O PROBLEMA DA MOTIVAÇÃO NA FILOSOFIA MORAL DE KANT
Por: Kelsomiller • 16/5/2018 • Resenha • 5.497 Palavras (22 Páginas) • 584 Visualizações
CRÍTICA DA RAZÃO PRÁTICA
Immanuel Kant
O PROBLEMA DA MOTIVAÇÃO NA FILOSOFIA MORAL DE KANT
Introdução
A Crítica da Razão Prática tem por ideia principal tirar da razão empiricamente condicionada a qualidade de pretender, ou de querer condicionar, de modo exclusivo, toda a fundamentação da determinação da vontade. Porém uma razão pura, totalmente livre de qualquer condição empírica, poderia também ser o único fundamento de tal determinação? Para Kant, nossa moralidade não pode ser praticada somente por inclinações individuais, ou prazeres, como a busca da felicidade; ou por um domínio racional sobre as paixões e apetições em prol da virtude, considerando que somos seres finitos, inevitavelmente afetados pelas inclinações sensíveis. Ou seja, Kant quer mostrar que a razão deveria ser o fundamento de determinação da vontade. Mas como esse sistema pode funcionar e quais questões precisam ser levantadas e estudadas, é o que vai impulsionar esse trabalho sobre a motivação moral na Crítica da Razão Prática.
Ressalto porém, que na primeira parte do trabalho, o objetivo maior é mostrar de forma sucinta, como se estruturavam algumas das principais doutrinas morais que, seja positiva ou negativamente, influenciaram Kant no desenvolvimento de sua doutrina. As teses, nesses sentidos, aliás, como qualquer estudo no campo filosófico, são amplas e vastas, abrindo um grande leque de certezas e hipóteses interpretativas, até mesmo dentro de uma mesma doutrina. Deste modo, cabe aqui apenas a indicação geral de certos temas e questões da tradição filosófica que, de algum modo, foram recebidas por Kant na elaboração de sua reflexão moral.
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Por outro lado, na sequência deste trabalho, pretendemos mostrar como se constituem os principais argumentos de Kant na Analítica da Crítica da Razão Prática. Sendo que o objetivo principal é mostrar que as inclinações sensíveis não poderiam ser a principal motivação para o agir moral. Mostrando, com isso, que cabe a razão, fornecer o “princípio do dever” e que esse princípio, pode ser livre das influências sensíveis e se tornar a motivação para a moralidade.
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A filosofia sempre procurou explicar as motivações para nossas ações, como elas são condicionadas ou como poderíamos determiná-las. Ao longo da história da filosofia, a busca pela felicidade foi o principal fundamento para a motivação na forma de agir do homem. O principal problema das chamadas “doutrinas da felicidade” para Kant, é que elas, de um modo geral, sempre acabam sofrendo uma influência empírica, o que escaparia de uma concepção de propriamente filosófica da moral, na medide em que esta pretendia lidar necessariamente com princípios racionais a priori e não apenas com a descrição empírica antropológica dos costumes relativos aos diferentes povos e épocas.
Logo no prefácio da Crítica da Razão Prática, Kant diz, que na Crítica da Razão Pura, o estudo esteve focado no uso teórico da razão como faculdade de conhecer e na crítica do uso dessas faculdades cognitivas para além de seus limites. Agora pensando um possível uso prático da razão, o estudo, terá um outro objeto, a saber a investigação da tese segundo a qual a razão, pode, por si mesma, ser tomada como um fundamento de determinação da vontade; mais exatamente, se é possível a razão determinar imediatamente a vontade. Com isso, a primeira questão é :
“se a razão pura basta por si só para a determinação da vontade ou se somente enquanto razão empiricamente condicionada ela pode ser um fundamento determinante da mesma.” ( Kant, 2011, Pag. 25)
Kant pretende fazer um estudo acerca de até onde nossa razão pode influenciar nossas ações. Para tal, é necessário fazer um exame da liberdade, que necessariamente deve fundamentar uma lei moral, lei essa, que se relaciona diretamente com a vontade
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e, consequentemente, com o arbítrio, no caso do homem, com o livre arbítrio. Ou seja, o objeto da segunda Crítica é a investigação acerca da capacidade de nossa razão pura em seu uso prático. Com isso, Kant buscará mostrar que o homem pode ter uma total autonomia moral em relação à sensibilidade.
Para ele, essa autonomia da razão, deveria ser o objetivo a ser buscado pela filosofia moral ao longo de sua tradição histórica, através das inúmeras doutrinas morais construídas. Algumas até se preocupavam, de alguma maneira, em buscar essa autonomia, sem, contudo, alcançar o êxito proposto. Mas isto nunca teria sido inteiramente alcançado ou devidamente explicitado pelos estudos filosóficos desta tradição mencionada por Kant.
Desde a antiga Grécia, a filosofia percorreu um longo caminho no estudo da ética, da moral, das ações ou das motivações que alimentam nossas ações. Motivações religiosas para o agir, até onde se sabe, sempre fizeram parte da cultura humana e na Grécia pré-socrática não era diferente, desde tempos remotos, contados nos poemas homéricos, os deuses, de uma certa maneira, guiavam as ações humanas e serviam, na maioria das vezes, como justificativa para tais ações.
Com o passar dos séculos e com as mudanças paulatinas que ocorreram na Grécia antiga, novos conceitos, e uma nova compreensão da noção mesma de sabedoria moral, se inseriram no universo cultural grego. Deste modo, a filosofia começou a tomar forma e, junto com ela, as mudanças na maneira de pensar e agir dos gregos, também começaram a ser sentidas. Vários estudos e discussões sobre o tema da moralidade foram feitos e discutidos, e como a nossa própria história e cultura provam, Platão e Aristóteles, tiveram entre as maiores influências filosóficas sobre os assuntos em questão. Devendo-se reconhecer, que a fé, principalmente o cristianismo e toda a moralidade fundamentada em princípios religiosos, teve claro, um papel importantíssimo sobre a conduta moral, porém, ressalta-se que não se trata aqui de objeto de considerações mais amplas. Dito isso, discussões e estudos sobre a moral foram realizados por séculos e a ética aristotélica centrada na ideia de prudência, juntamente com a ética estoica, centrada em um conhecimento físico e dialético do cosmo, foram correntes filosóficas de importante influência sobre a moralidade. Kant,
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então, com base em seus argumentos na Crítica da Razão Prática, vai tentar identificar os problemas destas doutrinas morais que o antecederam e, principalmente, com isso, pretender fundamentar de outro modo a doutrina da moralidade. Mas,
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