A Narrativa Como Ferramenta Da Construção Da Ideologia Amazônica
Ensaios: A Narrativa Como Ferramenta Da Construção Da Ideologia Amazônica. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: MarquesRaquel • 6/11/2014 • 3.580 Palavras (15 Páginas) • 445 Visualizações
A NARRATIVA COMO FERRAMENTA DE CONSTRUÇÃO DA IDEOLOGIA AMAZÔNICA.
Raquel Salgado Marques
RESUMO
A proposta central deste artigo é analisar de que forma a narrativa influenciou como ideologia na construção do pensamento social na Amazônia, refletindo a partir de autores como Neide Gondim, Renan Pinto e Iraildes Torres, entre outros, que trazem de uma forma sensível, narrativas sobre a invenção da Amazônia numa fantástica viagem das idéias e do pensamento ocidental sobre a Amazônia. Para análise dessas obras, considerar-se-á a proposta de Paul Ricouer de que há o cruzamento entre a ficção e a história através do uso de traços do imaginário no ato de composição desses enredos, por intermédio da operação de humanização do tempo na narrativa, o que o filósofo denomina como refiguração.
Palavras-chave: Narrativa, Amazônia, Ideologia, Pensamento Social.
ABSTRACT
The purpose of this article is to examine how the narrative as an ideology influenced the construction of social thought in the Amazon, reflecting from authors such as Neide Gondim, Renan Pinto and Iraildes Torres, among others, who bring in a sensitive, narratives about Amazon in the invention of the fantastic journey of ideas and western thought on Amazon. For analysis of these works, it will consider the proposal of Paul Ricoeur that is the intersection between fiction and history through the use of the imaginary strokes in the act of composition of these plots, through the operation of humanization of time in the narrative, what the philosopher calls as refiguring.
Keywords: Narrative, Amazon, Ideology, Social Thought.
INTRODUÇÃO
...Para mim, o mundo é o conjunto das referências abertas por todos os tipos de textos descritivos ou poéticos que li, interpretei e amei. Compreender esses textos é intercalar entre os predicados de nossa situação todos os significados que, de um simples ambiente, fazem um mundo.
Ao falar sobre narrativa é necessário antes de tudo definir o que é narrativa. Numa linguagem do cotidiano seria contar algo para alguém. Esse algo não requer elementos simbólicos complexos e sim simples, com a finalidade de atingir seu receptor. Pode ser do cotidiano ou associado a uma crença. Narrar é natural do homem. Foi através da narrativa que conhecemos a história do mundo. É por meio dela que questionamos e pesquisamos os fatos. Através de histórias narradas, reais ou fictícias, que compreendemos o mundo.
Segundo o dicionário Biderman (1998), narrativa é uma exposição oral ou escrita de um fato ou uma seqüência de acontecimentos. Acontecimentos do cotidiano, da nossa familiaridade. Porém, para Ricoeur (1994:90) a narrativa não se limita a fazer uso de nossa familiaridade com a trama conceitual da ação. Acrescenta-se à narrativa, traços sintáticos com a função de engendrar a composição das modalidades de discursos narrativos históricos ou fictícios. Para o autor, “compreender o que é uma narrativa é dominar as regras que governam sua ordem sintagmática” (Idem:91). Portanto, “toda narrativa explica-se por si mesma, no sentido de que contar o que aconteceu já é explicar porque isso aconteceu” (Ibidem: 221).
Os termos narrativa, narração e narrar derivam do Latim: narrare, narratum e narro , que por sua vez advêm do termo gnarus, que significa conhecimento ou visão. Esta etimologia evidencia a íntima conexão existente entre narrativa e conhecimento, que por sua vez leva ao agir.
Em Arqueologia do Saber (2004) Foucault afirma que da mesma forma que o sujeito do saber é um efeito do discurso, o objeto do saber também o é. Dessa forma, aquilo que encaramos como verdade, acaba, também, por ser um efeito do discurso. Não interessa ao arqueólogo do saber se um enunciado é verdadeiro ou falso a nível discursivo, mas ver, historicamente, como são produzidos os efeitos das verdades no interior dos discursos, que não possuem atributos verdadeiros ou falsos.
Fiorin (2001:74) afirma que “quando um enunciador comunica alguma coisa, tem em vista agir no mundo. Ao exercer seu fazer informativo, produz um sentido com a finalidade de influir sobre os outros”. Assim, o ato de narrar está relacionado intimamente com a forma de reprodução da visão do dominante sobre o dominado. Contribui para reforçar as estruturas de dominação (Idem:74).
Para Foucault (2004), um enunciado não é apenas uma proposição lógica ou um ato de linguagem, ele só é enunciado, ele só constituirá sentido, se possuir um conjunto de condições de existência. Segundo ele, um enunciado possui como espaço de correlações um conjunto de domínios em que os objetos podem aparecer, sendo que esses objetos podem ser reais ou fictícios.
Está antes ligado a um ‘referencial’ que não é constituído de coisas, de fatos, de realidades, ou de seres, mas de leis de possibilidade, de regras de existência para os objetos que aí se encontram nomeados, designados ou descritos, para as relações que ai se encontram confirmadas ou negadas. (p. 103).
Na antiguidade, entre os filósofos (considerados senhores do saber) era comum a narrativa de fatos para explicar determinadas situações do cotidiano ou até mesmo questiona-lo. Fenômenos da natureza eram explicados pela narrativa. Platão considerava como narrativa as narrações de todos os acontecimentos passados, presentes e futuros e aplica-se a todos os textos produzidos pelos prosadores e poetas, além do gênero mimético onde se inclui a tragédia e a comédia. Para ele, ainda há dois gêneros narrativos: o puro representado pelo ditirambo , e o misto, representado pela epopeia .
Na história ocidental cristã tem-se explicações da criação ou surgimento do mundo pela narrativa. No Gênesis, um dos livros da bíblia sagrada para os cristãos, o mundo se torna mundo como o conhecemos pela voz de um narrador “e disse Deus haja luz e houve luz”. Tal fato narrado é objeto de crença e axioma de muitas religiões ocidentais.
As narrativas mesclavam o fantástico pagão e cristão – o jardim das Hespérides e o Gênese confirmam – muito tempo antes que o homem ocidental se lançasse em viagens mais arrojadas pelo oceano desconhecido (GONDIM, 2007:27)
Ricoeur (1994:91) afirma que compreender uma história é compreender ao mesmo tempo a linguagem do “fazer” e a tradição cultural da qual procede a tipologia das intrigas. Portanto, a narrativa por intermédio da linguagem ordena o caos, determina uma coisa, um acontecimento.
Para
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