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A Segunda Articulação ou Fonologia

Por:   •  27/2/2023  •  Resenha  •  3.069 Palavras (13 Páginas)  •  99 Visualizações

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Universidade Federal de Mato Grosso

Departamento de Letras – Lingua Portuguesa e Literatura

Disciplina: Fonética e Fonologia

Docente responsável: Suseile Andrade Sousa

Nome do aluno: Talita Alves De Sousa

FICHAMENTO

Autor: MATTOSO, Joaquim Camara Junior

Título: A segunda articulação ou fonologia (Parte Primeira)

Livro: Estrutura da Língua Portuguesa

Organizador(es)/Autor(es) do livro: MATTOSO, Joaquim Camara Junior

Cidade: Petrópolis, RJ

Editora: Vozes Ltda

Ano: 1970

Palavras-chave:

fonema

vogal

consoante

sílaba

língua

  1. Sons vocais elementares e fonemas

  1. As vogais e as consoantes portuguesas
  1. As estruturas da sílaba em português
  1. A acentuação e o vocábulo fonológico

1 - Sons vocais elementares e fonemas

        Segundo o autor (p. 33), “a divisão mínima na segunda articulação da língua é a dos sons vocais elementares, que podem ser vogais ou consoantes. A divisão resulta de um processo psíquico da parte de quem fala e quem ouve. Na realidade física a emissão vocal é um contínuo, como assinalam quer os aparelhos acústicos, quer os aparelhos de registro articulatório.”

       O linguísta russo Baudouin, propos o nome do conceito fonema, onde “o que realmente interessa na comunicação lingüística é um pequeno número de propriedades articulatórias e acústicas, ou traços (ing. features) e não todo o conjunto da emissão fônica.” (p.33).

       Em seguida traz duas definições de fonema, uma dada por Jakobson e outra por Leonard Bloomfield. A definição de Jakobson é “as propriedades fônicas concorrentes (isto é, simultâneas para o ouvido humano) que se usam numa dada língua para distinguir vocábulos de significação diferente” (p.34). Já a de Leonard Bloomfield é “traços distintivos que ocorrem em conjunto ou feixe, como o adendo: O falante se exercitou em fazer os movimentos (entenda-se no aparelho fonador) produtores de som de tal maneira que os traços do fonema estão sempre presentes nas ondas sonoras e também se exercitou a só dar importância a esses traços, não tomando conhecimento da massa acústica que alcança em grosso o seu ouvido” (p.34).

        Existem dois tipos de alofones, os posicionais e os livres, tendo isso como base, o autor ressalta que os alofones posicionais “dão o sotaque local da nossa fala, distinguindo, por exemplo, o falar do Rio de Janeiro e o de São Paulo, e, até, de maneira geral, a pronúncia brasileira e a portuguesa” (p. 35). Alegando então que “o grande problema de quem fala uma língua estrangeira não é a rigor a má reprodução dos alofones mas o de emitir os verdadeiros traços distintivos dos fonemas, sem insinuar, sem sentir os traços distintivos dos fonemas mais ou menos semelhantes da língua materna, às vezes com confusões perturbadoras e cômicas.” (p. 35).

          A classificaçlo dos traços distintivos pode ser feita por mais de um critério. Ela pode ser acustica, baseada nas vibrações das ondas sonoras do ar, quando se fala. Também pode ser auditiva, tomando para critério o efeito que o som emitido produz no ouvido humano. E também pode ser articulatória, quando os traços se definem pelos movimentos dos órgãos fonadores quando se fala. Como diferença entre classificaçlo articulatória e classificação auditiva temos, para as consoantes, a sinonímia, entre constritivas e fricativas, que a nossa Nomenclatura Gramatical Brasileira não entendeu, fazendo das fricativas uma divisão das constritivas. Na realidade, a constrição é a aproximação muito grande entre dois órgãos fonadores, como para port. / f/ e /v/, em que a arcada dentária superior e o lábio inferior quase se juntam. A fricção, ou atrito, é a impressão que essa constrição produz em nosso ouvido. O nome de sibilantes e o de chiantes, respectivamente para /s/ - / z/ e / s'/ (z em eixo) - / z’ (J em jeito) são também uma classificação auditiva; articulatoriamente costumam ser chamados esses fonemas constritivos alveolares e palatais, respectivamente.” (p. 36).

         “A grande diferença entre o tratamento articulatório dos fonemas de J akobson e o da fonética tradicional é que ele põe de parte a classificação pelos pontos de articulação na boca (labiais, Jabiodentais, dentais, alveolares, pré-palatais, médio-palatais, velares).” (p. 37).

