O BINÔMIO MÃE - BEBÊ NA UTI NEONATAL: A MÃE QUE EU
Trabalho Universitário: O BINÔMIO MÃE - BEBÊ NA UTI NEONATAL: A MÃE QUE EU. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: • 10/4/2014 • 9.849 Palavras (40 Páginas) • 770 Visualizações
RESUMO: Este projeto surgiu da preocupação com o elevado número de nascimentos de bebês prematuros e de baixo peso; assim este
trabalho foi realizado com o propósito de observar se a freqüência e permanência das mães de RNs prematuros na UTI neonatal interferem
no desenvolvimento do bebê e no tempo de internação na unidade. Realizou-se com base no método de observação direta do comporta-
mento das mães, utilizando-se o modelo desenvolvido por Esther Bick. A amostra populacional foi selecionada no Hospital Universitário de
Maringá, na UTI neonatal, sendo o estudo realizado com 6 duplas, no período de novembro de 2003 a fevereiro de 2004. Os resultados
indicam que a freqüência da mãe na unidade não é o único fator responsável pelo desenvolvimento do bebê prematuro.
PALAVRAS – CHAVE: relação mãe-bebê; vinculo afetivo; mãe suficientemente boa; díade
MOTHER – BABY IN THE NEONATAL INTENSIVE CARE BINOMIAL: THE MOTHER
THAT I HAVE AND THE MOTHER THAT I NEED
ABSTRACT: This work came about from the concern with the high number of births of premature and underweight babies. Thus, this work
was carried out with the objective to observe if the frequency and the permanency of mothers in the neonatal intensive care (NIC) interfere with
the premature neonates development and the time the baby stay in the unity. The direct observations of the mothers’ behavior were carried out
according to a model developed by Esther Bick. The population sample of six pairs of mothers-babies was chosen from the NIC at Maringa’s
University Hospital in the period from November 2003 to February 2004. The results indicate that the mothers’ frequency in the unity is not the
only factor responsible for the premature baby development.
KEYWORDS: mother-baby relationship; affective link; sufficiently good mother; pairs
INTRODUÇÃO
ros, um terço dos quais morre antes de completar um ano de vida.
No Brasil, segundo o jornal Folha de São Paulo, cerca de 60% dos
Atualmente há um número elevado de nascimentos precoces,
e estimativas da Organização Mundial de Saúde (OMS) apontam
que anualmente nascem no mundo 20 milhões de bebês prematu-
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bebês que nascem prematuros sobrevivem graças ao contato mais
intenso entre a mãe e o filho no período de hospitalização.
Assim, há um interesse cada vez maior em se compreender a
Acadêmica do Curso de Psicologia do CESUMAR - Bolsista do Programa de Bolsas de Iniciação Científica do Cesumar (PROBIC)
Professora mestre do Curso de Psicologia do CESUMAR, orientadora.
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O Binômio mãe – bebê na UTI neonatal...
importância da presença da mãe na UTI neonatal e de que forma Para Cunha (2004), o recém-nascido, na UTI, está imerso no
essa intervenção atua no desenvolvimento do recém-nascido pre- isolamento e solidão da incubadora, que o impede de criar um
maturo e de baixo peso. espaço psíquico com uma figura receptora de sua angústia, que
Estudos já realizados, como os de Klaus e Kennell (1992), Bee
possa ajudá-lo a organizar seu ego.
(1996) e Bowbly (1984), enfatizam a importância de se estabelecer Para o bebê a incubadora fará o papel de placenta materna,
uma relação entre a mãe e o bebê, com base em um vínculo porém isso não o impede de receber estímulos, muitas vezes per-
afetivo, já que este contato mais íntimo permite ao bebê um senti- cebidos de forma negativa, pois não há contado direto com a mãe.
mento de proximidade e segurança, além de estimular mecanis- Isso porque a vida na UTI é muito diferente da do útero materno e
mos sensoriais e imunológicos que irão repercutir de forma decisi- traumática para o bebê; tanto que Wirth ( 2003 ) afirma que a vida na
va no seu desenvolvimento. UTI é hiperestimulante e que o bebê pode senti lá certa agressivida-
Diante desses dados e do conhecimento de que a relação mãe-
bebê fortalece o vínculo afetivo e influencia o desenvolvimento psi-
de, já que a luz é forte, os ruídos são desconhecidos e os cuidados
são dolorosos.
comotor do recém-nascido, definiu-se a realização desta pesqui- Não obstante, existem autores, como Spitz (2000), segundo os
sa, que tem por objetivo verificar se a freqüência e permanência quais o recém-nascido não reconhece o mundo externo, pois seu
das mães de recém-nascidos na UTI neonatal interferem no de- aparelho perceptivo é protegido do mundo exterior por uma “barrei-
senvolvimento do bebê e no tempo de internação na unidade. ra de estímulos”. O próprio Spitz levanta a hipótese de que os estí-
Frente a esse objetivo é importante que se apresente a funda- mulos vindos de fora só são percebidos quando seu nível de inten-
mentação teórica na qual se fundamentou o estudo: a definição de sidade excede o limite normal da barreira de estímulos, o que des-
prematuridade, suas implicações e desdobramentos, e a relação truiria a quietude do recém-nascido, fazendo-o reagir violentamente
mãe-bebê e o vínculo afetivo, para que se possa entender o que a esse desprazeres.
ocorre com o bebê prematuro e sua mãe na UTI neonatal.
Se levarmos em consideração a afirmação de Wirth (2003) de
que o bebê sofre na UTI, em média, 130 manuseios por dia e os
1. A PREMATURIDADE
sons de uma UTI giram em torno de 80 db , ou seja, está exposto
a uma quantidade de estímulos excessivos, podemos levantar a
O parto prematuro é aquele que ocorre antes do fim do desen- hipótese de que os estímulos vindos da UTI rompem com esta
volvimento fetal. Sendo assim, segundo Davidoff (2000,), conside- “barreira de estímulos” descrita por Spitz, e isso destrói a quietude
ra-se um bebê prematuro o que nascer com menos de 37 sema- do recém-nascido prematuro e o leva a perceber o mundo externo,
nas de gestação e pesar menos de 2,5 quilos. podendo assim sentir a mãe e reconhecê-la, já que não a tem mais
Para Tamez e Pantoja (2001), os principais fatores que contri-
como parte de si.
buem para o parto prematuro são: hipertensão arterial, infecção, Outra pesquisadora do assunto, Gandra (2003), afirma que o
história de partos prematuros prévios, diabetes, doenças cardía- bebê prematuro é hipersensível a estímulos sensoriais, o que pode
cas, doença renal, anomalia uterina, deslocamento prematuro de ser estressante, pois desde muito cedo, ainda na vida fetal (entre o
placenta, abuso de fumo, álcool e drogas e má nutrição. As mes- quarto e o sexto mês) o bebê já apresenta certas funções básicas
mas autoras afirmam que em partos prematuros ocorridos antes desenvolvidas, como, por exemplo, a audição.
de 32 semanas de gestação os bebês correm maiores riscos por
causa da imaturidade pulmonar e imunológica.
Voltando aos estudos de Spitz (2000), encontra-se a afirmação
de que a mãe é um mecanismo importante para proteger o recém-
Quando nasce, o bebê prematuro perde semanas de estimula- nascido dos estímulos externos. Com esta afirmação o autor está
ção no útero materno, e devido às complicações trazidas por esta nos apontado que a mãe impede que o bebê tenha uma estimula-
situação, o neonato deve ser levado às instalações tecnológicas de ção altamente carregada. Esse selecionar de estímulos é uma ne-
uma UTI neonatal, para uma incubadora, cuja função Davidoff (2000) cessidade para o recém-nascido que ainda não apresenta suas
define muito bem: permite manter a temperatura, a umidade e o estruturas psíquicas (isso é, o eu e o supereu) totalmente organiza-
oxigênio, além de prevenir infecções; porém priva a criança de das. Em face disso pode-se perceber que o isolamento de um bebê
outro tipo de estimulação. em relação a sua mãe em uma UTI não é necessariamente positi-
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vo, pois com o rompimento da “barreira de estímulos” o bebê sente Diante das afirmações de tantos autores, é lícito levantar a hipó-
o mundo externo e precisa de um mecanismo que o proteja. Des- tese de que o bebê prematuro percebe os estímulos vindos da UTI,
tarte, inserir a mãe na unidade de terapia intensiva é um aspecto o que pode causar um impacto em seu desenvolvimento, já que
importante para o bebê. tais estímulos podem ser percebidos de forma negativa. Para mini-
A respeito da importância do contato entre a mãe e o bebê
enquanto está hospitalizado, vários estudos apontam que:
mizar esses aspectos da prematuridade é importante neutralizar de
alguma forma esses estímulos, e a única figura capaz de selecio-
nar a percepção do bebê é a mãe, por meio da maternagem.
