Sonho de Uma Noite de Verão
Por: Priscila Mota • 19/9/2015 • Artigo • 1.643 Palavras (7 Páginas) • 420 Visualizações
Sonho de uma noite de verão –– W. Shakespeare
A peça teatral trata do gênero cômico-dramático, numa visão do clássico estereótipo do casal de enamorados, que do amor são proibidos, por questões sociais, financeiras e de tratos familiares, comumente firmados pelas aristocracias até o século XIX.
O primeiro ato da cena começa com o diálogo apaixonado, de linguagem rebuscada e apropriada á época, com tons exageradamente apaixonados e poéticos entre dois exemplares da alta classe social, que tem o privilégio de estarem apaixonados um pelo outro, enquanto discutem os últimos detalhes do casamento próximo. Em seguida entra a família que fará parte do tema central de personagens, onde há um triângulo amoroso inserido a ser resolvido, de maneira unilateral.
Na cena II desenrola-se o ensaio para a peça dentro da peça, ou seja, um grupo de comediantes idealiza um espetáculo para entreter o duque e sua esposa futura Hipólita, durante a festa de casamento. O diretor da cena é Quince e o pastelão é Bottom, ou seja, o mais falastrão e egocêntrico, que acha que é o melhor entre todos e se tenta mostrar que é capaz de fazer qualquer papel da cena.
O enredo dessa peça se assemelha a idéia inicial da trama principal, onde se imagina uma tragédia anunciada entre amores não correspondidos, sendo que há o foco na morte dos heróis de forma chocante ao publico que assistirá, como próprio nome propõe, A mais lamentável comédia, a mais cruel morte de Píramo e Tisbe.
O cenário inusitado gira, paralelamente, em torno do mundo de fantasia dos contos infantis, onde elfos, fadas e outros convivem com o mundo dos humanos e o influencia, além do que têm de resolver seus próprios entraves e conflitos de interesses. Eles não são meros personagens de segundo plano, deixam sua marca quando se equiparam a deuses gregos ou reis romanos, onde têm seus súditos e “fiéis escudeiros” a lhe servirem e realizarem os desejos.
Em um conto infantil, quando existem fadas, duendes e elfos, estes, geralmente são espécies de benfeitores, que ajudam os heróis a vencerem seus intentos ou batalhas, colaborando para um final feliz. No caso do enredo shakesperiano, há uma inversão de propósitos.
A Rainha dos elfos, Titânia, esta num conflito pessoal, em que tem decidir em proteger uma criança que ficou sob seus cuidados e resistir ao pedido de seu marido, o Rei dos Elfos, Oberon, que por ciúme e egocentrismo, quer que ela ceda as suas vontades e para isso, está disposto a usar de magia para enganá-la, porém ao confiar a tarefa a seu súdito Puck, não sai como esperado.
ELEMENTOS PARADOXAIS DA TRAGI-COMÉDIA SHAKESPERIANA
Diante dos principais atos que serão desenrolados durante a história, é preciso caracterizar em que se baseia a sua essência, bem como as características intrínsecas de cada personagem central, o que os motiva e qual agrupamento cujo significado o autor quer dar a vida aos seus personagens e como ele deseja interagir com os espectadores, seja pela tentativa de passar uma idéia, uma didática, moralidade ou simplesmente causar surpresa ou ser surpreendido pelo publico.
A temática se entretém em meio a varias facetas: amores proibidos, amores não correspondidos, casamento por conveniência paterna, o medo da tragédia iminente ou de um escândalo, ofensa a honra, traição de confiança, inveja, lealdade ao amor devotado, ciúme, gratidão, peraltices, trapalhadas, orgulho e entretenimento.
Além desses elementos, o espetáculo em si, como forma, tenta prender a atenção da platéia com efeitos visuais e sonoros, como a dicção e modo de falar de seus personagens, não meramente ao acaso.
Estabelece-se uma posição paradoxal, elemento essencial á tragédia, que é a posição do pai de Hérmia com relação a sustentar a palavra dada ao cavalheiro que prometeu sua filha em casamento e ceder ao desejo da filha com relação a um amor que ela mesma escolheu. Para se esquivar disso, pede ajuda ao duque de Atenas, se eximindo da culpa do confronto. E será que o próprio duque não se contradiz intimamente, quando decide pela lei dos costumes, em detrimento aos sentimentos dos jovens apaixonados, quando ele mesmo esta se casando por amor? Há ai o choque de moralidade: um socialmente necessário e o outro em obedecer ao que seu coração pede, uma vez que ele mesmo esta indo pelo segundo caminho, embora sem infringir o primeiro.
Eis o momento propício á aludida tragédia, pois quem infringe às leis esta sujeito a pena de morte. Para Hérmia restam duas escolhas: o cárcere de um convento ou a fuga para outras terras, uma vez que ela não deseja aceitar o casamento imposto com Demétrio.
Mas, de acordo com Heliodora (2004), em suas reflexões sobre as tragédias: “Em função do domínio universal da Igreja Católica na Europa Ocidental, não existiu tragédia na Idade Média, e a forma dramática que mais se aproxima dela é a “moralidade”, que se preocupava essencialmente com a morte e salvação da alma.”
A partir daí entra em cena outra situação conflitante, em que Helena, a desprezada de Demétrio, trai a confiança de Helena e Lisandro, prestando lealdade a seu idolatrado amor, contado-lhe sobre a pretendida fuga do casal. Ora, nesse momento, ela poderia compartilhar de tamanha alegria, por ser uma oportunidade única de ter o caminho livre para conquistar Demétrio, porém, ela opta pelo caminho da delação para obter certa admiração no íntimo dele, mesmo correndo o risco de haver uma tragédia ou ele conseguir se casar com sua devotada Hérmia.
Nessa cena, observa-se o conflito de diversos sentimentos e valores. Para Rosenfeld (1969), essa contraposição é divergente daquele tipo de comédia pessimista com relação à vida:
Mas há, em contraposição, valores positivos, igualmente substanciais – a lealdade, a ordem, a moderação, a serenidade, a gratidão, a justiça, a sabedoria – e é precisamente o choque de forças positivas e negativas, ambas poderosas e de maciça realidade, que constitui a tragicidade deste universo [...].
Essa anti-heroína mostra grandeza, nem tanto de caráter, mas de força, por suportar tal sofrimento, humilhação, desprezo e ainda ajudar o próprio Demétrio a impedir os amantes de fugir, mesmo contra a vontade dele.
Conjuntamente á idéia do paradoxo, na peça dentro da peça, o nosso protagonista Bottom, faz o papel herói e anti-herói ao mesmo tempo. Como anti-herói ele implica com as falas de todos os personagens da peça, fazendo chacota e dizendo que poder fazer melhor que qualquer um ali, fazendo uma espécie de sabotagem á equipe.
Dentro do contexto do ensaio, já na floresta, que é o refúgio das fadas e dos seres que protegem a natureza, Bottom é a vítima ideal da “peça” pregada por Puck, que lhe joga um pó mágico e lhe insere orelhas de asno, mostrando que toda a pujança, soberba, altivez e encenação dele, o deixa demasiado seguro de si, porém, em contra-senso, torna-o vulnerável.
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