Releitura O Pequeno Principe
Por: Victoria Carvalho • 22/11/2016 • Dissertação • 10.010 Palavras (41 Páginas) • 939 Visualizações
[pic 1]
Por muitos anos o maior estímulo que eu tinha para viver era viajar, eu e meu pequeno avião. E na verdade, nunca houve nada de errado nisso, afinal logo eu que desacreditava nos adultos precisava de uma saída desse mundo. Me encontrei nos céus.
Viajei por todos os cantos do mundo, da Inglaterra fria e submersa, para um mundo cheio de encantos. Índia, Japão, Rússia, entre outros lugares. Cada canto que pisei, mesmo com o meu desânimo para desenvolver relacionamentos com pessoas, me esforcei para conhecê-las e tentava usar isso ao meu favor para sobreviver em todos esses lugares, e também para compreender seus costumes. Digo isso pois na verdade o objetivo era sempre mostrar o desenho:
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Provavelmente você deve estar se perguntando porque mostrá-las um chapéu. Na verdade, eu nunca desenhei um chapéu, era algo mais profundo que isso.
[pic 3]
O pouco do meu dom artístico me possibilitou desenhar isso para testar os homens e talvez quem saiba encontrar um de coração puro igual ao de uma criança que com sua inocência consegue enxergar tudo em pouco. Infelizmente minha busca não foi bem-sucedida, em todos os lugares as pessoas me respondiam de maneira hostil que não existia tempo sobrando para ver um desenho infantil de um chapéu.
Triste por ter falhado, resolvi me aventurar por outros ares. A América Latina sempre me pareceu um prato cheio de novidades, então concertei meu velho amigo para deixá-lo pronto para essa nova viagem, que seria a mais longa e difícil de todas. Defini que o Brasil seria meu ponto de partida, e depois de mais o menos um mês e meio, eu estava pronto. Chegou a hora de arrumar as malas.
[pic 4]
Parti numa manhã de terça-feira, o sol estava radiante, um dia propício para me aventurar pelo lugar que sempre me proporcionou lembranças incríveis, o céu.
Viajei por horas sem me cansar, apenas venerando as maravilhas aéreas, desde pequenas aves até nuvens que definitivamente formavam figuras inusitadas. Durante a viagem vi uma se transformando de cachorro em elefante em segundos com o soprar da brisa.
Pousei no Brasil no final de tarde de uma quarta feira, mais especificamente no Rio de Janeiro. As luzes da cidade já estavam brilhando. Logo fui a procura de uma simples pousada, com o pouco de disposição que me restava e apenas uma mala pequena.
Nunca me senti tão confortável em toda minha vida. A cama dura não era páreo à canseira que eu estava sentindo. Naquela noite dormi feito uma criança.
A primeira manhã no Rio foi um tanto quanto calorosa. Fevereiro, no Brasil era verão, e um verão dos quentes. Logo no primeiro dia tive que ir atrás de algum lugar para comprar roupas novas, as minhas não eram adequadas para aquela temperatura. Peguei alguns reais, o suficiente para poder achar um lugar descente para matar a minha fome. Peguei também um livro. Nunca saio sem um livro. Costume tolo de achar que a qualquer hora a vontade de ler vai ser tão grande que terei que parar por aí, em qualquer praça, qualquer cafeteria, qualquer esquina, e ler um pouco. Dentro dele carrego o desenho da jiboia. Sinto mais segurança o levando comigo, do que o deixar por aí, mesmo que guardado. Não está guardado o suficiente se não estou por perto.
Cheguei até a recepção. Uma senhora com um sorriso simpático me indicou um shopping próximo para que eu pudesse matar a minha fome e fazer algumas compras. Consegui pegar o metrô com as indicações em inglês e fui parar em um bairro chamado Barra da Tijuca, que pelo o que havia lido em guias de viagem, era um bairro bem movimentado. Com o dinheiro cambiado e dentro do shopping, fui na busca de encontrar uma loja com roupas casuais e leves, mas era inevitável não observar demais as pessoas. Se mostravam muito receptivas, sorriam demais e pareciam se conformar com o calor e adorar aquilo.
Os cariocas tinham costumes muito peculiares, e me parecia muito natural a maneira que se relacionavam, me senti confortável, mas tive muita dificuldade para me expressar, porém consegui comprar minhas roupas e fui logo embora para o hotel. Após aquela situação conturbada decidi que não frequentaria mais lugares que eu dependesse tanto de pessoas. No dia seguinte segui a dica de um guia e fui visitar a Universidade do Rio de Janeiro que oferecia uma biblioteca com um enorme acervo. Um ótimo local para absorver cultura. Levando um tradutor, sai da pousada para a universidade.
A biblioteca me chamou muito a atenção, decidi entrar e finalmente usar meu livro para emergência. O lugar cheirava a conhecimento, e os exemplares tinham histórias para contar para seu bisavô até seu priminho mais novo. Grande e espaçosa, era coberta de livros até o teto. Sentei-me perto da janela e comecei a folhear meu companheiro.
Depois de duas horas entretido decidi que iria embora. Nesse momento uma moça morena com os olhos amendoados mais lindos que eu já vi, parou ao meu lado. Ela estava vestindo uma saia em tom rosa e uma blusa estampada de margaridas. Por algum motivo eu quis continuar ali. Ela me olhou com os olhos doces e perguntou se o lugar estava vago. Meu português não estava dos melhores, mas respondi que sim, num sotaque bem estranho. Ela percebeu que eu não era dali mas pareceu não se importar e agiu com naturalidade. Ela sentou e sorriu para mim. Eu definitivamente poderia passar mais dez horas naquela livraria.
Perdido com a parte que havia parado, comecei a folhear novamente o meu livro, foi quando vi o desenho da jiboia e inevitavelmente, fiz com que ele escorregasse, e assim ele caiu perto do pé da cadeira dela. Ela gentilmente se inclinou e pegou o meu desenho.
– Belo desenho – ela me disse sorrindo.
– Obrigado, mas não sou tão bom desenhista assim – respondi envergonhado.
– Na verdade, eu acho que você conseguiu retratar muito bem o que queria.
Naquele momento eu pensei “apenas mais uma que viu um chapéu”. Sorri, guardei o desenho e voltei a leitura.
Depois de vinte minutos eu já havia me cansado, arrumei minhas coisas, levantei-me e me despedi com um sorriso de canto. Ela olhou para mim e disse:
– Posso te fazer uma pergunta antes de ir?
– Claro. - Respondi
– Talvez você me julgue, talvez me ache louca. Minha imaginação vai além do que eu enxergo, mas você consegue ver? Isso é uma jiboia engolindo um elefante, não é?!
Naquele momento não pude prestar atenção em mais nada que acontecia em minha volta. Se um meteoro caísse ali, bem no meio da biblioteca, tudo o que eu faria seria continuar olhando para ela. Era ela. Ela era a única merecedora de ouvir a história. A história que eu me privei de contar para qualquer um. Me chamariam de louco. Ela não.
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