“ se um pequeno prematuro é tocado, acariciado, em-
balado ou trazido ao colo diariamente, durante sua per-
manência no berçário ele apresenta menos período de
apnéia, um ganho de peso aumentado, menos libera-
ção de fezes e um avanço em algumas áreas mais
altas do funcionamento do sistema nervoso central.”
(Klaus e Kennell, 1992, p.183 )
“ Acariciar, alisar, tocar o bebê, pegá-lo no colo e aconchegá-
lo é também uma excelente maneira de lhe transmitir amor
e ternura. É reconfortante sentir o cheiro da mãe, o calor
de seu corpo pois poder sentir-se aninhado e acolhido.
Isso é extremamente importante não só para o desenvol-
vimento emocional do bebê como para seu próprio desen-
volvimento.” (Maldonado,1979, p. 78)
Esta última ainda aponta que as crianças que não tiverem o contato
1.1 A MÃE DIANTE DA PREMATURIDADE DO FILHO
Maldonado (1979) aponta que em uma gestação de alto risco,
além dos temores habituais da evolução normal da gravidez, apre-
senta-se uma ameaça concreta de perda.
Com o nascimento prematuro há um rompimento abrupto do
sistema simbiótico que antes se desenvolvia. Ocorre uma separa-
ção imatura da dupla, o que pode causar na mulher um sentimento
muito maior de perda, já que o bebê é automaticamente levado
à hospitalização. Por este motivo Braga (2004) diz que, após o
nascimento prematuro, a mãe precisa de um tempo para fazer
a aproximação entre o bebê imaginário e o bebê real que lhe é
apresentado; ou seja, espera um sinal consistente, por parte
desse bebê real, de que pode investir em uma relação, sem que
haja uma ameaça de perda.
pele-a-pele com sua mãe ficam prejudicadas em suas capacidades de A respeito da perda, o mesmo autor aponta que, para a mãe,
formar vínculos afetivos. No mais, fisicamente, a criança que tem certa estar na UTI neonatal com seu filho, enquanto deveria estar
deficiência nesta área fica mais vulnerável a doenças, apresentando apropriando-se dos cuidados dele em sua casa, faz com que
um desenvolvimento mais lento dos que as que têm carinho. ela se sinta perdendo sua função de maternagem, tendo dificul-
Bick(1991), a respeito da experiência de pele-a-pele, revela em dade de reconhecer-se como mãe e muitas vezes de reconhe-
seu estudo que a pele tem uma função primário no bebê, ou seja, a cer seu bebê, pois há uma equipe que se apropria dos cuidados
pele é mecanismo que une as partes mais primitivas da personali- que deveriam ser dela.
dade, que ainda não se encontram diferenciadas. Assim o bebê Partindo desse pensamento, Almeida (2004) indica que a mãe
apresenta a necessidade de um objeto que toque a sua pele, como com dificuldade de reconhecer o bebê prematuro pode deixar de
uma luz, uma voz, um cheiro, ou outro objeto sensório, como, por voltar seu olhar a ele, pois tem dificuldade de vê-lo como sujeito, já
exemplo, o seio materno. Pensando da mesma forma, Klaus e que o bebê prematuro apresenta padrões de respostas diferente
Kennell (1992) apontam que o aconchego é essencial para a so- dos bebês que na,mento de um bebê prematuro representa um
brevivência do bebê, pois estimula mecanismos sensoriais, imu- momento de crise para a família, o qual muitas vezes pode causar
nológicos e comportamentais. um desequilíbrio ou confusão e tornar os pais incapazes de respon-
Gandra (2003) afirma que a prova real de que os bebês res-
der adequadamente a seu bebê.
pondem à estimulação materna são suas manifestações através Segundo Klaus e Kennell ( 1992), inicialmente a primeira pre-
de expressões faciais e corporais de que estão sentindo prazer ou ocupação dos pais seria com a sobrevivência do filho, mas se a
dor. Ao falar com o bebê, a mãe ou a enfermeira estão decodifican- esta preocupação somar-se um sentimento de culpa, pode haver
do as palavras, o que amplia a possibilidade de compreender o aumento da ansiedade.
mundo externo.
Além de todos esses sentimentos, ainda pode surgir na mulher
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uma sensação de impotência, ou seja, de sentir-se incapaz de que a mãe dispensa ao bebê contra os perigos físicos, consideran-
gerar um filho adequadamente, o que produz um declínio de sua do a sensibilidade cutânea, auditiva e visual. Nesta função, Winnicott
auto-estima e provoca reações depressivas. ressalta o modo de a mãe segurar a criança, tanto física quanto
Segundo Wirth( 2003), existe também a necessidade de um psiquicamente (colocando o bebê em contato com a realidade ex-
trabalho de luto em relação ao nascimento, pois é preciso elaborar terna), para que haja uma interação entre o tempo e o espaço. A
o luto pelo bebê imaginário, que geralmente, neste caso, é muito respeito do “holding” , Winnicott (1978, p.280) aponta que:
diferente do bebê real. O desafio maior está na aceitação do bebê
real, que corre risco de vida ou tem sua morte anunciada.
2. RELAÇÃO MÃE-BEBÊ
Cunha (2004) aponta que a mulher, com o nascimento do bebê,
“ a importância da mãe é vital especialmente no início e,
realmente, a mãe tem como tarefa proteger seu bebê de
complicações que ele não pode entender ainda e continuar
a fornecer, de maneira uniforme, o pedacinho simplificado
de mundo que a criança, através dela, passa a conhecer.”
adquire outra identidade: abandona o papel de filha de sua mãe para
assumir o papel de mãe de seu filho. Apesar disto, nesta nova Já o “handling” envolve a manipulação do bebê pela mãe en-
situação a mulher traz consigo experiências passadas vividas com quanto esta oferece cuidados, sendo necessário para o bem-estar
sua mãe. físico do bebê. É importante lembrar que tais funções atuam simul-
Para a autora, ao desenvolver sua nova função, a mulher pre-
taneamente e definem a qualidade da relação mãe-bebê.
cisa receber as projeções que não podem ser elaboradas pelo Winnicott (1994) chama de mãe suficiente boa aquela que apre-
bebê, e para possibilitar que este organize suas representações, a senta capacidade de exercer tais funções, ou melhor, a mãe que se
mãe deve apresentar a capacidade de conter as pulsões desorga- adapta perfeitamente às necessidades do bebê.
Winnicott aponta uma relação primitiva mãe-bebê, por ele cha-
nizadas do bebê.
mada de preocupação materna primária, a qual se desenvolve
2.1 RELAÇÃO MÃE-BEBÊ SEGUNDO WINNICOTT
gradualmente e consiste em um estado de sensibilidade aumenta-
da em relação ao bebê. Para o autor, a mãe, quando é suficiente-
Ao nascer, o bebê depende inteiramente do mundo que lhe é mente boa, proporciona ao bebê um sentimento de continuidade da
oferecido pela mãe, pois no começo da vida suas necessidades vida, que psiquicamente estrutura o self verdadeiro e pode ser sen-
estão relacionadas aos aspectos corporais e ao desenvolvimento tido como real. A evolução psíquica do bebê, estruturando-se para
psíquico do eu. Para Winnicott (1983), a mãe adapta-se a essas um self verdadeiro, favorece a ausência de fatores patológicos.
necessidades do bebê mediante o emprego de três funções: a
apresentação do objeto, o “holding” e o “handling”.
