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A Linguagem da ciência mediada pela televisão: uma análise de significado à luz da mimese

Por:   •  19/11/2017  •  Ensaio  •  3.130 Palavras (13 Páginas)  •  322 Visualizações

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A linguagem da ciência mediada pela televisão: uma análise de significado à luz da mimese

Mykon Rosa Figueiredo

Este artigo tem o objetivo de traçar um percurso analítico baseado no conceito de mimese para o estudo de programas de televisão do gênero documentário científico e que abordam conceitos complexos da Física Moderna, tratando-os em uma linguagem mais simples e acessível para transmiti-los a uma grande audiência leiga. A finalidade é entender como a visão científica do cosmos é trabalhada nos programas por meio de uma investigação sobre o caminho da produção de sentido.

A minha intenção é verificar a possibilidade de uma alternativa metodológica à análise semiótica que será utilizada no projeto de dissertação a ser apresentado no Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Territorialidades da Universidade Federal do Espírito Santo. O artigo não pretende testar um outro método para a análise, mas apenas se coloca como um outro modelo de compreensão para um fenômeno comunicacional.

Como objeto, o presente estudo toma o primeiro episódio da série “The Elegant Universe” (2003), que tem o título “Einstein’s Dream”. A minissérie foi apresentada em três episódios e a produção foi baseada na obra homônima do físico Brian Greene publicada em 1999, além de ser apresentada pelo próprio cientista. O objetivo específico foi o de levar ao público noções de como a Teoria das Cordas foi desenvolvida, o seu relacionamento com outras teorias da Física Moderna e a possibilidade de o modelo representar a explicação definitiva para todos os fenômenos físicos estudados, que acontecem desde a escala subatômica até as dimensões astronômicas.

O documentário mostrou um dos principais desafios atuais da Física contemporânea na tarefa de encontrar uma lei única que consiga ser aplicada na compreensão tanto de fenômenos subatômicos quanto do comportamento de grandes estruturas do cosmos, como estrelas, galáxias e conglomerados. O episódio mostrou um resumo da Física Clássica desenvolvida por Isaac Newton e explica a evolução da compreensão da força da gravidade até a Teoria da Relatividade Geral de Albert Einstein. O episódio exemplifica como as leis da Física estão relacionadas com nossa vida cotidiana e descreve quais são as quatro forças fundamentais que atuam sobre a matéria, que são a gravidade, o eletromagnetismo, a nuclear fraca e a nuclear forte. Além disso, o programa traça um panorama histórico a respeito do desenvolvimento da teoria da Mecânica Quântica e seus avanços obtidos na compreensão do mundo subatômico.

1. A mimese em Walter Benjamin

Em seu texto “A Doutrina das Semelhanças”, Benjamin entende as brincadeiras infantis como a escola das capacidades miméticas, que não são exatamente uma réplica ou uma imitação, já que correspondem a uma forma de reelaboração. A faculdade mimética, segundo o autor, é a capacidade humana de reconhecer e reproduzir semelhanças. Benjamin situa a faculdade mimética dentro do domínio do “extrassensível”, que escapa ao terreno dos sentidos.

Tal concepção é naturalmente próxima das teorias místicas ou teológicas, sem com isso abandonar o âmbito da filologia empírica. […]É digno de nota que esta pode esclarecer a essência das semelhanças extrassensíveis, talvez melhor ainda que certas configurações sonoras da linguagem, através da relação entre a imagem escrita de palavras ou letras com o significado, ou com a pessoa nomeadora. […] É, portanto, a semelhança extrassensível que estabelece a ligação não somente entre o falado e o intencionado, mas também entre o escrito e o intencionado, e entre o falado e o escrito. (BENJAMIN, 1987; p. 111)

Para os homens primitivos, a dimensão nomeadora da linguagem permitia a eles inventar nomes que correspondiam exatamente às coisas, baseados em ideias surgidas a partir da experiência direta que tinham com essas coisas. Com a instrumentalização da língua, uma outra dimensão da linguagem toma conta e a nomeadora abre espaço para a dimensão semiótica ou comunicativa, que está ligada à produção de significado.

Em “A Doutrina das Semelhanças”, Benjamin introduziu o conceito de dimensão mimética e o desenvolvimento desta ideia levou também à definição do conceito de semelhança.  Para o pensador, a linguagem é um arquivo completo de semelhanças extrassensíveis (BENJAMIN, 1987; p. 112) e não perceptíveis de forma direta, e a relação do ser humano com a linguagem permite uma leitura diferente, praticamente contrária, à maneira como faziam os povos antigos com o conhecimento astrológico e a implicação imediata do posicionamento dos astros na vida terrestre. Benjamin considera que a capacidade mimética do ser humano, a capacidade de reconhecer as semelhanças, foi fundamental para o surgimento da linguagem. Essa capacidade migrou da situação empírica com o mundo para se concentrar na linguagem e na escrita, passando a se modificar conjuntamente à dimensão semiótica. A humanidade, então, parece que foi deixando de lado a competência de ler as imagens do mundo através da experiência para enfocar sua faculdade mimética na compreensão de algo abstrato, que é o texto (linguagem).

2. Uma metodologia baseada na mimese

A mediação de informações sobre o mundo a partir dos meios de comunicação de massa marca uma característica da modernidade que fez com que fôssemos perdendo a capacidade de vivenciar a experiência. Consideramos que o ser humano carrega em si a marca inata da curiosidade e isso nos leva a reconhecer as semelhanças e a determinar a que categorias as coisas do mundo pertencem. A importância da ideia de mimese na relação central entre o indivíduo e o mundo, e para o reconhecimento de si mesmo e do outro, torna possível o uso do conceito no estudo de um objeto comunicacional a fim de elucidar características do processo de significação.

O pesquisador da área da comunicação Fabrício Silveira propôs a utilização de um modelo benjaminiano para realizar estudos nesse campo do conhecimento. Para Silveira (apud ITO & XAVIER, 2013), Benjamin apresentou um exemplo de “atitude investigativa”, um modelo epistemológico que poderia ser empregado “tanto no que diz respeito às estratégias empíricas de captação de dados quanto na apresentação, na concepção narrativa e/ou na formalização de eventuais materiais de campo”.

Como já foi mencionado, o uso de linguagem não especializada é um recurso bastante comum na produção de documentários para mediar conteúdos baseados em pesquisas científicas. Uma das maneiras de simplificar a compreensão básica de teorias da Física acerca de aspectos da realidade inacessíveis aos nossos sentidos é a aposta em imagens computadorizadas. Dessa forma, é possível ilustrar, por exemplo, o comportamento de partículas subatômicas, a dinâmica dos buracos negros ou a possível existência das entidades nomeadas como cordas, que de acordo com a teoria apresentada no episódio em questão seriam as menores unidades da matéria e da energia do universo.

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