          Segundo o autor, há duas formas de estabelecer a diferença entre vogal e consoante, “é considerar a vogal como um som, produzido pela ressonância bucal, onde a corrente de ar passou livremente. Ao contrário, na consoante, há a passagem da corrente de ar, seja uma oclusão, ou fechamento, seja uma constrição, ou aperto, seja uma oclusão parcial que desvia a direção da corrente de ar, ou uma tremulação da língua que imprime uma vibração à corrente de ar.” (p. 37 e 38). “O segundo critério é o comportamento do fonema na unidade superior da sílaba. As vogais e as consoantes liquídas ou nasais, mais raramente podem figurar como centro da sílaba. As consoantes ficam em volta desse centro, como também pode suceder com as nasais e as líquidas. Não há sílaba sem um centro ou ápice (V). Os elementos marginais (C) podem ser prevocálícos ou posvocálicos. Se há elemento posvocálico, a sílaba é travada ou fechada. Se nao o há a silaba é livre ou aberta. Em português, o centro da sílaba é sempre uma vogal. Só algumas consoantes podem ser posvocálicas. E predommam de muito as sílabas livres sobre as travadas.” (p. 38).

2 - As vogais e as consoantes portuguesas

              No Brasil, o enfoque da língua oral começou com Franco de Sá numa obra que ficou infelizmente fragmentária (Sá 1915). Não vai muito longe no rigor fonético, porque Franco de Sá um antigo político retirado da vida pública, não era foneticista de formação, como foi Gonçalves Viana e mesmo Sá Nogueira, e além disso não foi um observador direto da fala em si mesma. O seu método parte, em última análise, da língua escrita, pois o que ele pretente é examinar a maneira por que cada letra vogal é pronunciada nos vocábulos em que se escreve. A sua doutrina é que as cinco letras vogais, na pronúncia culta brasileira, têm três variedades de timbre, que ele chama respectivamente aberto, fechado e surdo (Sá 1915, 180).” (p. 39 e 40).

           Para as vogais portuguesas, a presença do que se chama acento, ou particular força expiatória (intensidade), associada secundariamente a uma ligeira elevação da voz (tom), é que constitui a posição ótima para caracterizá-las. A posição tónica nos dá em sua plenitude e maior nitidez (desde que se trate do registro culto formal) os traços distintivos vocálicos. Desta sorte, a classificação das vogais como fonemas tem de partir da posição tónica. Daí se deduzem as vogais distintivas portuguesas.” (p 40 e 41).

           “Elas constituem então o que Trubetzkoy chamou um sistema vocálico triangular (Trubetzkoy 1929, 39s). O dispositivo fica o seguinte:

                                [pic 1]” (p. 41).

              Todos os fonemas vocálicos, em termos fonéticos, apresentam variação articulatória e auditiva, então. Mas o que essencialmente caracteriza as posições átonas é a redução do número de fonemas. Isto é, mais de uma oposição desaparece ou se suprime, ficando para cada uma um fonema em vez de dois. É o que Trubetzkoy tornou um conceito clássico em fonologia com o nome de neutralização.” (p. 43).

              “Há assim, independentemente de se tratar sempre a rigor de alofones posicionais do correspondente fonema tónico, 3 quadros de vogais átonas para o português do Brasil:

           [pic 2]” (p. 44).

         

           “Resta uma derradeira posição átona para as vogais: a da chamada posição assilábica, quando a vogal, em vez de ser o centro da sílaba, fica numa de duas margens, como as consoantes. O resultado é uma vogal modüicada por outra na mesma sílaba e constitui-se o que se chama o ditongo.” (p. 45).

            O autor fala agora das consoantes: “Do ponto de vista fonológico, e auditivo antes que articulatório, oclusivas e fricativas têm em comum a circunstância de serem francamente consonânticas (com um efeito auditivo de forte embaraço à corrente de ar, que nas oclusivas é o de uma plosão, e nas constritivas o de uma fricção). Temos assim os fonemas consonânticos puros, plosivos e fricativos, respectivamente. As nasais, laterais e vibrantes se associam por uma combinação do consonântico com o vocálico (sonântico). Nas nasais há ressonância nasal; nas outras duas séries só há ressonância oral, diferindo entre si pelo ruído de oclusão parcial (/l/ e / I,/) e pelo de vibração (/r/ e / r'/).” (p. 49 e 50).