O mesmo autor faz também referência a uma mãe insuficiente-
mente boa. É aquela que não possui a capacidade de identificar-se
A apresentação do objeto, segundo o autor, consiste na oferta com as necessidades do bebê, o que leva a criança a deparar-se
do seio ao bebê, denominada de primeira refeição teórica, que com uma mãe dividida em pedaços, porque, em vez de responder
passa a ser representada na vida real a partir de experiências às necessidades do bebê, ela as substitui pelas necessidades pró-
precoces de muitas refeições. A mãe deve apresentar o seio quan- prias. Essas falhas de adaptação causam carências na satisfação
do o bebê estiver pronto para imaginá-lo, o que dará ao recém- das necessidades que criam obstáculos aos processos vitais do
nasacido a ilusão de que ele mesmo criou o objeto, permitindo que bebê, resultando no surgimento da angústia, que, neste caso, é
tenha uma experiência de onipotência; ou seja, o objeto (seio) apre- portadora de ameaça de aniquilação. Isso faz com que a criança
senta-se de forma real no momento em que é esperado. Sendo tenha a impressão de uma queda infindável, não tendo orientação
assim, nesse período de total dependência do bebê, a mãe que age de espaço e tempo. Esses sentimentos constituem a essência de
de forma disponível diante de uma necessidade do filho permite que uma angústia patológica.
este adquira a capacidade de assumir relações com outras coisas
A falta de adaptação materna e a forma como o bebê se arranja
diante da mãe insuficientemente boa podem vir ou não a evoluir
ou pessoas.
O “holding”, ou seja, a sustentação, corresponde à proteção
para uma organização patológica da personalidade, como autismo,
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esquizofrenia latente, estado limítrofe, personalidade esquizóide e
personalidade construída com falso self.
A formação do falso self constitui o traço principal da reação do
bebê à não-adaptação da mãe, originando-se essencialmente no
comportamento da mãe com o bebê, pois há um dependência
absoluta dele em relação à mãe, ou seja, a resposta dos gestos
espontâneos (self verdadeiro) do bebê.
A mãe suficientemente boa responde à onipotência do bebê
corretamente, de forma repetida, o que fortalece o ego e favorece o
surgimento do verdadeiro self. A conseqüência desse comporta-
mento materno é que o bebê começa a perceber a realidade e
gradualmente vai renunciado à sua onipotência.
A mãe insuficientemente boa não é capaz de responder à
onipotência do bebê, falhando repetidamente em satisfazê-lo. Este
comportamento materno não fortalece o ego e favorece o falso self.
Quando a organização da vida psíquica está baseada em um
falso self o individuo é levado a apresentar sentimentos de um
falsa realidade em relação a si mesmo e aos outros. A respeito de
uma organização patológica do bebê, Winnicott (1978) lembra que
o ambiente de maturação do bebê deve apresentar uma continuida-
de igual a seu desenvolvimento interno. Para isto a mãe precisa
apresentar características de contribuição e de adaptação sensível
e ativa às necessidades do filho. Assim a saúde mental da criança
é produto de cuidados contínuos, que lhe proporcionam o cresci-
mento emocional.
É claro que a adaptação da mãe às necessidades do bebê
nunca é completa; quando, porém, apresenta um processo conti-
nuo, essa adaptação favorece o estabelecimento de um self verda-
deiro, que integra as falhas e torna o ambiente uniforme. Quando
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chamado por alguns autores de transações dentro do qua-
dro do par mãe – filho. Freud (1921) chamou essa
dualidade de multidão de dois. Para simplificar, usarei o
termo díade. O relacionamento nesta díade é muito especi-
al, como foi evidenciado pela variedade de termos que os
diferentes pesquisadores criaram para ele. Tal relaciona-
mento está, em certa medida, isolado do ambiente é man-
tido por vínculos afetivos extraordinariamente poderoso.
Se o amor pode ser chamado de egoísmo a dois, por um
filosofo francês, isto se aplica cem vezes mais na relação
mãe- bebê”
O bebê percebe a capacidade de empatia da mãe, bem como
o seu humor, pois há um canal de comunicação que vai da mãe
para o bebê, assim como há um canal similar que vai da criança
para mãe. Um exemplo típico desta comunicação é a manifestação
de choro da criança para obter a atenção de alguém que esteja
perto, mostrando sua necessidade de alimentação. No intuito de
remover a tensão da fome a criança precisa mudar seu ambiente
externo, e para isso manifesta-se através da emoção. A comunica-
ção que ocorre na díade consiste de processos circulares. Pode-
se dizer que a comunicação entre mãe e filho é diferente da dos
adultos, já que a última vale-se basicamente da mesma categoria
de símbolos verbais ou gestuais e a da mãe com o bebê compõe-
se apenas de sinais. Este intercâmbio entre a dupla está presente
mesmo quando a mãe não está consciente dele, e exerce a função
de modelar a psique infantil.
Spitz (2000) aponta que na primeira infância o afeto tem um
papel de comunicação, de modo que, consciente ou inconsci-
esse processo de adaptação não é previsível o ambiente torna-se entemente, tanto a mãe como o filho percebem o afeto do outro e
respondem a ele. Para o autor, a mãe exerce ainda um outro
traumático e anula o efeito positivo. papel que não apenas o afetivo ou modelador da psique do filho:
2.2 A RELAÇÃO DO BEBÊ COM SUA MÃE, SEGUNDO SPITZ o de satisfazer os desejos do bebê, aceitando suas pulsões
agressivas e libidinais.
Segundo o pensamento de Spitz (2000), nesse período o bebê
Conforme ressalta Spitz (2000, p. 128), não devemos esque-
cer que não há apenas um gradiente vindo da mãe para o bebê, tem dois objetos: o bom, que está voltado para a libido; e o mau,
contra o qual é dirigida a agressão. No começo desse estágio exis-
mas também um gradiente vindo do bebê para mãe, pois a presen- te um ego rudimentar, pelo qual a criança aprende a distinguir o
ça do bebê também provoca reações na mãe. Ainda sobre essa objeto mau e o objeto bom. Para ela, o primeiro recusa-se a satis-
fazer sua necessidade, e por isso ela o agride; e o segundo satisfaz
reciprocidade relacional o autor afirma que ela
suas necessidades, e é para ele que ela dirige sua libido. Chega-se
“ consiste de uma série de intercâmbios entre dois parcei-
ros, a mãe e o filho, que reciprocamente influenciam um ao a um ponto em que a mãe é como uma totalidade, e com o passar
do tempo o correto é que os aspectos bons da mãe prevaleçam
outro de maneira circular. Esses intercâmbios têm sido sobre os maus. Conseqüentemente, o objeto bom parece predomi-
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nar nessa fusão, e é provavelmente por isso que o objeto libidinal superproteção materna, ou seja, um exagero de mimos. A mãe
também foi chamado de objeto de amor. superpreocupada apresenta uma menor capacidade de distinguir o
Desta forma pode-se afirmar que, a partir do momento em
que a mãe se torna única para o bebê, as pulsões são dirigidas
que realmente seu filho tem, pois o sentimento de culpa a impede de
distinguir a necessidade real do filho.
para um único objeto e iniciam-se as verdadeiras relações ob- Na hostilidade disfarçada em ansiedade manifesta, Spitz (2000)
jetais. No entanto, se for supressa da criança uma das pulsões observou que as mães com este comportamento apresenta-
ou for facilitada uma outra, pode-se se dar início a relações vam uma grande hostilidade inconscientemente reprimida, ma-
objetais malformadas. Spitz (2000, p.174) lembra, ao citar Ka- nifesta através de uma atitude de ansiedade na relação com o
therin e Wolf, que “As relações objetais normais com a mãe filho. Essas mães têm um comportamento bastante notável. Não
constituem um pré-requisito para a capacidade de a criança gostam, por exemplo, de tocar em seus filhos, pois em sua
relacionar-se com as coisas e dominá-las.” psique têm a impressão de que qualquer movimento falso pode
Partindo deste pressuposto, Spitz (op. cit) ressalta que a machucá-los. Isso nada mais é que supercompensação pela
mãe é o parceiro ativo e dominante na relação mãe-bebê, e que hostilidade inconsciente. Com este comportamento a mãe priva
se podem levantar duas hipóteses. A primeira é que os distúrbi- a criança da identificação primária, uma experiência de suma
os maternos se refletem em perturbações na criança; a segun- importância para o bebê, pois através dela ele passa a diferen-
da é que, como conseqüência das influências psicológicas da ciar-se da mãe e pode formar identificações secundárias, prepa-
mãe sobre a criança, a relação mãe-filho torna-se insatisfatória, rando-se para a autonomia e independência.
podendo ser dividida em duas categorias: as relações inade-
Outro comportamento inadequado da mãe é a oscilação entre
mimo e hostilidade. Neste padrão, as mães apresentam um com-
quadas e as relações insuficientes.
