Talidomida
Seminário: Talidomida. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: lucas.victor • 7/6/2013 • Seminário • 1.394 Palavras (6 Páginas) • 571 Visualizações
TALIDOMIDA
A talidomida, [(±)2-(2,6-dioxo-3-piperidinil)-1H-isoindol -1,3-(2H)-diona; ou (±)-ftalimidoglutarimida (1)], foi descoberta por série de fatores fortuitos e primeiramente relatada por Wilhelm Kunz, em 1953. Sua síntese foi realizada na indústria farmacêutica alemã "Chemie Grünenthal", objetivando a preparação de pequenos peptídeos utéis na produção de novos antibióticos. Entretanto, durante a rota sintética proposta inicialmente, Wilhelm Kunz isolou um produto secundário, racêmico, não peptídico (1), que foi reconhecido pelo farmacologista da "Chemie Grünenthal", Herbert Keller, como um análogo estrutural da glutetimida (2). Posteriormente, o perfil sedativo-hipnótico de (1) foi bem caracterizado1, 2.
Em 1957, a talidomida (1) foi comercializada como fármaco sedativo-hipnótico, amplamente vendido em países europeus, asiáticos, no Canadá e América do Sul, tornando-se o medicamento mais vendido na Alemanha Ocidental para o tratamento da insônia3, 4.A despeito de sua ampla comercialização nos continentes Europeu e Asiático, este fármaco, em diferentes especialidades farmacêuticas: Kavadonâ, Sedalis®, Softenon®, Distaral®, Contergan®, entre outros, não obteve licença do Food and Drug Administration (FDA) dos Estados Unidos da América para uso neste país5,6.
No ínicio da década de 60, a talidomida (1) foi prescrita mundialmente como sedativo e agente anti-naúseas, indicada no alívio do mal-estar matinal comum em gestantes, sendo responsável pelo nascimento de milhares de crianças com deformações congênitas, que foram, posteriormente atribuídas ao seu perfil teratogênico7-9. Após confirmação e divulgação destes graves efeitos colaterais, este fármaco teve sua licença para comercialização cancelada, rendendo, em 1961, à oficial médica americana Frances Kelsey, responsável pelas decisões à frente do FDA, a medalha e título de guardiã da Saúde Pública concedida pelo, então, presidente John Kennedy, em reconhecimento aos serviços prestados10,11.Quatro anos mais tarde, em 1965, o médico israelita Jacob Sheskin prescreveu a talidomida (1) como sedativo para pacientes leprosos, observando fortuitamente acentuada redução da dor e do processo inflamatório associado ao leproma12,13, identificando as propriedades antiinflamatórias de (1), até então desconhecidas. Este intrigante perfil antiinflamatório incentivou diversos grupos de pesquisas ao estudo do provável mecanismo de ação relacionado às ações benéficas de (1) sobre os lepromas. Em 1991, a Dra Gilla Kaplan e colaboradores, da Universidade de Rockefeller, Nova York, em trabalho pioneiro, demonstraram que pacientes leprosos apresentavam níveis sanguíneos aumentados de um modulador do sistema imunológico, identificado como uma citocina denominada fator de necrose tumoral a (TNFa)14. Estes mesmos pesquisadores constataram, posteriormente, a participação da talidomida (1) na inibição seletiva desta citocina, quando expressa em quantidade superior àquela necessária à manutenção do sistema imunológico normal, denotando, portanto, o potencial imunorregulador de (1).
SÍNTESE E METABOLISMO
A metodologia sintética empregada na obtenção da (R,S)-talidomida (1) explorou, numa primeira etapa, a condensação do (R,S)-ácido glutâmico com anidrido ftálico (3), seguida da etapa chave da estratégia sintética, que consistiu na condensação do intermediário ftalimídico (4) com amônia em temperatura elevada15 (Esquema 1).
Estudos, ex vivo, sobre o destino metabólico da talidomida (1) permitiram evidenciar sua instabilidade em solução aquosa, em diferentes valores de pH. Em pH=6,0 observou-se a hidrólise espontânea do anel glutarimídico, originando os derivados a-(orto-carboxi-benzamido)glutarimida (5) e (6) como principais metabólitos (Figura 1)16.
Entretanto, em pH fisiológico (pH=7,4) a talidomida sofre ca. 28% de metabolização na primeira hora de ensaio, sendo os principais metabólitos formados identificados como produtos de hidrólise do anel ftalimídico e glutarimídico, originando majoritariamente os compostos (7) e (8) (Figura 1)16.
Por outro lado, em pH=8,0 sua taxa de metabolização é consideravelmente aumentada, ca66% na primeira hora, evidenciando que o metabolismo in vivo de (1) é estritamente dependente do pH da biofase16.
Quiralidade
A constatação no início da década de 60 dos efeitos teratogênicos provocados pela (±)-talidomida em gestantes, nos três primeiros meses de gravidez7,8, representou um marco na conscientização do risco da administração de um fármaco em sua forma racêmica, quando a razão eudísmica entre os dois enantiômeros é desconhecida (Figura 2).
Posterior tentativa de resolução cromatográfica de (1) e administração das espécies enantiomericamente puras, i.e., (R) e (S)-(1), demonstrou que o efeito teratogênico da talidomida era proveniente do emprego do enantiômero de configuração absoluta (S), enquanto seu antípoda era desprovido de ação teratogênica17. Todavia, a estereoespecificidade da ação teratogênica de (1) foi evidenciada como sendo dependente da espécie animal estudada. Por outro lado, a atividade de (1) como inibidor da produção de TNF-a foi identificada como sendo estereosseletiva, tendo-se o enantiômero de configuração absoluta (S) como eutômero17,18.
Eriksson e colaboradores demonstraram a rápida epimerização de (1) em plasma humano,in vivo, após administração por via oral das espécies enantiomericamente puras. De fato, a inversão de configuração de fármacos enantiopuros ou racêmicos ocorre em outras classes terapêuticas como nos antiinflamatórios não-esteróides pertencentes à classe dos ácidos 2-aril-propiônicos20, sugerindo que o emprego da talidomida em sua forma enantiomericamente pura não evitaria a tragédia teratogênica ocorrida no início da década de
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