O Artigo Sobre Adm Pública
Por: Thalles Melo • 18/1/2022 • Artigo • 8.931 Palavras (36 Páginas) • 100 Visualizações
Os processos de transparência e accountability em municípios da Região Metropolitana de Porto Alegre na pandemia de Covid-19
Thales[a]
Lui[b]
Resumo
O presente trabalho se inscreve nas discussões sobre os processos accountability no Brasil. Para tal, empreendeu-se uma análise sobre como os portais da transparência dos municípios da Região Metropolitana de Porto Alegre estão dispostos para que haja a adequação à Lei 13.979/20, que, dentre os instrumentos jurídicos, estabelece a obrigatoriedade de disponibilizar os gastos relativos ao combate à crise sanitária devida à pandemia de SARS-COV-2. Em termos metodológicos, o artigo é um estudo de caso que utiliza a abordagem exploratória. Constatou-se que, em municípios que possuem portais da transparência próprios, estes são mais adequados às prerrogativas legislativas quanto maior o porte do município. Em relação aos municípios que terceirizam os seus portais, há uma maior precariedade nas informações disponibilizadas quanto constratados estas com os requisitos legislativos. Conclui-se que, apesar dos avanços obtidos desde a promulgação da LAI, é necessário aprimorar os mecanismos de transparência e accountability do setor público.
Introdução
Este artigo objetiva investigar de que forma os municípios da Região Metropolitana de Porto Alegre se estruturaram para cumprir as prerrogativas de tornar público os gastos relativos à dispensa de licitação durante a crise sanitária causada pela Sars-Cov-2. Para tal, empreende-se uma discussão a partir da literatura sobre accountability no Brasil, além de referenciá-la mediante a Lei 8.666/93 e a Lei 13.979/20, que, dentre as prerrogativas, condicionam o gestor a gerar a publicidade dos atos adminsitrativos.
A discussão sobre transparência e publicidade vem sendo impulsionada no Brasil a partir de diversos estudos (FILGUEIRAS, 2011; SALGADO, AIRES, 2017). Segundo o IBGE (2020), 45% dos municípios brasileiros possuem legislação específica de acordo com a Lei de Acesso à Informação (LAI) e 86% disponibilizam, pela internet, meios para solicitação de informações públicas.
Um capítulo recente das esferas administrativas públicas no que concerne ao acesso à informação é a Lei nº 13.979/20, que estabelece normativas para combater a propagação do vírus Sars-Cov-2. A lei foi promulgada com base no art. 196 da Constituição da República, que institui a saúde como um direito fundamental do cidadão, assim como estabelece como dever do Estado a oferta serviços de saúde (BRASIL, 2020). A fim de que o pico de contágio não conduzisse o sistema de saúde ao colapso, além de prever protocolos para o estabelecimento de mecanismos de isolamento social e aplicar as definições estabelecidas pelo Regulamento Sanitário Internacional da OMS (UCHÔA, UCHOA; 2020), a lei visava ampliar a discricionariedade do gestor no sentido de dar margem à atenuação de procedimentos burocráticos, como, por exemplo, o processo de licitação.
Nesse sentido, a lei 13.979/20 propunha estabelecer a dispensa de licitação para os provimentos utilizados no combate à SARS-CoV-2. O legislador não estipula um rol restritivo de insumos que podem ter dispensa de licitação, apenas os descreve de maneira genérica. Assim, estabelece-se que há a possibilidade de dispensa de licitação para bens, serviços, inclusive de engenharia, e insumos destinados ao enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do coronavírus (BRASIL, 2020). Logo, cabe ao gestor decidir quais são as medidas necessárias para que o sistema de saúde dê conta de abarcar o número de enfermos que necessitem de cuidados.
Todavia, o legislador impôs condicionantes para que haja a dispensa de licitação. A primeira se refere à exclusividade dessa modalidade de compras para o combate à pandemia. Desse modo, o instrumento jurídico só terá vigor enquanto durar a crise sanitária. Por fim, conforme o § 2 da lei, há a obrigatoriedade de disponibilizar as contratações realizadas com o fulcro dessa lei em sítio oficial específico na rede mundial de computadores.
A obrigatoriedade de disponibilizar as compras efetuadas sem licitação em sítios oficiais será o objeto de análise do presente artigo. Entende-se que a transparência mediante a disponibilização de dados abertos condiciona mecanismos de accountability, uma vez que reforça a responsabilização dos administradores públicos perante suas ações.
Desse modo, o estudo tem o objetivo de verificar de que modo se constitui a resposta administrativa para disponibilizar os dados abertos governamentais referentes à dispensa de licitação durante a crise sanitária de SARS-COV-2. Entretanto, não se objetiva mensurar a efetividade da prestação de contas, assim como a responsabilização do gestor público, mas sim a disponibilização dos dados que geram o processo de accountability.
Para tanto, o artigo, além da introdução, está dividido em 4 partes. Em um primeiro momento, há uma discussão sobre accountability e portais da transparência a partir dos marcos legais. Em seguida, a hipótese de dispensa de licitações em situações de emergência é discutida. A seguir, há uma revisão da literatura sobre os portais da transparência no Brasil. Após a contextualização teórica, empreende-se o desenvolvimento metodológico e o modelo de análise. Depois, há a apresentação dos dados e a discussão destes. Por fim, encerra-se o artigo com uma seção conclusiva.
Avaliação e responsabilização dos agentes públicos mediante a Accountability
Um dos fundamentos da democracia moderna é a contraposição ao despotismo, que institui no Estado a participação por meio da soberania popular (BOBBIO, 1998). Contemporaneamente, tem-se na democracia a forma de representação da vontade popular. Todavia, esta distância entre a representação e a participação pode atenuar o papel soberano da população. Para isso, existem meios institucionais que auxiliam o aspecto democrático, tais como a divisão de poderes, descentralização política, eleições periódicas, etc. Além diasso, há um conjunto de instrumentos que servem para promover a transparência e accountability dos atos tomados pelos agentes do Estado.
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