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CONTRA O GÊNIO ROMÂNTICO: A ESTILÍSTICA LITERÁRIA NO ENSINO DE LÍNGUA E LITERATURA

Por:   •  5/12/2019  •  Ensaio  •  2.181 Palavras (9 Páginas)  •  214 Visualizações

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CONTRA O GÊNIO ROMÂNTICO: A ESTILÍSTICA LITERÁRIA

NO ENSINO DE LÍNGUA E LITERATURA[1]

 

Daniel Cosme da Silva Nascimento[2]

 

RESUMO

O presente ensaio discorre-se em uma reflexão acerca do espaço da estilística literária na sala de aula, bem como sua utilidade à prática da escrita, e sobre como métodos de ensino da estilística podem ser eficazes tanto às aulas de língua quanto de literatura. A partir das ponderações de alguns autores, tais como Rildo Cosson e Fábio Andrade, a problemática dos impasses gerados pelo imaginário do “gênio romântico” é discutida à desmistificação através de estudos diretos e formais da obra literária como meio de expressão, conhecimento e aprimoramento. Faz-se, portanto, o apelo para que a formação de professores conte com disciplinas específicas ao tratamento artístico da linguagem, contribuindo para um domínio que encerra os equívocos do romantismo, no tocante ao processo criativo, e inicia uma consciência reflexiva do trabalho da escrita agradável.

Palavras chave: Ensino de literatura. Livro Didático. Estilística Literária. Metodologia Pedagógica. Criação Literária.

INTRODUÇÃO

A literatura projeta-se do desejo do artista ao mundo, para neste desenvolver-se como um desvio, uma quebra do automatismo perceptivo e um produto formal da matéria fabulatória, ou seja, a realidade. Nas salas de aula, no entanto, o conhecimento de uma concepção como essa, ou mesmo a de que a literatura tem sua função social na formação do homem, esgueira-se com dificuldade (se quando consegue) entre professores despreparados ou subjugados e alunos desinteressados ou desfavorecidos.

Nesse cenário, de infeliz habitualidade, apresentar as obras literárias como objetos estéticos — fontes riquíssimas de conhecimentos tanto metalinguísticos quanto extraliterários — é de suma importância, ao mesmo tempo que é de suma dificuldade; enquanto a estilística, que despontou com suas pretensões científicas no início deste século, ainda é relegada aos últimos capítulos da maioria das gramáticas normativas, sendo intitulada como “figuras de linguagem” — vide Cegalla (2009) ou Lima (2011), como exemplo.

Por uma investigação nos PCNs observamos a ausência do próprio termo “estilística” no que se refere à procedimentos criativos[3]. Mas o problema é mais dobradiço. Vejamos: como os ideais românticos sobreviveram até os tempos atuais — como a ideia da obra como extensão direta do sujeito artista e sua negação das normas culturais em prol do dom (gênio)? Basta-nos pensar nessa questão para perdemo-nos em uma pequena digressão, em um emaranhado de aspectos sociológicos, antropológicos e filosóficos, desenvolvidos pelo imaginário social e facilmente identificados através de respostas que tentam justificar a criação pelo talento.

A INSUFICIÊNCIA DE ABORDAGEM

Ao bom desempenho do ensino de literatura, entre todos os obstáculos encontrados na formação de professores e um sistema educacional por vezes inexorável, essa noção do gênio, concebida no pré-romantismo, tem servido de abismo segregador, cedente do desencanto aos alunos, que distanciam-se de uma experiência de fruição estética e conhecimento do mundo. Um dos fatores acarretadores desse problema é a falta de uma abordagem menos canônica das obras literárias, contando com a dessacralização daqueles que, como qualquer outro profissional (não no sentido referido por Lispector[4]), experienciaram seus processos de formação artística.

Não podemos ignorar, ademais, que o papel dado à literatura na maioria das salas de aulas brasileiras é o de “mineração gramatical”, através da qual os alunos são cobrados a encontrarem tesouros verbais, adjetivos, adverbiais, substantivos, subordinados ou adversativos. Essa abordagem não só apresenta, mas também interpreta o texto literário como sendo um mero caça-palavras, uma porta diferente para um mesmo fim. Porém, a utilização da literatura como meio de aprendizagem metalinguística não deve ser considerado um erro, logo que suas minúcias, como as conjunções, por exemplo, constituem obviamente a sustentação da coesão textual; e a literatura, em qualquer um dos seus gêneros, encontra-se abundante de significações por ser linguagem antes de qualquer outra definição. Somente quando de tais “tesouros” não se pode tirar algum proveito além da taxonomia de classes gramaticais, a legítima dicionarização, o uso do texto literário deve ser repensado! Silva e Fritzen, no artigo Ensino de literatura e livro didático: uma abordagem a partir das pesquisas na pós-graduação brasileira, sintetizam perfeitamente a atual realidade do ensino de língua e a disparidade que pode haver entre a alfabetização e o desempenho de leitura do mundo quando ambos são atravessados pelo filtro da mera codificação e decodificação:

Há pouco tempo, as denominações analfabetizado e alfabetizado bastavam para descrever o nível de domínio das habilidades de leitura e escritura. No entanto, na atualidade, não basta mais saber ler e escrever, decodificar e codificar: é preciso também estar apto a usufruir daquilo que a leitura e a escrita podem proporcionar, porque as possibilidades de interação em sociedade tendem a ser maiores na mesma proporção que o nível de letramento for mais apurado. (SILVA e FRITZEN, 2012).

Antes de respondermos à pergunta “o que nos falta são mais profissionais capacitados para lidar com a palavra de forma criativa na sala de aula?”, devemos salientar que o invencionismo pela subversão da gramática é próprio da criação literária, o que não cabe, portanto, aos gêneros não literários, de objetividade clara e concisa. Todavia, os desvios produzidos pelos autores artistas requerem uma consciência ímpar da linguagem, a qual não se nutre apenas de regras convencionadas e é de real importância até mesmo à receptividade dos textos não-literários, que ganham tanto mais acessibilidade quanto flexibilidade ao prazer de uma leitura de si próprios.

DO MODO DE LER AO MODO DE ESCREVER

É evidente que a importância de uma disciplina de metodologia para o ensino de literatura se estabelece, também, nas concepções adotadas pelos futuros professores sobre os modos de leitura das obras literárias, dentre os quais, como proposto por Cosson (2014, p. 77) e pertinente ao assunto aqui abordado, destaque-se a leitura do texto-intertexto:

 

[...] a leitura do texto-intertexto volta-se para a língua literária da obra, como ela organiza os recursos estilísticos da linguagem para construir os seus sentidos. Nesse modo de ler, interessa verificar como os recursos dados pela linguagem – que é feita intertexto – são apropriados na tessitura da obra, como eles se desdobram e se renovam na singularidade daquele texto.

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