Resumo Linguagem e Persuasão
Por: Cristianepta2021 • 15/6/2021 • Resenha • 3.622 Palavras (15 Páginas) • 151 Visualizações
Linguagem e Persuasão |
1)Informação sem persuasão?
É necessário voltarmos aos clássicos para falar sobre a persuasão: foi com os gregos que obtivemos o domínio da expressão verbal. Com seus conhecimentos de democracia se expunham ao público e assim deveriam ser hábeis em argumentação. As escolas tinham disciplinas para ensinar a arte do domínio da palavra, sendo algumas a eloqüência e a retórica – esta última era a disciplina que trazia mais harmonia para a arte e o espírito. Segundo Oswald Ducrot e Tzvetan Todorov essa foi a primeira manifestação a refletir a linguagem como um discurso e não mais como uma língua. Assim, a retórica tornou-se responsável pelo uso da linguagem para convencer. Mas essa visão, com o tempo, passou a significar “recurso embelezador do discurso”, chegando a ser vista, no século XVIII e XIX, como algo pejorativo. O povo grego exercia o poder através da palavra. Filósofos como Sócrates e Platão deixaram relatos sobre a linguagem como meio de soberania, mas é Aristóteles que estuda a sua estrutura e função. Ele escreveu a Arte retórica que é subdividida em partes I, II e III, tendo gramática, lógica, filosofia da linguagem e estatística como alguns de seus temas.
Tendo já clara a relação entre retórica e persuasão, persuadir, como a sua etimologia já aponta, é aconselhar. Para isso não é necessário trabalhar com a verdade, basta ser algo verossímil ao objetivo. Podemos ver isso na seguinte situação: cartazes que fazem o produto a ser vendido passar por uma série de processos fotográficos, redefinindo sua imagem. Nestas situações, sabe-se que ocorre essa manipulação, mas mesmo assim a imagem (verossímil) faz entender a excelência do produto.
Foi dada uma visão negativa para a retórica, pois ao longo do tempo ela foi modificada em suas funções e ganhou relação com o embelezamento, com o esvaziamento das idéias. Os parnasianos se encontraram nesse vazio da retórica de enfeite, onde até se pode citar um exemplo: o poema Profissão de fé, de Olavo Bilac. Percebemos no texto que o ato de escrever ganha um sentido de trabalho artesanal, onde se deve haver um ritual para realizá-lo. A retórica se renovou criando um laço com a poética. Jean Dubois e o grupo da Universidade de Liège foram fundamentais para os trabalhos desenvolvidos. A retórica poética se vincula com o estudo das figuras da linguagem e o das técnicas de argumentação. Para Umberto Eco ela é uma técnica de raciocínio lógico controlada pela dúvida e submetida a todos os condicionamentos de qualquer ato humano.
Existem alguns raciocínios discursivos: o raciocínio apodítico que fornece uma verdade única, sem deixar caminho para dúvidas. Exemplo: Zupavitin, a sopa que emagrece 1 quilo por dia; o raciocínio implícito que usa o imperativo para erradicar com possíveis questionamentos. Exemplo: Se você quer emagrecer, deve tomar Zupavitin; e, por último, o raciocínio dialético que mostra várias possibilidades usando o verbo na condicional, mas aponta à mais desejada. Exemplo: Você poderia comprar várias marcas de sabão em pó, mas há uma que lava mais branco. Deste último para o raciocínio retórico temos a ausência do convencimento racial, mas em troca temos o apelo emotivo – a retórica envolve o receptor através da mente e coração.
Para segurar a atenção do receptor usam-se as figuras de retórica, as quais são importantes, pois quebram o significado esperado pelas palavras do discurso. Roman Jakobson define a metáfora e a metonímia como matrizes textuais, onde se revezam na sua dominância.
O texto, o período e a frase nascem da inter-relação dos signos – o significante (o audível) e o significado (o legível), segundo orientações de Ferdinand de Saussure. Exemplo: a palavra “cabeça” (significante) e a imagem de uma cabeça (significado). Ambos formam a mesma unidade: a significação. Assim, duas deduções possíveis: a primeira é que significante e significado (o signo) pode haver diversas significações, mas é arbitrário; e a segunda é que o signo é simbólico, não se confunde com as palavras. S. Ullmann aponta um relacionamento dos objetos com o nome através do sentido. Emile Benveniste vê que a relação nome-objeto (palavra-coisa) não se dá somente pela arbitrariedade, mas também pela necessidade. O contexto gera a necessidade de nomeação dos objetos. O signo pode indicar o rumo do discurso, inclusive o grau de persuasão.
