Um saber necessário: os estudos rurais no Brasil.
Por: juniorufb • 19/8/2021 • Resenha • 1.960 Palavras (8 Páginas) • 240 Visualizações
Novos Cadernos NAEA • v. 18 n. 2 • p. 281-286 • jun-set. 2015
Novos Cadernos NAEA
RESENHA
Livro: WANDERLEY, Maria de Nazareth Baudel. Um saber necessário: os
estudos rurais no Brasil. Campinas: Unicamp, 2011. 152p.
Irã Carvalho Sampaio - Doutor pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia e
Antropologia da Universidade Federal do Pará. E-mail: irasampaio@bol.com.br
Maria de Nazaré Baudel Wanderley1, na obra acima, elaborou um
importante balanço dos estudos rurais que permearam sua trajetória acadêmicocientífica
e inspiraram sua percepção desse mundo, para, por meio dele medir até
que ponto esses estudos contribuíram para sistematizar suas próprias reflexões,
para preencher vácuos existentes nesses estudos e para o mesmo servir mais um
norte teórico para novas gerações de pesquisadores. A autora optou por dividir
esse estudo em dois períodos, que são de 1964 até meados dos anos 1980, e da
redemocratização (1985) aos dias atuais, e em cinco capítulos.
No primeiro capítulo, a “Agricultura e acumulação de capital”, a autora
destacou aspectos que levaram ao gradativo avanço da hegemonização do
capitalismo no campo, especialmente a partir da desagregação da economia
escravocrata e da liberalização da sua mão-de-obra, e, de forma subsequente, por
meio do imaginário urbano-industrial e de transformações produtivo-financeiraeconômicas
no país. Com isso, o trabalho rural, sua produção e o campo passaram
a ordenar-se em direção ao produtivismo, baseando-se em relações cada vez mais
complexas, no avanço da (inter)dependência entre o meio rural e o urbano e
na subordinação ao capital, aspectos que se intensificaram com a modernização
“conservadora” da agricultura.
1 Maria de Nazaré Baudel Wanderley é doutora em Sociologia pela Universidade de Paris –
X-Nanterre, França. Foi ligada à Universidade de Campinas (SP) até 1997 e atualmente é
coordenadora do Laboratório de Estudos Rurais do Nordeste, ligado ao Programa de Pós-
Graduação em Sociologia, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
v. 18, n. 2, p. 281-286, jun-set. 2015, ISSN 1516-6481 / 2179-7536
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Novos Cadernos NAEA • v. 18 n. 2 • p. 281-286 • jun-set. 2015
Segundo a autora, essa modernização teve um papel fundamental para
a abertura de novas fronteiras agrícolas e também para a ampliação da ação
e influência do capital sobre a agricultura, assim como para o surgimento e
desenvolvimento dos complexos agroindustriais (CAI), do sistema de crédito,
para a reorganização dos mercados e para a (re)divisão do trabalho no campo. Do
mesmo modo, demandou a criação de instituições de pesquisas, a adoção gradativa
e intensa de tecnologias agrícolas e de uma legislação específica que ajudou a
redefinir os perfis de diferentes atores rurais, bem como “desinvisibilizar” outros.
No caso do crédito rural, de 1967 a 1976, o Norte e o Centro-Oeste receberam
quatro vezes mais recursos do que em anos anteriores.
Apesar desses efeitos iniciais, a modernização contribuiu para a reprodução
de aspectos socioeconômicos e produtivos contraditórios no campo e junto à
sua população, como a má distribuição de renda, a subocupação, as jornadas de
trabalho excessivas, o êxodo rural, a “imobilidade” dos salários, a exacerbação
dos lucros agroindustriais, a apropriação da produção de alguma matéria-prima
pelos CAI ou mesmo a imposição do que produzir ao mercado. Este cenário se
repetiu em extensas áreas de terras apropriadas pelo grande capital “autoritário”
com a ajuda do Estado e junto a projetos de colonização, ocasionando em seguida
o “fechamento de fronteiras agrícolas” ao campesinato e outros, o uso da terra
como reserva de valor e para o acesso ao crédito, o recrudescimento de conflitos
fundiários, bem como limitações à reforma agrária, mas não a supressão toal de
mobilizações em prol dela.
No segundo capítulo, “A subordinação do trabalho e a resistência dos
trabalhadores rurais”, a autora trouxe diferentes pontos de vista sobre a crescente
descaracterização e subordinação do trabalho rural e os movimentos de resistência
a certas condições de vida resultantes inicialmente da modernização da agricultura,
aspectos que levaram a uma forte mobilidade demográfica, a migrações para
centros mais dinâmicos, a expropriações, à marginalização, ao aumento da
exploração do sobretrabalho, à favelização, à escravização e à proletarização
do campesinato, a exemplo dos casos da Zona da Mata pernambucana, da
Amazônia e do Vale do Jequitinhonha (MG), aspectos que o Estado procurou
controversamente
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