TrabalhosGratuitos.com - Trabalhos, Monografias, Artigos, Exames, Resumos de livros, Dissertações
Pesquisar

A Concepção de ser humano: a antropologia de Viktor Frankl

Por:   •  25/10/2017  •  Artigo  •  6.801 Palavras (28 Páginas)  •  1.743 Visualizações

Página 1 de 28
  1.   O sentido do Outro na perspectiva Frankliana
  1. A concepção de ser humano: a antropologia de Viktor Frankl

O início do século XX, fruto de uma grande revolução no campo científico, herdou do século anterior uma filosofia que iniciara idealista e termina como positivista. Filosofia essa que atacou e depreciou todo pensamento metafísico e idealista, e desembocou assim no naturalismo e no positivismo[1]. A partir da afirmação de que a única realidade existente era a realidade física, ou seja, aquilo que podia ser comprovado por uma teoria científica, reduziu a realidade a conceitos da natureza que afirmam a finalidade suprema do homem.

Partícipe nesse contexto, em 1905, em Viena, nasceu Viktor Emil Frankl (1905-1997), judeu, estudou neurologia e psiquiatria na Universidade de Viena, onde teve os primeiros contatos com Sigmund Freud. Não concordando com a postura determinista e reducionista sobre o homem que o pai da psicanálise apresentava - que o homem era sempre movido pela busca de prazer, migrou para a psicologia individual de Alfred Adler. Posteriormente foi convidado a se desligar da psicologia individual, por discordar da visão que Adler apresentava sobre a neurose e por discordar também que o ser humano é motivado unicamente pela busca de poder, movido por um complexo de inferioridade.

Com a sua saída do conselho de psicologia, Viktor Frankl fundou a terceira escola vienense de psicoterapia, a logoterapia[2]. Por ser judeu, foi preso pelo regime nazista juntamente com os seus familiares em setembro de 1942, foi conduzido à estação de trem de Bauschwitz para o campo de Theresienstadt. Frankl conheceu também outros três campos de concentração: Auschwist, Kaufering e Türkhein. Sua experiência nos campos lhe serviu para experienciar e validar sua teoria, através do experimentum crucis[3], ou seja, experiência da cruz, em que ele não tinha mais nada e só poderia discernir o que era essencial diante da situação-limite.

Liberto dos campos de concentração em 1945, Frankl foi nomeado chefe do departamento de neurologia da Policlínica de Viena, recebeu o grau de doutor em Filosofia, defendendo sua tese sobre o “Deus oculto”, foi nomeado professor de neurologia e psiquiatria da Universidade de Viena, proferiu duzentas e nove conferencias em universidades dos cinco continentes, chegando a escrever 32 livros. Recebeu o prêmio Oskar Pfitzer, além de ter recebido vinte e nove títulos de Doutor Honoris Causa por diversas universidades do mundo acerca do homem.

Ele denomina o ser humano espiritual - não o qualificamos como meramente religioso - como uma dimensão que há muito procurava, e até então não era notada. A dimensão espiritual ou noética, de origem grega nous, é o termo usado por Frankl para denominar essa categoria espiritual, o que diferencia o ser humano de outros seres, e o eleva da categoria meramente animal, como afirma Aquino que “Frankl atribui a dimensão noética à especificidade do ser humano, pois esta não é compartilhada com os outros entes, sendo considerada a dimensão dos fenômenos especificamente humanos” FRANKL apud AQUINO (2013, p. 44).

Para Viktor Frankl, o ser humano não pode ser reduzido a sua busca desenfreada pelo prazer, como nos descreve Freud, tampouco pela vontade de poder que Adler descreve. A definição acerca do homem para ele está em íntima ligação com algumas linhas de pensadores do século XX, desenvolvidas de modo particular por Bergson, Husserl, Max Scheler, Mounier, Heidegger, Jaspers e Marcel. Fruto da filosofia de Sócrates, Agostinho Pascal e Kierkegaard.

Em sua teoria Frankl apresenta a concepção de que o homem é bio-psico-socio-espiritual, ou seja, uma pluralidade, uma totalidade múltipla - unitas multiplex, ou seja, antropologicamente único e ontologicamente múltiplo, que não pode ser fragmentada, mas direcionada para um fim, para uma realização que vai além de seus campos específicos. Esta Unitas Multiplex, nos permite perceber o ser humano como um ser único, responsável e capaz de se posicionar diante dos condicionamentos. A partir da compreensão desse caráter humano, podemos iniciar a nossa trajetória de busca por desvendar, ou se possível, larguear o nosso campo de visão sobre o que é ser humano.

  1. Ontologia dimensional

Partindo dos conceitos ontológicos de Nicolai Hartmann[4] e da antropologia de Max Scheler[5], Frankl define o homem como unidade apesar da pluralidade, ou seja, uma unidade antropológica apesar das diferenças ontológicas. Assim ao refletir a diferenciação das dimensões ontológicas do ser humano defende a ideia da unidade e pluralidade do homem. Frankl se serve de figuras geométricas para expressar sua imago hominis, recorre à ontologia dimensional e explica a multiplicidade do ser humano - unidade e pluralidade, caracterizado por duas leis:

[pic 1]

 A primeira lei diz:

Se tomarmos uma e a mesma coisa numa dada dimensão e a projetamos em várias dimensões inferiores àquela que lhe é própria, a coisa em questão representa-se de tal modo que as figuras obtidas se opõem umas às outras. Tomaremos por exemplo um copo, representado geometricamente sob a forma de cilindro, em um especial tridimensional. Projetemo-lo em seguida nos planos horizontal e longitudinal; e teremos: num caso, um círculo; no outro, um retângulo. (FRANKL, 2010, p. 43)

[pic 2] 

A segunda lei diz:

[...] quando não um, mas vários objetos são projetados em uma outra dimensão (não em diferentes dimensões), a que está mais próxima da sua própria, formam-se eles de tal maneira que as figurar, embora não se contradizendo umas às outras, são ambíguas. Se eu projeto, por exemplo, um cilindro, um cone e uma esfera no plano bidimensional, em todos os casos se obtém um círculo. Se suponho que o cone e a esfera se tratam de sombra lançadas pelo cilindro, então, consigo concluir, n de uma delas, se foi o cilindro, o cone ou a esfera que a projetou. (FRANKL, 1978, p. 140)

Aplicando essas leis ao homem, se o projetarmos pelas dimensões específicas, perceberemos que a imagem projetada se contradiz uma com a outra. Assim sendo, o homem observado somente em suas dimensões inferiores, produz reflexos que lhe são peculiares a essas dimensões, contraditórias entre si. Por exemplo: a projeção no plano biológico produz apenas resultados somáticos, a psicológico, fenômenos psíquicos. Na perspectiva da ontologia dimensional, essa contradição não diz a respeito da unidade do homem, tanto é que essas diferenças se tratam do mesmo cilindro. Assim como o copo, um vaso aberto cujo projeção deu como resultado um sistema fechado, o homem se constitui em sistemas fechados, se visto apensas por ângulos específicos. Outra vez podemos perceber uma contradição na projeção, já que é próprio da natureza do homem que “seja aberto.” (FRANKL, 1978, p.139)

...

Baixar como (para membros premium)  txt (41.5 Kb)   pdf (320.5 Kb)   docx (231.5 Kb)  
Continuar por mais 27 páginas »
Disponível apenas no TrabalhosGratuitos.com