Mikhail Bakhtin adverte que a forma que se coloca o signo dentro dos recursos lingüísticos revela ideologias. Em Marxismo e filosofia da linguagem, o teórico soviético afirma que tudo o que é ideológico é um signo e que sem eles não existe ideologia. Exemplo: o martelo possui valor de ferramenta de trabalho, mas ao passar para um contexto diferente pode ser convertido em signo: na bandeira da ex-URSS tem o signo de “estado construído pela aliança dos trabalhadores urbanos (martelo) e rurais (foice)”. O valor do signo de instrumento de trabalho muda para trabalhadores urbanos ou operários. Existem inúmeros exemplos de objetos que agora possuem outro sentido: a balança para a justiça e a pomba para a paz são alguns que passaram do plano denotativo (balança / pomba) para o conotativo (justiça / paz). Assim o signo só pode ser pensado socialmente e em um contexto. Muitos empresários empregam o termo livre-empresa para não dizer que a empresa é aberta ao capitalismo. Ambos os modos de expressar possuem o mesmo significado. Ocorre o eufemismo, que não é um processo sinonímico, mas um enriquecer algo que era evidente e desgastado, pois a abertura ao capitalismo embute exploração do homem e ganância, ao contrário de livre-empresa que sugere o oposto. Por que trocar os nomes? Porque essa troca estimula reações emocionais no receptor e da um novo contexto ao signo, que por sua vez ganha novas idéias e novos valores. Para Brecht, dramaturgo alemão, a função ideal para a comunicação de massa era saber nomear as coisas: nacional-socialismo é diferente de nazismo. Umberto Eco mostra a relação signo e ideologia no discurso dizendo que o modo que se empregou a linguagem determina o modo de pensar a sociedade. Até agora vimos que o discurso persuasivo usa signos para adotá-los como verdade, alterando algo já estabelecido. Assim, se deduz que é também um discurso institucional já que usa signos fechados. Tanto as macroinstituições (judiciário, igreja, escola etc.) ou microinstituições (família, classe escolar, amigos etc.) determinam signos que serão aceitos como uma verdade absoluta. Isso mostra que os signos derivam e indicam as instituições de onde tiveram origem.
Marilena Chauí é quem desenvolve o conceito de discurso competente já que a sociedade tem como característica premiar as competências. A eficiência é atribuída às medalhas e aos tons pejorativos dados às pessoas de forma indevida. O discurso burocrático-institucional, embora aparente ser neutro e científico, é a causa desse desvio. Com isso temos os que falam “a” e “pela” instituição e os que são “por ela falados”. Esse discurso faz com que as verdades de uma instituição se tornem a verdade de todos os seus associados. Esse discurso impõe aos homens uma conduta pessoal. Já se viu as relações entre a ideologia, discurso persuasivo e as instituições e agora veremos outros tipos de discurso. Eni Orlandi em seu livro “A linguagem e seu funcionamento” mostra três grandes tipos: o polêmico, o lúdico e o autoritário. Todos são autônomos: um pode conter o outro, mas um é dominante e mais visível, assim sendo, é o que caracteriza o discurso. Discurso mais aberto, democrático. Significa jogo de interlocuções que propicia novos sentidos ao signo. Corresponde à maioria dos textos artísticos como exemplo podemos citar a música e a literatura. Possui um grau de persuasão mais elevado onde causa uma luta entre os interlocutores com a finalidade de um derrotar o outro. Corresponde a um vasto grupo de discussões como as entre amigos, entre familiares (na família), na defesa de uma tese, em uma aula e em um editorial jornalístico. É a mais persuasiva. Não se abre para mediações, é exclusivista. Ganha um tom de monólogo. Pode ser mais, ou menos, visível na família: o pai manda. Para melhor compreensão, Courdesses tem um esquema que analisa os discursos em função de quatro elementos: distância. Relação entre enunciador e enunciado; modalização. Como é feita a construção do enunciado; tensão. Relação entre os interlocutores; e transparência. Grau de visibilidade do enunciado em relação ao enunciador. As metáforas não se encaixam no discurso autoritário.
