A perspectiva construida na modernidade sobre a ruptura com a Idade Média
Por: Daniel Camargo • 10/9/2017 • Ensaio • 1.846 Palavras (8 Páginas) • 677 Visualizações
UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E DA EDUCAÇÃO – FAED
HISTÓRIA MODERNA I
DOCENTE: SÍLVIA LIEBEL
DISCENTE: DANIEL CAMARGO
Este ensaio tem por objetivo, analisar e expor a “transição” entre Idade Média e Idade Moderna, visando problematizar a idéia de total ruptura entre os dois períodos bem como identificar as diversas continuidades e permanências de costumes e visões de mundo da população européia. Serão analisadas também as drásticas transformações que se deram entre os séculos XV e XVII, tendo por objetivo expor as rupturas que de fato ocorreram em relação ao recorte temporal anterior.
O recorte temporal “Idade Moderna”, foi criado por historiadores deste mesmo período e portanto, tentaram por muito, fazer um elogio e exaltar sua “era”. É neste ponto que se apresenta a noção de uma Idade Média atrasada e mergulhada na barbárie, de reis fracos lutando entre si em seus pequenos reinos instáveis. É de extrema importância, que não nos afundemos no anacronismo e julguemos esta noção de “era de ouro” que se criou no imaginário europeu da modernidade, visto as rápidas e intensas transformações que se deram em solo europeu, a noção de tempo das pessoas foi de fato mudando, porém muito devagar e ainda sim muito imerso no contexto medieval.
Quando se pensa em Idade Moderna, logo de início vem à mente o Renascimento, os grandes Estados Nacionais, o florescimento de diversos ramos das ciências e da economia com base no mercantilismo, as Grandes Navegações e entre outros diversos processos que causaram um impacto imenso na sociedade européia da época. Foi de fato um período com acontecimentos mais marcantes que os mil anos do recorte da Idade Média, devido ao curto espaço de tempo em que ocorreram na modernidade. Deve-se, porém, deixar bem explícito que, no período medieval, diversas transformações ocorreram que deixaram marcas muito profundas nos pilares da sociedade da Europa e que de fato, estes acontecimentos levaram o ocidente a experimentar as transformações tão intensas da era seguinte. O próprio Renascimento europeu se deveu a inúmeros fatores ocorridos na Idade Média, como o contato com povos orientas, principalmente pelas cruzadas, com os árabes e seus avanços nos campos de astronomia, matemática e medicina.
De fato, o período medieval experimentou diversas intempéries em seu recorte temporal, como guerras, pestes e controle ou influência soberana da Igreja Católica sobre todas as classes da população. Porém, são nestes pontos que os recortes temporais históricos se complicam, entender diferentes épocas com uma espécie de “barreira” torna a análise destes períodos bastante complicada. Baschet (2006, p.37), levanta a questão “ era Cristóvão Colombo medieval ou moderno?”, a resposta para ela, na prática, não existe. Sabendo-se que Colombo viveu no período do Renascimento, ainda sim era uma pessoa com uma visão de mundo extremamente pautada na forte influência católica do período medieval, servindo reinos ainda não unificados em um Estado Nacional, no caso a corte do rei Fernando de Aragão, antes de a Espanha existir, mas é claro, foi muito influenciado pelas profundas transformações dos séculos XV e XVI, como as descobertas científicas que impulsionaram o desenvolvimento de técnicas de navegação nunca antes experimentados.
O controle do clero ainda se fez muito presente no contexto moderno, sua influência e domínio das massas perdurou com muita força nos três primeiros séculos da modernidade, vemos como exemplo, a inquisição tomando força em diversos países europeus, principalmente nos reinos espanhóis e a incessante perseguição às “bruxas” que se mostra com muita intensidade em áreas do Sacro Império Romano Germânico no século XVI, como o episódio de Trier, em que milhares de mulheres foram queimadas em diversas cidades do Império, conhecido como uma das piores perseguições às mulheres consideradas “bruxas”. É interessante analisar neste caso, as longas continuidades de práticas que perduram por muitos séculos, trazendo o exemplo de Portugal, que ainda sim no início do século XIX queimava mulheres suspeitas de praticarem” bruxaria”, tendo assim um exemplo de que existem muitas rupturas entre os recortes temporais, mas diversas continuidades.
Mas analisando as rupturas da modernidade com a Idade Média, é possível observar a gritante mudança no modo de pensar e na vida dos europeus. O final do século XIV e o século XV, foram palco para uma verdadeira revolução na vida das pessoas, percebe-se, no período acima citado, a influência que os avanços das ciências tiveram sobre a população, bem como diferentes formas de pensar a cerca do mundo físico e espiritual. Tem-se como exemplo a invenção da prensa por Gutenberg, que foi uma verdadeira revolução intelectual no contexto ocidental, desta forma, pessoas puderam colocar suas idéias a rodar por um reino inteiro ou até mesmo pela Europa inteira, como Lutero e suas 95 teses, tendo esta invenção como a propulsora para idéias revolucionárias, facilitando com que o Protestantismo alcançasse as mais distantes regiões do continente e todas as classes populares, tomando por base o uso intenso de ilustrações em livros que faziam referência às idéias escritas nas obras, as quais podiam ser interpretadas por pessoas analfabetas.
O Renascimento foi com certeza um marco para historiadores do período moderno, para eles, teve-se aí um “resgate” da noção de civilidade romana, ou seja, um divisor de águas entre a “bárbara” Idade Média e o surgimento de uma era que se acreditava ter saído da estagnação. Com certeza é difícil de imaginar como este período teve impacto na mentalidade européia, sendo que com o Renascimento, a Europa entrou em um período marcado pelo impulsionamento da vida urbana, é certo que a maioria da população da época vivia no campo, mas a burguesia das grandes cidades, com suas novas formas e divisões de trabalho, fez com que nestes locais tivessem um notável crescimento demográfico, tendo por base a demanda por mão de obra. É provável que o melhor exemplo se dá com o “surgimento” do ofício do artista, que trabalhando com pinturas ou esculturas apresenta um impacto drástico na burguesia e no clero.
Aí está um importante item que entra em contraponto ao período medieval: a arte e o papel que esta desempenhou nos dois períodos. Na Idade Média, a arte tinha basicamente, um papel religioso, de glorificação de santos e de representações de passagens bíblicas, além do fato de que a maioria dos indivíduos que realizavam as obras eram membros do clero. O Renascimento apresentou uma notável ruptura no meio artístico, pois com a inspiração nas artes e religiões greco-romanas, os artistas modernos passaram a representar em suas obras diversos temas, como cenas de batalhas, reinterpretações de mitos clássicos, retratos de famílias, e etc. Um ponto que merece destaque é o do papel econômico e de status social que a arte desempenhou na sociedade moderna, pois arte era sinônimo de prestígio para a a burguesia e para o clero, A Igreja demonstraria por meio de encomendas de pinturas e esculturas a sua riqueza e o poder que exercia como religião dominante na Europa. Para a burguesia, “consumir” arte demonstrava também sua riqueza e sua posição na sociedade bem como a domesticidade da vida social, muito retratada em pinturas da época como “O Casal Arnolfini”, do atista flamengo Jan Van Eyck, que demonstra uma necessidade da classe alta demonstrar o seu status social por meio da vida doméstica na cidade e seus bens materias.
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