Assistência social: de ação individual a direito social
Pesquisas Acadêmicas: Assistência social: de ação individual a direito social. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: YasmimLorraneRoc • 3/11/2014 • Pesquisas Acadêmicas • 1.445 Palavras (6 Páginas) • 254 Visualizações
ASSISTÊNCIA SOCIAL: DE AÇÃO INDIVIDUAL A DIREITO SOCIAL
Introdução
A construção da assistência social como política pública no Brasil é um compromisso
constitucional cuja concretização vem se arrastando há quase 20 anos. De fato este é um tema
com forte estigma desde sua nomenclatura. É interessante notar, porém, que muitos sugerem
a mudança do seu nome para promoção, desenvolvimento, ação, inclusão, inserção, sempre
apostos ao termo social. Chegam até, a realizar a mudança da nomenclatura “assistência
social” no órgão ou organização em que tem autoridade de gestão, mas não alteram seus
procedimentos. Considero que são as heranças nos procedimentos da assistência social que
devem ser rompidas e resignificadas sob novo paradigma, e não propriamente sua
nomenclatura.
Em 50%, ou mais, dos municípios brasileiros, é ainda a esposa do prefeito a gestora da
assistência social, acumulando, em 20% dos casos, a Presidência do Conselho Municipal de
Assistência Social, órgão criado em atenção ao artigo 204 da CF-88 para proceder ao
democrático controle social da gestão de um órgão e uma política que se quer pública.
As discussões e matérias atuais da mídia sobre programas governamentais de
transferência de renda têm sido generosas em criticá-los, usando como argumento pejorativo
o enquadramento como ações de assistência social, o que os tornaria instrumentos de
dependência e assistencialismo.
Não está incorporado na nomenclatura “assistência social” o conteúdo de seguridade
social que lhe foi atribuído na CF-88.
Comentaristas de traço conservador — e mesmo aqueles que se reconhecem como de posições ideológicas mais à esquerda — caracterizam a assistência social como uma área subordinada à ordem econômica, substituta do trabalho, e não como pertencente à ordem social, portanto, afiançadora de condições de defesa dos direitos próprios à defesa da dignidade humana.
* Professora titular da PUC/SP de Pós Graduação em Serviço Social. Coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas de Seguridade e Assistência Social da PUC/SP – NEPSAS. Coordenadora do CEDEST – Centro de Estudos das Desigualdades Socioterritoriais (INPE-PUC/SP). Secretária Municipal de Assistência Social de São Paulo (2002/2004).
ASSISTÊNCIA SOCIAL: DE AÇÃO INDIVIDUAL A DIREITO SOCIAL ALDAÍZA SPOSATI
436 Revista Brasileira de Direito Constitucional – RBDC n. 10 – jul./dez. 2007
A assistência social parece ser tratada com menos crítica, ou mais conforto, quando é comentada no âmbito das velhas práticas patrimoniais. Estas parecem ser inerentes às damas, principalmente às primeiras, como são denominadas as esposas de governantes eleitos em sociedades marcadas pelo sexismo ou pela hierarquia dominação/subordinação entre os gêneros masculino e feminino. Fica confortável, também, a ponderação sobre a assistência social quando colocada no âmbito da filantropia de patronos, eclesiais ou leigos, empresários ou benfeitores. Nas duas situações ela parece perfeitamente harmoniosa e própria à relação onde o doador tutela ou subordina aquele que recebe a doação.
Reconhecer todos iguais perante a lei parece valer no Brasil — ainda que em parte —
mais para situações do crime e da transgressão do que para a garantia de direitos sociais ou de
cidadania. Nesse caso, o poder do dinheiro e o conseqüente acesso ao consumo de serviços
privados se colocam como valores que desvalorizam o vínculo entre cidadania e acesso aos
serviços sociais públicos. Desmercadorizar a proteção social é apresentado como objetivo
assistencialista e pejorativo ao desenvolvimento da nação. Alguns que se consideram mais a
esquerda tratam a proteção social não contributiva como moeda compensatória à
desqualificação do trabalho presente na lógica de produção capitalista.
Séculos de práticas sociais fragmentadas individualizadas tuteladoras que foram sendo
designadas como de assistência social geram grande confusão no senso comum entre práticas
assistencialistas e a proposição da política pública de assistência social presente na CF-88. Por
decorrência, as práticas, públicas ou privadas, que têm sido apresentadas como de assistência
social não coincidem com as referências a uma política de direitos de cidadania. De fato reside
razão, em parte, a essa crítica por decorrência da presença persistente de costumes
conservadores nas relações sociais no Brasil. O confronto deve ocorrer, porém, contra a
presença do conservadorismo tutelador, mas não com a assistência social e seu potencial em
provocar a extensão do acesso a direitos e reconhecimento de cidadania caso seja tratada
como política pública de direitos à proteção social não contributiva.
1. Assistência social como política de Estado
Entre o plano legal e o plano real, o plano institucional e o político-econômico-social, da
construção das políticas pública de assistência social, existem significativos intervalos nos
âmbitos da compreensão, interpretação e diferenciação entre os tipos de projetos políticos
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