Análise Comparativa de Manuel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade
Por: bandy • 25/6/2015 • Trabalho acadêmico • 2.564 Palavras (11 Páginas) • 1.376 Visualizações
Beatriz Andery nº 8973831
Literatura Brasileira – I Trabalho Final
Análise Comparativa dos Poemas “ Murmúrio D’água”, de Manuel Bandeira e “ Noturno Oprimido” de Carlos Drummond de Andrade.
O poema “Múrmurio D’água”, apresenta alguns aspectos simbolistas, como a individualidade subjetiva e a musicalidade, além de acentuado lirismo. Bandeira era um poeta que como diz Antônio Cândido em Literatura e Sociedade, fazia parte do fermento de renovação literária que esboçava-se desde a primeira guerra mundial, mas que ainda ligava-se à poetas de gerações anteriores, como por exemplo, Cruz e Sousa, falecido quando Bandeira tinha aproximadamente dez anos de idade.
A Poesia de Manuel Bandeira é toda recheada fixações simbólicas ligada a elementos da natureza, como a estrela, a água, e a noite. Além disso, Bandeira procura em seu passado, no dia-a-dia e em elementos que não podem ter sua beleza traduzida com palavras humanas (aqui a estrela e um rio corrente são bons exemplos), cenas de delicado lirismo, e às vezes, o até mesmo o “poema-piada”, mais curto e cômico.
Todas essas características, e tantas outras, tornam Manuel Bandeira um poeta de profundidade, mas extremamente delicado, e nada espalhafatoso.
No começo de “Murmúrio D’água”, há uma sensação de positividade, com a água trazendo tranquilidade e frescor, qualidades benéficas percebidas através dos sentidos do tato e da audição.
Simbolicamente, e isso faz sentido na obra de Bandeira, a água é um elemento ligado à purificação, tranquilidade e ao tempo. Tais características são bem marcantes em outro poema seu, “ O Rio”. No entanto, embora a poética de Bandeira seja recheada de alusões à água como sinônimo da brevidade e incontrole do tempo, no primeiro trecho do poema analisado, esse caráter não tem um tom propriamente negativo.
“ Murmúrio d'água, és tão suave a meus ouvidos.
Faz tanto bem à minha dor teu refrigério!
Nem sei passar sem teu murmúrio a meus ouvidos,
Sem teu suave, teu afável refrigério”.
É interessante perceber que a água em todo o poema aparece ligada aos sentidos da audição e tato, nunca a visão. Além disso, ela é retratada como um elemento que parece afetuoso para o eu lírico.
Na segunda estrofe, o poeta classifica as águas. De fontes , oceanos, pranto e rios. O Rio, como já foi dito, é um constante símbolo do tempo que passa, e das transformação da vida. As fontes podem ser o começo da vida, pois é onde se inicia o curso da água, que inevitavelmente, mesmo que flua para outros rios, acabará chegando no oceano, que é imenso e desconhecido. A água do pranto vêm de nós e só por motivos em especial, como saudade, raiva, tristeza e mesmo muita alegria. É a água que nasce por causa dos sentimentos, ou, no caso das crianças, muitas vezes apenas por serem crianças. A água da chuva, que purifica e fertiliza. Mais uma vez, a ideia das água que cantam é apresentada, agora ligando-as ao acalanto, e consequentemente com a infância e ao carinho que o gesto de ninar alguém pressupõe.
A terceira estrofe tem um desenvolvimento irônico e um tanto pessimista., paradoxalmente ligado ao sorriso. É como se toda a tranquilidade e ingenuidade infantil das duas primeiras estrofes fosse de repente rebatida pelo ar sarcástico e desenganado de um Bandeira que vive com a morte a espreitar lhe. No entanto, é preciso ficarmos atentos a alguns sentidos dúbios das palavras usadas nesse trecho.
“ A que sorri a minha cínica descrença.
A que sorri o meu opróbrio de viver.
A que sorri o mais profundo desencanto
Do mais profundo e mais recôndito em meu ser!
Sorriem como aqueles cegos de nascença
Aos quais Jesus de súbito fazia ver...”
É preciso prestar atenção nas no termo “cínica descrença”. A descrença é a falta de fé, e o cinismo é o descaso às normas sociais e também uma certa imprudência. As duas palavras, juntas, compõem uma perda de fé absoluta em tudo e em todos? Ou é a descrença cínica porque é petulante, e falsa a si mesma, sendo, na verdade, a fé disfarçada de desencanto? Os versos que se seguem nos ajudam a escolher o significado mais compatível ao poema. O Eu lírico fala de “opróbrio viver” e “profundo desencanto”. A vida desonrada e a perda do encanto com o mundo são a vida adulta, tão cheia de decepções . Essa existência desencantada, no entanto, sorri às águas que refrescam e acalantam, como um adulto que sorri para os dias se sua infância.
“Sorriem como aqueles cegos de nascença
Aos quais Jesus de súbito fazia ver...”
Esse dois últimos versos, fecham a terceira estrofe com uma promessa de esperança. Para compreende-los, é preciso retomar à passagem bíblica, em que dois cegos na beira da estrada pedem a Jesus – à caminho de sua crucificação que os cure. Embora a multidão vaiasse os cegos pelo pedido em um momento inoportuno, Jesus os atende, e lhes concede a visão. Porque Bandeira utiliza essa história para fechar a estrofe mais pessimista do poema? É como se no momento em que os cegos abrem os olhos, retomassem a esperança, afinal, os milagres implicam fé e uma espécie de encantamento.
A quarta estrofe começa com uma lembrança evidente da infância, que é a causa de uma característica do poeta quando adulto.
“ A minha mãe ouvi dizer que era minh'ama
Tranqüila e mansa.
Talvez ouvi, quando criança,
Cantigas tristes que cantou à minha cama.
Talvez por isso eu me comova a aquela mágoa.
Talvez por isso eu me comova tanto à mágoa
Do teu rumor, murmúrio d'água...”
A figura da mãe e da ama parecem confundir-se em uma só, pois na infância do poeta, provavelmente tinham o mesmo peso, eram duas figuras femininas adultas que o cuidavam e por isso confundem-se em seu imaginário. A figura mansa e tranquila cantando cantigas tristes ao pé da cama do garotinho. A mãe e a ama são figuras do acolhimento, da segurança, ligada à infância. No entanto, essa mulher que é nascente de boas sensações, canta canções tristes para ninar o seu filho. Aqui, isso parece ser a causa da sensibilidade do poeta quando adulto às mágoas em geral, e mais especificamente do murmúrio d’água. Esse pequeno pedaço do poema contém algumas questões que sugerem questões psicológicas (outro traço visto em muitos poemas de Bandeira) , em que algo visto ou vivido quando criança desencadeia algumas características no adulto que ela virá a ser.
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