Melhorar a alfabetização de usuários de variedades linguísticas não padronizadas
Pesquisas Acadêmicas: Melhorar a alfabetização de usuários de variedades linguísticas não padronizadas. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: albanes • 15/5/2014 • Pesquisas Acadêmicas • 4.633 Palavras (19 Páginas) • 297 Visualizações
O presente trabalho procura mostrar que a falta de atividades nas aulas de língua materna com a modalidade oral em contraponto com a modalidade escrita por meio de gêneros discursivos adequados, que a falta de uma maior dedicação à leitura e à escrita e de uma proposta de ensino que respeite as variedades da língua são fatores que contribuem para que os alunos não consigam distinguir a gramática da modalidade oral da gramática da modalidade escrita, o que compromete o processo e aquisição de letramento de usuários de variedades lingüísticas não padrão. Como fatores causas, entre outros, apontamos o despreparo técnico-didático-metodológico do professor, que insiste em um ensino ainda “gramatiqueiro” descontextualizado, e ignora que o ensino de língua vai além do ensino da gramática normativa tão somente e que o oral é tão importante quanto o escrito no convívio social em que os alunos se encontram. Mesmo porque, em geral, as categorias de erros, segundo Bortoni-Ricardo (2005), estão relacionadas aos aspectos fonológicos, mais precisamente ligados à questão da grafia, ou seja, aos aspectos convencionais da língua, que são equivocadamente confundidos e apontados como erros de língua e atribuídos às variedades não padrão, fazendo parecer que a grafia é algo natural e não convencional, e que de fato se escreve como se fala, quando na verdade se trata de falha lacunar do próprio sistema de convenção que não consegue estabelecer uma relação biunívoca entre fala e escrita a contento. Assim, o processo de letramento é comprometido à medida que o professor de língua materna não consegue apreender e trabalhar com ambas as modalidades e levar os alunos a dominarem e a diferenciarem-nas em seus vários aspectos e peculiaridades.
Normalmente os erros presentes na escrita que marcam tanto os textos dos alunos são de caráter fonológico, mais precisamente e freqüentemente ligados à ortografia e à acentuação gráfica. Tal fato nos leva a levantar a hipótese de que tais erros são motivados pela modalidade oral que os alunos dominam tão bem e pela artificialidade da convenção gráfica que apresenta falhas, lacunas que de fato não atendem a totalidade do oral. As formas lingüísticas da oralidade, porém, são confundidas com as variedades não-padrão da língua das quais os alunos são usuários e anotadas como erros de português pelos professores.
O que leva o professor, equivocadamente, a estabelecer uma relação entre formas lingüísticas características da oralidade e variáveis lingüísticas com erros de português? Os textos orais, em geral, são tomados como aqueles marcados pela informalidade e, dizem os professores, são mais passíveis de erros de língua e toleráveis porque não há um rigor quanto à observância das regras gramaticais, assim, pode se fazer uso dos níveis coloquial e familiar, não observando as exigências que o texto escrito requer. O que implica dizer que, no contraponto com a modalidade formal, esta está para a escrita e, portanto, deve-se precisar pelo rigor que ela exige e no nível culto/padrão. Ou seja, se estabelece a relação:
Oral/língua falada → informal → variedades não padrão
Escrita/língua escrita → formal → variedade culta/padrão
o que não está necessariamente correto. O que defendemos aqui é o ensino da modalidade lingüística (oral/escrita) atrelada à variedade (não padrão/padrão) adequadas ao gênero discursivo que a situação de uso (ou contexto) requer.
A falta do hábito da leitura e da escrita como uma proposta de prática social e uma necessidade real de interferência e atuação no cotidiano, e a ausência de um trabalho com gêneros discursivos reais que caracterizem essa prática, é uma conseqüência da falta de um preparo técnico-didático-metodológico do professor, que se verifica desde a alfabetização e se prolonga pelas séries subseqüentes. Sem o domínio necessário de conhecimentos lingüísticos, leitura e de produção de textos, tanto orais quanto escritos, não sejam significativos. A leitura e a escrita não têm o espaço devido nas aulas de português. Ainda prevalece nas escolas o ensino de regras gramaticais sem qualquer adequação dos conteúdos a um determinado gênero real ou não, pelo contrário, ainda se mantém preso a um ensino tradicional. Das duas modalidades de textos, a oral não é sequer cogitada.
Fala e escrita são duas instâncias diferentes da linguagem, mas que andam lado a lado e que em determinados momentos se associam mutuamente. Segundo Kato (2002), a escrita e a fala são realizações de uma mesma gramática da língua, mas há variação na forma pela qual as atividades lingüísticas são distribuídas entre as duas modalidades devido a diferenças temporais, sociais e individuais.
Neste trabalho, procuramos mostrar que a falta de atividades nas aulas de língua materna que explorem a gramática da oralidade em contraponto com a gramática da escrita por meio de gêneros discursivos adequados, que a falta de uma maior dedicação à leitura e à escrita (momentos essenciais) e de uma proposta de ensino multidialetal da língua são fatores que contribuem para que os alunos não consigam distinguir a gramática da modalidade oral da gramática da modalidade escrita, o que compromete o processo de letramento. Assim, autores como Ramos (2002), Kato (2002), Soares (2004, 1997), Bortoni-Ricardo (2005), Marcuschi (2001) e outros são base para uma reflexão e análise das relações escrita/oralidade, alfabetização/letramento, variedades lingüísticas/norma culta/padrão.
O Oral e o Escrito e as Variedades Lingüísticas: o Quê? Como? Por quê?
A cultura ocidental está fundamentalmente baseada na cultura letrada escrita. Quiçá mais do que a cultura oriental, há uma supervalorização do escrito que se sobrepõe ao oral, daí aquele ter um prestígio maior em relação a este. A oralidade nunca será da mesma forma que a escrita. É preciso entender, principalmente os professores de língua materna, que a escrita é uma tentativa de representar graficamente, por meio de símbolos convencionais (letras), criados pelo homem, os sons (fones) que produzimos naturalmente, mas por meio de aprendizagem.
O ensino escolar está essencialmente direcionado para uma aprendizagem da escrita e a oralidade, é marginalizada a um segundo plano ou simplesmente não é tomada como ‘matéria de ensino’ nas aulas de português. Raras são as atividades de língua que exploram a oralidade do/no aluno. Quando muito, fica apenas nas leituras em voz alta, o que nem todo aluno participa por diversas razões ou tão pouco caracteriza
...