             “Tudo isso nos dá um quadro das 19 consoantes portuguesas em grupos triangulares como propus, sem tão longas considerações, desde 1948 (Camara 1953, 104) ; separando, nas plosivas e fricativas, as surdas das sonoras:

            [pic 3]” (p. 50).

             “Nessas condições, podemos agora levantar o quadro das consoantes portuguesas em posição posvocálica: /S/ / N/ (/l/) /r/” (p. 52).

3- As estruturas da sílaba em português

       “ [...] a silaba é uma divisão espontânea e profundamente sentida, na segunda articulação. Os seus tipos de estruturas marcam caracteristicamente as línguas. Não é, a bem dizer, o fonema, mas a sílaba que é a estrutura fonemica elementar (J akobson 1967, 133)” (p. 53).

        “Tem-se partido do efeito auditivo (sílaba sonora), da força expiratória (silaba dinâmica), do encadeamento articulatório na produção contínua dos sons vocais (sílaba articulatória, descrita por Saussure numa parte importante do seu Curso (Saussure 1922, 77s), da tensão muscular durante essa série de articulações (sílaba intensiva, desenvolvida por Grammont, na implícita das sugestões de Paul Passy, para complementar a teoria articulatória de Saussure) ( Grammont 1933, 97s) ou do jogo da musculatura peitoral, como estabeleceu Stetson numa elaboração mais rigorosa do conceito de sílaba dinâmica (Stetson 1951).” (p. 53).

          “De todos esses pontos de vista, resulta como denominador comum um movimento de ascensão, ou crescente, culminando num ápice (o centro silábico) e seguido de um movimento de decrescente, quer se trate do efeito auditivo, da força expiratória ou da tensão muscular, focalizados nessas diversas teorias. Por isso é normalmente a vogal, como o som vocal mais sonoro, de maior força expiratória, de articulação mais aberta e de mais firme tensão muscular, que funciona em todas as línguas como centro de sílaba, embora algumas consoantes, particularmente as que chamamos «sonantes», não estejam necessariamente excluídas dessa posição.” (p. 53)

          “Outro problema, singularmente sério para a descrição da estrutura silábica em português, é decidir se realmente temos ditongos em nossa língua. Em outros termos, se fonemicamente a seqüência, considerada em regra ditongo, não pode ser interpretada sempre como «hiato», ou seja, duas vogais silábicas contíguas. “[...] podemos afirmar que o ditongo, inegável em certas áreas como o Rio de Janeiro, não é um traço fonêmico geral do português e falta em outras áreas, como Lisboa, em Portugal, e o Rio Grande do Sul, no Brasil.” (p. 55).

           “Já vimos que, além da sílaba travada por /l/, /r/ e /S/, há em português um quarto tipo de vogal travada, em virtude da interpretação que aqui se propôs para a chamada «vogal nasal». Segundo essa interpretação, é uma vogal travada por um elemento nasal. Trata-se, como para /S/, de um arquifonema /N/, que se realiza como /m/ diante de consoante labial na sílaba seguinte, como /n/ diante de consoante anterior nas mesmas condições e como um alofone [fi] posterior diante de vogal posterior: campo, lenda, sangue. Isto, ou seja, a existência fonética de um elemento consonântico nasal nessas condições foi observado desde Gonçalves Viana para «a pronúncia normal portuguesa» e é extensiva, sem a menor dúvida, ao Brasil (Camara 1953, 90). Morais Barbosa repete recentemente a observação de Gonçalves Viana, estendendo-a ao caso de vogal nasal seguida de sibilante e comprovando-a com a fonética experimental (Barbosa 1965, 86). Diante de pausa pode-se dizer que o elemento consonântico nasal se esvai, ou, em termos fonológicos, se reduz a zero, tornando-se então distintiva a nasalidade que, em conseqüência dele, envolve a vogal.” (p. 58).

          “O único argumento contra a existência fonética da consoante nasal e a conseqüência da presença fonológica de um arquifonema nasal/N/, a rigor, é que na vogal nasal portuguesa nós «sentimos» a nasalidade que envolve a vogal ~ «não sentimos» o elemento consonântico posvocálico imediatamente seguinte. É um argumento de ordem psicológica e não de ordem estrutural. Ora, a LINGUÍSTICA moderna, e dentro dela a fonêmica ou fonologia, põe de lado essa espécie de fundamentação, que faz apelo ao «sentimento» do falante. Cabe aqui a advertência de Hjelmslev no sentido de que a língua é uma estrutura, de que falantes podem ter uma compreensão inexata ou deficiente (Hjelmslev 1935, 88).” (p. 59).

