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A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

Por:   •  7/3/2019  •  Monografia  •  4.795 Palavras (20 Páginas)  •  178 Visualizações

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3. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

3.1 CONCEITO

Como já estudado, as pessoas jurídicas possuem personalidade distinta dos sócios que a compõem, e como ressalta Didier Junior (2016, p. 524):

É, portanto, instrumento técnico-jurídico desenvolvido para facilitar a organizar da atividade econômica. É técnica criada para o exercício da atividade econômica e, portanto, pra o exercício do direito de propriedade. A chamada função social da pessoa jurídica (função social da empresa) é corolário da função social da propriedade. Se assim é, o caráter de instrumentalidade implica o condicionamento do instituto ao pressuposto do atingimento do fim jurídico a que se destina.

Isso, contudo, faz com que em algumas ocasiões as sociedades empresárias sejam utilizadas como instrumento de fraude e abuso contra eventuais credores. Alguns sócios, aproveitando-se do instituto e com o objetivo de se eximirem de suas obrigações perante terceiros utilizam a pessoa jurídica como forma de proteger, em muitos casos, seus próprios bens. A pessoa jurídica, nesse sentido, é utilizada como manto protetor do patrimônio dos sócios.

Daí que, diante da necessidade de se reagir desses abusos, nasceu a teoria da desconsideração da personalidade jurídica que no direito anglo-americano foi nomeada como disregard of legal entity, no direito francês abus de la notion de personnalité sociale, no direito italiano superamento dela personalità giuridica e, por fim, no direito alemão, Durchgriff der juristischen Personen, como ensina Gonçalves (2013, p. 249).

Assim, em caso de fraude, má-fé, abuso de personalidade, desvio de função, poderá o Juiz desconsiderar que as pessoas jurídicas existem diversamente dos seus membros, de modo a atingir, nesse contexto, os bens particulares dos seus sócios para a satisfação das dívidas e obrigações da sociedade.

Fábio Ulhoa Coelho, citado por Gonçalves (2013, p. 250), destaca que na desconsideração da personalidade jurídica o Juiz pode:

Deixar de aplicar as regras de separação patrimonial entre sociedade e sócios, ignorando a existência da pessoa jurídica num caso concreto, porque é necessário coibir a fraude perpetrada graças à manipulação de tais regras. Não seria possível a coibição se respeitada a autonomia da sociedade. Note-se, a decisão judicial que desconsidera a personalidade jurídica da sociedade não desfaz o seu ato constitutivo, não o invalida, nem importa a sua dissolução. Trata, apenas e rigorosamente, de suspensão episódica da eficácia desse ato. Quer dizer, a constituição da pessoa jurídica não produz efeitos apenas no caso em julgamento, permanecendo válida e inteiramente eficaz para todos os outros fins... Em suma, a aplicação da teoria da desconsideração não importa dissolução ou anulação da sociedade.

Assim, um esclarecedor conceito trazido por BRUSCHI, NOLASCO e AMADEO (2015, p. 138) é o de que a desconsideração da personalidade:

É um meio de repressão à frustração da atividade executiva, caracterizado pela decretação da inoponibilidade (ineficácia relativa) do limite patrimonial da pessoa jurídica, permitindo que sejam atingidos os bens de seus sócios, ex-sócios, acionistas, ex-acionistas, administradores, ex-administradores e sociedades do mesmo grupo econômico; ou ainda, que sejam atingidos os bens da pessoa jurídica por obrigações contraídas por eles, no caso da chamada “desconsideração inversa da personalidade jurídica”.

Outra conceituação importante é trazida por Gonçalves (2013, p. 274):

Em linhas gerais, a doutrina da desconsideração pretende o superamento episódico da personalidade jurídica da sociedade, em caso de fraude, abuso, ou simples desvio de função, objetivando a satisfação do terceiro lesado junto ao patrimônio dos próprios sócios, que passam a ter responsabilidade pessoal do ilícito causado.

E também assim Fábio Konder Comparato, também citado por Gonçalves (2013, p. 275), ressalta que a “desconsideração da personalidade jurídica é operada como consequência de um desvio de função, ou disfunção, resultando, sem dúvida, as mais das vezes, de abuso ou fraude, mas que nem sempre constitui um ato ilícito”.

De tudo isso se conclui que a desconsideração da personalidade jurídica jamais almeja extinguir, por fim a pessoa jurídica, mas apenas suspender, de forma episódica, a eficácia de sua distinção das pessoas dos sócios, como modo de que possam assim responder pelas obrigações contraídas pela pessoa jurídica. E assim ressalta Didier Junior:

A teoria da desconsideração da personalidade jurídica não pretende eliminar o histórico princípio da separação dos patrimônios da sociedade e de seus sócios, mas, contrariamente, servir como mola propulsora da funcionalização da pessoa jurídica, garantindo as suas atividades e coibindo a prática de fraudes e abusos através dela. Ela atua episódica e casuisticamente.

Logo, e uma vez que os prejuízos dos credores estejam ressarcidos, com a responsabilização pessoal dos sócios, os responsáveis pelos ilícitos praticados, “a empresa, por força do próprio princípio da continuidade, poderá, desde que apresente condições jurídicas e estruturais, voltar a funcionar”, como ensina Gagliano e Pamplona Filho (2010, p. 275).

E nesse ponto, importante destacar a diferença entre os conceitos de despersonalização e desconsideração da pessoa jurídica. A despersonalização é o fim, a extinção da própria pessoa jurídica, quer por sua dissolução, quer por cassação da autorização de funcionamento. Já a desconsideração, como visto, é a “se refere apenas ao seu superamento episódico,em função de fraude, abuso ou desvio de finalidade” (Gagliano e Pamplona Filho, 2010, p. 276).

3.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA

De acordo com BRUSCHI, NOLASCO e AMADEO (2015, p. 139), a desconsideração da personalidade jurídica originou-se na jurisprudência dos Estados Unidos e da Inglaterra, por volta do século XIX e, posteriormente, sistematizada por Maurice Wormser, nos Estados Unidos no século XX, Rolf Serick na Alemanha e Piero Verrucoli na Itália.

O precedente mais famoso sobre a desconsideração da personalidade jurídica é que deu início ao desenvolvimento da teoria foi o caso Salomon v. Salomon and Company, na Inglaterra, em 1987. E como destacam BRUSCHI, NOLASCO e AMADEO (2015, p. 139), o caso Salomon v. Salomon and Company e Bank of United States vs. Deveaux: 

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