seu ensaio, dizendo que chegou a uma conclusão obvia:

“(...) Assim como o opressor, para oprimir, precisa de uma teoria da ação opressora, os oprimidos, para libertar-se, necessitam igualmente de uma teoria de sua ação. O opressor elabora a teoria de sua ação, necessariamente sem o povo, pois que é contra ele. O povo, por sua vez, enquanto esmagado e oprimido, introjetando o opressor, não pode, sozinho, constituir a teoria de sua ação libertadora. Somente no encontro com a liderança revolucionária, na comunhão de ambos, na práxis de ambos, é que esta teoria se faz e refaz.” (FREIRE, 1968, p.107).

Freire, dentre suas inúmeras contribuições para a sociedade brasileira, podemos ressaltar duas que devem ser dogmas norteadores para reforma societária: o imperativo da luta contínua contra as injustiças e a aversão perante a barbárie.

Enfim, para que haja, de fato, uma mudança no Sistema Educacional Brasileiro, é preciso focar-se na modificação de comportamento e atitudes, na incorporação de novos valores e práticas.

Finaliza-se essa análise, anuindo com Gadotti ao afirmar que “Não pode estar superada a pedagogia do oprimido enquanto existirem oprimidos. Não pode estar superada a luta de classes enquanto existirem privilégios de classe” (GADOTTI, 1999a, p. 19).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ABNT. NBR 6022: informação e documentação: artigo em publicação periódica científica impressa: apresentação. Rio de Janeiro, 2003. 5 p.

BELLO, José Luiz de Paiva. Educação no Brasil: a História das rupturas. Pedagogia em Foco. Rio de Janeiro, 2001. Disponível em: <http://www.pedagogiaemfoco.pro.br/heb14.htm>. Acesso em: 10/02/2014.

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Paulo Freire, educar para transformar: fotobiografia. São Paulo: Mercado Cultural, 2005. 140 p.

DUARTE, Ana Cléia de Souza; BARBOZA, Reginaldo José. PAULO FREIRE: O PAPEL DA EDUCAÇÃO COMO FORMA DE EMANCIPAÇÃO DO INDIVÍDUO. Revista CientÍfica EletÔnica de Pedagogia –, Garça-sp, v. 9, p.1-7, 2007. Semestral. Faculdade de Ciências Humanas de Garça FAHU/FAEF e Editora FAEF, mantidas pela Associação Cultural e Educacional de Garça – ACEG. Disponível em: <http://www.geledes.org.br/component/rsfiles/view?path=Paulo_Freire/Paulo_Freire_O_papel_da_educacao_como_forma_de_emancipacao_do_individuo.pdf>. Acesso em: 0 fev. 2014.

FÁVERO, Osmar; ANDRADE, Eliane Ribeiro. Educação Básica de Jovens e Adultos. In: VALLE, Bertha de Borja Reis do et al (Org.). Políticas Públicas em Educação.Curitiba: Iesde Brasil S.a., 2009. Cap. 10. p. 163-179.

FOLENA, Jorge . O Plano Nacional de Alfabetização (PNA) e a Anistia. Tribuna da Internet. São Paulo, 31/07/2010. Disponível em:<http://http://tribunadaimprensa.com.br/?p=10364.>. Acesso em: 10 jan. 2014.

FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967.

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