A respeito das relações inadequadas, Spitz (2000) afirma portamento extrovertido, com facilidade para fazer contato, porém
que elas podem conduzir a uma série de distúrbios na criança, com uma personalidade infantil, não controlando suas agressões,
visto que a mãe não apresenta qualidade em relação aos cuida- emoções negativas e hostilidade. Desta forma o bebê torna-se uma
dos com o bebê. válvula de escape para suas emoções instáveis, ficando exposto
Nesta categoria de relações inadequadas a personalidade mater- a intensas demonstrações tanto de amor e carinho como de hosti-
na é incapaz de oferecer ao bebê uma relação normal, o que nos leva lidade e fúria, o que torna a relação mãe-bebê distante do equilíbrio
a afirmar que a mãe poderia ser um agente provocador das chamadas e da intimidade. Segundo Spitz ( 2000), o resultado desta relação
doenças psicotóxicas da primeira infância. Estas resultam dos se- inadequada é que a criança apresenta dificuldades de se adaptar ao
guintes padrões de comportamento materno: rejeição primária mani- meio social.
festa; superpermissividade ansiosa primária; hostilidade disfarçada em Na oscilação cíclica de humor da mãe, o comportamento de
ansiedade; oscilação entre mimo e hostilidade; oscilação cíclica de amor pelo bebê é exagerado. A mãe apresenta uma incapacidade
humor da mãe e hostilidade conscientemente compensada. ansiosa de afastar-se do filho que oscila até à rejeição. Essas mães
Spitz (2000) subdivide a rejeição primária manifesta em ativa e apresentam depressão ou distúrbios psiquiátricos. Em conseqüên-
passiva. No caso da ativa, a atitude da mãe consiste em uma rejeição cia da ambivalência materna, a criança apresenta um estado afeti-
a toda a maternidade, incluindo a gravidez e a criança, o que leva vo de depressão. A criança identifica-se com as características
freqüentemente à morte, ou, na melhor das hipóteses, à doação do filho. externas do comportamento da mãe e com atividades afetivas do
Na rejeição passiva, o autor lembra que o recém-nascido torna-se objeto, que são atitudes contra e a favor, o que leva a criança a
“comatoso”: apresenta palidez extrema e sensibilidade reduzida. Na apresentar comportamento correspondente ao da mãe. A criança
opinião desse autor, a rejeição materna passiva não é dirigida contra a sofre o que equivale à perda do objeto bom.
criança, mas contra o fato de ela ter uma criança; ou seja, sua rejeição A mãe com oscilação de humor bloqueia o desenvolvimento
é relativa à maternidade. Entende ele que essa atitude da mãe está normal (integração do objeto bom e mau) do bebê. Sua mudança
relacionada a sua história individual, a sua relação com o pai da radical de atitude emocional transforma o objeto bom em mau, não
criança, à elaboração de seus conflitos edipianos. havendo uma integração dos objetos. Como resultado, a criança
Na superpermissividade ansiosa primária o que ocorre é uma
acaba por incorporar as características da mãe.
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Spitz (op.cit) aponta um último comportamento inadequado da
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3. VÍNCULO AFETIVO
mãe, que seria o de hostilidade materna conscientemente compen-
sada. Neste caso a mãe usa a criança como satisfação narcisista, Para Klaus e Kennell (1992), os primeiros sentimentos em
e não como objeto de amor; mas, diferentemente dos outros com- relação ao vínculo afetivo por parte do bebê se iniciam, neces-
portamentos inadequados, aqui a mãe tem consciência de sua for- sariamente, no primeiro contato; por isso eles enfatizam a im-
ma inadequada de agir com o filho, sente-se culpada e supercom- portância de um contato precoce nas primeiras horas após o
pensa a criança por outro meio (“doçura melosa”). Os pais que nascimento. Nos primeiros minutos de vida o bebê é capaz de
apresentam esta conduta com o filho mostram um comportamento distinguir a voz, o cheiro e o ritmo cardíaco da mãe, e isso
exagerado e exibicionista. significa que, desde o nascimento, ele apresenta um sistema de
Spitz também faz referências a relações insuficientes, que di-
comportamentos ativado.
zem respeito ao fator quantitativo como responsável pelas doenças Não obstante, para Bee (1996), o contato inicial nem sempre é
de carência afetiva. A mãe se ausenta fisicamente por motivo de suficiente para a formação de um vinculo afetivo. O essencial é que
hospitalização do filho, morte, ou moléstia, e em conseqüência dis- os pais tenham a oportunidade de desenvolver um padrão comum
so a criança é privada dos cuidados maternos. Essa privação de comportamento para o estabelecimento do apego. Independen-
pode ser total ou parcial, sendo que o sofrimento da criança será temente de quando tenha sido estabelecido, autores como Bowlby
equivalente a sua privação. (1984), Bee (1996), Klaus e Kennell (1992) concordam que o ape-
A privação afetiva parcial da mãe ocorre na depressão anaclíti- go é um comportamento crucial para o desenvolvimento e sobrevi-
ca. Nesta síndrome a criança apresenta as seguintes característi- vência do bebê. Cunha (1991) afirma que o apego adequado estru-
cas: choro persistente, perda de peso, insônia, grande suscetibili- tura o ego do bebê, proporcionando o desenvolvimento dos pro-
dade a resfriados, atraso no crescimento da personalidade. Quan- cessos cognitivos e afetivos.
do o choro e todos esses sintomas se acalmam há o surgimento de Segundo Vayer (1999), apego é um termo utilizado para des-
rigidez na expressão facial e a criança fica com o olhar distante, o crever a busca do bebê de aproximar-se da mãe para sentir-se
rosto frio e imóvel. O mais importante dessa síndrome é que, para
a maioria das crianças, a volta da mãe constitui um fator decisivo
para sua recuperação. No entanto, se a separação ultrapassa cin-
co meses, a criança incorpora outros sintomas e desenvolve o que
Spitz denomina hospitalismo, que consiste na privação afetiva total.
A criança apresenta, então, sintomas de progressiva deterioração,
que pode ser irreversível. A respeito Spitz (2000. p.28) afirma que:
(....) os cuidados da mãe proporcionam ao bebê a oportunidade
para ações afetivamente significativas no quadro das relações obje-
tais. A ausência da mãe equivale á carência emocional. Vimos que
isso leva á deterioração progressiva, envolvendo toda a criança.
Tal deterioração manifesta-se primeiramente por uma interrupção
do desenvolvimento psicológico da criança; iniciam-se, então, dis-
funções psicológicas paralelas a mudança somática. No estágio
seguinte, isso acarreta uma predisposição crescente á infecção e,
finalmente, quando a privação emocional continua no segundo ano
de vida, leva a uma taxa extremamente alta de mortalidade.”
