FORMATO DE CENA

FORMATO DA CENA

A unidade básica do roteiro é a CENA.

Para definirmos uma cena é preciso saber primeiro para que ela serve. A cena possibilita ao roteirista dividir sua história ou fábula em partes, de modo que ela possa ser encenada, gravada ou filmada. Enfim, transformada em ação.

Na narrativa, ou gênero épico, contamos com a imaginação do receptor para preencher espaços e tempos informados em poucas frases:

Não falei com ninguém sobre essa história. Mas levei o maior susto do mundo quando dois meses depois tia Daniela telefonou da chácara para avisar que tio Ed estava muito doente.Tia Pombinha começou a tremer. O pescoço ficou uma mancha só.

O roteiro precisa mostrar uma coisa que o personagem não fez, (“não falei com ninguém sobre essa história”); em seguida, indicar que se passaram dois meses; ainda por cima, precisa mostrar a reação da tia Pombinha, sendo que o texto não indica quem atendeu ao telefonema: se a narradora ou a própria Pombinha. A não ser que se lance mão do narrador off, isto é, um recurso épico,, será preciso transformar essas cinco linhas em cenas que mostrem as ações de modo que os acontecimentos da fábula cumpram seu objetivo: manter o interesse do receptor num encadeamento crescente de suspense e expectativa.

Alguns autores não recomendam a numeração das cenas, mas isso foi num tempo onde se escrevia a máquina, e dava muito trabalho renumerar quando fossem feitas alterações na ordem das cenas. Com a numeração automática, o recurso é útil tanto para dar uma idéia da extensão do roteiro como para discutir o conteúdo.

Para escrever uma cena é preciso estabelecer seus limites. O primeiro deles é espacial: onde a ação acontece. Algumas convenções foram estabelecidas para essa indicação. Primeiro, a cena pode ser interna ou externa. Interna se for gravada em estúdio ou dentro da locação, externa se for ao ar livre. Para isso usam-se as abreviaturas INT e EXT.

A próxima indicação especifica o cenário e o recorte da cena: se acontece numa casa, de quem é a casa, e em que cômodo da casa isso se dá.

A terceira informação diz respeito à luz. Basta indicar dia ou noite no cabeçalho da cena. No máximo, amanhecer ou entardecer. A hora precisa pode vir na rubrica (indicação cênica,didascália) o próximo elemento.

Didascálias: instruções dadas pelo autor a seus atores(teatro grego, por exemplo), para interpretar o texto dramático. Por extensão, no

58

emprego moderno: indicações cênicas ou rubricas.

Indicações cênicas (stage directions): todo texto(quase sempre escrito pelo dramaturgo,mas às vezes aumentado pelos editores como para SHAKESPEARE) não pronunciado pelos atores e destinado a esclarecer ao leitor a compreensão ou o modo de apresentação da peça. Por exemplo: nome dos personagens,indicações das entradas e saídas, descrição dos lugares, anotações para a interpretação etc.

As rubricas exercem três funções: descrevem o cenário, orientam o movimento dos atores e estabelecem seu estado de espírito. Sua diferença da narrativa é que são escritas em tempo presente e visam fornecer informações não ao leitor, e sim aos encenadores.

-- Daniela é assim como um jardim selvagem – disse tio Ed olhando para o teto. -- Como um jardim selvagem...

Tia Pombinha concordou fazendo uma cara muito esperta. E foi correndo buscar o maldito licor de cacau feito em casa. Passei a mão na tampa da caixa de marron glacê que ele trouxera. Era a segunda ou terceira vez que a presenteava com uma caixa igual, eu já sabia que aquele nome era como o papel dourado embrulhando simples castanhas açucaradas. Mas, e um jardim selvagem? O que era um jardim selvagem?

Foi o que lhe perguntei. Ele me olhou com um ar de gigante da montanha falando com a formiguinha.

-- Jardim selvagem é um jardim selvagem, menina.

-- Ah, bom – eu disse. E aproveitei a entrada de tia Pombinha para fugir da sala.

Transformado numa cena, o trecho acima ficaria mais ou menos assim:

Cena 1/INT/SALA/NOITE

Ducha, tio Ed e Tia Pombinha sentados ao redor da mesa de centro. Sobre a mesa, uma caixa de marrons glacês fechada.

59

TIO ED

Daniela é assim como um jardim selvagem. (Olha para o teto) Um jardim selvagem...