Os Narradores Itinerantes
Por: dynn • 20/6/2017 • Trabalho acadêmico • 1.405 Palavras (6 Páginas) • 277 Visualizações
HISTÓRIA, METODOLOGIA, MEMÓRIA
Antônio Torres Monteiro
Narradores Itinerantes
Dean Soares Rodrigues
FICHAMENTO
“O percurso deste capítulo será construído a partir do estudo de Walter Benjamin “O narrador: considerações sobre a obra de Nikolai Leskov”. Visitarei narradores que, em tempos múltiplos e sobre temas diversos, exerceram a sua maneira a arte de narrar, ou seja, “a faculdade de intercambiar experiências”” (p. 49).
“Para Walter Benjamin (1985), haveria dois modelos básicos ou, por que não dizer, arcaicos do narrador: “o camponês sedentário e o marinheiro comerciante” (p. 49).
Na época atual, poderíamos pensar que essa prática está ainda mais limitada, sobretudo em razão do domínio que a televisão alcançou, aprisionando a atenção das pessoas, das famílias, dos grupos, horas e horas todos os dias, cerceando a conversa, o ouvir histórias, o contar causos” (p. 50P).
“Enquanto afirma Benjamin (1985:201) que “a arte de narrar está definhando porque a sabedoria – o lado épico da verdade – está em extinção”, o relato em pauta projeta em direção contrária a essa avaliação, ou seja, aponta a insistência em perpetua-se” (p. 51).
“Outro relato de artesão que destaco para analisar foi extraído do documentário Cabra marcado para morrer, dirigido por Eduardo Coutinho. Entre as diversas pessoas que o diretor entrevista, na tentativa de reconstruir a memória de João Pedro, líder das Ligas Camponesas de Sapé, na Paraíba, assassinado em 1962, encontra-se um companheiro de trabalho em numa pedreira, chamado Manoel Serafim [...] Manoel Serafim transforma a informação em narrativa” (p. 52 – 53).
“O conteúdo da notícia é sintetizado em poucas palavras: “Rapaz, mataram o ´presidente da Liga Camponesa da Paraíba”. O recriar da memória do amigo assassinado projeta-o numa dimensão maior do que a que realmente estava registrada no periódico, João Pedro era líder da Liga Camponesa de Sapé – estampava o jornal em letras gráficas -, cidade do interior da Paraíba. Entretanto, há de se considerar que a repercussão política do seu assassinato tornava-o a pessoa a pessoa mais importante da Liga Camponesa da Paraíba. A releitura do acontecimento por Manoel Serafim traz embutida a amplitude que a notícia adquiriu na época e como foi interiorizada por ele. Afinal, o assassinato de João Pedro foi publicada na imprensa, em diversos estados, percebe o amigo, ao afirmar: “E aquele nome surgia assim numa notícia, como se fosse uma grande pessoa. “O assassinato, a notícia, o nome do jornal, a foto, tudo tornava o ex-artesão da pedra e líder da Liga Camponesa de Sapé uma “pessoa importante”” (p. 53).
“Como observa Benjamin [...] A narrativa, que durante tanto tempo floresceu num meio de artesão – no campo, no mar e na cidade -, é ela própria, num certo sentido, uma forma artesanal de comunicação. Ela não está interessada em transmitir o “puro em si” da coisa narrada como uma informação ou um relatório. Ela mergulha a coisa na vida do narrador para em seguida retira-la dele. Assim se imprime na narrativa a marca do narrador, como a mão do oleiro na argila do vaso” (p. 54).
“O narrador em foco mostra-se, dessa forma, um artesão extremamente arguto, cuidadoso, minucioso no seu trabalho de transformar a pedra/informação, reescrevendo o cenário da notícia daquele acontecimento trágico. Entretanto, uma força maior de sua arte revela-se no momento em que passa a reconstruir o sentimento vivido, em razão da dor provocada pela perda do amigo” (p. 54).
“Ora, todos aqueles que assistiram ao filme perceberam como Manoel Serafim fala com as mãos; como a mão e o seu falar instituem a própria expressão do seu ser” (p. 55).
“Por intermédio do projeto Guerreiros do Além-Mar realizei entrevistas de história de vida com diversos padres holandeses =, franceses, italianos, belgas que emigraram para o brasil nas décadas de 1950 e 1960. Selecionei algumas passagens entre os relatos deles com a perspectiva de analisar a forma como narraram suas memórias orais de vida” (p. 55).
“O padre Jaime de Boer [...] Em 1998, ao entrevista-lo, trinta anos após a experiência de Xiquexique, ele resume com as seguintes palavras aquele período de vida: “O tempo que morei no interior em Xiquexique foi o período mais rico da minha vida. Nunca queria repetir, nunca queria repetir. Mas depois sempre reconheci que foi uma experiência de vida incrível.” Embora tenha vivido em Xiquexique o período mais rico da sua vida, uma experiência que considera incrível, não gostaria de repeti-la. Poderíamos, talvez, buscar em alguma passagem de sua história de vida nessa cidade do sertão da Bahia as razões que o fazem reconhecer a importância desse período e, ao mesmo tempo, não querer voltar a repetir a experiência” (p. 55).
“À medida que reconstrói essas memórias, relembra momentos, fatos que revelam a intensidade com que foram vividos. Ao mesmo tempo, é notável a maneira como as transforma em linguagem oral” (p. 55 – 56).
“Por outro lado, algumas vezes observa-se que esses padres, visitadores de antigas marcas, criam em seus relatos uma série de quadros representativos do passado como memória, estabelecendo uma proximidade com o que Benjamin denomina cronista [...] Nesse sentido, seus relatos de memória orais apontam ainda para o exercício de reviver experiências, acontecimentos, fatos, possibilitando ao ouvinte transportar-se para o cenário, o contexto reinventado” (p. 56).
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