Resenha - Origem do Capitalismo
Por: Ana Luiza Freitas Oliveira • 26/6/2017 • Resenha • 2.118 Palavras (9 Páginas) • 854 Visualizações
Universidade Federal de São Paulo
Livro: A Origem do Capitalismo - Ellen Meiksins Wood - Rio de Janeiro; Jorge Zahar Ed, 2001.
Título da resenha: Novas interpretações para história do capitalismo
A obra denominada The Origin Of Capitalism de Ellen Meiksins Wood foi originalmente publicada em 1999 pela Monthly Review Press em Nova York, Estados Unidos. Em 2001, foi traduzida no Brasil por Vera Ribeiro com introdução de Emir Sader e publicada pela editora Jorge Zahar.
A Origem do Capitalismo se encaixa num longo debate histórico-sociológico desde Henri Pirenne e Karl Marx no fim do século XIX até Perry Anderson e Robert Brenner na década de 1970 que busca a gênese do sistema capitalista no qual nos inserimos. Partindo de autores influenciados por diversas correntes intelectuais, Wood começa a sua crítica e percebe uma lacuna não explicada, inclusive pelos autores marxistas opositores do capitalismo, a respeito do início desse sistema. Dentro da maior parte dos discursos, sejam esses pró ou contra o capitalismo, não há uma origem e todas as explicações tendem a naturalizar o capitalismo como se seus imperativos fossem próprios da vida humana em sociedade: “O capitalismo parece estar sempre lá, em algum lugar, precisando apenas ser libertado de suas correntes – dos grilhões do feudalismo, por exemplo – para poder crescer e amadurecer.” (p.14) Se caímos nesse discurso, corremos o risco de não discutir o capitalismo e suas consequências de forma ampla e prejudica inclusive o questionamento sobre sua substituição, já que segundo a autora “Explicar o capitalismo como algo natural, com isso negando sua especificidade e os longos e dolorosos processos históricos que originaram, restringe nossa compreensão do passado. Ao mesmo tempo, limita nossas esperanças e expectativas de futuro, pois, se o capitalismo é a culminância natural da história, superá-lo é inimaginável. A questão da origem do capitalismo profundamente enraizados em nossa cultura - as ilusões difundidas e perigosas sobre o chamado mercado livre e seus benefícios para a humanidade. Pensar em alternativas futuras ao capitalismo exige que exploremos concepções alternativas de seu passado.“(p.17) Com a queda da URSS socialista e a vitória dos Estados Unidos capitalista esse debate perde sua potência e reforça premissa de capitalismo inerente à vida humana. É exatamente aqui, na década de 1990 e com a recente derrota da URSS e a descrença em novas opções contra o sistema capitalista, que Ellen Wood nos guia pelas mais importantes discussões intelectuais a respeito do capitalismo no primeiro momento de seu livro para depois nos mostrar a sua versão a respeito das raízes históricas do sistema e nos propor uma outra interpretação que enxerga o capitalismo como fruto específico de particularidades do seu momento histórico.
A ideia que parece estar no cerne de grande parte das futuras explicações sobre a origem do capitalismo se baseia fundamentalmente no modelo mercantil e a visão principal desse modelo é do historiador Henri Pirenne. Partindo do pressuposto de que no gênese da história os seres humanos já tinham uma inclinação natural para “comerciar, permutar e trocar”¹ o capitalismo é o para o modelo mercantil o “(...) estágio mais elevado do progresso, representa o amadurecimento de práticas comerciais antiquíssimas (juntamente com avanços técnicos) e sua libertação das restrições políticas e culturais.”(p.22) Wood percebe que não há indício de origem aqui e que tampouco há necessidade de explicá-lo “Segundo o modelo mercantil, na verdade, não havia nenhuma necessidade de explicar o surgimento do capitalismo. Ele presumiu que o capitalismo existiu, pelo menos sob forma embrionária, desde o alvorecer da história, se não no próprio cerne da natureza humana e da racionalidade humana.” (p.25) Muitas outras visões apresentadas neste bloco partem da mesma premissa, apesar dos esforços de Max Weber, por exemplo, de perceber que o capitalismo só surgiu por conta da especificidade de sua época ele procura origens para esse desde a Antiguidade Clássica. Pode-se citar também a explicação do modelo demográfico que apresenta uma falha interpretativa e coloca o burguês como responsável por esse processo por uma confusão puramente semântica do termo burguês e seu significado ao longo do tempo. Wood marca Karl Polanyi como uma exceção dentro desse debate, em A grande transformação de 1944 o historiador e antropólogo percebe que havia diferentes motivações para a organização da vida econômica e diferencia as sociedades com mercado (anteriores a era moderna) e as sociedades de mercado (a partir da modernidade), noções importantes para a compreensão do enredo de A origem do capitalismo mas que não foram marcantes para a mudança das ideias enraizadas no modelo mercantil clássico, mesmo que este tenha sido aprimorado.
Adentrando os principais debates marxistas, Wood nos alerta para uma duplicidade narrativa na obra de Karl Marx o que justifica a enorme discordância entre os autores marxistas e até a não contestação do modelo mercantil em diversas obras marxistas. O debate da transição entre o economista Paul Sweezy e o historiador Maurice Dobb em 1950 é um importante marco para a discussão marxista a respeito da origem do capitalismo utilizando da transição do sistema feudal para o sistema capitalista buscando assim entender o “motor primordial” dessa passagem com a contribuição também do medievalista R.H Hilton: “De várias maneiras, Dobb e Hilton sugeriram que a dissolução do feudalismo e a ascensão do capitalismo haviam resultado da libertação da pequena produção mercantil, de sua liberação do jugo do feudalismo, sobretudo por meio da luta de classes entre senhores e camponeses.”(p.38) os intelectuais que foram responsáveis por essa discussão que se tornou livro mais tarde em 1976 discordavam no ponto que tratava a dissolução do feudalismo como suficiente para a ascensão do capitalismo, e aqui novamente vemos a sutileza do discurso do modelo mercantil: “se a dissolução do feudalismo é suficiente para explicar a ascensão do capitalismo, não estamos de novo muito próximos dos pressupostos do modelo mercantil? (...) Dobb e Hilton, portanto, não parecem questionar todos os pressupostos básicos do modelo mercantil.”(p.41) Paul Sweezy é o único que tinha dúvidas inquietantes a respeito da “via realmente revolucionária” e sobre a não aceitação da dissolução do feudalismo como momento de elevação do capitalismo, Wood nos mostra algumas que essas questões não foram esclarecidas. O marxista Perry Anderson nos dá uma interpretação ligada a outro momento da História:
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