Aproximação da Discussão Matemática do Infinito: Sobre a Abordagem Geométrica ou Conjuntista
Por: Rafael De Oliveira Foncêca • 31/5/2016 • Artigo • 4.924 Palavras (20 Páginas) • 332 Visualizações
Aproximação da discussão matemática do infinito: sobre a abordagem geométrica ou conjuntista
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Rafael de Oliveira Foncêca
No artigo da Stanford Encyclopedia of Philosophy sobre a teoria de conjuntos, a primeira frase é a seguinte: “Set Theory is the mathematical science of the infinite”. A melhor forma para compreender a seguinte afirmação é que a elaboração da teoria de conjuntos foi um avanço no modo de tratar o problema do infinito. Importa saber, nesse sentido, que o infinito nem sempre foi abordado pela teoria de conjuntos. Na verdade, a teoria de conjuntos passou a ser, na transição do século XIX para o XX, a forma matemática encontrada para responder, de um modo mais rigoroso, qual seria a natureza do infinito.
Isto se observa nas palavras ainda vacilantes de Bolzano (1781-1848) no Paradoxien des Unendlichen (1851) ao tratar o infinito por intermédio da teoria dos conjuntos, opondo-se a uma forma de tratar o continuo por meio da geometria. Entra em disputa nessas duas formas de tratar o infinito respectivamente a questão da quantidade, que lida com a noção de partes, número, multitude oposta à qualidade que expressaria pela análise da magnitude e extensão (ambas qualidades) do objeto o seu modo de ser na realidade. Sua discussão ocorre com Hegel, que seria defensor do infinito qualitativo, que é superior – simplesmente por ser expressão da verdade (cf. §11) – ao modo de se entender o infinito por meio da quantidade e na matemática (§ 2).
Por meio dessa nova forma de se abordar o problema entende-se então que o infinito não havia sido tratado com prioridade por uma teoria de conjuntos envolvida na definição de número, coleção de unidades (isto é, multitudes) e etc., mas pelo problema da magnitude de um corpo, isto é, de sua infinita divisibilidade em parte cada vez menores como expressão da extensão real de um corpo, que remete a geometria euclidiana e a Aristóteles.
As palavras de Bolzano são vacilantes porque o desenvolvimento efetivo de um conjunto infinito ocorre apenas com Dedekind no Was sind und was sollen die Zahlen? (1888) e Cantor no Foundations of a general theory of manifolds: a mathematical-philosophical investigation into the theory of the infinite (1883). No Paradoxes of the inifinite (em tradução inglesa do Paradoxien des Unendlichen, 1851), isso fica claro pelas suas palavras de “esperança de que uma rigorosa investigação das circunstâncias em que enunciamos um conjunto como sendo finito ou infinito poderá nos fornecer informações sobre a natureza do infinito enquanto tal" (§2). Essas palavras de Bolzano inspiraram igualmente as importantes formulações de Cantor, Dedekind e Pierce (1839-1914) sobre o infinito e sobre o contínuo, todas rompendo com a visão matemática tradicional (geométrica) e qualitativa (magnitudes e extensões) de se abordar o infinito. Em Bolzano encontra-se o esclarecimento do que essa nova maneira de se tratar o infinito critica.
As palavras de Bolzano no início do seu texto são de que certamente todos os paradoxos da matemática contêm imediatamente a idéia de infinito e de um modo direto ou indireto dependem de um aprimoramento da noção de infinito para serem resolvidos. Por isso ele inicia tratando do conceito de infinito como um acréscimo negativo a tudo aquilo que é finito (o “in”), ou seja, o conceito de infinito dependeria de certa maneira de uma noção anterior sobre o que é finito, tal como uma teoria de conjunto sobre o infinito dependeria de uma certa coleção de unidades que em si não finitas, no sentido de discretas e individualizadas (well-defined).
Uma teoria clássica de uma teoria filosófica sobre o infinito encontra-se em Aristóteles, que tinha a noção do sempre maior na definição de número, pois sempre poderíamos pensar em um número maior, sendo infinitos no aumento, além disso, não acreditava que um número pudesse ser infinito em divisibilidade, pois para ele a unidade indivisível é encontrada, isto é, chega-se a um número indivisível, sendo que o número dois, três, e etc. são todos derivações desta unidade. No caso das magnitudes físicas o que ocorre é seguinte: sua concepção do universo estabelece que o corpo é finito em extensão, ou seja, o seu aumento é finito porque o seu universo é “fechado”, ao contrário do que acontece com a divisibilidade para a diminuição, pois as magnitudes (extensões) são divisíveis ao infinito, em parte sempre menores (Cf. Física).
Segundo Aristóteles, na Física, a crença na realidade universal do infinito em todas as coisas, números, magnitudes e etc., tanto para o máximo quanto para o mínimo provêem de cinco razões. Uma destas razões poderia ser tratada aqui, pois trata da idéia que os matemáticos tinham do contínuo por meio da infinita divisibilidade das magnitudes e dos números. Assim, então, ele explica a razão pela qual os matemáticos pensam na infinita divisibilidade da magnitude, fazendo, pois, uso do infinito porque “ao não encontrarem nunca um termino em seus pensamentos, pensam que não somente o número é infinito, mas também as magnitudes matemáticas (...)” (Física, III, 203 b 24). Mas o correto seria, para Aristóteles, considerar o infinito nos números somente no aumento e nas magnitudes apenas na diminuição e não em todos os casos, isto é, no número para diminuição e na magnitude por aumento.
Alguns problemas surgem ainda a esse respeito e lida com a questão do infinito atual e potencial. Quando Aristóteles fala que “tampouco pode haver um número infinito separado, pois um número, ou que tem número, é numerável; e se fosse possível numerar o que é inumerável, então seria possível recorrer ao infinito” (Física, III, 204 b 4-9) atualizado e de um modo completo. O infinito ao qual seria possível recorrer é o infinito atual, o que é impossível para Aristóteles. Assim, esse texto não nega todo o infinito quando nega a possibilidade de se contar o infinito, atualizado. O infinito para Aristóteles é apenas potencial, incontável, tanto nos números sempre maiores como nas magnitudes sempre menores (Física, III, 204 b 4-9).
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