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Trajetória dos movimentos sociais no Brasil e Bolívia

Por:   •  6/1/2016  •  Ensaio  •  2.724 Palavras (11 Páginas)  •  454 Visualizações

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A pesquisa apresentada tem como proposta trabalhar a representatividade dos movimentos sociais de uma maneira mais geral, quais são as abordagens teóricas existentes que buscam seu entendimento, e como eles se portam frente o esvaziamento das organizações políticas. A partir disso, evidenciaremos essas questões no interior de dois países: Bolívia e Brasil, no intuito de expor de maneira “prática” o tema apontado. Ao final, em moldes comparativos, serão ressaltadas as semelhanças e as especificidades de cada caso.

Segundo Maria da Glória Gohn, pós-doutora em sociologia, o conjunto das teorias que intentam tratar dos movimentos sociais “é amplo e diversificado” (GOHN, 2008). Apesar de aparentar certa simplicidade, devido a uma pré-noção de seu conceito, o tema dos movimentos sociais é bem complexo e por isso, para a melhor compreensão, suas teorias voltam suas atenções a determinados eixos. Alguns deles são notados e apontados pela autora, em seu artigo Abordagens Teóricas no Estudo dos Movimentos Sociais na América Latina e serão expostos a seguir. A começar pelo eixo cultural, as teorias que são formuladas a partir dele focam nas identidades construídas com base nos “tipos de pertencimento” comuns a um determinado território, como “grupo étnico, religião, faixa etária, comunidade ou grupo de interesses, etc.” (2008, p. 442). Outro eixo é o da justiça social, em que as teorias se voltam para as questões das disparidades sociais e das buscas por redistribuição como forma de corrigir\ compensar coerções sustentadas ao longo da história.  (2008, p. 442). Também é possível observar o eixo que trata da autonomia desses movimentos sociais a partir do poder de resistência que possuem, destacando a capacidade e objetivo que esses têm de dar fim à ordem vigente. Dão enfoque à sua luta “em busca da construção de um novo mundo, de novas relações sociais não focadas ou orientadas pelo mercado, da luta contra o neoliberalismo.” (2008, p.442).  Dessa maneira, as teorias voltadas para essa abordagem, contestam o que a autora chama de “ressignificação” dos movimentos sociais pelas políticas públicas, que buscam permitir apenas a participação social dentro do que é tolerável\conivente às ordens, o que acarreta em uma “cidadania tutelada”. (2008, p. 443). Por fim, o eixo das teorias que focam na organização “das ações coletivas” no sentido da institucionalização social. (2008, p. 443).

Segundo Maria da Glória Gohn, ao tratarmos dos movimentos sociais, não podemos esquecer que, por terem um caráter processual, não podem ser entendidos fora de sua conjuntura e de seu contexto histórico. Respeitando suas temporalidades, eles são direcionados a modificarem e adaptarem suas lutas de acordo com as imposições presentes. Dessa maneira, é comum que suas formas de atuação, suas reivindicações e seus atores se alterem no tempo e no espaço. Assim também se portam as suas identidades políticas, que por estarem inseridas em um processo de construção, são consideradas móveis e múltiplas. Elas, para representarem um movimento social, devem corresponder aos ideais e objetivos de seus sujeitos, e dessa maneira, se transformarem de acordo com as “aprendizagens” e a “consciência de interesses” que são criadas.  As identidades políticas não são ou pelo menos não devem ser determinadas previamente, elas tem que condizer à “demanda socioeconômica ou cultural” vigente. (2008, p.444-445).

Essa parte da pesquisa visa apresentar a trajetória dos movimentos sociais na Bolívia, com enfoque no período pós-ditatorial (1984), onde a crescente abertura ao capital estrangeiro que não trazia retorno às camadas populares e o sufocamento étnico foram algumas das razões para o surgimento de diversos movimentos sociais, principalmente sobre a matriz indígena, nos anos 90. Utilizaremos como fontes principais para esse estudo a obra La Sociologia de los movimientos sociales en Bolívia do sociólogo Álvaro Garcia Linera, no qual o autor apresenta as formas gerais de organização e representação dos principais movimentos bolivianos e também sua entrevista dada à Iconos: Revista de Ciencias Sociales, onde Linera traça um paralelo entre o passado, presente e o futuro desses movimentos.

Apesar da temporalidade recente utilizada no presente trabalho, os movimentos sociais na Bolívia não constituem em um fator novo do cenário político no país. Direitos importantes, como o do sufrágio universal, foram conquistados a partir da Revolução Nacionalista de 1952 e desde a década de 70, as mobilizações exerciam influência direta ou indireta no país. Nesse período, os movimentos sociais bolivianos distinguiam-se por sua base sindical (LEMGRUBER, 2006).  Apesar da existência de movimentos que propunham maior inclusão social às comunidades indígenas assim como o resgate e preservação dessas culturas, como o Movimento Revolucionário Tupac Katari e o Partido Indígena (PI), mobilizados somente por indígenas (Indianistas) ou por indígenas que aceitavam a presença de camponeses e estudantes técnicos e universitários (Kataristas), esses movimentos não obtiveram relevância, e sendo assim, pertencia a Central Obrera Boliviana (COB), o sindicato dos trabalhadores, o dever de representar as camadas populares, sendo intensa a atuação e importância dessa organização frente ao governo boliviano.

Com o término da ditadura militar (1971-1984), inicia-se o período de redemocratização comandado pelo então presidente eleito, Vitor Paz Entessoro (1985-1989). Seu governo é marcado pelo neoliberalismo e a presença maciça de investimentos estrangeiros, exercendo uma postura firme em relação aos sindicatos, enfrentando-os e adotando uma política econômica austera condizente aos interesses do capital internacional. As constantes privatizações causaram precarizações nos sistemas de saúde e educação além do desemprego em diversos setores. Segundo Linera, não foi o neoliberalismo em si, mas sim a crise de sua hegemonia que levou à organização e mobilização dos setores populares contra esse modelo. (LINERA, 2001). As principais reivindicações giravam em torno do custo de vida, da gestão da água e hidrocarbonetos e o acesso à terra.

O setor trabalhista da mineração, extremamente prejudicado frente ao fechamento de parte das minas e as crescentes demissões, logo se organiza em torno no Movimento Mineiro, que influenciado pelos ideais leninistas e trotskistas, já possuía experiências em mobilizações e panfletagens relacionadas à conscientização política nas minas e críticas à esquerda tradicional. Com o intuito de impedir o fechamento das minas, foi organizada pelo Movimento Mineiro a Marcha per la vida, onde marcharam pelas ruas de La Paz, mineiros, operários, estudantes entre outros  setores insatisfeitos com a política entreguista do governo atual. A passeata, no entanto, não logrou êxito algum, nem no campo político e nem no moral.  Após o episódio, verificou-se um grande enfraquecimento nas mobilizações de esquerda do país, inclusive da COB.

Somente a partir da metade da década de 90, o ciclo de esvaziamento é revertido, pois, novas, e ao mesmo tempo antigas, formas de organização ressurgem adaptadas ao período. Os movimentos sociais anteriormente fundamentados nas concepções socialistas passaram a se organizar em torno de um novo discurso, no qual as demandas conciliavam o interesse pela redistribuição de renda com o discurso identitário. Influência clara dos já citados novos movimentos sociais, onde o reconhecimento étnico é pauta de suma importância. Esses novos movimentos indígenas começaram a se tornar protagonistas políticos importantes na Bolívia, ‘’diferenciando-se dos movimentos tradicionais, singularizados pela divisão de classes’’. (LEMGRUBER, 2006)

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