Resenha Dom Casmurro

Olhos de ressaca na tela do plin plin.

“De cigana oblíqua e dissimulada...” já dizia o agregado José Dias. Quem já leu a obra mais célebre de Machado de Assis conhece bem esta frase, por ser uma descrição fina e penetrante da alma de Capitu, um labirinto sem saída, um enorme enigma que ainda ninguém desvendou. Falo de um dos livros mais extraordinários da literatura brasileira dos últimos tempos, Dom Casmurro, publicado em 1899, enredo que deixa um grande mistério no ar, afinal: Capitu traiu, ou não, Bentinho, seu amigo de infância e marido?

O livro foi a musa inspiradora da microssérie brasileira – Capitu, apresentada pela Rede Globo de Televisão, em Dezembro de 2008, escrita por Euclides Marinho, é a segunda produção do Projeto Quadrante (a primeira foi “A Pedra do Reino”, realizada pelo diretor Luiz Fernando Carvalho), projeto que pretendia levar a literatura brasileira para a televisão. Pois bem, quem assistiu a série com certeza teve arrepios por ter a impressão de que o próprio Machado de Assis estava ali presente, dirigindo cada capítulo, contado a história de Bento Santiago, o Dom Casmurro, que desde pequeno tem sua vida entrelaçada com a da jovem Capitolina e sofre com o fanatismo de Dona Glória – sua mãe, que depois de ter perdido o primeiro filho faz a promessa de colocá-lo no seminário com a intenção de que vire padre. E ainda com a desilusão de ter sido “traído” pelo seu grande amor com seu melhor amigo Escobar.

A atmosfera criada na superprodução da Globo é digna de Oscar, pois é lúdica e fiel a imagem contida na mente dos leitores da obra. O cenário é caracterizado em tons pastéis e remete algo teatral, juntamente com a maquiagem que não é feita para ser bonita, mas sim mágica e realística ao mesmo tempo. É dividida em cinco episódios, a adolescência que é belamente contracenada com a atriz Letícia Persiles interpretando Capitu e César Cardadeiro no papel de Bentinho, da entrada ao seminário até a vida adulta, onde a atriz Fernanda Cândido faz a personagem mais madura, tal que não poderia deixar de ser, pois seus olhos também são caídos e misteriosos – Olhos de Ressaca. E pelo ator Michel Melamed, que diferente da preferência de outras séries não tem uma aparência galante, e sim um rosto vívido e transparente.

A trilha sonora também é bastante dinâmica e bucólica que vai de músicas internacionais à MPB, como Elephant Gun da Banda americana Beirut e Juízo final de Chico Buarque.

É narrada pelo personagem Dom Casmurro, onde o tal relembra sobre os fatos de sua vida em um trem, simbolizando as passagens póstumas e termina com o fim que todos já aguardavam, com a enigmática pergunta: “Bem, e o resto?”, o resto é que está é a melhor microssérie que a Globo já realizou, e que infelizmente não foi tão bem reconhecida como o merecido o que é uma lástima, já que o nosso país tem um imenso acervo literário que não deveria ser ignorado.

Isabella Ramos Lobão.

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