ANÁLISE DO MITO E SEUS DESAFIOS NOS DIAS ATUAIS
Por: Eriksen Amaral • 25/11/2015 • Artigo • 2.607 Palavras (11 Páginas) • 483 Visualizações
ANÁLISE DO MITO E SEUS DESAFIOS NOS DIAS ATUAIS
Eriksen Amaral de Sousa*
- INTRODUÇÃO
Antes de tudo, gostaria de expor tamanho lisonjeio que nutre em mim esta oportunidade que tenho em explanar algumas considerações sobre uma temática que já venho trabalhando faz algum tempo e da qual alimento com afinco intensas incursões, tanto por curiosidade ou ainda como objeto de pesquisa – que é o mito e sua concepção, como também sua influência que permeia o imaginário e o simbólico da sociedade em determinado tempo.
Talvez seja pelo fato de eu ter sido “capturado” por este assunto desde o início de minha carreira acadêmica, comungando da mesma opinião que Joseph Campbell, quando interpelado por Bill Moyers, responde aos seguintes questionamentos: “Por que mitos? Por que deveríamos importar- nos com os mitos? O que eles têm a ver com minha vida?” (CAMPBELL 1989; p.14).
Deveras que não existe hoje uma essencialidade do mito para o dia-a-dia do homem, e se ela existe constantemente é despercebida, não sendo essencial para desempenhar suas atividades cotidianas. Logo, continua Campbell: “Vá em frente, viva a sua vida, é uma boa vida – você não precisa de mitologia” (CAMPBELL 1989; p.14).
O nosso cotidiano não necessita de mitologia, entretanto ela espreita por entre as ruas próximas, nos corredores, em nossos atos, embrenhada em nossos sonhos. Sempre presente, como já concluía Max Müller, citado por Ernest Cassirer:
“Indubitavelmente, a mitologia irrompe com maior força nos tempos mais antigos da história do pensamento humano, mas nunca desaparece por inteiro. Sem dúvida, temos hoje nossa mitologia, tal como nos tempos de Homero, com a diferença apenas de que atualmente não reparamos nela, porque vivemos à sua própria sombra e porque, nós todos, retrocedemos ante a luz meridiana da verdade.”
(CASSIRER 1985; p.19)
E já discordando da não necessidade dos mitos vou parafrasear Roger Bastide, “o homem é uma máquina de inventar deuses”, e pontua assertivamente que, “No entanto, se há uma época que entrou em guerra contra os mitos, essa época é a nossa” (BASTIDE 2006; p.97).
* Graduando nos cursos de Licenciatura Plena em História e Bacharelado em Filosofia pela Universidade Federal do Amazonas.
- DEFINIÇÃO, FUNCIONALIDADE E TIPOS DE MITO
O Mito se apresenta como uma das primeiras formas de expressão pela qual o homem buscou compreender suas origens e os diversos fenômenos que o cercava. Deste modo cabe então explicar, de início, como sua influência no pensar e no agir do homem, que o vive, teve fundamental importância. Porém não se trata de uma tarefa fácil encontrar uma definição que conseguisse abarcar toda a universalidade de suas características e que fosse aceito pela maioria dos demais. Então, como “traduzir” esta herança de eras, que nos é legada, com todas estas nuances multicoloridas de tentativas de definição?
Poderia afirmar de forma direta e enxuta que uma mitologia, sendo o conjunto de mitos, por sua vez, seria “o comentário especifico de uma era ou uma civilização sobre os mistérios da existência e da mente humanas” (DAVIDSON; 2004), no entanto, concordo com uma profundidade maior de maneira a transceder o simples relato ou uma construção limítrofe do que se é conhecido, mas que seja “uma realidade cultural extremamente complexa, que pode ser abordada e interpretada em perspectivas múltiplas e complementares.” (ELIADE 1989; p.12), continuando:
“Pessoalmente, a definição que me parece menos imperfeita, por ser a mais lata, é a seguinte: o mito conta uma história sagrada, relata um acontecimento que teve lugar no tempo primordial, o tempo fabuloso dos ‘começos’.”
(ELIADE 1989; p.12)
ou seja, trata-se de uma história do início de tudo, uma história da criação de algo, de uma realidade, de um mundo, algo que ainda estava por ser ilustrado através do conjunto de percepções que o homem se utilizava para explicar sua maneira de vislumbrar o mundo a seu redor e detém um aspecto plural que associado as estas variadas interpretações nos servem para definir traços de determinada cultura que pertenceu a esta sociedade do “tempo fabuloso dos começos”.
Na continuidade de nossa senda, poderíamos ainda recorrer ao básico uso do dicionário, como o faz Everardo P.G. Rocha, em sua obra O que é mito?, citando o verbete do Dicionário Aurélio:
“diz que mito é o seguinte: Fato, passagem dos tempos fabulosos; tradição que, sob forma de alegoria, deixa entrever um fato natural, histórico ou filosófico; (sentido figurado) coisa inacreditável, sem realidade.”
(ROCHA; 1984)
entretanto, ele mesmo propõe esta jornada como um “quebra-cabeças”, devido as muitas partes que devemos associar para montarmos uma panorama interpretativo de muitas “peças”.
Mas, talvez, fato seja que “Não há um sistema definitivo de interpretação dos mitos e jamais haverá algo parecido com isso.” (CAMPBELL; 2005) para se limitar o mito e condensá-lo em amarras, pois:
“A mitologia é semelhante ao deus Proteu, ‘o ancião do mar, de palavra infalível’. O deus ‘tentará escapar, assumindo todas as formas, as dos seres que rastejam no solo, as dos seres da água e do fogo de implacável chama.
O viajante da vida que desejar receber o ensinamento de Proteu deve ‘segurá-lo firmemente e apertá-lo mais e mais’ e, com o tempo, ele aparecerá em sua forma própria. Mas esse determinado deus jamais revela, mesmo ao mais habilidoso formulador de perguntas, todo o conteúdo de sua sabedoria.”
(CAMPBELL; 2005)
Deste modo formulam-se “as mil formas” de se definir o mito através de cada um dos momentos pelo qual foi submetido como objeto de observação, mas se fundamenta de forma apropriada quando nos preocupamos com o modo como funciona:
“A mitologia tem sido interpretada pelo intelecto moderno como um primitivo e desastrado esforço para explicar o mundo da natureza (Frazer); como um produto da fantasia poética das épocas pré-históricas, mal compreendido pelas sucessivas gerações (Müller); como um repositório de instruções alegóricas, destinadas a adaptar o indivíduo ao seu grupo (Durkheim); como sonho grupai, sintomático dos impulsos arquetípicos existentes no interior das camadas profundas da psique humana (Jung); como veículo tradicional das mais profundas percepções metafísicas do homem (Coomaraswamy); e como a Revelação de Deus aos Seus filhos (a Igreja). A mitologia é tudo isso. Os vários julgamentos são determinados pelo ponto de vista dos juízes. Pois, a mitologia, quando submetida a um escrutínio que considere não o que é, mas o modo como funciona, o modo pelo qual serviu à humanidade no passado e pode servir hoje, revela-se tão sensível quanto a própria vida às obsessões e exigências do indivíduo, da raça e da época.”
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