CENÁRIO ARQUEOLÓGICO DO PARANÁ
Por: samara.dyva • 3/7/2017 • Ensaio • 2.152 Palavras (9 Páginas) • 226 Visualizações
Cenário Arqueológico Regional do Paraná
A ocupação do atual território do Paraná na pré-história deu-se por três tipos de populações que podem ser distinguidas com base em suas diferentes culturas materiais, implantações geográficas e ocorrência temporal: os caçadores-coletores, os sambaquieiros e os horticultores-ceramistas. A arqueologia histórica paranaense é representada pelos vestígios provenientes da ocupação do estado pelos colonos e de suas interações com os nativos indígenas e, posteriormente, os negros africanos, assim como destes entre si.
Os sítios e vestígios arqueológicos das populações caçadoras-coletoras e horticultoras-ceramistas costumam ser separados em diferentes tradições arqueológicas[1] que representam grupos de cultura material distinta. No Paraná, foi identificada a presença de caçadores-coletores das tradições Umbu e Humaitá, e de horticultores-ceramistas das tradições Tupiguarani e Itararé-Taquara (Parellada 2007), além da tradição arqueológica histórica Neobrasileira (Parellada 1999). Os povos sambaquieiros, por sua vez, não são enquadrados em tradições, sendo estudados à parte.
Tradição Umbu
É uma tradição lítica de grande extensão territorial, ocupando áreas desde o sul de São Paulo até o Uruguai. Uma de suas principais características é a longa persistência dos padrões tecnológicos de sua cultura material, que apresenta técnica de manufatura e matérias-primas semelhantes desde cerca de 12.000 AP a 1.000 AP (Noelli 2000).
Sua indústria lítica é caracterizada pela utilização de lascas retocadas e pela presença de pontas de projétil, havendo a preferência por rochas frágeis para matéria-prima, como o quartzo, sílex, calcedônia e ágata, devido a estas serem mais apropriadas à extração de lascas e ao retoque fino. Além das pontas de projétil, seu instrumental lítico também apresenta raspadores terminais com gumes diversificados, bifaces amigdaloides e retangulares, facas sobre lascas bifaciais, buris, furadores, lâminas e núcleos e lascas secundárias. Mais raramente ocorre a presença de instrumentos pesados como chopping tools, lâminas de machado, bolas de boleadeiras, alisadores e trituradores para corante. A indústria óssea, preservada apenas nos abrigos do Rio Grande do Sul, é composta por furadores, retocadores, anzóis, espátulas e agulhas, confeccionados sobre ossos ou chifre de cervídeo. A ocorrência de adornos feitos com materiais típicos do litoral como dentes de tubarão, contas de gastrópodes e placas de conchas bivalves representam a ligação destes grupos com o mar (Prous 1992).
As populações da tradição Umbu se estabeleciam em três tipos de sítios: a céu aberto, abrigos sob rocha, e cerritos[2] (Noelli 2000). Os sítios a céu aberto costumam ocupar uma única área de 20-80m de diâmetro, e suas camadas de ocupação não ultrapassam os 20cm de espessura, ocorrendo muito raramente um sedimento mais escuro que denota grande quantidade de matérias orgânicas. As oficinas de lascamento, por sua vez, podem alcançar extensão bem maior. A ocupação dos abrigos era recorrente, podendo o mesmo sítio ter sido ocupado por séculos, e por vezes apresentam estruturas que comprovam a organização do seu espaço interior (Prous 1992).
Com relação à sua subsistência, foram encontrados vestígios do consumo de mamíferos, aves, peixes, répteis e moluscos, e assume-se que estes grupos também tenham explorado a rica diversidade florística do sul do Brasil como complementação à sua alimentação (Noelli 2000). Os vestígios funerários das populações da tradição Umbu foram preservados no abrigo Cerrito Dalpiaz, no Rio Grande do Sul, que apresenta restos esqueletais de crianças e adultos deitados sobre uma camada de cinzas, sendo que em alguns ossos ocorrem marcas de queima, o que indica que os corpos foram depositados sobre brasas. Abaixo há um pavimento de pedras, algumas colocadas abaixo das cabeças, como que servindo de almofada. Acima dos corpos foi colocado um ‘embrulho’ de folhas, e o conjunto é recoberto por terra e blocos de pedra. O mobiliário funerário resume-se a colares de contas, quando presente.
Tradição Humaitá
Esta tradição, assim como a Umbu, é característica da região sul do Brasil, ocorrendo nos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, porém em menor extensão territorial, não ultrapassando a área ao sul do rio Jacuí. Os sítios Humaitá apresentam grande abrangência temporal, com os mais antigos datando de 8.000 AP e os mais recentes de 300 AP. As principais diferenças entre as tradições Umbu e Humaitá estão relacionadas à suas indústrias líticas, sendo a última caracterizada pela presença marcante de artefatos maciços e a primeira pelas pontas de projéteis, e pela sua distribuição espacial, estando os sítios Umbus geralmente localizados em ambientes campestres enquanto os Humaitá ocorrem predominantemente em áreas florestais (Noelli 2000).
Com relação à sua ocorrência no Paraná, Prous (1992) indica que a datação mais antiga para esta tradição no estado é de 5.241±300 AP no sítio José Vieira. Nos sítios Humaitá paranaenses há a presença de choppers e chopping tools e de lascas corticais espessas, geralmente utilizados com gumes brutos, sendo rara a ocorrência de retoques, que costumam se limitar aos raspadores plano-convexos, também conhecidos como lesmas. É interessante notar que no caso específico desta tradição, os artefatos mais cuidadosamente elaborados são encontrados nos níveis mais antigos dos sítios. Seus assentamentos encontram-se geralmente a céu aberto, mas alguns conjuntos foram identificados em abrigos, a exemplo da gruta de Wobeto, na qual foram identificadas, além dos artefatos citados acima, bigornas de seixo picoteados do tipo quebra-coquinho.
Tradição Tupiguarani
Os ceramistas da tradição tupiguarani surgiram no Paraná há cerca de 2.000 AP, saídos da Amazônia, e seus sítios ocorrem com frequência no vale dos rios Paraná, Ivaí, Tibagi e Iguaçu (Parellada 2007). Sendo povos agricultores, os tupiguarani cultivavam uma variedade de espécies que incluía o milho, o aipim (ou mandioca doce), a mandioca brava, batata-doce, feijão e amendoim. A seus produtos agrícolas, agregavam-se também alimentos obtidos através da coleta, da pesca e da caça, esta última uma atividade masculina (Prous 1992). Entre os animais consumidos, encontram-se mamíferos, aves, peixes, répteis, anfíbios, moluscos e insetos (Noelli 2000).
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