Fernando Pessoa E Seus Heterônimos
Exames: Fernando Pessoa E Seus Heterônimos. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: laricruzsilva • 23/4/2013 • 1.520 Palavras (7 Páginas) • 1.071 Visualizações
Fernando Pessoa e seus heterônimos
A mais rica, densa e intrigante faceta de Fernando Pessoa diz respeito ao fenômeno da heteronímia, ou seja, à sua capacidade de despersonalizar-se e reconstruir-se em outros personagens, ao fato de termos um poeta que seja vários poetas. E a cada um deles Fernando Pessoa deu uma biografia, caracteres físicos, traços de personalidade, formação cultural, que resultam em diferentes maneiras de interpretar o mundo.
Alberto Caeiro
Alberto Caeiro da Silva nasceu em Lisboa, em 16 de abril de 1889, e morreu tuberculoso em 1915, na mesma cidade. Órfão de pai e mãe, viveu com sua tia no campo. Só teve instrução primária e, por isso mesmo escrevia mal o português.
Esses traços biográficos ajustam-se perfeitamente à poesia de Caeiro e, principalmente, à sua visão de mundo. Poeta que está em contato direto com a natureza, sua lógica é a mesma da ordem natural:
“ E ao lerem os meus versos pensem que sou qualquer cousa natural.”
Para Alberto as coisas são como são, tendo, assim um conceito direto das coisas. Por isso mesmo, seu mundo é o mundo do real-sensível, é tudo aquilo que existe e que percebemos através dos sentidos. Daí vem uma das principais características de Caeiro, ele pensa com os sentidos, desprovido de conceitos e valores preconcebidos. Mas engana-se aquele que vê nessa postura dele ausência de reflexão, ao contrário, é apenas outra forma de pensar.
“ Sou guardador de rebanhos
O rebanho é os meus pensamentos
E os meus pensamentos são todos sensações.
Penso com os olhos e com os ouvidos
E com as mãos e os pés
E com o nariz e a boca.
Pensar uma flor é vê-la e cheira-la
E Comer um fruto é saber-lhe o sentido.
Por isso quando num dia de calor
Me sinto triste de goza-lo tanto.
E me deito ao comprido na erva,
E fecho os olhos quentes,
Sinto todo o meu corpo deitado no realidade
Sei a verdade e sou feliz.
Olá, guardador de rebanhos,
Ai à beira da estrada,
Que te diz o vento que passa?
Que é vento, e que passa,
E que já passou antes,
E que passará depois,
E a ti o que te diz?
Muita cousa mais do que isso.
Fala-me de muitas outras cousas.
De memórias e de saudades
E de cousas que nunca foram.
Nunca ouviste passar o vento.
O vento só fala do vento.
O que lhe ouviste foi mentira,
E a mentira está em ti.”
O Guardador de Rebanhos nos transmite ou propõe uma forte cosmovisão ao querer reintroduzir aparentemente um mundo pagão no século vinte de um ocidente cristianizado, mas também é certo que não possui uma ordem ou hierarquia de valores como é apanágio do poema épico. Pelo contrário, a sua forma modular permite que o poema se alongue com repetições de motivos que passam de texto para texto não resolvidos ou por resolver, numa recombinação sucessiva onde emerge uma insuspeita temporalidade. Assim, a natureza aleatória das séries sugere que estas são anárquicas, não porque acabem num tumulto de sentidos incompreensíveis, mas porque se recusam a impor uma ordem externa nos assuntos que tratam ou desenvolvem.
Por outro lado, se o poema de Caeiro oferece um texto final de adeus, este final é completamente arbitrário, não decorre de nenhuma progressão temática ou narrativa que o exija ou a venha coroar, nem, por outro lado, de uma finalidade ou intencionalidade, como acontece necessariamente com o poema épico. Além disso, a concatenação dos textos que se seguem uns aos outros não é subordinada, antes denuncia o seu acaso de inspiração.
O Guardador de Rebanhos guarda pensamentos, que são sensações. O símbolo do rebanho é a representação do limite da existência humana, onde reside a liberdade. O que possui rastros do religioso torna-se demoníaco. O símbolo rompe a angústia da separação e busca na dimensão do divino, o divino que se rompera.
Ricardo Reis
Ricardo Reis nasceu na cidade do Porto, em 19 de setembro de 1887. Estudou em colégio de jesuítas, formando-se em Medicina. Politicamente, defendia a Monarquia e, por não concordar com a república, auto-exilou-se no Brasil. Era um amante da cultura clássica, um estudioso de latim, grego e mitologia.
Esses traços biográficos explicam as inquietações que marcam a poesia de Ricardo Reis e que fazem dele um poeta de inspiração neoclássica, horaciano na constante preocupação de “gozar o momento”. A vida se resume a breves momentos, a instantes volúveis; gozar o momento significa aqui, estar atento a tudo o que a vida nos oferece, mas viver serenamente, sem excessos.
“Mas tal como é, gozemos o momento, solenes na alegria levemente, e aguardando a morte como quem a conhece.”
Quão Breve Tempo é a Mais Longa Vida
“Quão breve tempo é a mais longa vida
E a juventude nela! Ah!, Cloe, Cloe,
Se não amo nem bebo,
Nem sem querer não penso,
Pesa-me a lei inimplorável, dói-me
A hora invicta, o tempo que não cessa,
E aos ouvidos me sobe
Dos juncos o ruído
Na oculta margem onde os lírios frios
Da ínfera leiva crescem, e a corrente
Não sabe onde é o dia,
Sussurro
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