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A Macintyre e Nietzsche

Por:   •  1/3/2019  •  Artigo  •  4.480 Palavras (18 Páginas)  •  131 Visualizações

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O Nietzsche de MacIntyre: uma crítica

R. Kevin Hill

 

            Neste artigo tento mostrar que a leitura de Alasdair MacIntyre de Nietzsche em Depois da Virtude  é insustentável. Tal crítica esclarece nossa compreensão de Nietzsche e é uma introdução a uma crítica mais geral de MacIntyre. Para MacIntyre, Nietzsche representa o desenho final das conseqüências do projeto Iluminista de fundamentar racionalmente a moralidade. Primeiro MacIntyre compartilha com Nietzsche o julgamento da inevitável falha do projeto Iluminista. Segundo, MacIntyre, ao rejeitar as sugestões positivas subseqüentes de Nietzsche, para além dessa crítica (as quais ele considera intoleráveis), fornece uma base para ressuscitar uma abordagem pré-iluminista da moralidade. Eu argumentarei que Nietzsche nem rejeita o projeto Iluminista completamente nem a tradição clássica que ele substitui; ele nem endossa alguma dessas alternativas. A possível viabilidade de tal posição lança dúvidas sobra o próprio projeto de MacIntyre e sua rejeição da tradição iluminista.

O argumento de MacIntyre depende  da plausibilidade de uma narrativa histórica hipotética. Era uma vez, sociedades ocidentais possuíam uma vida moral que fornecia objetivos alcançáveis e satisfatórios para seus membros, e que eram racionalmente defensáveis, isto é, reivindicavam que esta moralidade fazia com que os membros desta sociedade fossem objetivamente unidos. Então uma catástrofe ocorreu: certas premissas chave deste edifício moral foram rejeitadas; as práticas que eram justificadas por este edifício moral definharam ao longo do tempo. Os filósofos começam a ver que estas práticas morais necessitavam de uma justificação racional, a qual eles tentaram sem recursos às premissas rejeitadas. Tais tentativas falharam porque estas premissas são necessárias para justificar as práticas. Subseqüentemente, a crença de que as práticas morais são incapazes de justificação racional espalhou-se como cada tentativa falha. Finalmente, as próprias práticas começaram a morrer. Nós agora vivemos em um tal mundo, um mundo niilista que Nietzsche profetizou. A menos que nós retornemos as velhas premissas rejeitadas, nós estamos condenados.

A narrativa de MacIntyre interpreta este niilismo nos termos de uma aceitação comum de uma metaética emotivista, mas sua explicação do emotivismo difere das versões difundidas por Ayer, Stevenson e outros. Emotivistas clássicos afirmaram que uma relação de sinonímia é obtida entre sentenças que expressas afirmações morais ou  pretensões e sentenças que expressam aprovação a respeito de ações ordenadas nas sentenças morais afirmativas. Esta equivalência,   que MacIntyre afirma, é insustentável, e deve ser superada em termos de uma distinção entre significado e uso.  As sentenças morais são usadas para afirmar uma aprovação para as ações em questão, mesmo se elas não significarem “eu tenho uma atitude aprovativa em relação a A”. Na medida em que sentenças morais afirmativas trazem com elas uma afirmação subentendida  de objetividade ou impessoalidade, elas são “seriamente enganosas”, já que uma atitude aprovativa em relação a algo não pode ser objetiva no sentido necessário. A linguagem moral influencia o comportamento de seus ouvintes precisamente no grau em que ela erradamente aceita a não aparente porém não-existente objetividade de suas afirmações. Poderia ser mais honesto abandonar isto. O Nietzsche de MacIntyre é precisamente esta figura honesta: o emotivista que deseja parar de ocultar o caráter manipulador da linguagem moral por trás de uma tela de objetividade putativa.

Parte das razões de MacIntyre para fazer esta ultima identificação do emotivismo honesto com Nietzsche é que MacIntyre afirma duas afirmações suprimidas e não-demonstradas  sobre a natureza humana que dar à sua explicação do emotivismo sua qualidade peculiar. Primeiro, não há aprovações em relação ao bem estar dos outros; todas as disposições emotivas humanas são auto-interessadas em um sentido estrito. Isto descarta a possibilidade de ter, por exemplo, uma desaprovação em relação ao assassinato baseado em considerá-lo intrinsecamente repelente; o aparecimento de tal atitude exigiria de MacIntyre uma explicação nos termos de minha aprovação em relação ao meu não ser assassinado, e minha aprovação em relação a instituições que favoreçam estes interesses egoístas. Segundo, há muito pouco no desejo de aprovações compartilhadas porque há muito pouco no desejo de auto-interesse compartilhado. MacIntyre não declara isso em lugar nenhum, mas eu não posso ver nenhuma outra razão para sua equação de uma guerra putativamente nietzschiana de todos contra todos com o emotivismo, a menos que isso seja em termos de uma tal declaração. Ambas as suposições são completamente falsas.

Finalmente, MacIntyre fracassa na distinção entre o emotivismo assim caracterizado e a noção existencialista de escolha sem critério. Na visão existencialista, assim como  na visão emotivismo, as sentenças ou valores morais últimos não são suscetíveis de justificação posterior. Visto que os existencialistas aceitam a liberdade absoluta, essas aprovações ultimas devem ser uma questão de escolha fundamental. Nós “escolhemos” estes valores no interior da existência. Este ultimo uso da palavra “escolhemos” facilita a identificação de MacIntyre da posição de Nietzsche com Sartre. É claro, um emotivista não precisa estar comprometido com a liberdade absoluta sobre atitudes fundamentais. Essas atitudes podem ser elas mesmas causalmente determinadas. A equação de MacIntyre do existencialismo com o emotivismo poderia ser vista antes como uma junção da liberdade absoluta com o emotivismo. Esse movimento elabora a suposição de MacIntyre sobre o auto-interesse, se isso é correto, então o mundo não poderia ser visto como uma guerra de todos contra todos, onde os interesses destes guerreiros são relativamente determinados, mas antes uma guerra de escolhas vazias uma contra as outras. Eu deveria considerar que aquilo em que meu auto-interesse  consiste deve ser indeterminado.

Nietzsche é um emotivista no sentido supra-citado? A tentação de ler o “uso” de MacIntyre  do emotivismo em Nietzsche é grande à luz de observações como

[negar a moralidade] pode significar: negar que julgamentos morais são baseados em verdades...  Este é meu ponto de vista... Eu nego a moralidade assim como eu nago a alquimia, isto é, eu nego suas premissas... Eu também nego a imoralidade: não que incontáveis pessoas sintam-se imorais, mas que haja qualquer razão verdadeira para sentir isso. É evidente que eu não nego – a menos que eu seja um tolo – que muitas ações chamadas imorais devem ser evitadas e repelidas, ou que muitas ações chamadas morais devam ser feitas e encorajadas – mas eu penso que umas deveriam ser encorajadas e outras evitadas por razoes diferentes das que foram dadas até agora. (Aurora)

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