           “A nasalidade pura da vogal não existe, aliás, fonologicamente, porque por meio dela não se cria oposição em português entre vogal pura envolvida de nasalidade e vogal seguida de consoante nasal posvocálica.” (p. 59).

            Há em nossa língua o fenômeno da «ligação» (fr. liaison) 6 entre a sílaba final travada de um vocábulo e a vogal inicial de um vocábulo, que a ele se segue sem pausa (substantivo com seu adjetivo, verbo com um seu complemento etc.). Ora, neste caso a consoante posvocálica se liga à vogal imediatamente seguinte e a sílaba final, que era travada, fica uma sílaba livre, ao mesmo tempo que a sílaba seguinte ganha uma consoante prevocálica ou crescente.” (p. 60 e 61).

             

4- A acentuação e o vocábulo fonológico

“[...] falta o fenômeno da «juntura», ou seja, uma marca fonológica que indique, independentemente de qualquer pausa, uma delimitação entre vocábulos na corrente da fala. Essa ausência de juntura, inevitável pelo fato da ligação, entre um vocábulo que termina por por consoante e o seguinte começa por vogal, não é, entretanto, absoluta  em outras ocorrências. No português europeu (é certo) há a mais o fenômeno da elisão e da crase que também anulam a separação entre uma vogal final e a inicial do vocábulo seguinte, quando átonas ambas ou pelo menos átona a primeira. No português do Brasil, porém, as ocorrências são mais matizadas.” (p. 62).

         “Quando se têm, porém, C + V ou C + C (diferentes), desaparece qualquer juntura segmental. Não se pode dizer que desapareça propriamente a delimitação vocabular, porque surge uma juntura «supra-segmental», decorrente das pautas acentuais. Podemos dizer, assim, que o acento em português tem tanto a função distintiva quanto a delimitativa, na terminologia de Trubetzkoy.” (p. 62 e 63).

          “De qualquer maneira, o acento (de grau 2 ou 3 conforme a posição no grupo de força) é a marca nítida do vocábulo fonológico. Além desse valor demarcativo, que cria uma juntura suprasegmental, o acento em português é também distintivo, pois serve pela sua posição a distinguir palavras, como em jaca «uma fruta brasileira» e jacá «uma espécie de cesto», caqui «a fruta de origem japonesa» e cáqui «cor de poeira», e assim por diante. É até um processo gramatical de distinguir padrões morfológicos entre o substantivo, proparoxitono, e a forma verbal, paroxítona, com os mesmos fonemas, do verbo correspondente: rótulo: rotulo (verbo rotular), fábrica: fabrica (verbo fabricar), intérprete: interprete (verbo interpretar).” (p. 64 e 65).

           “A pausa só auxilia a delimitação do vocábulo na circunstância muito relativa de que, de um grupo de força a outro, é preciso se chegar ao fim de um vocábulo para haver pausa. Por outro lado, o acento é livre aJnda no sentido de que a sua posição não depende da estrutura fonêmica do vocábulo. Não há em português terminações de fonemas que imponham uma dada acentuação. Quando muito, há uma maior freqüência, fonologicamente indeterminável, para dada terminação. Assim o mais comum é serem oxítonos os vocábulos terminados em -r, mas há, não obstante, açúcar, alcáças e assim por diante e até revólver, substantivo, em oposição com o infinitivo verbal revolver. O mesmo se pode dizer a respeito dos vocábulos terminados em -l ou por arquifonema nasal (cf. hábil, ao lado de abril; servem, ao lado de convém, e assim por diante).” (p. 65)

         “Daí não se segue que não haja um determinado tipo de acentuação que é o mais generalizado no vocabulário português. e imprime à língua o seu ritmo característico. É sem a menor dúvida o tipo paroxítono, de que decorre para a língua um ritmo «grave». Nisto, entre as línguas românicas, o português, junto com o espanhol, e talvez mais do que este, se opõe ao ritmo «esdrúxulo» do italiano, decorrente da retenção dos proparoxítonos latinos, e ao ritmo «agudo» do francês, que é uma língua de acento fixo, constituída de vocábulos oxítonos. Neste particular, o português do Brasil, com o seu amplo empréstimo léxico no tupi e às línguas africanas, se diferencia do português europeu por um maior número de vocábulos oxítonos. Ao mesmo tempo, a língua padrão do Brasil se diferencia da língua popular pela manutenção dos proparoxítonos, que esta tende a reduzir a paroxítonos pela supressão de um segmento postônico, como em exérço, em vez de exército, ou Petrópis, por Petrópolis, e assim por diante.” (p. 65).

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