Tanto a depressão anaclítica como o hospitalismo causam da-
nos às relações objetais, o que leva a uma suspensão, parcial ou
total, do desenvolvimento de todos os setores da personalidade.
seguro em face de sua presença. Quando a mãe é sensível às
respostas do filho e atende imediatamente ao seu chamado, adap-
tando-se às necessidade dele, ela está permitindo ao bebê um
apego seguro; no entanto, se a mãe responde ao bebê conforme
suas próprias necessidades, e não as do bebê, estará propiciando
um apego inseguro por parte do filho. Para Pichon-Riviere (2000
p.14), o vínculo pode-se definir como uma relação particular com o
objetivo. A respeito do vinculo mãe-bebê afirma:
“ Quando a criança depende totalmente de seu objeto mãe
deposita partes internas nela, e quando a mãe faz o mes-
mo, ou seja, deposita na criança partes interna dela, ocor-
re entre ambas um entrecruzamento de depósito, criando
para cada um delas dificuldades para reconhecer o que é
propriamente seu. A situação extrema seria a da primeira
relação da criança com o peito da mãe, estabelecendo-se
inicialmente uma relação parasitária, que em seguida se
torna simbiótica, no sentido de que há intercambio de situ-
ação emocionais e de afeto. Se essa situação de simbiose
vai diminuindo, há um determinando momento em que o
objeto e o sujeito tem um limite preciso já não estão mutu-
amente confundidos mas sim diferenciado.”
Iniciação Científica CESUMAR - Jan.Jun 2005, Vol 07 n.01 pp. 25-40
32
O Binômio mãe – bebê na UTI neonatal...
Ao nascer, a criança estabelece sua primeira relação com o
objeto (mãe) por meio de uma série de processos de interação e
e condições para ir para casa, os pais sentem dificuldade em
estabelecer vínculo com o filho.
projeção, e com essa relação constrói seu mundo interno. Assim, Para evitar este tipo de problema os profissionais da saúde
primeiro o vínculo é externo, depois interno e novamente externo, enfatizam a importância de encorajar os pais a interagir com o
como uma espiral, permitindo à criança configurar as noções de filho ainda na UTI, falando, tocando e principalmente desenvol-
limites entre o que é parte dela e o que faz parte do objeto. vendo o Método Mãe-Canguru, um tipo de assistência que im-
O vínculo entre a mãe e seu bebê é um importante mecanismo
para o desenvolvimento da criança, já que através da mãe o bebê
plica em contato pele-a-pele precoce entre a mãe e o recém-
nascido.
passa a reconhecer o mundo à sua volta. A respeito desta afirmati-
4. A RELAÇÃO DA DÍADE NA UTI NEONATAL:
ACOMPANHANDO DUPLAS DE MÃE- BEBÊ
va Bowlby (1984 p.198) observa:
“Acredita-se que os próprios sistemas
comportamentais se desenvolvem no bebê como re-
sultado de sua interação com o meio ambiente de adap-
tabilidade evolutiva e, em especial, de sua interação
com a principal nesse meio, ou seja, a mãe.”
A presente pesquisa abrangeu 6 duplas de mãe-bebê, es-
tando os RNs prematuros internados na UTI neonatal do Hospi-
tal Universitário de Maringá, o que facilitou o interesse pela
observação da regularidade da presença da mãe na unidade e
de seu impacto sobre o bebê.
Bowlby (1997) propõe que o vínculo entre indivíduos desenvolve- As observações se desenvolveram de forma direta, basea-
se inicialmente para satisfazer certos impulsos (como, por exemplo, o das no modelo de observação proposto por Esther Bick em
de alimentação, na infância), os chamados impulsos primários e se- 1948 na Clínica Tavistock, na cidade de Londres. Ali elas ocor-
cundários; isso porque a criança apresenta certas necessidades fisio- riam em visitas semanais, em horário previamente combinado
lógicas que precisam ser satisfeitas, como a alimentação e o conforto. com a família do bebê, do nascimento até o término do segundo
Sendo assim, o comportamento do bebê de se apegar à mãe é natural ano de vida. Adequando-se este método aos objetivos desta
e essencial para um desenvolvimento saudável. Não obstante, Bowlby pesquisa, definiu-se a observação da dupla no tempo compre-
afirma que o vínculo afetivo ocorrerá onde existe um relacionamento endido entre o nascimento e a alta hospitalar, no período de
íntimo e contínuo, no qual tanto a mãe quanto o bebê encontrem satisfa- novembro de 2003 a fevereiro de 2004.
ção e prazer.
Este modelo de observação consiste em uma técnica em
Para Bee (1996), a formação de vínculo se dá através de uma que o observador deve anotar o maior número possível de de-
verdadeira mutualidade, mas isso exige tempo. Assim que a talhes e descrever o desenvolvimento da relação entre a mãe, o
mãe estabelece um vínculo com o bebê, gradualmente este bebê e o meio ambiente, para compreender os aspectos in-
apega-se a ela. conscientes do comportamento. Nas observações que ocorre-
Segundo o Ministério da Saúde (2000), a ligação afetiva ram neste estudo, foram levados em consideração os principais
entre a mãe e o bebê consiste em um processo contínuo, que aspectos da relação mãe-bebê, o vínculo afetivo, o comportamento
começa no início da gestação, quando se confirmar a gravidez, inadequado e insuficiente da mãe, bem como a capacidade da mãe
pois entende-se que aceitá-la é um indício de estabelecimento de adaptar-se às necessidades do filho hospitalizado.
de futuro vínculo.
Às observações foram associados dados de prontuários médi-
O nascimento precoce impede o estabelecimento de um cos e uma entrevista semi-estruturada, contendo perguntas nortea-
vínculo adequado, que é necessário, pois ao nascer, o bebê doras sobre a gestação e o nascimento do bebê. Esta metodologia
pré-termo é acomodado em uma incubadora, perdendo o con- foi aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade Estadual de
tato com a mãe. Neste sentido, Maldonado (1979) ressalta que Maringá, sem restrições.
o vínculo fica abalado, principalmente por causa da separação Os resultados obtidos foram esquematizados a partir de cada
abrupta que aconteceu e da internação do bebê no hospital. dupla observada, sendo apresentados a seguir, através de vinhetas
Observa que, passado o tempo e quando o bebê ganha peso clínicas:
Iniciação Científica CESUMAR - Jan.Jun 2005, Vol 07 n.01 pp. 25-40
Amadeu, V.T.R., Hartmann, J. B.
4.1 VINHETA CLÍNICA 01
33
valentes ante o fato de ter estado com o filho por apenas 4 vezes
durante 28 dias. Essa dificuldade fica exemplificada no relato de
Adolescente, 18 anos, estudante, primeira gestação, filho não
uma das observações dessas raras visitas:
planejado, fumante durante toda a gravidez. Risco de aborto espon- “Quando cheguei na unidade, a mãe estava sentada em um
tâneo no início da gestação, com indicação de repouso durante a banco ao lado da incubadora, de forma que conseguisse tocar e
gravidez. Ao descobrir que estava grávida a adolescente não teve olhar para o filho, que se encontrava entubado e dormindo devi-
apoio da família, apenas do namorado, com quem está há dois do ao medicamento. A mãe toca na criança com apenas um dos
anos. O parto natural se realizou quando o bebê estava com 28 dedos da mão e seu olhar apresentava-se distante e distraído,
semanas. O nascimento do filho, segundo a mãe, trouxe-lhe um não estando voltado para criança. Durante toda a observação, a
ambivalência muito grande, pois ao mesmo tempo que queria ter o mãe não esboçou um olhar, nem toque mais intimo e intenso em
filho em seus braços para vê-lo, não queria que nascesse, por direção ao filho”.
medo dos cuidados que teria que oferecer ao bebê.
Diante da inconstância da presença da mãe e do seu não-
Durante toda a gestação imaginava que o filho fosse nascer envolvimento com o filho, comprovados pela sua ausência da
gordinho e saudável, mas o RN1 (recém-nascido) nasceu com unidade, podemos supor que não houve o estabelecimento de
1.000g, sendo, portanto, pequeno. Foi acomodado em incubadora um vínculo afetivo. Isso talvez possa ser justificado pelo não-
aquecida e mantido sob ventilação pulmonar mecânica, já que seu desejo de ter um filho, pelo nascimento não previsto (antecipa-
sistema respiratório encontrava-se imaturo, devido ao nascimento do), portanto precoce, e ainda pela dificuldade em fazer a transi-
precoce. ção entre o bebê imaginário e o real, considerando-se a descri-
O RN1 esteve internado na UTI neonatal por 28 dias e teve a ção que fez sobre como imaginava seu bebê. Todos esses
visita da M1 (mãe) em apenas 4 dias, vindo a óbito por insuficiência aspectos podem ter-se refletido de forma decisiva no desenvol-
respiratória. vimento do RN1, levando-o a um desfecho desfavorável, que foi
o seu óbito. Tal comportamento nos remete ao questionamento
PESO E PRESENÇA ( GRÁFICO 01 )
da possibilidade de ter ocorrido o que Spitz denomina de rejei-
1.200
ção primária manifesta, uma atitude da mãe que consiste em
1.000
uma rejeição a toda a maternidade, incluindo a gravidez e a
800
criança, o que leva freqüentemente à morte.
