Psicologia E Senso Comum
Pesquisas Acadêmicas: Psicologia E Senso Comum. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: ana0601 • 15/4/2013 • 7.329 Palavras (30 Páginas) • 1.035 Visualizações
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O QUE É QUE A PSICOLOGIA CIENTÍFICA TEM
QUE A PSICOLOGIA POPULAR E O SENSO COMUM NÃO TÊM? (1)
Amâncio da Costa Pinto
Faculdade de Psicologia e C. da Educação, Universidade do Porto
Resumo
A relação da psicologia científica com o senso comum é complexa. Os detractores
da psicologia afirmam que de psicologia todos sabemos um pouco, que a psicologia não
passa de um senso comum esclarecido, que tem por objectivo confirmar o óbvio e em redescobrir
o que já se sabe. A psicologia científica responde ao senso comum
demonstrando as contradições expressas em vários provérbios, aponta a indefinição de
fronteiras e das circunstâncias em que se aplica, apresenta resultados de investigações
psicológicas contra-intuitivos e ressalta a existência de áreas em relação às quais o senso
comum pouco ou nada tem a dizer, como a neuropsicologia e a psicologia cognitiva
experimental. O artigo discute estes argumentos, analisa as contradições do senso comum
em provérbios portugueses, descreve 10 resultados contra-intuitivos da psicologia
cognitiva e defende em conclusão o distanciamento da psicologia científica face ao senso
comum.
PALAVRAS-CHAVE: Psicologia científica, psicologia popular, senso comum, provérbios,
investigação contra-intuitiva.
Psicologia popular
Um dia ao viajar de táxi e a meio de uma conversa animada sobre um tema qualquer
da actualidade, o motorista perguntou-me indirectamente qual era a minha profissão:
“Você por acaso não é advogado?” “Não, — respondi eu — Sou professor de
psicologia”. “Psicologia, grande curso!” — disse o motorista. E continuou, “Sabe, eu
acho que tinha jeito para a psicologia. Uma pessoa na minha profissão não se safa se não
tiver uns bons conhecimentos de psicologia”.
Em certa medida o taxista tem razão. Se se considera a psicologia como o estudo do
comportamento, então as observações do taxista sobre o comportamento das pessoas
que conduz ou talvez recuse conduzir, constitui uma parte potencialmente importante da
sua profissão, conforme referiu Baddeley (1984) ao reflectir sobre uma situação
quotidiana semelhante.
(1) Publicação: [Pinto, A. C. (1999). O que é que a psicologia científica tem que a psicologia
popular e o senso comun não têm? Psicologia, Educação e Cultura, 3 (1) 157-178.]
(2) Partes deste artigo e dos artigos de Félix Neto e Orlando Lourenço foram inicialmente objecto de
uma comunicação e debate na Casa de Cultura de Paranhos, Porto, em 24 de Abril de 1998.
Estudo realizado no âmbito do Projecto FCT, nº 113/94.
Morada (address): Faculdade de Psicologia, Universidade do Porto, R. Campo Alegre, 1055, 4169-
004 Porto, Portugal. Email: amancio@psi.up.pt.
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Pensando melhor, a avaliação do taxista podia ser feita por qualquer pessoa, na
medida em que a sobrevivência da espécie humana depende de uma interpretação
adequada das reacções dos nossos semelhantes quando interagimos uns com os outros.
Uma percepção correcta de como as pessoas agem e se comportam é uma vantagem
considerável nas interacções sociais. Em geral, de psicologia todos sabemos um pouco,
do mesmo modo que julgamos saber de educação, gestão, futebol e televisão. De onde
nos vem este conhecimento psicológico?
Cada vez mais diariamente somos bombardeados com telenovelas, músicas,
canções, programas de TV, conferências e debates, livros, revistas e jornais a tratarem de
psicologia, comportamento, dificuldades de relacionamento, sexo, paixão e dinheiro,
ódio, ciúme e tragédias, sucesso e felicidade. Por muito desatenta que uma pessoa seja,
alguma desta informação irá transitar ou ser absorvida subrepticiamente pela mente das
pessoas (e.g., Fletcher, 1995). No que se refere à psicologia, o problema não está no
pouco que sabemos, ou no muito que julgamos saber, mas antes em julgar que sabemos o
suficiente e de modo preciso e correcto. Estará fundamentado o que julgamos saber? Será
que podemos aplicar os conselhos gerais ao nosso caso? Será que também sabemos de
outras áreas, como a física ou a química?
Voltando ao taxista para servir de exemplo, este profissional tem outros
conhecimentos práticos, além da psicologia, igualmente importantes como o
conhecimento da aceleração e da desaceleração do carro, dos efeitos da gravidade nas
descidas e das forças centrífugas e centrípetas nas curvas da estrada (Baddeley, 1984).
Apesar de tudo isto, poucos serão os taxistas que ao encontrarem-se com um professor
de física dirão: — “Eu acho que tinha jeito para a física”.
Segundo Baddeley (1984) a diferença entre as duas situações
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