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ESTUDO DE CASO COM BASE NO REFERENCIAL TEÓRICO DE WILFRED RUPRECHT BION

Por:   •  28/5/2015  •  Trabalho acadêmico  •  2.134 Palavras (9 Páginas)  •  1.770 Visualizações

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ESTUDO DE CASO COM BASE NO REFERENCIAL TEÓRICO DE WILFRED RUPRECHT BION

O CASO:

“João, de nove anos, foi levado para consulta, pela tia – responsável por sua guarda - por apresentar graves problemas comportamentais. Juntamente com sua irmã, Maria, presenciou o assassinato da mãe pelo próprio pai quando tinham três anos e um ano, respectivamente. A mãe foi asfixiada e as crianças ficaram com ela por três dias consecutivos até serem socorridas pelos vizinhos. Foram encaminhadas a um abrigo e adotadas um ano depois. O pai adotivo batia nas crianças e recebiam maus tratos da mãe adotiva. A empregada do casal denunciou o ocorrido, tentou adotá-los, mas não conseguiu. Atualmente, a tia Dirce (irmã da mãe) conseguiu a guarda de João e Maria. Além dos dois sobrinhos, mora com seus dois filhos biológicos e o marido. A tia relata que sabe pouco sobre a vida pregressa do sobrinho, mas lembra-se que a mãe procurava cuidar das crianças, mas apresentava alterações de humor e aparentava fragilidade devidos as frequentes brigas com o marido. Na escola, João apresenta muito problemas comportamentais e de aprendizagem. É extremamente agressivo com a professora e os colegas, além de ter baixo rendimento escolar. Em casa, também é agressivo, não assume a responsabilidade por suas atitudes, se esconde, faz necessidades na cama.

ANÁLISE DO CASO JOÃO:

Sem alterar os conceitos básicos que transformaram a psicanálise em ciência, Wilfred Ruprecht  Bion, aprofundou e ampliou diferentes conceitos da psicanálise, que após Freud, já haviam recebido inúmeras contribuições teóricas de vários outros autores, principalmente, Melanie Klein, Lacan e Winnicott.

A diferença em Bion foi ele ter entendido que já havia um excesso de teorias na psicanálise e resolveu selecionar alguns elementos básicos e combiná-los, acreditando que o resultado desta combinação poderia ajudar as diferentes dinâmicas que cada sujeito vai construindo em direção à sua subjetividade. Ou seja, Bion substitui as diversas teorias por “modelos” mais simplificados, porém utilizando os elementos básicos da psicanálise.

O tema da análise infantil não foi tratado diretamente por Bion, mas seus textos despertam o interesse de analistas que tratam de dinâmica de grupo, dos que trabalham com crianças, inclusive as bem pequenas, e os que trabalham com adolescentes e com pacientes psicóticos, por ter sido um dos autores que mais se dedicaram a estudar e explicar a constituição da mente primitiva.

Para Bion a prática da psicoterapia em grupo e com crianças tem um tipo de escuta diferente da terapia individual devendo estar voltada, inicialmente, sobre o continente antes de levar em consideração os conteúdos.

Norman, Johan, citado em França, Maria, 2001, concorda que a teoria preconizada por Bion do "sem memória e sem desejo", do uso do silêncio, da não explicação do presente pelo passado e, principalmente, do trabalho clínico voltado para a experiência emocional do fazer analítico é o melhor caminho para a análise com crianças.

Continuando com França, 2001, para o autor acima citado, a importância da capacidade de rêverie do analista e a necessidade da concepção de um objeto continente internalizado deve ser destaque no trabalho psicanalítico.

A análise do caso em apreço se propõe a seguir Bion através dos seus conceitos, buscando fazer uso, principalmente, sobre o conceito de continente, identificação projetiva, função alfa, traumas físicos e psicológicos, parte psicótica da personalidade e da aplicabilidade destes conceitos à psicanálise infantil relacionando-os às Implicações na Prática Analítica.

Bion designa a PPP - Parte Psicótica da Personalidade, não como uma questão psiquiátrica, mas como um modo de funcionamento mental que coexiste em todo ser humano junto com outras formas de funcionamento. Assim, Bion define todo o paciente psicótico como tendo uma parte neurótica em sua personalidade e os pacientes neuróticos também possuindo uma parte psicótica oculta.  

Dentre as características presentes na PPP é possível que João esteja começando a apresentar algumas delas, de modo que o auxilio terapêutico, pode beneficiá-lo para que estas características não se cristalizem ao longo de sua vida.  São elas:

  1. Baixa tolerância as frustrações, João não conseguiu lidar com a morte da mãe, no lugar de modificá-las;
  2. A onipotência e onisciência substituem o processo de aprender com a experiência – João se recusa a aceitar o que não pode modificar, a morte da mãe, o abrigo, os maus tratos, o pai assassino e reage como se ele tudo pudesse, sem aceitar limites, como se ainda fosse sua majestade o bebê;
  3. A pouca capacidade de descriminação o impede de compreender a situação, levando-o a uma confusão entre o verdadeiro e o falso, tanto do próprio self como do que está no mundo externo;
  4. Fuga á verdade, prevalecendo à negação através de distorções, não aceitando limites e se comportando de forma hostil tanto no meio sócio-familiar e educacional.

Melo, Franciele em “Aprendendo sobre Bion”, 2011, nos conta que Bion em sua prática clínica chegou à conclusão de que os pensamentos não existem sem as emoções, e que é necessário que exista na mente uma função que construa o sentido das experiências emocionais. Essa função, à qual ele denominou  de vinculo K é o conhecimento. Uma criança pode aprender a tolerar e a modificar a realidade com a atividade do pensar e do conhecer.

João parece não estar apto a fazer este movimento em direção ao pensar. Não conseguiu ainda tolerar a realidade, uma vez que esta lhe foi muito amarga, não estabeleceu um vinculo satisfatório com a mãe nos primeiros momentos de vida, ter assistido o pai assassinar a mãe e ficado junto ao corpo por 03 dias, ter ido para um abrigo e posteriormente, ter sido maltratado pelos pais adotivos até ser recebido na casa da tia. É natural, portanto, que João não veja sentido nas suas experienciais reais e emocionais e tenha abstraído tais experiências de seus pensamentos por não conseguir tolerá-las.

Melanie Klein teorizou sobre o impulso inato do ser humano ao conhecimento e Bion sobre o impacto mental da qualidade emocional do conhecimento. Os profissionais que se ocupam com a idade evolutiva, diante do caso João, certamente haverão de refletir acerca da impossibilidade de João possuir uma qualidade mental satisfatória em termos de pensar e adquirir conhecimento sobre o seu pensar, como conseqüência, do impacto sofrido decorrente da possível ausência de vinculo com a mãe e seu posterior assassinato.

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