600
400
200
4.2 VINHETA CLÍNICA 02
0
TEMPO DE HOSPITALIZAÇÃO
Adolescente, 19 anos, casada, dona de casa, primeira ges-
tação, gravidez não planejada, porém desejada. No início da
Presença da mãe
Não presença da mãe
óbito
gestação sentiu enjôo e precisou ficar em repouso, pois apre-
sentou perda de líquido amniótico. Quando descobriu que esta-
O gráfico permite ilustrar um primeiro ponto, que seria o da va grávida teve todo o apoio do marido. O parto, natural, reali-
incapacidade da mãe em se colocar à disposição das necessi- zou-se quando o bebê estava com a idade gestacional de 26
dades do filho desde o início da gestação. Tal comportamento semanas.O nascimento, segundo a mãe, trouxe-lhe ansiedade
permitiria classificá-la (segundo Winnicott) como mãe insufici- e medo de perder o filho, porquanto sabia que o parto precoce
entemente boa, por dois motivos. O primeiro diz respeito ao fato teria como conseqüência a ida do RN2 para UTI.
de, durante a gestação, a mãe não ter conseguido deixar de O RN2 nasceu com 835g; foi acomodado em incubadora
fazer algo que lhe trazia prazer (fumar) para atender às neces- aquecida e mantido sob ventilação pulmonar mecânica, já que
sidades do feto, com vista a um desenvolvimento saudável. O seu sistema respiratório encontrava-se imaturo, devido ao nas-
segundo refere-se ao fato de a mãe não conseguir o “holding” e cimento precoce.
a “handling”, verbalizados através de seus sentimentos ambi-
O RN2 ficou hospitalizado por oitenta dias, com a presença
Iniciação Científica CESUMAR - Jan.Jun 2005, Vol 07 n.01 pp. 25-40
34
O Binômio mãe – bebê na UTI neonatal...
da mãe em sete desses dias. O gráfico permite visualizar que a
mãe tenha possivelmente demorado um certo tempo para elabo-
Essas atitudes ficam exemplificadas no relato de uma das
observações dessas visitas:
rar o bebê imaginário e aproximá-lo do bebê real, aspecto este que “Ao chegar na unidade encontrei a mãe com o filho no colo
pode ser justificado por sua ausência na UTI neonatal nos primeiros na posição ‘canguru’, que consiste em ficar sentada em uma
cinqüenta e três dias de vida do filho. cadeira com o bebê colocado em seu peito, com a cabeça
virada e com o ouvido voltado para o coração da mãe. Neste
PESO E PRESENÇA Grafico 02
primeiro momento a criança chora, mais é acariciada pela mãe
2500
e acalma-se. A mãe fica fazendo carinho e murmura uma can-
2000
ção para o filho, até que foi possível verificar que seus olhos se fecha-
ram e dormiu. A dupla permaneceu junta por mais ou menos uma hora.
1500
Quando o bebê foi colocado novamente na incubadora pela mãe teve
1000
um ataque apnético, parou de respirar, ficou todo roxo, com os braços
500
para cima. A mãe ficou apavorada, as mãos tremiam, suava frio pelo
0
TEMPO DE HOSPITALIZAÇÃO
presença da mãe
não presença da mãe
rosto, mas isso não a impede de colocar a mão no peito do filho e mexê-
lo em movimentos mas bruscos enquanto gritava pela enfermeira, que
colocou rapidamente um aparelho respiratório ( bomba de oxigênio) no
bebê. Aos poucos o bebê voltou a respirar sozinho e o aparelho foi
Nesse período de ausência da mãe é possível perceber, obser- retirado; enquanto isso a mãe permaneceu ao lado do filho o tempo todo,
vando-se o gráfico, que o RN2 inicialmente apresentou dificuldade tocava em sua mão peito, enfim todo o corpo. Quando o bebê encontra-
em ganhar peso, mas a partir da primeira visita da M2 (54 dias) va-se estabilizado porém acordado, a mãe o tocava e de seus olhos
passou a ganhar peso de forma considerável, pulando de 1.355g lagrimas escorriam” (M2).
para 1.410g e apresentando uma melhora na respiração, sendo Esta mãe demonstrou assim um adequado envolvimento
possível a retirada da ventilação pulmonar mecânica. Esses acon- com o filho, levando-nos a supor que a pouca presença da
tecimentos foram como que um sinal consistente por parte do RN2 mãe não impediu a constituição de um laço afetivo importante
para sua mãe, que favoreceu o investimento por parte de M2 na entre a mãe e o bebê, que repercutiu de forma positiva em seu
relação mãe-bebê. Este fato pode ser confirmado observando- desenvolvimento, contribuindo para sua alta da unidade. Esta
se os próximos vinte e sete dias em que o bebê ainda esteve dificuldade em estar presente em várias situações na UTI foi
hospitalizado, com a mãe mais presente e com o desenvolvi- justificada pela mãe por seu temor de perder o filho amado,
mento apresentado pelo RN2. ameaça concreta presente desde o início da gravidez, pois apre-
É possível perceber que há uma diferença bastante acentu- sentava perda do líquido amniótico. Tudo isso pode ter impedi-
ada no gráfico (marcada por uma linha vertical mais forte), entre do a idealização do bebê e dificultado a entrada da mãe em
o período de 53 dias em que a M2 não estava presente, com contato com seus conteúdos internos de um bebê imaginário,
dificuldade do RN2 para ganhar peso, e o período de 27 dias obrigando-a a construir um bebê imaginário distante do bebê
após a participação da M2 nos cuidados, pois o bebê passou a real. O medo de perder se amplifica após o nascimento, com a
ter um desenvolvimento constante, com mais ganhos do que ida do RN2 para a UTI, levando-a à aceitação do bebê real,
perdas. O comportamento da M2 mostrou sua capacidade em que corre risco de vida.
colocar-se à disposição das necessidade do filho, o que permi- Neste caso também foi possível observar a comunicação
tiria incluí-la no que Winnicott classificaria como mãe suficiente- da díade (assim definida por Spitz), que pressupõe um gradien-
mente boa, pelo fato de conseguir o “holding” e a “handling”, te de comunicação que vai da mãe para o bebê e do bebê para
observados através de seus comportamentos. Apesar das pou- a mãe. Nesta observação, quando o bebê estava no colo da
cas vezes em que esteve presente, esta mãe conseguiu cor- mãe, relaxou tanto que chegou a dormir; porém quando foi colo-
responder às necessidades do filho nos dias em que veio até o cado na incubadora respondeu negativamente, apresentando
hospital. uma apnéia, o que provocou uma resposta de angústia na mãe.
Iniciação Científica CESUMAR - Jan.Jun 2005, Vol 07 n.01 pp. 25-40
Amadeu, V.T.R., Hartmann, J. B.
