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Críticas De Jürgen Habermas à "justiça Como Eqüidade", De John Rawls.

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Por:   •  18/11/2012  •  5.831 Palavras (24 Páginas)  •  1.293 Visualizações

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Críticas de Jürgen Habermas à “justiça como eqüidade”, de John Rawls.

INTRODUÇÃO

O presente artigo visa ao exame de uma das críticas de Jürgen Habermas (1929-) à teoria da justiça como eqüidade de John Rawls (1921-2002), nomeadamente a crítica de que aquela teoria haveria confundido a noção deontológica de justiça com a noção teleológica de bem e tentado o acesso a uma visão universalista pela via de um auto-interesse esclarecido. Essa nos pareceu uma problemática especialmente interessante, não só porque a teoria de Rawls exerceu e continua a exercer uma forte influência sobre muitas proposições teóricas que tangem direta ou indiretamente à filosofia do direito, mas sobretudo porque o equívoco identificado por Habermas de modo algum se trata de um caso isolado de ausência de rigor conceitual, senão que se constitui num problema muito recorrente na maioria dos trabalhos jurídicos e jusfilosóficos que pretendem ter algum acesso a uma perspectiva de justiça, quer sejam influenciados pela proposição rawlsiana, quer adotem qualquer outra.

Conforme teremos oportunidade de ver ao longo do artigo, a distinção entre as visões deontológica e teleológica é incontornável, o que vicia de inconsistência qualquer tentativa, intencional ou eventual, de conciliação entre elas. Não se trata, assim, de um erro qualquer, irrelevante no contexto de uma proposição que, apesar desse equívoco, poderia ter muitos méritos e ainda prover um caminho interessante a seguir. Trata-se, isto sim, de uma distinção conceitual que não poderá deixar de ser observada por todo aquele que pretenda o mínimo de coerência e plausibilidade para sua construção teórica.

Para abordar de modo razoavelmente inteligível o tema que nos propomos a tratar, devemos começar distinguindo entre concepções teleológicas e concepções deontológicas. Em seguida, faremos uma exposição sucinta das idéias da teoria rawlsiana da justiça, que representam, afinal, o objeto de crítica dos argumentos finais. Depois, exporemos a crítica de Habermas ao caráter pseudodeontológico da justiça como eqüidade. E, para encerrar, faremos algumas considerações acerca de como o erro de Rawls se trata de um equívoco recorrente também nas proposições jusfilosóficas explícitas ou implícitas de muitos autores jurídicos.

1.CONCEPÇÕES DEONTOLÓGICAS E CONCEPÇÕES TELEOLÓGICAS

Aristóteles e Kant representam os marcos respectivos das teorias do bem e das teorias da justiça. Dessa maneira, entendemos que uma exposição cuidadosa deveria primeiro Mestrado em Direitos Humanos. Universidade Federal do Pará.

caracterizar a abordagem aristotélica, depois caracterizar a abordagem kantiana e, por último,

apontar as diferenças entre as duas e justificar a tese da sua inconciliabilidade. As noções

fixadas neste ponto serão indispensáveis para a compreensão dos itens posteriores.

2. A ABORDAGEM ARISTOTÉLICA

Na sua Ética a Nicômaco, Aristóteles fixa que toda ação humana visa a algum fim (ho

télos), que o sujeito da ação identifica com o bem (tó agathôn)1. Com isso Aristóteles define a

estratégia teórica que pretende utilizar. Se toda ação é teleológica, no sentido de que visa a

algum fim, e se todo fim se apresenta ao sujeito como um bem, a Ética será aquela disciplina

que identificará o fim mais digno de ser perseguido2 e os motivos pelos quais o sujeito deveria

emprenhar-se na sua consecução. O objeto por excelência da Ética passa a ser o “sumo bem”

(tó agathôn tó árchon) e a “vida boa” (ho bíos agathós), quer dizer: o bem maior a ser

alcançado e o modo de vida mais apto a alcançá-lo.

Aristóteles percebe que, embora todos os sujeitos ajam na persecução de algum bem,

nem todos o identificam nas mesmas coisas3 e, mesmo que fosse pedido aos sujeitos que

indicassem o bem mais excelente, haveria, por trás do acordo aparente de que se trata da

felicidade, um desacordo real sobre a natureza desse bem4. Essa diversidade e desacordo

também contribuem para a feição que a Ética adquire, porque, então, deverá se apresentar

como disciplina que argumenta em favor de uma certa concepção de felicidade em detrimento

de outras possíveis, mostrando que estas outras alternativas, por alguma razão, não são tão

boas quanto aquela que se está a defender. Adquirirá, por isso mesmo, a feição em que

predomina um procedimento de cálculo5 de vantagens e desvantagens, propondo em geral

1 “Toda arte e toda investigação, bem como toda ação e toda escolha, visam a um bem qualquer; e por isso foi dito, e não sem razão, que o bem é aquilo a que as coisas tendem” (Ét. Nic., I, 1, 1094a, 1-3).

2 No seu Dicionário de filosofia, Abbagnano explica que existem, na história da filosofia, duas concepções de

“bem”: uma subjetiva, que o identifica com o objeto real da apetição (que é desejado), e outra objetiva, que o

identifica com o objeto ideal da apetição (que deve ser desejado). O mesmo autor chama a atenção para a

oscilação que se percebe na concepção Aristotélica, que começa definindo o bem como o fim a que cada um

busca em suas ações, mas depois se propõe a indicar o bem mais perfeito, que deve ser buscado por todos.

3 “Mas, como muitas são as ações, artes e ciências, muitas também são suas finalidades. O fim da medicina é a

saúde, o da construção naval é um navio, o da estratégia militar é a vitória, e o da economia é a riqueza” (Ét.

Nic., I, 1, 1094a, 7-9).

4 “Em palavras, quase todos estão de acordo, pois tanto o vulgo como os homens de cultura superior dizem que

esse

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