HISTÓRIA PÚBLICA E HISTÓRIA ORAL, CAMINHOS A SEREM CONHECIDOS, CAMINHOS A SEREM PERCORRIDOS!
Por: Lêda Fernandes Bertamoni • 17/11/2019 • Ensaio • 2.456 Palavras (10 Páginas) • 369 Visualizações
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INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
LÊDA FERNANDES BERTAMONI
HISTÓRIA PÚBLICA E HISTÓRIA ORAL, CAMINHOS A SEREM CONHECIDOS, CAMINHOS A SEREM PERCORRIDOS!
PORTO ALEGRE
2019
História pública e história oral, caminhos a serem conhecidos, caminhos a serem percorridos!
Lêda Fernandes Bertamoni[1]
A proposta da disciplina de História Pública foi à construção de um ensaio acerca das diversas temáticas discutidas no decorrer do semestre. Confesso, foi um semestre de grande aprendizado e entendimento, primeiro na construção de conceito do que é história pública, construído nas leituras de Liddington[2] “podemos considerar a prática da história pública como sendo a apresentação popular do passado para um leque de audiências”. A proposta do ensaio já foi formulada no início do semestre, a definição do tema se deu na provocação de que a temática seguisse sendo trabalhada no seguinte, que será Seminário de História pública. A história oral tem me encantado e tenho feito aproximações, no sentido em que amplia as possibilidades de construção de conhecimento histórico. No ano de 2018, cursei a disciplina Memórias e Identidade, que propôs aos acadêmicos realizarem entrevistas com alunos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, que ingressaram em cursos superiores através do sistema de cotas, a partir disso, construir transcrições e analises que permitissem um olhar sobre acesso e permanência destes alunos. No decorrer daquele semestre, fomos sendo instrumentalizados com leituras e falas de profissionais, que permitiram a construção do processo acadêmico de elaboração de trabalho final.
As leituras base para esta tarefa foram os relatórios anuais do Programa de Ações Afirmativas[3], que entre outras questões, nos mostram como se dá o acesso as cotas, quais são elas, as ações propositivas que permitam o acesso e permanência destes estudantes na universidade. Tenho a convicção que, ao ter acesso, ou melhor, ao ser estimulada a ter conhecimento das ações propostas, pude construir base de conhecimento que me permitiu estar instrumentalizada para discussões acerca do tema. Aponto um aspecto importante, de que a maioria da sociedade acredita que o acesso através de cotas se dá exclusivamente sobre a questão racial, desconhecendo o ingresso de escola pública e o sócio-econômico, sendo construído um discurso que discute o primeiro item, porém considera importante os outros dois, seria racismo?
Optei por entrevistar um estudante cotista, acadêmico do curso Bacharelado em Música – Canto, ingressante pela reserva de vagas de estudante de escola pública. O mesmo já possui curso superior, realizado em universidade privada com bolsa de estudos 100% (é bacharel em enfermagem), com mestrado em enfermagem em universidade federal. Meu desejo era ter o olhar sobre um cotista, que aos olhos de muitos e dele próprio não seria cotista.
A entrevista possibilita a construção e incursão nas diferentes cotas que compõe o cardápio de acesso. O tema cota passa a ser percebido pelo entrevistado através do convite e do conhecimento de que cotas vão além das questões raciais. O mesmo passa a fazer observações em sua turma, e expressa preocupações.
“Eu vejo que cada artista tenta que se reafirmar, hã, e se tolera, pela arte, pela arte que eles desenvolvem, não pela pessoa. Eu vejo que se, as relações, elas se norteiam, pela arte que é produzida, não pela relação gênero, raça, cor. O que eu identifico, que me perturba um pouco, é a quantidade, por exemplo, de negros que tem dentro da sala de aula. Tem muito poucos! Eu posso contar hoje numa turma de oitenta são três, quatro negros dentro de uma sala, sendo que uma única mulher. Uns dois já desistiram. Na verdade, hoje são dois, um menino e uma menina. Hã, isso me preocupa muito, por que, que é um, eu acho que mostra toda uma característica que a arte, ela ainda mantém esse predomínio elitista, ou seja, para você fazer arte é muito caro”.[4]
Então, em alguns espaços da universidade, ou melhor cursos, não temos o ingresso pleno na reserva de vagas, tendo em vista o apontamento do entrevistado. Mesmo no corpo da fala, de que as relações se dão de forma tranquila, se dão entre os presentes, que ainda passa sendo muito seletivo, como ele mesmo aponta o elitismo do curso.
Oliven e Bello trazem questões importantes sobre isso, no sentido que trazem que “as universidades que formam a elite de um país costumam ser redutos da branquidade e percebidas como o lugar da cultura superior do mundo ocidental.”[5] Seguem ainda, “a branquidade se traduz numa posição que assegura vantagens na estrutura de oportunidades e poder em sociedades marcadas pela dominação racial.”[6]
O entrevistado segue nesta linha apontando por que o curso pode ser considerado elitista:
“ Para tocar um contrabaixo, por exemplo, contrabaixo custa dezoito mil reais, não é todo mundo que vai tocar. O piano, se você quiser ter em casa, mais de trinta mil reais. Uma flauta doce você não compra por menos de sete, oito mil reais. Então, você ter um instrumento é muito caro! E você ter acesso a formação musical, você não tem de graça, diferente de uma escola pública, você vai estuda.”[7]
A questão é: a universidade inclui, ou melhor, a universidade tem a possibilidade de incluir, tem investimento econômico que permita esse acesso de forma efetiva? Por que senão, inclui com grandes limitações. Isso aparece em outro momento na entrevista, onde quando questionado se a universidade além de permitir o acesso, dá acompanhamento efetivo a este:
“Não, acho que a universidade ainda tá bastante incipiente neste sentido, no meu curso, pelo menos. Essa menina deficiente visual, mas ela não tem recurso nenhum, ela dá conta pela iniciativa pessoal. Ela ta ali, ela leva o computador, ela grava as aulas, ela leva para casa. Mas ela não tem, por exemplo, uma tecnologia que ela possa utilizar em sala de aula. Os professores passam o conteúdo de forma verbal, quando podem sentam do lado, fazem um acompanhamento, mas nada, nada, nada, além disso. Então acho que ainda é um pouco incipiente, para se explorar como forma de projeto, extensão ou algo assim, uma possibilidade de acesso, não só para deficiente visual, mas auditivo, ou quaisquer outras formas de, de deficiência e também de necessidades especiais, precisa ser explorado. Não é você largar as pessoas numa sala e, ‘ah, eu deixei você entrar, agora você se vira!’ Não! Tem que ter espaço, é dar oportunidade! Não basta deixar entrar!”[8]
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