4.3 VINHETA CLINICA 03
35
mente explicável neste caso, por se tratar de uma mãe que passou
por um parto precoce, para o qual não se encontrava ainda prepa-
Adolescente, 14 anos, estudante, primeira gestação, gravidez rada nem psicológica nem fisicamente, sem tempo para desenvol-
não planejada. No início da gestação apresentou muito enjôo.Quando ver uma preocupação materna primária, já que normalmente esta
descobriu que estava grávida, teve todo o apoio de sua família. O capacidade se consolida ao final da gestação.
parto, natural, realizou-se quando o bebê apresentava a idade ges- É provável que a ausência por um período longo no processo
tacional de 27 semanas. O nascimento da filha, segundo a mãe, de hospitalização da filha tenha ocorrido por uma necessidade da
trouxe medo, quando ela soube que o bebê teria que ir para a UTI. mãe em elaborar o luto do bebê imaginário (verbalizava espontane-
Durante a gestação, imaginava estar grávida de um menino, gordi- amente que tinha imaginado a gestação de um jeito e ocorreu de
nho, mas teve uma criança do sexo feminino, com o peso de 965g, outro). Quando se consolidou esse encontro entre o bebe real e o
que foi acomodada em incubadora aquecida. Percebe-se assim bebê imaginário houve uma aceitação do bebê real, ficando mais
que o bebê imaginário nada tinha a ver com o bebê real. fácil o estabelecimento do vínculo afetivo. Essas atitudes ficam exem-
O RN3 ficou hospitalizado por cinqüenta e nove dias, tendo a
plificadas no relato de uma das observações dessas visitas:
presença da mãe em 10 dias do tempo de internação. Importante
lembrar que essa mãe era uma adolescente que morava com a “A criança está no qüinquagésimo sexto dia de vida, aca-
própria mãe, da qual dependia para deslocar-se de sua cidade para ba de ser transferida para o Alojamento Conjunto (fase em
a cidade onde o RN estava. Isso não nos impede de considerar que, que o bebê já apresenta condições de receber alta, ape-
além dessa dependência, pode ser que M3 tenha precisado de um nas a mãe precisa aprender como cuidar corretamente
tempo para fazer a transição de identidade do papel de filha para o do bebê), estando com o peso de 1.820 gramas.
papel de mãe, como aponta Cunha (2004). Ao chegar no quarto, a mãe3 estava dormindo no leito 03.
Ao lado de sua cama encontrava-se um berço, na qual
PESO E PRESENÇA ( Grafico - 03 )
estava sua filha, acordada, descoberta, bastante agitada;
suas pernas e braços não paravam de se mover, se
2500
levantam e abaixam; ela dá uns gritinhos finos, mas a
2000
mãe continua a dormir.
1500
A criança permanece agitada, tanto que nesse momento
1000
seu corpo começa a escorregar no berço, as perninhas
500
ficam dependuradas por entre as grades, começa a solu-
TEMPO DE HOSPITALIZAÇÃO
presença da mãe
não presença da mãe
0
çar, parece estar bastante incomodada. Isto é possível
perceber por sua expressão facial ,que está enrugada.
Passados alguns minutos a criança novamente grita, agora
mais alto; resmunga, esboça começo de choro, em se-
O gráfico permite visualizar que há uma diferença considerável guida chora baixo e fino; mas como não obtém resposta
entre o período em que a M3 não esteve presente (34 dias) e o alguma da mãe, que continua a dormir, começa a chorar
período em que passou a participar do desenvolvimento do RN3, alto, soluça, em seu rosto chegam a escorrer lagrimas.
ou seja, os próximos 25 dias desse processo de hospitalização. A A mãe do leito ao lado (02) sentiu-se incomodada com a
demora na primeira visita pode ser justificada pela dificuldade da situação e acordou a mãe 3. Quando acordada, pegou a
M3 em adaptar-se à vinda da filha, considerando-se que essa mãe, filha no colo a aclamou – a, que logo parou de chorar em
sendo uma adolescente, ainda não tinha desenvolvido o que Winni- seguida enrolou-a na coberta e a colocou no seio; a crian-
cott chamou de preocupação materna primária, que nada mais é ça suga-o sem parar. Durante a amamentação a mãe 3
que um estado de sensibilidade aumentada em relação às necessi- está totalmente voltada para a criança; sua cabeça está
dades do bebê. para baixo com o olhar em direção ao olhar da filha, que
Podemos considerar que essa falta de sensibilidade é perfeita-
suga o seio com os olhos abertos, olhando em direção à
Iniciação Científica CESUMAR - Jan.Jun 2005, Vol 07 n.01 pp. 25-40
36
O Binômio mãe – bebê na UTI neonatal...
mãe. Passados alguns minutos a criança relaxa comple-
PESO E PRESENÇA ( GRÁFICO 04)
tamente o corpo, a mãe a tira do seio, fica com ela no colo,
2.500
Aos poucos a criança fecha os olhos e dorme. A mãe a
2.000
coloca novamente no berço, agora coberta, e volta a
dormir”(M3).
1.500
1.000
necessidade de dormir, tendo pouca sensibilidade para com as
TEMPO DE HOSPITALIZAÇÃO
necessidades da filha; porém também foi possível perceber que,
presença da mãe
não presença da mãe
quando estimulada, a M3 foi capaz de destingir através do choro da
filha qual sua real necessidade, o que nos permite supor que, com Levando-se em consideração o fato de tratar-se de uma mãe
o tempo, a M3 terá sua sensibilidade desenvolvida, proporcionan- que apresentava uma patologia grave (esquizofrenia), podemos
do um “holding” adequado a seu bebê. supor que seu comportamento tenha destacado pontos importantes,
A partir da participação mais ativa da M3 na relação com o RN3 que podem ter desestabilizado o crescimento físico e psicológico da
parece ter havido uma minimização do impacto do nascimento filha. O comportamento mais claro observado foi a oscilação do
prematuro, visto que depois dos 34 dia de vida o RN3 passou a humor, já que em alguns momentos encontrava-se agitada e logo
apresentar um desenvolvimento constante e mais rápido, compa- depois em completo embotamento afetivo, comprometendo assim a
rado com o período em que a mãe não esteve presente. relação entre a mãe e o bebê.
Para Spitz (2000), esta oscilação de humor da mãe faz com que
4.4 VINHETA CLINICA 04
a criança se identifique com todas essas fases do comportamento
materno externo, sendo levada a sentir sua mãe em alguns mo-
Adolescente, 16 anos, casada há um ano, primeira gestação, mentos a favor e, em outros, contra ela. Isso fica evidenciado na
gravidez não planejada. Durante a gestação apresentou enjôo e oscilação observada no gráfico no intervalo entre os dias 33 e 53. O que
teve de ficar em repouso por causa da hipertensão. Quando desco- podemos perceber é que às vezes a mãe apresentava atitudes coe-
briu que estava grávida, teve todo o apoio de sua família. Alguns rentes, que permitem a formação de relações objetais, para logo após
dias antes do parto apresentou-se agitada, não reconhecia as pes- oscilar em seu comportamento, apresentando à criança um novo obje-
soas, passou a conversar sozinha e a ter alucinações visuais e to exatamente contraditório ao primeiro.
auditivas. Após avaliação psiquiátrica detectou-se um transtorno Winnicott, que tem um pensamento parecido a respeito, aponta
mental, diagnosticado como esquizofrenia. O parto, cesariano, foi que quando a mãe é incapaz de adaptar-se às necessidades do
indicado por grave sofrimento fetal e pela hipertensão materna, no filho, produz-se uma distorção na organização desse ambiente, o
período gestacional de 29 semanas. Segundo a mãe, o nascimento que leva a criança a uma posição defensiva. Se o ambiente encon-
da filha trouxe muita angústia. tra-se desorganizado para a criança, isso significa que a mãe não
Durante a gestação a M4 imaginava que o bebê seria uma encontra condições de apresentar à criança experiências repetidas
menina, gordinha e saudável, mas seu bebê nasceu com 1.110g, e de oferecer continuidade para que o bebê possa sozinho reparar
sendo acomodado em incubadora aquecida e mantido em ventila- falhas normais maternas.
ção pulmonar mecânica. O RN4 esteve hospitalizado por oitenta e Neste caso essa consideração de Winnicott fica muito clara na
três dias, tendo a presença da mãe em vinte e três deste dias e do apresentação do objeto (seio), que pode ser observada em três
pai em oito dias, totalizando trinta e um dias de acompanhamento, o situações:
que equivale a 37,5 % do tempo de hospitalização
1o Situação: “Encontrei a mãe na sala de televisão do hospital,
O gráfico permite visualizar que durante todo este tempo foi deitada no sofá com o olhar distante, com comportamento de completo
possível observar diferenças entre o cuidado materno e o paterno, embotamento afetivo; a criança estava em outro sofá ao lado da mãe,
influenciando decisivamente o desenvolvimento desta criança. descoberta e chorosa. A mãe nada fazia, continuava parada e distante.”
