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Devaneios

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Por:   •  18/9/2013  •  Tese  •  703 Palavras (3 Páginas)  •  300 Visualizações

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Cansada de sonhar de olhos abertos, uma leitora, Ana, quer saber mais sobre devaneios: "Por que acabo sempre fugindo para esse lugar fictício, onde tudo pode ser tão melhor ou pior, um mundo do que poderia ser, do que poderia ter sido, da pior hipótese fantástica, pretéritos imperfeitos, mais que perfeitos, futuros incertos -e quando vejo, perdi tanto tempo com isso?".

Tenho carinho pelos sonhos de olhos abertos. Até o começo da adolescência, o devaneio era meu aliado contra o que me parecia ser a mediocridade do mundo.

Para mim, como para Ana, o devaneio era o país de onde eu vinha (minha origem escondida) ou minha pátria futura; de um jeito ou de outro, era meu passaporte para um outro mundo, que me salvaria de meu lugar e de meu presente.

Graças ao devaneio, assisti a centenas de aulas chatérrimas aparentando minha absoluta atenção (embora de olhos um tanto vidrados). Quando atravessei a dolorosa época em que os adolescentes menosprezam os seus pais, o devaneio me consolou, alimentando a certeza de que eu, de fato, pertencia a outra família.

Enfim, à força de contar histórias para mim mesmo, aprendi a contá-las para os outros.

O que fez com que, aos poucos, meu devaneio se acalmasse (por sorte, sem se exaurir)? Será que eu "amadureci"? Ou será que as aulas, o trabalho e os amores se tornaram interessantes, e a necessidade de sonhar diminuiu?

Na hora de explicar o excesso de devaneio, o adolescente tende a acusar a realidade na qual ele vive, a qual mereceria o enfado que ela lhe inspira.

Mas, em geral, não há realidade enfadonha, apenas indivíduos enfadados, que, por alguma razão, não enxergam o encanto possível do dia a dia.

Ao devanear, eu me afasto da realidade. Por outro lado, sem devanear, mal consigo inventar e desejar realidades diferentes. O que é pior? Entre renunciar a devanear e sucumbir ao devaneio, talvez seja pior renunciar a devanear.

Infelizmente, enquanto a gente sonha sossegado, alguns se esforçam para transformar o devaneio num transtorno, se não numa doença. Desde um texto de 2002 no "Journal of Contemporary Psychotherapy" (revista de psicoterapia contemporânea, http://migre.me/cjDUi), monitoro a ascensão do

"transtorno" de devaneio excessivo e "mal-adaptativo" (ao mesmo tempo, desadaptado e capaz de comprometer nossa adaptação ao mundo).

Rapidamente, os blogs se multiplicaram -tanto de pessoas se queixando de seus devaneios excessivos como de médicos interessados em registrar o novo transtorno e propor uma cura. Dez anos atrás, o devaneio era considerado como fuga de um provável abuso infantil. Hoje, é possível ser sonhador sem ter sido abusado; é um alívio.

No fim de 2011, foi publicada, em "Consciousness and Cognition" (consciência e conhecimento), uma pesquisa detalhando o sofrimento dos sonhadores compulsivos (http://migre.me/ciyPG): blogs e sites fizeram uma festa.

Aprendemos que os sonhadores de olhos abertos sentem vergonha de sua condição. Eles se escondem, mas podem ser identificados porque, sem se dar conta, enquanto sonham, eles atuam seus devaneios em gestos e palavras (ou seja, falam sozinhos).

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