Na publicidade Sem o aspecto visual e sim verbal, o texto publicitário vai atrás de uma originalidade instigante produzindo-os de modo a quebrar as normas já estabelecidas para causar impacto no receptor. Por causa da redemocratização, tabus são livres para serem usados e garantem a persuasão dos textos. Mas mesmo os mais criativos usam lugares-comuns e pessoas bem sucedidas para recomendar o produto. São vários os fatores que originam o texto publicitário. Exemplo: “Nove entre dez estrelas do cinema usam Lux”. Primeiro fator: o slogan – assim como um bom slogan está formado por cinco ou sete palavras gramaticais; o raciocínio – usa o silogismo (parte de uma premissa maior, as mais belas usam Lux, para um menor, você é bela ou quer ser, chegando a uma conclusão: deve usar Lux); o uso de figuras de retórica – comparação (estrela de cinema com a mulher comum) e hipérbole (exagera: nove entre dez). E ainda no slogan fazem uma pressão psicossocial – exclusão (uma única, das dez, não usa Lux) e símbolo (beleza é um símbolo que a sociedade criou e está relacionado sucesso e vitória). È um dos discursos mais persuasivos, sendo muito autoritário. Possui o eu persuasivo muito invisível, já que não é Deus quem fala, por ser imaterial, mas um representante. Eni Orlandi usa o termo “ilusão de reversibilidade” para mostrar a impossibilidade de interação entre emissor (Deus) e receptor, pois se usa um intermediário. Exemplo: Credo, um dos textos religiosos mais conhecidos. Primeiro ele estabelece uma relação entre o homem (plano humano) e a fé (plano espiritual). Depois segue o discurso clássico-aristotélico: o exórdio (Creio em Deus Pai todo poderoso, [...] pelo poder do Espírito Santo;) esclarece a desigualdade entre homem (o que crê) e Deus (nosso Senhor); a narração (nasceu da Virgem Maria, [...] ressuscitou ao terceiro dia;) conta a vida e morte de Cristo, explicando e provando. Coloca a morte antes da vida, morrer é chegar à vida eterna, a felicidade; e a peroração (subiu aos céus, [...] Amém.) coloca a condição básica para a salvação: crer. A reza acentua a persuasão através de imperativo, vocativo subjacente, função emotiva, metáforas, parábolas, paráfrase e estereótipos e chavões. É fortemente marcado por estereótipos e ideologias. São textos separados por temas e com os quais buscam formar “bons hábitos”. Como são fortes no estereótipo, são marcados também por estandardização e lidam com uma classe média. No texto Minha família, de Yolanda Marques, temos uma criança que apresenta sua família como modelo padrão desejável. Por ser a narradora uma criança, carrega-se o texto com maior veracidade. Então são apresentados dois preconceitos: ser feliz por ter a família unida excluindo a felicidade dos casais separados (desunidos) e estabelece os tipos de trabalhos a serem desenvolvidos pelos diferentes sexos (masculino sustenta a casa e feminino cuidar da casa, função doméstica). Ela descreve uma família harmoniosa (sem graus de tensão interna).
Pegando como exemplo o Capítulo CXXIII, Olhos de ressaca, de Dom Casmurro, Machado de Assis, e um fragmento de O cortiço, de Aluísio Azevedo, podemos ver possíveis relações entre o discurso literário e a persuasão. Em Dom Casmurro, se tem a alternância entre afirmação e dúvida. Por ser Bentinho um narrador comprometido na estória podemos duvidar, pois ele valida somente um ponto de vista, esquecendo as outras versões. No trecho ele narra como sua mulher olhava para o corpo de Escobar, acreditando em um possível adultério entre Capitu e o defunto. Essa dúvida alimenta o texto de modo a impedir definições sobre o que realmente aconteceu. Já em O cortiço, o modo de organização é diferente: é precisamente descritivo e minucioso. Usa isto para a materialização do ser humano embasado no seu comportamento.
São Paulo capital recebe todas as manhãs uma rajada de informação através de dois eventos jornalísticos: Gil Gomes se coloca como um justiceiro que, ao mesmo tempo em que relata, julga; e em Notícias Populares, coisas espetaculosas ficam empolgantes. Este último fornece a alegria pela infelicidade de outros. Já o outro é carregado de seriedade para mostrar que os bons também têm o seu lugar. Mas mesmo diferentes eles possuem igual forma de persuasão, pois possuem uma linguagem unidirecional (o receptor só ouve), um modo para se dizer as coisas (modalização com hipérboles, advérbios e adjetivos que superdimensionam a notícia), uma transparência (fácil decodificação da mensagem), uma distância (os emissores se sobressaem mais que o emitido), um jogo com o emocional (o emissor domina o receptor através do impacto) e, por fim, um trabalho com o inusitado (para provocar estranhamento; usa ângulos diferentes de visão).
Mas é possível um discurso sem persuasão? Primeiro, temos que ter claro que persuadir não é sinônimo de mentira: é a vontade de fazer alguém aderir a algum comportamento, seja ele bom ou mal; segundo, a persuasão só existe se houver a livre circulação de idéias, pois, diferentemente da ditadura, deve haver choque de idéias; terceiro, mesmo com os menos persuasivos fica difícil de imaginar a não persuasão. Os textos artísticos tendem a essa expressão mais livre, assim como se diz no quarto ponto, a arte moderna e a vanguarda possuem muitas desta natureza antipersuasiva.
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