Iniciação Científica CESUMAR - Jan.Jun 2005, Vol 07 n.01 pp. 25-40
0
pação materna primária, visto que a mãe estava voltada a sua 500
Com esta observação parece ficar clara a falta da preocu-
37
Amadeu, V.T.R., Hartmann, J. B.
2 o Situação:” Durante a noite, segundo a própria mãe, come- O RN5 esteve hospitalizado por cinqüenta e quatro dias, sendo
çaram “ aquelas coisas”, alucinações; ela ficou com medo e aca- que a mãe esteve presente em quinze dias. O gráfico permite visu-
bou por deixar a filha cair de seus abraços.” alizar que a primeira visita da M5 ocorreu no décimo oitavo dia de
3o Situação: “Agora a mãe encontra-se em situação coerente e vida do RN5. Essa demora nos faz levantar a hipótese de que a M5
a criança está com fome. Coloca-a no seio, mas ela não aceita, tenha tido certa dificuldade em elaborar a situação do parto precoce
entra em posição defensiva e empurra com as mãos o seio da mãe, e a hospitalização do filho; porém a partir da primeira visita estabele-
chora muito e apenas aceita ser alimentada quase uma hora depois, ceu um vínculo afetivo com este, o que a fez participar mais ativa-
quando já estava calma; mas tomou o leite no copinho.” mente no processo do filho, favorecendo seu desenvolvimento.
Essas situações permitem perceber que a mãe, devido à sua
PESO E PRESENÇA ( GRÁFICO 05 )
oscilação comportamental, não foi capaz de ser suficientemente boa,
2.000
proporcionando uma desorganização psíquica na filha e levando-a
1.800
a uma posição defensiva.
1.600
1.400
Complementarmente, considerando o pai como outro provável
às necessidades da filha de forma satisfatória, satisfazendo-as quando
necessário. Isso pode ser observado na seguinte situação:
1.200
cuidador, podemos perceber que esse pai foi capaz de adaptar-se
1.000
800
600
400
200
Essas oscilações entre o cuidado materno insuficientemente
bom e o paterno suficientemente bom, sem regularidade ou continui-
dade, refletiram-se de forma negativa no desenvolvimento da crian-
ça, o que pode ser observado na oscilação em seu peso e no
prolongamento de seu tempo de internação.
presença da mãe
não presença da mãe
Aqui podemos perceber a capacidade da mãe de se colocar à
disposição das necessidades do filho, minimizando o impacto desta
internação na unidade. No momento em que ela passou a participar
com mais intensidade e regularidade no processo de hospitalização
do filho percebe-se que há significativamente mais ganhos do que
perdas de peso. Tal resultado permitiria classificá-la como mãe su-
ficientemente boa, pelo fato de conseguir o “holding” e a “handling”.
Em algumas situações, apesar dessa presença, também foi possí-
vel perceber que o sentimento de culpa que verbalizava a impedia
muitas vezes de se relacionar mais intimamente com o filho.
uma das observações dessas visitas:
Mulher de 34 anos, casada há dois anos, primeira gestação,
não planejada. Sentiu muito enjôo no início da gravidez. Quando
descobriu que estava grávida teve apoio de marido. O parto, natural,
realizou-se quando o bebê estava com a idade gestacional de 28
semanas.Segundo a mãe, o nascimento precoce trouxe sentimento
de culpa, pois estava carregando coisas pesadas quando começou
a se sentir mal e precisou ser hospitalizada.
Durante a gestação a M5 se imaginava grávida de um menino,
que nasceria gordinho e saudável; mas acabou por nascer uma
criança com 1.180g, acomodada em incubadora aquecida e manti-
“O bebê está no quadragésimo sétimo dia de vida com 1745g.
Ao chegar no semi-intensivo encontrei a mãe5 com o filho no
colo, colocando–o em um uma bancada para trocá-lo. Reti-
rou a roupa, colocou nova fralda, e com a ajuda da enfermei-
ra, deu banho. A criança permaneceu calma em todo o pro-
cesso, relaxando bastante quando foi colocado na água. Em
seguida a mãe5 a enxugou, colocou roupa e sentou-se em
uma cadeira para amamentá-la.
Durante a mamada a criança suga muito bem, tudo ocorre
normalmente, mãe e filho em completa simbiose; porém a
Iniciação Científica CESUMAR - Jan.Jun 2005, Vol 07 n.01 pp. 25-40
TEMPO DE HOSPITALIZAÇÃO
Essa duplicidade de situação fica exemplificada no relato de
4.5 VINHETA CLINICA 05
da sob ventilação pulmonar mecânica.
0
“A criança encontra-se muito agitada, nada a acalma; cho-
ra e a enfermeira tenta acalmá-la, pegando-a no colo, mas
não resolve. O pai chega e pega-a no colo e, como por
mágica, a criança pára de chorar. Em seguida é colocada
no colo do pai na posição ‘canguru’, e em pouco tempo
ficou relaxada, chegando a fechar os olhos e acabando
por dormir tranqüila.”(P4)
38
O Binômio mãe – bebê na UTI neonatal...
criança começa a soluçar, e a mãe imediatamente come-
ça a ficar pálida e suar frio; chama a enfermeira desespe-
radamente, dizendo que seu filho está parando de respirar.
A enfermeira diz à mãe que não, que sue filho está apenas
soluçando, que é normal acontecer, já que acabou de to-
mar banho e ficou certo tempo exposto ao frio.”(M5)
Desta forma a mãe teve um papel importante no desenvolvi-
mento da filha, minimizando o impacto e o tempo da hospitaliza-
ção, sendo possível perceber que a criança teve um ganho
gradual de peso sem ser seguido de grandes perdas. Isto foi
possível porque a mãe apresentou a capacidade de se colocar
à disposição das necessidades da filha, revelando-se como
Este caso permite perceber que o sentimento de culpa im- uma mãe suficientemente boa, pelo fato de conseguir o “holding”
pede a mãe de perceber a real necessidade do filho, a qual no e a “handling”. Essas atitudes ficam exemplificadas no relato de
momento apenas era de ser aquecido para cessar os soluços. uma das observações dessas visitas:
Tal comportamento nos remete ao questionamento da possibili-
dade de ter ocorrido o que Spitz denomina de superpermissivi- “A criança encontra -se no vigésimo primeiro dia de
dade ansiosa primária. vida, com o peso de 1.350 gramas. Quando cheguei
no semi-intensivo a M6 acabava de chegar. A filha
4.6 VINHETA CLINICA 06
estava chorando muito, pegou-a no colo e a acariciou,
Mulher de 22 anos, casada há dois anos, primeira gestação,
mas a criança não parava de chorar. Automaticamente
não esperava estar grávida, porém sempre quisera ser mãe. Apre- a M 6 a colocou no seio e no mesmo momento a crian-
sentou enjôo até o começo do sexto mês, precisou ficar em repouso ça parou de chorar e sugou o seio. A M6 e filha ficaram
por causa da hipertensão produzida pelo estado gestacional. O par- em completa simbiose, uma olhando em direção à
to, cesariano, realizou-se quando o bebê estava com a idade gesta- outra; nada as incomodava, parecia que apenas as
cional de 29 semanas. Segundo a mãe, o parto trouxe muita ansie- duas estavam no local. Após a mamada a M 6 coloca
dade, pois nunca pensara que a filha teria que ir para a UTI. Durante a filha no berço, e ela alguns segundo depois começa
a gestação imaginava que a filha seria uma criança saudável, entre- a resmungar. A mãe a pega e, como por instinto, já a
tanto seu bebê nasceu com 1.410g, sendo acomodado em incuba- leva para a bancada para trocá-la, e estava certa; a
dora aquecida.
O RN6 ficou hospitalizado por quarenta e dois dias, tendo a
presença da mãe em vinte e cinco destes dias. O gráfico permite
visualizar que, diferentemente de todos os outros casos desta pes-
quisa, a M6 demorou pouco tempo para adaptar-se à vinda precoce
filha estava a reclamar porque estava suja. Após dar-
lhe banho e trocá-la, a acolheu no colo, acariciou
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