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Resenha do Livro Indústria da Música em Transição

Por:   •  19/10/2020  •  Resenha  •  1.597 Palavras (7 Páginas)  •  232 Visualizações

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Apontamentos para a elaboração de um mapa da indústria da música em transformação

Leonardo De Marchi[1]

Livro resenhado:

HERSCHMANN, Micael. A indústria da música em transição. São Paulo: Estação das Letras e Cores, 2010. 179 p.

Resumo: Nesta resenha, destacam-se os pontos mais relevantes tratados no livro A indústria da música em transição, de Micael Herschmann. O objetivo é discutir a articulação que o autor dá aos diversos temas relacionados às recentes transformações do negócio da música, discutindo suas contribuições teóricas e metodológicas para o estudo deste objeto desde o campo da Comunicação.

Palavras-chave: música, novas tecnologias da comunicação, inovação, indústrias culturais.

Desde a publicação de Lapa: cidade da música (Mauad X, 2007), Micael Herschmann tem se notabilizado por realizar pesquisas sobre o negócio da música como vetor de crescimento econômico e de desenvolvimento social no Brasil. Naquele estudo sobre a revitalização do tradicional bairro boêmio do Rio de Janeiro, a Lapa, através dos concertos ao vivo de samba e de choro, o autor situara seu objeto de estudo – o negócio de concertos de música ao vivo – sobre um quadro mais amplo, o do cenário cambiante da indústria da música ao final do século XX. Então, chamara a atenção para a diminuição do valor tanto econômico como cultural da música gravada e a concomitante valorização dos concertos ao vivo como negócio, sem estabelecer uma relação causal entre os dois fenômenos. Tendo abordado o tema da reestruturação de forma apenas pontual, o professor da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro passou a se dedicar à análise do processo de transformação do negócio da música em seus mais diferentes setores: a música ao vivo, a música gravada e as interfaces com outros setores das indústrias culturais. Os resultados de suas investigações têm sido apresentados de forma dispersa entre conferências, mesas de debate, apresentação de trabalhos em congressos, além da publicação de artigos em revistas científicas ou capítulos de livros.

Sua recente publicação, Indústria da música em transição (Estação das Letras e Cores, 2010), tem como motivação reunir tais reflexões. A missão não é fácil, contudo. Um breve olhar sobre os temas discutidos ao longo dos três capítulos que compõem o livro revela que o pesquisador abordou temas distintos de um objeto de estudo em plena transformação: consolidação dos concertos ao vivo como negócio; emergência de negócios fonográficos no entorno digital; a crescente importância da indústria de jogos eletrônicos como plataforma de negócio para a indústria da música. Como articular isto? O fio que conduz Herschmann neste livro é sua preocupação não em meramente identificar oportunidades econômicas, a sacro-santa busca por “novos modelos de negócio”, mas entender como as possibilidades comerciais que emergem podem servir ao desenvolvimento social local e, por conseguinte, fortalecer a vida democrática. Isto é, há

[...] uma constante preocupação em produzir um conhecimento compromissado com a elaboração de uma reflexão que possa contribuir não só para um melhor entendimento do potencial de desenvolvimento local sustentável, que está associado a pequenos e médios produtores locais de música, mas também subsidiar com pesquisas aplicadas a reelaboração de políticas culturais mais democráticas (endógenas), que sejam capazes de garantir os interesses do território e fomentar a diversidade cultural da região. (HERSCHMANN, 2010, p. 14).

Esta citação esclarece a opção teórica e metodológica adotadas pelo autor e explicitadas no primeiro capítulo da publicação, Por uma agenda de pesquisa para a indústria da música. Desde seu livro anterior, Herschmann propõe – de forma algo provocativa – a retomada das preocupações críticas dos autores originais dos Estudos Culturais ingleses e sua articulação com as preocupações macro-econômicas dos estudos da economia política da comunicação e da cultura. A intenção não é desacreditar ambas as linhas de pesquisa, é lógico, mas reestabelecer uma agenda de pesquisa comum para dois campos antes afins em suas preocupações sobre o papel da cultura na sociedade contemporânea. O leitor encontrará neste capítulo uma aprofundada discussão teórica e metodológica em que críticas aos estudos culturais e à economia política da comunicação não são poupadas e, o que nos parece muito profícuo, há uma sincera discussão sobre como conduzir pesquisas sobre a indústria da música em um país cujas informações sobre o tema são escassas.

No segundo capítulo, apresenta-se um compreensivo mapeamento da indústria da música neste momento de transformação. Três são os temas ressaltados pelo autor: (a) a consolidação dos concertos ao vivo como negócio baseado no valor da experiência que se oferece aos espectadores, (b) a emergência de negócios fonográficos no entorno digital e (c) a crescente importância do setor dos jogos eletrônicos (games) para a indústria da música. Em um trabalho notável de reunião e análises de dados estatísticos, o autor consegue construir um quadro panorâmico completo, conciso e coerente sobre a indústria da música. No que concerne aos negócios de concertos musicais, Herschmann explora sua recente valorização não apenas à luz da depreciação dos fonogramas como também pela importância que a comercialização da “experiência” ganha no capitalismo imaterial. Isto é, pautando-se na teoria da “economia da experiência” (PINE; GILMORE, 1997), o autor afirma que, ao contrário da música gravada que é estocada e reproduzida em massa, os concertos presenciais possuem uma sensação única que permite a aplicação de estratégias de negócio bastante rentáveis para os empresários culturais por oferecerem.

A segunda e terceira partes desse capítulo são dedicadas a fenômenos mais recentes e, no entanto, extremamente relevantes. O primeiro refere-se aos emergentes negócios fonográficos digitalizados que, pouco a pouco, vão colonizando o entorno digital. O argumento apresentado impressiona. Talvez pela popularização do pré-conceito de que a indústria fonográfica esteja em inevitável decadência, pouco se notou, como demonstra o autor, que já está em pleno funcionamento, de forma consistente e vigorosa – ainda que modesto em seus números se comparado aos anos áureos da venda de discos físicos – um mercado digital de fonogramas com características estruturais bem definidas e que merecem uma discussão aprofundada. De fato, é um fenômeno bastante novo e cuja relevância somente poderá ser mais bem avaliada no futuro. No entanto, sua presença aqui revela uma prova incontestável da reconstrução da indústria de fonogramas no entorno digital, ao contrário de muitas previsões feitas até agora. Este debate ganha mais fôlego quando o autor evidencia a crescente interface entre a indústria da música e a dos jogos eletrônicos. Estranhamente pouco estudados, fenômenos como o jogo Guitar Hero indicam que os jogos eletrônicos possuem uma penetração social crescente, prometendo ser talvez o grande setor articular das indústrias culturais em um futuro próximo.

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