A TEORIA DA INTERPRTETAÇÃO DE ECO VISLUMBRADA METAFORICAMENTE EM CONTO DE CAIO FERNANDO ABREU
Por: giugambassi • 17/6/2015 • Trabalho acadêmico • 11.852 Palavras (48 Páginas) • 344 Visualizações
INTRODUÇÃO
Este trabalho tem por objetivo analisar a teoria da interpretação de Umberto Eco no que diz respeito aos contos de Caio Fernando Abreu “O rapaz mais triste do mundo” e “Dama da noite”, de modo a buscar, nos contos, recursos narrativos empregados por Abreu, mas que sejam metaforicamente equiparados aos conceitos de autor modelo e empírico, contemplados por Eco. Nesse sentido, abordaremos o conceito do que é um conto, analisando excertos das ficções em questão e expondo o contexto no qual foram escritos, de modo a tecer paralelos com a concepção de Eco.
Visando desvendar também a vida de Caio Fernando Abreu, no decorrer do trabalho, demonstraremos os contos abordados como a vivência de um autor, principalmente deste – o que, muitas vezes, é indissociável da obra.
Lançar-se-á mão, também, da música Roda Viva de Chico Buarque, a partir da qual realizaremos comparação com o conto “Dama da noite”, observando também o histórico comum dos autores. Por fim, estabeleceremos conceito sobre o que consideramos ser autor empírico e modelo.
SOBRE O AUTOR CAIO FERNANDO ABREU
Quem é Caio Fernando Abreu?
Jornalista, exilado, morto aos 47 anos pelo mal de sua década (a AIDS), foi um escritor que marcou sua época pela veracidade violenta de suas palavras. Reúne em seus textos temas como a morte, o sexo e o amor, todos refletidos em momentos de sua vida, salpicados ora com ironia, ora depressão, ora revolta.
Apesar de cada conto seu ser uma autobiografia, tentaremos reunir neste trecho quem foi Caio Fernando Abreu a partir de fragmentos encontrados fora sua obra.
Nascido em 12 de setembro de 1948, iniciou seus estudos na área de Letras e depois Artes cênicas, deixando incompletas as duas faculdades para ser um jornalista. Ao decorrer de sua vida, escreveu diversos contos, crônicas, cartas que trazem quase que inteiramente a totalidade de sua vida.
Encontramos a expressão “fotógrafo da fragmentação contemporânea” [1], devido à dramatização de seus dias descrevendo como poucos a sociedade e seus males como a ditadura, a AIDS e as desilusões de uma geração inteira. Reinventava-se a cada personagem sem perder o que era, cada linha parecia um desabafo, uma olhada no espelho, um pedaço de sua história e, principalmente, de sua alma.
Para depreendermos quem foi figura tão complexa, iremos utilizar principalmente o texto de Márcia Denser encontrado sob o título de “A Crucificação Encarnada dos Anos 80”, inserido na coletânea Caio 3D. Nesta coletânea está o livro Os dragões não conhecem o paraíso de onde tiraremos dois contos que serão abordados neste trabalho “O rapaz mais triste do mundo” e “Dama da noite”.
Como em muitos de seus livros, Caio apresenta este como “um romance desmontável, onde essas 13 peças talvez possam completar-se, esclarecer-se, ampliar-se ou remeter-se de muitas maneiras umas às outras”, como se fosse um apanhado de memórias, que resolveu descrever em forma de conto, o que pode ser observado no seguinte trecho de Denser: “Inversamente à vida, na ficção Caio não mente nunca, porque nela acontece o autoquestionamento, a revelação, o desnudamento, algo que se realiza quase sempre pela via negativa, pela técnica da inversão (claro) – da qual Caio é mestre – de dizer pelo não dito, significar pelo oposto ou pelo implícito, pelo subtexto ou pela elipse[2] – suas ilhas de silêncio”. [3]
Abreu usava da técnica da inversão ironizando a própria história, para talvez tentar impor um véu entre sua empiria e seu modelo[4], mas muitos que o conheceram puseram em evidência a dificuldade de Caio Fernando não colocar tudo de si mesmo em seus personagens. Neste livro, até os períodos de silêncio levariam a uma reflexão intensa, ou seriam espaço para tal. Ao tentar ler o livro na íntegra, a impossibilidade se daria pela intensidade de sentimentos comuns que abrangem qualquer um de nós, decifrando os nós de seus personagens em si mesmo como autor e em nós mesmos como leitores. Propõe uma cumplicidade tão viva, que nos faz fechar o livro antes de chegar ao próximo capítulo.
O segredo de Caio poderia ser a sinceridade, ou como colocado anteriormente, a veracidade violenta de suas palavras, desmistificando crua e friamente as fantasias e sonhos românticos de sua época. Descrito muitas vezes como um mentiroso, um auto-enganador tentando refugiar-se de si mesmo, conseguia colocar em 5 páginas a aflição de uma vida inteira, de uma doença imbatível, de uma condição sexual refutada por seus contemporâneos. Sem poder deixar de lado que qualquer autor manipula sua verdade, conseguiríamos observar um desabafo desenfreado de tudo que alguém poderia viver.
Reconhecemos a dificuldade de contar sobre alguém o que este conta sobre si mesmo em qualquer uma de suas palavras escritas, onde é incontestável a dualidade de cada história. É como se o autor quisesse se tornar uma charada que poderia ser desvendada encaixando as peças de suas obras na ordem certa. É preciso que se entre no universo desse autor para entender sua obra e na ilha de cada obra para desvendar o autor.
O QUE É UM CONTO
De acordo com Neto[5], seguindo uma visão moderna, conto é um gênero literário; trata de narrativa, diferenciando-se, porém, do romance e da novela, principalmente, em função do tamanho, já que em relação aos dois últimos é menor, fato que permite a estes a abundante quebra de cenários, existência de vários personagens e a divisão do enredo em capítulos. Verifica-se, assim, no conto, a “concisão” e a “densidade”[6], a criação de alguns personagens e o não excesso de capítulos.
O clímax do conto encontra-se no final: revelador e reflexivo. O conto, então, se desenvolve no sentido de um final reflexivo, surpreendente ou polêmico[7].
Os focos narrativos do conto se dão em: Primeira pessoa – personagem fala sobre si mesmo, expondo seu ponto de vista, sua vivência, sem considerar ideias de possíveis coadjuvantes, sendo peça principal em seu quase monólogo; Terceira pessoa – onde podemos encontrar A: Narrador observador e B: Narrador onisciente. Em A, percebemos que o narrador descreve o que está acontecendo, podendo especular, mas não nos coloca “dentro” da mente dos personagens. Já em B, o narrador transmite os pensamentos, destinos e acontecimentos do mundo ficcional, é como se soubesse da “vida” inteira dos personagens.
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